sábado, 29 de fevereiro de 2020

Guiné 61/74 - P20695: (D)o outro lado do combate (54): memórias do militante do PAIGC , Inácio Soares de Carvalho, cabo-verdiano, funcionário do BNU - Banco Nacional Ultramarino, em Bissau, detido pela PIDE em 1962, em seguida deportado para o Tarrafal, donde regressa em 1965, sendo colocado na Ilha das Galinhas... Liberto em 1967, é de novo preso em 1972 e 1973... Regressa à sua terra natal, em finais de 1970, afastando-se da vida política ativa... Morreu em 1994 - Parte I (Carlos de Carvalho, Praia, Santiago, CV)


Capa e contracapa do livro "Memórias da Luta Clandestina", de Inácio Soares de Carvalho. Foto: cortesia de Expesso das Ilhas, 30/1/2020.


1. As memórias de Inácio Soares de Carvalho já não são inéditas nesta data... O livro "Memórias da Luta Clandestina" já foi lançado, no passado dia 30 de janeiro, na Praia, capital de Cabo Verde, na Biblioteca Nacional.  

Dois meses antes, um dos filhos, Carlos de Carvalho, arqueólogo e historiador, que coordenou o projeto editorial, pediu-nos autorização para reproduzir uma foto do administrador Guerra Ribeiro, da autoria de Paulo Santiago (*). Autorizou-nos, ao mesmo tempo, a reproduzir alguns excertos daobra

Aqui vão alguns excertos das suas mensagens:


(i) sexta, 22/11/2019, 13:37


Exmo. Senhor Luís Graça

Antes de mais meus melhores cumprimentos.

Sou Carlos de Carvalho, natural da Guiné, de nacionalidade cabo-verdiana.

Estou concluindo as Memórias de nosso falecido pai, um Combatente de Liberdade da Pátria, Inácio Soares de Carvalho, de nome de luta Naci Camara, várias vezes preso pela PIDE durante o tempo que durou a luta pela independência.

As Memorias narram a vida politica dele desde 1956 a 1974.  (...)

(ii) sexta, 22/11/2019, 19:13

Caro Sr. Luís Graça,

Boa tarde.

Confesso ter ficado surpreso com sua pronta resposta. Pensava que levaria dias a me responder. Confesso também ter ficado surpreso, claro pela positiva, com o conteúdo de seu email.

É verdade que é um dever de memória resgatar parte de nossa história comum. É o que faremos publicando a obra de nosso velho.(...)

Envio em anexo, extractos do Livro para sua apreciação e com autorização de o publicar no seu/nosso blogue se assim entender. Será uma forma de divulgação do que será o livro.

Meus / nossos (da família) antecipados agradecimentos.
Carlos de Carvalho

(iii) segunda, 25/11/2019, 19:12

(...) Aceito com muito gosto fazer parte da “rede de memórias” que conseguiram criar, sem remorsos, sem ressentimentos. O passado nosso, quer queiramos quer não, foi comum. Tive a felicidade de ter estudado com muitos colegas portugueses que hoje não sei por onde andam mas que na altura éramos amigos, jogávamos à bola juntos, sem perguntarmos donde cada um vinha e quem eram nossos pais. (...)

Eu vivo na Praia, Cabo Verde, V, e sou historiador e arqueólogo de profissão. Trabalho no Instituto do Património Cultural de que fui Presidente largos anos. Faço mais é investigação no domínio da preservação do património e agora estou também me enveredando pela temática da luta de libertação. (...)


2. Na altura, escrevemos o seguinte:

Inácio Soares de Carvalho trabalhou no BNU - Banco Nacional Ultramarino, em Bissau,  até ser detido pela PIDE em 15/3/1962. Vamos publicar, em breve, um excerto das suas memórias políticas, até há pouco inédita,  com a devida autorização do seu filho, Carlos de Carvalho. 

Nasceu na Praia, foi em criança para a Guiné com os pais. Envolveu-se na luta política, filiando-se no PAIGC. Era compadre e colega de Abílio Duarte. Foi preso pela primeira vez em 1962. É deportado para o Tarrafal, donde regressa em 1965, sendo colocado na ilha das Galinhas. Em 1967, é liberto pela primeira vez. Em 1972, é de novo preso e encarcerado na 2.ª Esquadra de Bissau, sendo solto, 3 meses depois, sem culpa formada. Em 1973, é de novo preso, para conhecer a liberdade definitiva com o 25 de Abril de 1974, em Portugal. Nos finais de setenta, regressa a sua terra natal, Cabo Verde e afasta-se praticamente da vida política activa. Já faleceu. (Informações biográficas fornecidas pelo filho, Carlos de Carvalho).

Ficamos, em dois ou três, a sinopse do livro e alguns excertos.


3. Excertos do livro - Parte I

Sinopse

As « Memórias », que se traz a público, constitui o testemunho, em primeira pessoa, do combatente de Liberdade da Pátria, Inácio Soares de Carvalho (ISC),  que consagrou toda sua vida ao desígnio de ver livre suas duas pátrias, a Guiné e Cabo Verde.

Tendo nascido na cidade da Praia, foi, ainda criança, levado pelos pais para a Guiné, onde viveu quase toda sua vida.

Inácio Soares de Carvalho foi dos militantes da primeira hora da gesta libertadora dos povos da Guiné e Cabo Verde.

Milita no MLGC em 1957, Movimento que se transforma, segundo o próprio autor, nos inícios dos anos sessenta no PAIGC.

Conta que foi mobilizado, em 1956, pelo amigo e compadre Abílio Duarte, seu colega de trabalho no antigo Banco Nacional Ultramarino, na Guiné-Portuguesa.

É preso pela primeira vez em 1962.

Conheceu todas as prisões do regime salazarista na Guiné-Portuguesa: as de Bissau, Mansoa e Ilha das Galinhas.

Em 1962, é deportado para a Colónia Penal do Tarrafal.

Em 1965, regressa a Guiné e segue preso, com mais cinco companheiros, para a Ilha das Galinhas.

Em 1967, é liberto pela primeira vez.

