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domingo, 21 de novembro de 2021

Guiné 61/74 - P22738: Memória dos lugares (430): Tabatô, a tabanca da utopia, a 10 km, a nordeste de Bafatá - Parte I

 

Guiné > Região de Bafatá > Carta de Bafatá (1955 ) > Escala 1/50 mil > Posição relativa de Bafatá e de Tabatô que fica a cerca de 10 km, a nordeste, do lado direito da estrada que vai para Contuboel.

Infografia: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2021)


1. Heureca!...  A fim destes anos todos (!), descobri finalmemte a localização precisa da famosa tabanca de Tabatô. E mais: vi escrito o topónimo na carta de Bafatá... 

Nunca lá fui no tempo em que estive em Contuboel (de 2 de junho a 18 de julho de 1969), embora devesse ter andado por lá perto, uma vez que a CCAÇ 2590 (, futura CCAÇ 12) fez a IAO num raio de 15 km à volta de Contuboel, em farda nº 3 (as praças do recrutamento local), e com espingardas G3 apenas com cartuchos de salva... Só os graduados tinham nos bolsos uma dúzia de balas reais, não fosse o diabo tecê-las... 

Mas na altura o subsetor de Contuboel era um verdadeiro "oásis de paz", com as mais belas tabancas da Guiné,que nunca mais voltei a ver ... (*) Na realidade, nunca devo lá ter ido, a Tabatô, se não, lembrar-me-ia do seu nome... Afinal, os exercícios finais da instrução de especialidade da CCAÇ 2590 decorreram entre 6 e 12 de Julho de 1969, a 10 km a norte de Contuboel, e não a sul (*).

De facto, nem sequer o nome me ficou no ouvido. A primeira vez que ouvi falar em Tabatô foi através do João Graça que lá passou uma noite, memorável, de 15 para 16 de dezembro de 2009 (**).

Já aqui escrevi, há mais de 10 anos atrás: 

"Devo dizer, com toda a sinceridade, que nunca ouvi falar da Tabatô, durante a guerra colonial. (...) Foi o meu filho que me contou a sua experiência ímpar. Passou lá uma noite a curtir a música afro-mandinga e a tocar também 'world music' para os seus novos amigos...

"Tabatô, a aldeia de Kimi Djabaté, é agora a tabanca mais famosa da Guiné-Bissau. É já um lugar mítico, nomeadamente para a malta nova, que não vai em 'turismo de saudade', à procura de lugares e restos do passado, vai à descoberta do futuro, desse continente do futuro, que é a África... E quer ajudar a construir também esse futuro... Nem sei se Tabatô existia no tempo da guerra colonial... Já pedi ao meu amigo Pepito para saber da história da aldeia" (***).


O saudoso Pepito, que tinha uma forte ligação ao subsetor de Cntuboel, onde trabalhou como engenheiro agrónomo, e que representou como deputado na Assembleia Nacional do seu país, deu-me as primeiras coordenadas do lugar (****):

(...) " Luís, Tabató é uma tabanca muito antiga e sempre foi conhecida por ser uma povoação de djidius, isto é cantores, mas cantores que andam de tabanca em tabanca contando a história passada, os feitos individuais e colectivos marcantes e, desta forma, asseguram às novas gerações o conhecimento do passado.

Não me recordo o nome deles na Europa, mas andará à volta de jograis ou trovadores.
[Griots, em inglês e em fancês (LG)]

Alguns são contratados para enaltecerem as qualidades reais ou fictícias de certas pessoas.

É natural que não conheças esta tabanca, uma vez que se situa depois do cruzamento para Contuboel (de quem sai de Bafatá para Gabú), e a cerca de 5 Km da tabanca principal.

É uma tabanca de Djacancas, etnia aparentada aos Mandingas. Abraço, Pepito" (...).

2. Pergunto-me o que será a tabanca hoje ? (*****) E como é que lá se
 chega?  

Tabatô  tem beneficiado de bastante "mediatização" nos últimos anos (nomeadamente com o filme "A batalha de Tabatô", do realizador português João Viana)  e tem já alguns filhos ilustres, nomeadamente músicos. 

Descobri, entretanto, que qualquer um de nós pode lá passar uns dias úteis e agradáveis, para não  dizer umas "férias únicas", como "workawayer", hóspede que paga em trabalho (5 horas por dia / 5 dias por semana) a hospedagem, traduzida em "cama, mesa  & roupa lavada"... Ou eja, Tabatô está no roteiro mundial do turismo alternativo...