Em 1972, é de novo preso e encarcerado na 2`ª Esquadra de Bissau. Porém, 3 meses depois é liberto.

Em 1973, é de novo preso para conhecer a liberdade definitiva com o Golpe de Estado de 25 de Abril de 1974, em Portugal.

Nos finais de setenta, regressa a sua terra natal, Cabo Verde, e afasta-se praticamente da vida política activa.

Após incessantes insistências dos filhos, ISC  resolve escrever suas “Memorias”, tendo-as dado por concluídas em 1992. Nelas o autor narra factos novos, desconhecidos da maioria dos militantes, pois, infelizmente, poucos foram os combatentes da clandestinidade, sobretudo na Guiné, que deixaram escritos sobre essa vertente da luta protagonizada pelo PAIGC.

A vida, em si, de ISC, do nascimento à morte, é também, como se poderá constatar lendo esta obra, o espelho da história dos povos da Guiné e de Cabo Verde.

O autor morre em Dezembro de 1994, sem ver suas “Memórias” serem do conhecimento daqueles para quem deu grande parte de sua vida.

No intuito de enriquecer a obra e melhor compreender a personalidade do homem e do político que ISC foi, os filhos decidiram publicar a obra introduzindo alguns capítulos. Assim, a obra final apresenta a seguinte estrutura: uma Nota Introdutória, onde se explica toda a história da obra; um Prefácio; os agradecimentos; um 1° capítulo, designado de Pré-luta; o 2° que constitui as “Memórias” propriamente ditas do autor; um 3°, designado de Pós-luta; um 4° capítulo denominado Depoimentos, onde são apresentados testemunhos de companheiros de luta de ISC ainda vivos e contactáveis e de pessoas que, de uma forma ou de outra, lidaram com o autor na sua vida normal e nas “coisas da luta” [1].
Índice:

i) Nota Introdutória ................................................................3-6

ii) Prefácio ..............................................................................7-8

iii) Agradecimentos ...............................................................9-11

iv) Pré-luta ...........................................................................12-23

v) Memorias de ISC ...........................................................24-185

vi) Pós-luta ........................................................................186-254

vii) Depoimentos ...............................................................255-290

viii) Anexos .......................................................................291-300

viii) Bibliografia consultada ..............................................301-302


Nota Introdutória

As « Memórias », que se traz a público, constituem a história da vida política de Inacio Soares de Carvalho, que a consagrou inteiramente ao desígnio de ver livre suas duas pátrias, a Guiné e Cabo Verde [2].

A vida, em si, de ISC, do nascimento à morte, é também, como se poderá constatar lendo esta obra, o espelho da história dos dois povos.

O autor deu por concluídas as “Memórias” em 1992.

Nelas, ele relata seu engajamento político, ainda de forma não oficial no MLGC, em 1956, através de seu compadre Abílio Duarte, até o dia 29 de Abril de 1974, dia em que os presos políticos, na Ilha das Galinhas - Guiné Bissau, receberam a notícia do golpe de estado havido em Portugal, à 25 de Abril desse mesmo ano, golpe que pôs fim ao longo período do império colonial português.

Terminada a escrita, ISC as dá aos filhos para leitura e preparação da sua publicação. Porém, estes lendo-as ficam algo “decepcionados”, pois, constataram que ISC omitiu episódios interessantes do período da militância clandestina mas, sobretudo, da sua vida política no período pós-independências da Guiné e Cabo Verde. Essa omissão não caiu no agrado dos filhos. Estes consideravam que, procedendo dessa maneira, o autor estaria, por um lado, “retirando” páginas interessantes de sua própria história e da história da luta no seu todo, o que, por sua vez, “roubaria” importância e objectivo à obra. Essa pretensão dos filhos encontrou acérrima e firme oposição do autor, aliás, espelho de seu carácter.

Mesmo vivendo já amargurado com seus companheiros de luta, opôs-se determinantemente às constantes “provocações” dos filhos, tendo ficado unicamente pelo relato dos factos vividos até a libertação das terras pelas quais lutou. Não acrescentou nem mais uma única página à história.

A posição de pai e dos filhos não se concilia. O impasse entre a contínua insistência dos filhos em fazer o autor das “Memórias” esquecer mágoas e “segredus di luta” e contar sua vida política completa, por um lado, e, por outro, a feroz resistência deste em fazê-lo, foi adiando a publicação do livro até que...ISC adoece e a degradação de sua saúde foi tão rápida que não resiste [3].

O autor morre a 26 de Dezembro de 1995/96, sem ver suas “Memórias” serem do conhecimento daqueles para quem deu grande parte de sua vida.

Com o desaparecimento do autor, o dilema continua. Ou os filhos acatam a decisão do pai e publicam as “Memórias” tal como escritas ou a obra ficava sem publicar.

Após algum período de indecisão, os filhos decidem por uma outra via alternativa, cumprindo, porém, o desígnio do pai. Decidindo publicar a obra, resolvem introduzir, em capítulos separados, os episódios vividos e não narrados pelo autor, mas que eram/são do conhecimento da família.

Toda esta situação explica o longo intervalo entre a conclusão das “Memórias” e a sua publicação.

Assim concertados e na expectativa de enriquecer a obra, se decidiu pela sua publicação com a estrutura que apresenta: uma Nota Introdutória, onde se explica toda a história da obra; um Prefácio; um 1° capítulo, designado de Pré-luta; o 2° que constitui as “Memórias” propriamente ditas do autor; um 3°, designado de Pós-luta e um 4° capítulo denominado Depoimentos, onde são apresentados testemunhos de companheiros de luta de ISC ainda vivos e contactáveis e de pessoas que, de uma forma ou de outra, lidaram com o autor nas “coisas da luta”[4].

Não tendo sido escritos pelo autor, impõe-se clarificar porque foram introduzidos o 1°, mas sobretudo o 3° capítulo do livro.

Em relação ao 1° capítulo, entendeu a família que o conhecimento da vida de ISC no “Pré-luta” faria todo o sentido, pois, as peripécias por que passou, nesse período, teriam contribuído certamente para a formação do carácter do “Homem”, o que, por sua vez, ajuda a entender sua postura na política. Assim, no capítulo, se retratou, resumidamente, a difícil vida de ISC, do nascimento até se tornar homem, ingressar no funcionalismo público ultramarino e constituir família.

Com a introdução do «Pós-luta», 3° capítulo, a família quis trazer a público parte dos episódios que ISC recusou narrar, escudando-se, como dito anteriormente, no “respeitável” “segredus di luta”. Os “segredus di luta” constituem normalmente o refúgio da grande maioria dos combatentes que resolvem deixar suas “Memórias”; este “escudo” serve, na essência, para evitar abordar episódios sensíveis passados durante a luta, para não “beliscar” ou “afrontar” camaradas, sobretudo quando estes ainda se encontram em vida.

Interessante seria se ISC contasse, nas Memorias, as inúmeras conversas tidas com os dirigentes máximos do Partido e com RB, no período pós-independência. Contadas essas conversas seriam, com certeza, um importante contributo para o conhecimento de vários episódios “obscuros” da história da luta, tais como o discurso de RB no Palácio, diante do Governador-General Spínola; o assassinato de Amílcar Cabral ou e sobretudo os desvios comportamentais do Partido, no pós-luta.

É essa “falha” que se quis colmatar, introduzindo o 3° capítulo.

O conteúdo do “Pré-luta” e do “Pós-luta” resulta das estórias contadas pelo autor e seus camaradas de luta, no seio familiar, e ao testemunho da mulher, Maria Rosa de Carvalho, companheira de todos os tempos e todas as lutas, mãe dos nove filhos de ISC.

Do ponto de vista estético, tentou-se que o livro, no seu todo, tivesse a linguagem simples que as “Memorias” propriamente ditas apresentam. De se referir que o nível académico do autor era o básico (4a classe ou 2° grau, como também era designado) que a maioria dos cidadãos guineenses podia alcançar na época.

Ao longo das narrações, o autor recorreu à constantes chamadas de atenção ao leitor para o facto de a luta de libertação não ter sido obra fácil e ter exigido muito sacrifício daqueles que nele participaram.

Em relação à este aspecto, a família decidiu não retirar as repetições precisamente para poder realçar o que o autor mesmo quis, procedendo dessa forma.

Recorrentes chamadas de atenção também foram dirigidas aos militantes de 1a hora. Estas últimas foram uma espécie de grito de desespero àqueles que “vieram do mato” no sentido de não se esquecerem de que o avanço da luta até a vitória final só foi possível devido aos enormes esforços consentidos e o inabalável empenho dos companheiros de luta na clandestinidade.

Com largos anos de atraso, eis que se cumpre o desígnio de um dos protagonistas principais da luta clandestina que foi dar (ver) a conhecer, através destas “Memórias”, o contributo duns e doutros fornecendo/disponibilizando mais elementos para o conhecimento de parte da história da luta de libertação dos povos da Guiné e de Cabo Verde.

É entendimento dos familiares que estas Memorias ou este pequeno livro, como lhe designa o próprio autor, constitui um marco, pois, crê-se ser o primeiro testemunho de quem viveu e relatou, em/na primeira pessoa, os diferentes episódios da luta clandestina do PAIGC, na Guiné, desde os seus primórdios até ao 29 de Abril de 1974, quando conheceram a liberdade os prisioneiros políticos encarcerados na Ilha das Galinhas. Os factos históricos narrados, as personagens elencadas ao longo das páginas que enformam o livro deixam pistas para uma melhor aprofundamento dos estudos da luta de libertação nacional protagonizada pelo PAIGC.

Com este “testemunho” fica o desafio à outros “testemunhos” dos protagonistas da “saga da independência”, nas diferentes frentes de luta, e à estudos mais aprofundados dos estudiosos do “processo” da independência dos povos da Guiné e de Cabo Verde. Como sabiamente afirma o autor destas “Memorias” a história da luta só seria completa com o testemunho dos que estiveram nas três frentes da luta: 1) os da clandestinidade, tanto na Guiné como em Cabo Verde; 2) os que estiveram nas frentes da luta armada nas matas da Guiné e 3) os que estiveram na sede do PAIGC, em Conakry. Só cruzando as histórias das três frentes de luta se poderia ter a verdadeira “História da Luta de Libertação da Guiné e Cabo Verde”.

(Continua)
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Notas de Carlos de Carvalho:

[1] O 1º e º 3º capítulo constituem recolhas e pesquisas efectuadas pela família junto de determinadas fontes, algumas já fora do mundo dos vivos, e das próprias vivências familiares que, querendo ou não, são partes integrantes das Memórias do autor.

No processo de recolha de Depoimentos, 4° capítulo, constatou-se que os mais velhos companheiros de luta de ISC, na clandestinidade, já não se encontram no mundo dos vivos; constatou-se ainda e com grande mágoa que a História quase que deles se esqueceu. Por isso, os entrevistados foram os que, na altura dos acontecimentos narrados, eram todos jovens: António Cabral, Brigido de Barros, Carlos (Carlitos) Barros, Constantino Costa, Mário Soares, Noberto (Kote) de Carvalho, Wladimir Brito, entre outros.

[2] Doravante encontrar-se-á também ISC, Inácio ou Carvalho,  para se referir ao autor.

[3] A família de ISC é “longevo” e ele sempre foi extremamente resistente pelo que os filhos nunca imaginaram que a doença o levaria assim tão cedo, apesar de saber das imensas torturas que sofrera nas mãos da PIDE. Terão sido, aliás, essas torturas físicas e psíquicas, sofridas nas constantes prisões, ao longo dos 12 anos de luta, que levaram ao seu “precoce” desaparecimento.

[4] O 1º e º 3º capítulo constituem recolhas e pesquisas efectuadas pela família junto de pessoas, companheiros de luta de ISC. A maioria dessas fontes não se encontra no mundo dos vivos. Foram também “recolhas” resultantes das próprias vivências / estórias passadas no seio da família.

Os Depoimentos, 4° capítulo, constituem, so por si, uma fonte importante da luta clandestina de libertação nacional.