Também fiquei a saber que a tabanca de Tabatô não é apenas célebre pela sua escola de música, e por ser um grande viveiro da música, dos músicos e dos instrumentos musicais da tradição afro-mandinga. É também uma comunidade viva e aberta, tendencialmente igualitária, e que se tem empennhado na luta por causas nobres e avançadas como os direitos humanos, o desenvolvimento autossustentado,  a igualdade de gênero,  a mutilação genital feminina, a saúde pública, as alterações climáticas, etc.

Só é pena que as viagens para Bissau ainda sejam caras... E, convenhamos, ainda temos o problema da pandemia de Covid-19 por resolver... Mas pode ser um belo projeto para o futuro... Confesso que ainda lá gostava de ir, mesmo não sendo músico... (LG)

(Continua)


Guiné-Bissau > Bissau > Dezembro de 2009 > No conhecido e conceituado Hotel Spa Coimbra, sito na Av Amílcar Cabral, em pleno centro: da esquerda para a direita, o João Graça, o Mamadu Baio (músico da tabanca mandinga de Tabatô de onde é natural o Kimi Djabaté), o Vitor (cooperante espanhol), a Catarina Meireles (médica, portuguesa, minha antiga aluna na Escola Nacional de Saúde Pública)... Os restantes cinco elementos não sei, de momento, identificá-los. 

O João Graça, músico e médico, na altura interno de psiquiatria, esteve na Guiné duas semanas, em Dezembro de 2009, tendo estado mais tempo em Iemberém (onde prestou cuidados de saúde à população local, durante cinco dias), além de Bissau, e visitado ainda a zona leste (Bafatá, Tabatô, Gabu, Contuboel...) e a região do Cacheu (S. Domingos). Em Bissau conheceu a colega Catarina Meireles. É membro da nossa Tabaa Grande tal como o Mamadu Baio e o Kimi Djabaté.

Foto (e legenda): © João Graça (2009). Todos os direitos reservados.[Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

____________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 25 de Junho de 2010 > Guiné 63/74 - P6642: A minha CCAÇ 12 (4): Contuboel, Maio/Junho de 1969... ou Capri, c'est fini (Luís Graça)

(**) Vd. poste de 12 de julho de 2010 > Guiné 63/74 - P6720: Álbum fotográfico de João Graça (4): Uma noite memorável na terra de Kimi Djabaté, a tabanca jacanca de Tabatô

(***) Vd. poste de 8 de Julho de 2010 > Guiné 63/74 - P6695: Memória dos lugares (82): Bafatá, Tabatô, Tabaski 2009:Não há preto nem branco, somos todos irmãos, disse a Fátima de Portugal numa cadeia de união... (Catarina Meireles)

(****) Vd. poste de 11 de julho de 2010 > Guiné 63/74 - P6713: Memória dos lugares (91): Tabatô, tabanca antiga de Djacancas, berço de didjius, terra de Kimi Djabaté (Pepito)

(****) Último poste da série > 11 de novembro de 2021 > Guiné 61/74 - P22709: Memória dos lugares (429): Formosa és tu, Cacela... (Poema e fotos do Eduardo Estrela, ex-fur mil at inf, CCAÇ 14, Cuntima e Farim, 1969/71)

segunda-feira, 12 de julho de 2010

Guiné 63/74 - P6720: Álbum fotográfico de João Graça (4): Uma noite memorável na terra de Kimi Djabaté, a tabanca jacanca de Tabatô


















Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Tabatô > 15/16 de Dezembro de 2009 > Músicos, homens e mulheres, da etnia minoritária jacanca (leia-se, djacanca), da famíla de Kimi Djabaté (*), tocando os seus instrumentos (balafón, kora...), experimentando os instrumentos (violino) do outro, mostrando  a sua música, oferecendo a sua hospitalidade... Uma noite memorável que emocionou o João Graça (**), médico e músico, em viagem  pelo Leste (Bambadina, Bafatá, Contuboel, Gabu...). 

O João ficou, nessa noite, na casa dos Super Camarimba,  o conhecido grupo de música afromandinga da aldeia de Tabatô, liderado por Mamadu Baio. No seu bloco de notas, o João registou (e a foto documenta...) que na casa havia uma pele de cascavel [?], de mais ou menos 7 metros, morta um mês antes. O João irá encontrar (e tocar com) os Super Camarimba, em Bissau, dois dias depois (haveremos também de publicar as fotos desse encontro)... Eles tinham acabado de participar num festival de música... 