No processo de recolha de Depoimentos, constatou-se que os mais velhos companheiros de luta de ISC, na clandestinidade, já não se encontram no mundo dos vivos. Por isso, os entrevistados foram os que, na altura dos acontecimentos narrados, eram todos jovens (António Cabral, Brigido de Barros, Caramo Sanha, Carlos (Carlitos) Barros, Constantino (Tino) Costa, Mário Soares, Noberto (Kote) de Carvalho, Wladimir Brito, entre outros). Constatou-se ainda e com grande mágoa que a História quase que deles se esqueceu.
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Notas do editor:

(*) Vd. postes de:

16 de janeiro de  2020 > Guiné 61/74 - P20563: O mundo é pequeno e a nossa Tabanca...é Grande (112): Vamos publicar, com a devida autorização da família, um excerto das memórias, ainda inéditas, de Inácio Soares de Carvalho, um nacionalista da primeira hora, militante do PAIGC, pai do nosso leitor (e futuro grã-tabanqueiro), o historiador e arqueólogo Carlos de Carvalho, cabo-verdiano, de origem guineense

15 de janeiro de 2020 > Guiné 61/74 - P20559: O nosso blogue como fonte de informação e conhecimento (67): pedido de autorização para uso de fotos de Guerra Ribeiro, em livro de memórias do "tarrafalista" Inácio Soares de Carvalho (Carlos de Carvalho, Praia, Santiago, Cabo Verde)

(**) Último poste da série >  29 de novembro de 2019 > Guiné 61/74 - P20396: (D)o outro lado do combate (53): Quando um comando das FARP, da Frente Nhacra / Morés, destruiu, em 6 de maio de 1972, o centro emissor regional de Nhacra...(Comunicado do PAIGC, em francês, assinado por Amílcar Cabral)... Afinal, a propaganda era uma arma, tão ou mais eficaz que as minas A/C, a Kalash, a "costureirinha", o morteiro 120 ou o RPG 7... Nesse aspeto, a "Maria Turra" ganhava ao "Pifas"...

Guiné 61/74 - P20694: Os nossos seres, saberes e lazeres (379): A Bélgica a cores que guardo no coração, e para sempre (7) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 4 de Setembro de 2019:

Queridos amigos,
Terá sido o acontecimento memorável daquele domingo do primeiro fim de semana passado em Bruxelas, estávamos em 1977, a Comissão Europeia convidara funcionários a conhecer os seus serviços, naquela fase em que muito simplesmente se batia à porta para um dia lá entrar, o que irá acontecer cerca de dez anos depois. Manhã cedo, mergulhei na policromia daquele bazar de velharias, a Feira da Ladra de Bruxelas, ainda não havia low cost, podia-se trazer uma mala cheia, foi um ver se te avias. E com saco às costas, depois de ter atravessado o bairro típico de Marolles, entrei na Rua da Regência para visitar a arte flamenga, e não só.
Era a primeira vez que eu dava tal mergulho. Foi inesquecível, e do muito que tive a felicidade de ver aqui vos trago esta simples lembrança.

Um abraço do
Mário


A Bélgica a cores que guardo no coração, e para sempre (7)

Beja Santos

Adverte-se desde já o leitor que estava concluída a série de recordações belgas quando o visitante deu consigo a repor na memória aquele primeiro fim de semana que passou em Bruxelas, no ano da graça de 1977. Fora com alguma antecedência ao comissariado do turismo belga, na Rua do Alecrim, quem o atendeu foi a escritora Fernanda Botelho que lhe fez recomendações para a ocupação do dito fim de semana em museus, artérias a percorrer ao fim de tarde, livrarias, a catedral, igrejas, jardins, a sorrir apercebeu-se que estava a propor uma empanzinadela de eventos, refreou-se e terá dito algo como, “olhe, se gosta de arte flamenga, vá aos Museus Reais, tem lá do bom e do melhor, passe a manhã na companhia de Rogier van der Weyden, Jerónimo Bosch, Memling, Bruegel, Rubens, Rembrandt, não se sentirá defraudado, e depois de almoçar lance-se no Museu de Arte Moderna, é contíguo, se gosta dos surrealistas, terá ali uma grande surpresa, Magritte em peso, boa viagem”.
E aconteceu o que Fernanda Botelho preconizara, o viandante saiu do albergue com os alvores da manhã, foi à Feira da Ladra, e entrou neste magnífico edifício do século XIX ajoujado de tralha avulsa, meteu num cacifo, foi ao encontro de alguns génios e contemplou obras que jamais esqueceria, não haverá exagero em dizer que vem a esta casa em peregrinação, sempre que pode.

Entrada principal dos Museus Reais da Bélgica

Este museu é dedicado principalmente à arte nacional belga. A Bélgica tem fortes razões para se queixar dos saques que sofreu. Filipe II ornamentou palácios espanhóis com tesouros artísticos belgas, e o mesmo fizeram as regentes dos Países Baixos, Margarida da Áustria e Maria da Hungria. As grandes pilhagens vieram com a dominação austríaca. E depois veio o período napoleónico, com importantes saques, muito trabalho tiveram os primeiros conservadores do museu depois da queda de Napoleão em repor a legalidade. Quando o visitante entrou aqui pela primeira vez, a visão do átrio era bem diferente, tal como a ligação entre o Museu de Arte Antiga e o Museu de Arte Moderna. A denominação precisa é a de Museus Reais de Belas-Artes da Bélgica, estão aqui coleções de pintura e escultura antiga. Como o visitante passou a maior parte da sua visita aqui e só de raspão é que se embasbacou com os contemporâneos, a homenagem foca este esplêndido museu de Arte Antiga, memória indestrutível, repete-se, convida a permanentes regressos, no texto seguinte, o último desta série, irá mostrar-se o homem da flecha de Rogier van der Weyden, tem identidade desconhecida, como traz o colar do Tosão de Ouro, há investigadores que dizem tratar-se do príncipe português D. João de Coimbra, sobrinho de Filipe, O Bom.

Museu de Arte Antiga

Em 1994, o viandante tirou um curso de duas semanas na Universidade de Lovaina a Nova, e visitou em Bruges a memorável exposição dedicada a Hans Memling, um pintor de assuntos religiosos, mas também retratista. Há qualquer coisa de onírico nesta atmosfera de O Martírio de S. Sebastião. O santo não tem qualquer traço de sofrimento, parece que o artista quis pôr o seu modelo em pose, com olhar distante enquanto os algozes são a expressão do dever, mas também não há sombra de ódio ou violência nos seus rostos. Ali se especou o viandante a ver a profundidade do quadro, com água e montanha ao fundo, uma beleza idealizada. E há o poder da cor, umas vezes intensa, outras vezes opaca.

O Martírio de S. Sebastião, Hans Memling

Nem toda a obra de Bosch remete para o delírio ou indicia que o genial artista é um surrealista antecipado alguns séculos. Mas veja-se com atenção o ambiente à volta da Cruz e do Cristo pregado ao lenho, há ali dois rostos transtornados e os caminhantes fazem relevar a solidão, viajam em sonambulismo. Bosch, nesta fase, capricha em praticar a simetria, a imobilidade, e põe no fundo uma cidade envolta pela neblina.

Crucificação, Jerónimo Bosch

Duas obras de Bruegel, O Velho, foram marcantes nesta visita: o Recenseamento em Belém e A Queda dos Anjos Rebeldes, optou-se por falar da primeira. É um tema do Evangelho, o recenseamento decretado pelo Imperador Augusto, não estamos na Judeia mas numa típica aldeia flamenga, há para ali um ar invernal e a brancura da neve. Como, em visitas posteriores, me irá impressionar um outro quadro, A Queda de Ícaro, em que o tema principal assume proporções insignificantes, vemos aqui uma multidão de gente que veio a Belém recensear-se e com discrição reconhecemos José e Maria, ela montada no burro, mas também vemos a cabeça da vaca, figura obrigatória do presépio. A técnica é maneirista: é a paisagem que invade o olho do espetador, que andará de um lado para o outro até reconhecer Maria e José, igualmente impressiona que o caráter religioso não é o tema dominante, é a aldeia cheia de vida, com gente a folgar e os miúdos brincam.

Recenseamento em Belém, Pieter Bruegel, O Velho

Este museu de Bruxelas tem algumas telas de Rubens que qualquer um dos maiores museus do mundo daria tudo para possuir. Rubens tratou em grande formato e repetidamente o tema da adoração dos magos. O viandante confessa que aqui se deteve fascinado pelos pormenores: ao alto, os mirones, uns bem nítidos, outros esfumados, em amena conversa; a cena maior, obviamente, é a contemplação dos magos, os grandes do mundo curvam-se diante do Filho de Deus, mas é enternecedor o rosto e a postura de Baltasar, olhar mais carinhoso não há e as mãos recurvadas em oração traduzem todo o simbolismo que Rubens pretende imprimir aos três reis que seguiram a estrela para se curvar diante do rei dos reis.

Adoração dos Magos, Rubens

Estas Cabeças de Negros têm suscitado dúvidas quanto à sua autoria, apesar das dúvidas o viandante pressentiu nelas a dedada genial do grande artista. São esboços do mesmo indivíduo, com diferentes perfis, admite-se que este negro tenha sido um modelo apreciado em Antuérpia, pois pousou não só para Rubens como para Van Dyck e Jordaens. Prende a atenção a interioridade das feições, a reflexão, a bonomia, a contemplação absorvida, a expressão distante, Rubens não desenhou exatamente o mesmo rosto, faz experiências, mexe no nariz, o tamanho dos lábios, nas orelhas. O conjunto pode ser acidental, não passar de um exercício, mas é um momento gigante da pintura, o viandante não teve dúvidas, continua a não ter dúvidas.

Cabeças de Negros, Rubens

Tal como Rubens e Van Dyck, Jordaens está entre os maiores mestres da escola de Antuérpia do século XVII, está altamente representado no Museu de Bruxelas, atrai pela sua monumentalidade, pelo belo tratamento estilístico tanto ao profano como ao religioso, é um verdadeiro perito a mexer nas cores. O viandante rendeu-se a este quadro de grande alegria, o tema é retirado do folclore flamengo, o festejo da noite da véspera da Epifania, toda a família e a criadagem reunia-se à volta da mesa, havia um bolo com fava, a quem saísse a fava era eleito o rei da noite. Há aqui algo de desbunda completa, até uma mãe limpa o rabito do filho, a boa-disposição é contagiante.

O Rei Bebe, por Jabob Jordaens

Em dado passo, o viandante contempla retratos em série, só há um Rembrandt nos Museus Reais, este Retrato de Nicolaas van Bambeek, um rico comerciante de Amesterdão. Não se trata de ficar embasbacado com o único Rembrandt, ele é mesmo muitíssimo bom, veja-se a gola do comerciante, a iluminação que vem por detrás e do lado, e que permite o contraste entre o escuro da indumentária, o assombro das mãos, a barba rala, o nariz adunco, o olhar voltado para o retratista, tudo aparentemente tão simples, e sente-se que seria possível sair-se daquela imobilidade, atravessar a tela, e pôr-se a conversar com quem a contempla.

Retrato de Nicolaas van Bambeek, Rembrandt

A coleção de mestres estrangeiros no museu de Bruxelas é de uma infinita riqueza. O viandante bate à porta com regularidade da Coleção Gulbenkian, e não é a primeira vez que ali entra só para conversar com Francesco Guardi, o multimilionário arménio comprou por atacado uma série de telas que são indispensáveis em qualquer retrospetiva de Guardi. Estamos no século XVIII, Veneza vive um novo renascimento, Guardi dedica-se exclusivamente a pintar vistas, curiosidades, praças cheias de gente, os canais, as gôndolas. Este quadro do Doge Mocenigo pertence a uma série chamada de Festas Venezianas. Temos aqui o interior da Basílica de S. Marcos, não nos pode deixar indiferentes esta arquitetura grandiosa e o jogo da luz do sol com os mármores, o ouro, a cor dos mosaicos, a suprema mestria na gradação das cores.
O que aqui se recolheu tem a ver com as reminiscências de um domingo inesquecível, depois de ver esta esplendorosa arte flamenga e estrangeira, ainda houve energia para dar umas passadas pela Arte Moderna. Mas no essencial, foram estas as imagens que ficaram, na sua modéstia de recursos o viandante conhecera nos livros algumas destas obras-primas, daí a inefável alegria de as olhar no local a que pertencem.