Esperemos que o João arranje tempo para publicar aqui as suas prometidas notas de viagem, e transmitir-nos as emoções que sentiu ao ver reunir-se à sua volta 20 músicos que tocaram e cantaram, para ele,  nessa noite... Ele retribuiu essa magnífica hospitalidade tocando também, no seu violino, música do seu reportório "world music"... 

"Eles agradeceram que um músico europeu tenha vindo a Tabatô", escreveu o João no seu bloco de notas.
De facto, "o momento da viagem [à região de Bafatá] foi a recepção em Tabatô. Inicialmente o Homem Grande (o tio do Kimi Djabaté) estava a ver TV, mas o Demba [, primo do Mamadu Baio e do Kimi,]  lá o convenceu a mostrar o estaminé, à entrada da sua casa.  Era preciso meter gasolina no gerador, mais ou menos 1000 francos (cerca de 1,5 €) para amplificar as vozes. Chegaram os balafons, o kora, os djambés,  o coro feminino"...

Na sua biografia oficiosa, na sua página pessoal, em My Space / Kimi Djabaté, diz-se que Tabatô foi uma prenda do poder reinante na região, há muitos, muitos anos atrás,  aos seus antepassados, músicos ambulantes,  que vieram do Mali...e que encantaram os seus hóspedes com a sua música... Mais obscura parece ser a história da aldeia durante o período colonial... Kimi nasceu já depois da independência, em 1975, e como muitos outros meninos africanos (e portugueses...)  conheceu a dura experiência de ter um "pai e patrão"...

Kimi Djabaté, o filho mais ilustre de Tabató, viveu aqui até aos 21 anos. Na última foto, aqui publicada (a contar de cima para baixo), vê-se o chefe da aldeia, que é tio do Kimi...

(... )Kimi Djabaté was raised in Tabato, Guinea-Bissau, a village known for its griots, hereditary singer-poets whose songs of praise and tales of history and legends play an essential role in Africa's musical life.

Centuries ago, Djabaté's ancestors, a wandering troupe of musicians from Mali, traveled to the region and the king of Guinea so loved their songs he invited them to stay and offered them the territory of Tabato.

Ever since, the area has been a recognized center for music, dance, handcrafts and other creative arts. Djabaté was born into a poor but musically accomplished family in Tabato on January 20, 1975.

His parents, two brothers and his sister were all professional musicians. Recognized as a prodigy, Djabaté began playing the balafón, the African xylophone, when he was just three years old and soon after learned to play many other traditional instruments. As a pre-teen he was sent to the neighboring village of Sonako to study the kora, which provided a foundation for subsequent accomplishments as a guitarist.

As his musicianship developed, Djabaté also mastered a wide variety of traditional drums and other percussion instruments. Music was not a past time or a hobby for the young Djabaté, however, and from a very young age he was obliged to contribute to the family's income by performing at weddings and baptism ceremonies.

Djabaté's early talents proved both a gift and a burden, as his family often forced him to sing and dance against his will, and he had little time to partake in the carefree fun and games of other children his age.

Djabaté's parents as well as his uncle, provided the young phenom with excellent training in traditional Mandingo music, but Djabaté was also interested in popular African genres such as the local dance music style gumbé, Nigerian Afrobeat, Cape Verdean morna, not to mention western jazz and blues.

In 1994, Djabaté toured Europe as a member of the national music and dance ensemble of Guinea-Bissau, and he decided to settle in Lisbon, Portugal. Djabaté's move to Europe proved to be one of the most difficult experiences of his life, and he faced many personal challenges adapting to a different culture and society. (...)



O cantor, guitarrista e exímio tocador de balafón [xilofone africano), vive em Portugal desde 1994. Próximos concertos do Kimi Djabaté (façam o favor de divulgar):

16 de Julho de 2010, 21h00 > Tom de Festa, ACERT, Tondela
30 de Jullho de 2010, 18h00 > Sines - Festival de Músicas do Mundo, Castelo de Sines, Sines
5 de Agosto de 2010, 21h30 > Festival Sons do Atlântico, Lagoa, Algarve
4 de Setembro de 2010, 21h30 > Festa do Avante, Seixal

Fonte: http://www.myspace.com/kimidjabate

Comprem o último álbum dele, saído em Julho de 2009, Karam (Educação, em mandinga), sob a prestigiada etiqueta norte-americana Cumbancha. É obrigatório comprar e ouvir muitas vezes... Um cheirinho (da sua música e da nossa querida Guiné...) pode ser sentido aqui:


Um dos músicos que toca com ele, é o Braima Galissá, o mestre do kora, já diversas vezes referido no nosso blogue. São dois grandes nomes da música e da cultura da Guiné-Bissau de hoje. (LG)

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