O Doge Mocenigo aparece à multidão em S. Marcos, Francesco Guardi

(continua)
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Nota do editor

Último poste da série de 22 de fevereiro de 2020 > Guiné 61/74 - P20674: Os nossos seres, saberes e lazeres (378): A Bélgica a cores que guardo no coração, e para sempre (6) (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P20693: Efemérides (319): O "Jornal do Exército", fundado em janeiro de 1960, faz 60 anos (Jorge Araújo)


Capa do 1.º número do «Jornal do Exército» - Janeiro de 1960 (Tiragem: 20 mil exemplares). 


Cabeçalho do "Jornal do Exército", ano I, nº 1, janeiro de 1960, Preço: 2 escudos (convertidos em euros, a  preços de hoje, equivaleria a 0,89 €)





Jorge Araújo, ex-fur mil op esp / ranger, CART 3494 / BART 3873 (Xime e Mansambo, 1972/1974); doutorado pela Universidade de León (Espanha) (2009), em Ciências da Actividade Física e do Desporto; professor universitário, no ISMAT (Instituto Superior Manuel Teixeira Gomes), Portimão, Grupo Lusófona; autor da série "(D)o outro lado do combate"; nosso coeditor.  



EFEMÉRIDES: A PUBLICAÇÃO DO JORNAL DO EXÉRCITO, ÓRGÃO DE INFORMAÇÃO, CULTURA E RECREIO DO EXÉRCITO PORTUGUÊS, FOI INICIADA HÁ SESSENTA ANOS (JAN 1960)



1. – INTRODUÇÃO

Numa das últimas pesquisas efectuadas a literatura de âmbito militar, foi com surpresa que dei conta das origens do «Jornal do Exército», informação que, sinceramente, desconhecia. Considerei, então, uma feliz coincidência.

Numa altura em que se comemorou o seu 60.º Aniversário (Jan 1960-Jan 2020), achei interessante dar conta, ainda que em síntese, de alguns detalhes que estão na génese do seu nascimento, e que fazem parte da História de uma época – a minha!

Sobre a existência deste órgão de informação do exército português, e como memória mais remota, recordo-me de ter manuseado/folheado alguns números, nomeadamente a partir do ano lectivo 1960/1961, ano em que ingressei no Liceu Camões em Lisboa, então disponíveis na Biblioteca e no Gabinete da Mocidade Portuguesa. Estávamos ainda, nessa ocasião, nos primeiros meses da sua existência.

Passadas que estão seis décadas, e porque não encontrei qualquer referência no blogue relacionada com este tema, entendi ser oportuno recordar, aqui e agora, esta efeméride.


2. – ANTECEDENTES HISTÓRICOS

De acordo com as fontes consultadas, foi a 7 de Dezembro de 1959, 2.ª feira, que a ideia da criação do «Jornal do Exército» é objecto de reflexão no seio militar, uma vez que a alínea c) do artigo 62.º do Decreto-Lei n.º 42564, de 7 de Outubro de 1959, aprovara a criação de um órgão de informação, cultura e recreio do exército português, na dependência directa da Direcção do Serviço de Pessoal e no âmbito das atribuições que a esta lhe estavam conferidas.

Assim, e para esse efeito, reuniram-se numa dependência do Colégio Militar, em Lisboa, o Brigadeiro David dos Santos (futuro 1.º Director do Jornal), os Majores Balula Cid (Professor de Desenho do Colégio Militar, caricaturista e futuro 1.º Chefe de Redacção), Pinto Coelho, Eduardo Fernandes e Tavares Figueiredo e o Capitão José Marques, onde os seus mentores redigiram a competente proposta para ser analisada superiormente.

Em 11 de Janeiro de 1960, 2.ª feira, decorridas cinco semanas, é publicado um despacho do Ministro do Exército, Brigadeiro Afonso de Almeida Fernandes [nome completo: Afonso Pinto de Magalhães Galvão Mexia de Almeida Fernandes (1906-1986)], com o seguinte teor:

"Aprovo com a maior satisfação a presente proposta que vem ao encontro de uma aspiração que há muito acalentámos e que as circunstâncias parecem tornar agora oportuna. Conviria que o primeiro número do Jornal saísse ainda no corrente mês, o que julgo possível, em face do trabalho preliminar já realizado. O Jornal intitular-se-á «Jornal do Exército» (…)."

Esse desejo foi possível concretizar ainda em Janeiro, com o primeiro número do Jornal a registar uma tiragem de vinte mil exemplares.

A 26 de Janeiro, 3.ª feira, ou seja quinze dias após a publicação do despacho do Ministro, o Jornal do Exército abandona o Colégio Militar e passa a ocupar o 2.º andar do n.º 61 da Rua da Escola Politécnica, em Lisboa.

A 14 de Julho de 1960, 5.ª feira, por Portaria do Ministério do Exército, é criado formalmente o «Jornal do Exército», definido como: Órgão de Informação, Cultura e Recreio do Exército Português.

(Fonte: https://historiadastransmissoes.wordpress.com/2016/06/18/as-tm-no-no-1-do-je-jan1960/), com a devida vénia.



Legislação que aprova a criação de um órgão de informação do Exército Português (Decreto-Lei n.º 42564, de 7 de Outubro de 1959 e Portaria n.º 17843, de 14 de Julho de 1960) – Adaptado do Jornal do Exército n.º 100, de Abril de 1968, p 47, com a devida vénia.


3. – A MISSÃO A CUMPRIR PELO «JORNAL DO EXÉRCITO»


Cumprindo com o protocolo institucional, o Brigadeiro Afonso de Almeida Fernandes, na qualidade de Ministro do Exército (1958-1961), e considerado ainda como sendo o fundador do «Jornal», pois foi através do seu despacho que a revista foi criada, explicitou os fundamentos da "Missão a Cumprir" por este Órgão de Informação Militar, mas também aberto à sociedade civil, referindo:

(…) "Trata-se, como se disse, de um elemento de informação geral, sem a preocupação de versar problemas militares de natureza demasiadamente técnica e especializada, os quais interessam fundamentalmente às publicações das respectivas especialidades." (…), (Jornal do Exército, nº 1, janerio de 1960, p 5.)

Como pequena nota biográfica é de relevar o seguinte:

Afonso Pinto de Magalhães Galvão Mexia de Almeida Fernandes, conhecido na estrutura militar como Afonso de Almeida Fernandes, nasceu na Freguesia de São Sebastião da Pedreira, Lisboa, em 12 de Dezembro de 1906.

Foi oficial da Arma de Engenharia, tendo-se licenciado em Engenharia Civil (1928) pelo Instituto Superior Técnico da Universidade Técnica de Lisboa, onde conheceu a sua esposa, a engenheira Maria Amélia Sousa Ferreira Chaves Almeida Fernandes (1911-2017), a primeira engenheira portuguesa formada por aquele Instituto.

Como actividade docente, foi Professor da Escola do Serviço de Saúde Militar (1942-1943) e, ainda, Professor do Curso do Estado-Maior do Instituto de Altos Estudos Militares (1943).

No âmbito das suas competências institucionais, fez parte da missão militar de estudo e observação na Alemanha durante a Segunda Guerra Mundial (1942), da missão oficial junto do Estado-Maior Francês e da NATO, em Paris (1954), e da missão oficial junto ao Estado-Maior Espanhol, em Madrid (1955).

Foi subsecretário de Estado do Exército (1956-1958).

Em 1958, foi nomeado Ministro do Exército na mesma remodelação que nomeou o General [Júlio Carlos Alves Dias] Botelho Moniz (Lisboa, 12.01.1900-30.09.1970) para Ministro da Defesa, mantendo-se no cargo até 1961.

No governo, reorganizou a Escola do Exército e foi um grande impulsionador da defesa dos territórios ultramarinos.

Foi o criador, em 1960, do Centro de Instrução de Operações Especiais (CIOE), em Lamego, Decreto-Lei n.º 42926, de 16 de Abril de 1960, onde se formaram as primeiras Companhias de Caçadores Especiais [CCE] que foram enviadas para Angola ainda antes do início da Guerra.

Nesta, o dia 4 de Fevereiro de 1961, sábado, surge-nos como o primeiro acto gravado na sua cronologia [outra efeméride, esta com cinquenta e nove anos], quando um grupo de cerca de duzentos angolanos, alegadamente ligados ao MPLA, atacou a Cadeia de São Paulo e a Casa de Reclusão Militar, em Luanda, com o objectivo de libertar alguns correligionários presos, mas sem sucesso.

Afonso de Almeida Fernandes, no final da sua vida activa, seria aposentado com o posto de Brigadeiro do Exército.

In: https://pt.wikipedia.org/wiki/Afonso_de_Almeida_Fernandes, com a devida vénia.







3.1 – «NOTA DE ABERTURA» DO DIRECTOR DO JORNAL DO EXÉRCITO – BRIGADEIRO DAVID DOS SANTOS

Depois da descrição dos principais fundamentos que estiveram na base do lançamento do «Jornal do Exército» e da "Missão a Cumprir" por este órgão de informação militar, da autoria do Brigadeiro Almeida Fernandes, Ministro do Exército, apresentados no ponto anterior, coube ao Brigadeiro David dos Santos, na qualidade de seu Director, acrescentar mais algumas "Notas" consideradas de "Abertura".

Considerando que a impressão do conteúdo relacionado com estas "Notas de Abertura", que serviu de base na elaboração deste trabalho, não reunia a qualidade para a sua reprodução, decidimos transcrevê-las.

O texto que segue está publicado nas páginas 5 e 20:


"Por decisão de Sua Ex.ª o Ministro do Exército é dado à luz da publicidade, no presente mês de Janeiro, o primeiro número do mensário «Jornal do Exército», Órgão de Informação, Cultura e Recreio das Forças Terrestres e que se destina também a uma difusão que se deseja tão larga e profunda quanto possível, no meio da população civil.

Tal decisão levanta um problema ligado, em grande parte, às actividades específicas do Serviço de Pessoal; não se estranhará, portanto, que Sua Ex.ª o Ministro tivesse determinado – não por méritos próprios, antes, em certa medida, por inerência de funções – que a Direcção da referida publicação fosse atribuída ao Director dos Serviços de Pessoal.

Nesta qualidade, lhe compete e lhe é sumamente agradável dizer duas palavras, à laia de «Nota de Abertura».

O sucesso de uma publicação periódica assenta, em primeiro lugar, no pressuposto de que os elementos do seu corpo redactorial ponham toda a capacidade, entusiasmo e calor, no desempenho das suas atribuições, fazendo dela, por esta forma, um órgão vivo, ligeiro, dinâmico, sugestivo e pleno de interesse. Onde tais requisitos falharem logo aí se abrirá uma brecha insanável.

Estou sinceramente convencido – porque conheço os homens designados para este sector do jornal – que neste ponto podemos ficar descansados.

Em segundo lugar, todo o jornal ou, mais geralmente, toda a publicação periódica corresponde sempre a necessidades comuns de uma certa massa de indivíduos, tanto na ordem material, como na ordem espiritual, moral ou profissional. No caso vertente, este traço de união é garantido e vinculado, em prioridade, pela evidente comunhão de interesses, de toda a ordem, dos elementos do ramo terrestre das Forças Armadas, se bem que se possam reservas naturais quanto à eficácia e profundidade da penetração do jornal no elemento civil, eficácia e profundidade que dependerão, sobretudo, da forma como os problemas militares forem apresentados no seu livre exame e para sua inteira compreensão.

A comunidade de interesses, anseios e aspirações militares que pressupõem a excelência das respectivas instituições existe porém e primariamente, «em potências».

O seu desenvolvimento «em acto» será iniludivelmente favorecido com a publicação deste jornal, se cada militar, qualquer que seja a sua graduação ou grau de responsabilidade, for efectivamente um agente da sua propaganda e expansão. Neste domínio todo o Comandante ou todo o Chefe deve considerar como ponto de honra e até como uma responsabilidade de comando ou direcção, a adopção das medidas necessárias para aquele efeito. Não é que se não devam fazer as observações e sugestões que a experiência for aconselhando para melhoria do jornal e que serão sempre bem-vindas. Mas – antes de mais – há que o amparar e fazer viver e prosperar.

Por último convém notar que a massa dos leitores interessados não é, neste caso, homogénea, tanto sob o ponto de vista de preparação e cultura, como no aspecto da sua capacidade de apreensão. Este ponto terá, pois, de ser considerado, em permanência e a um tempo, pelo corpo redactorial e pela colaboração espontânea ou solicitada.

O ideal seria que os artigos e assuntos tratados pelas várias secções do jornal fossem igualmente interessantes para qualquer dos seus leitores.

Não negamos e antes preferimos sublinhar esta dificuldade que exigirá um esforço constante para a sua superação.

Seja como for, estou sinceramente esperançado em que todos nós, militares das Forças Armadas, faremos tudo para evitar que o sucesso do jornal nos fuja das mãos e com ele o factor de prestígio e consideração que os elementos da classe civil, naturalmente e mercê da sua leitura e meditação, nos poderão conceder."


David dos Santos, Brigadeiro


Termino, agradecendo a atenção dispensada.

Com um forte abraço de amizade e votos de muita saúde.

Jorge Araújo.

08JAN2020
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Nota do editor:

sexta-feira, 28 de fevereiro de 2020

Guiné 61/74 - P20692: Fotos à procura de...uma legenda (127): correção às legendas de fotos do poste P13445, de 1/8/2014: Forte de São Julião da Barra, Oeiras; estação ferroviária, Entroncamento; e estação rodoviária, Rio Maior (Rui Fonseca)


Foto nº 1 > Oeiras > Estuário do  Tejo>  Junho de 1970 > Forte de São Julião da Barra


Foto nº 6 > Entroncamento > Estação ferroviária


Foto nº 9 > Rio Maior >  Av João Ferreira da Maia > Do lado esquerdo, a antiga  estação rodoviária, hoje encerrada [, segundo Rui Fonseca, 2020]


Fotos, originalmente sem legendas, do álbum do Otacílio Luz Henriques, ex-1º cabo bate-chapas.  CCS/BCAÇ 2852 (Bambadinca, 1968/70). Pertencia ao pelotão de manutenção, que era comandado pelo alf mil Ismael Augusto, membro da nossa Tabanca Grande. o BCaç 2852 regressou à metrópole em 28/5/1970, um ano depois, curiosamente, do ataque a Bambadinca...

Fotos: © Otacílio Luz Henriques (2013). Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné; legendagem complementar: Rui Fonseca, 2020]


1. Do nosso leitor Rui Fonseca:

Data: sexta, 28/02/2020 à(s) 08:00

Assunto; fotos do blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné

Boa tarde:

Tendo passado pela vossa Tabanca de memórias da Guerra Colonial, vi uma publicação vossa de sexta-feira, 1 de agosto de 2014 [, poste P13455], onde que têm fotografias lindíssimas do nosso antigo Portugal.

Querendo ser de utilidade, venho por esta via dar as seguintes informações sobre as legendas das fotos da dita publicação na esperança de que sejam de utilidade para uma melhor informação e uma melhor memória ao torná-las mais precisas.

Assim faço as seguintes sugestões para as respectivas fotos:

Foto nº 1;  trata-se de facto da entrada na barra do Tejo. No entanto trata-se da cidadela do Forte de São Gião, actual forte de "S. Julião da Barra", e não da cidadeda de Cascais.

A foto nº 6 é da estação [ferroviária] o Entroncamento.

Na foto nº 9, podemos ver a Avenida Ferreira da Maia em Rio Maior. O edifício da camionagem ainda existe embora esteja encerrado, e o edifício ao fundo da Avenida também ainda existe,  estando ao seu lado um 'mamarracho' enorme com cerca de 13 pisos[, já na Praça da República] [Vd. Goople Maps]

Não posso deixar de expressar o meu agradecimento e apreço por blogues como aquele que dinamiza com os seus camaradas, para memória e registo dos tempos que lá vão. (**)

Bem haja,

Rui Fonseca
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Guiné 61/74 - P20691: Notas de leitura (1268): Missão cumprida… e a que vamos cumprindo, história do BCAV 490 em verso, por Santos Andrade (47) (Mário Beja Santos)



1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 2 de Outubro de 2019:

Queridos amigos,
Teima-se em tentar eliminar o palco em que se desenvolveu aquele período da guerra, havia mil militares antes de se desencadearem as hostilidades, o número vai crescendo, nesta fase começa a aproximar-se dos 25 mil. Estão lá os três ramos das Forças Armadas, a Armada percorre os rios, tem na Guiné o seu papel crucial, muitíssimo superior ao que viveu em Angola e Moçambique. Indubitavelmente, 1964 é um ano chave pelo alastramento da guerra, pelas populações em fuga, pela compreensível dificuldade em definir uma estratégia com defesa das populações. As forças portuguesas irão vezes sem conta ao Oio, como ao Cantanhez e a outras paragens de luta renhida. Os resultados serão sempre minguados pelo facto de ali não se permanecer mais tempo daquele que dura a operação. Só muito mais tarde, com a operação "Grande Empresa", em 1972, é que se procurará a reocupação do Sul, como se sabe com resultados efémeros pois em 1973 um vendaval de fogo irá comprometer o esforço quase titânico do que foi a criação desses novos estacionamentos.
De seguida, passamos para os documentos da estratégia portuguesa, tal como eles constam na "Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África", no teatro de operações da Guiné.

Um abraço do
Mário


Missão cumprida… e a que vamos cumprindo (47)

Beja Santos

“Deixando estas regiões
para Brá se abalou.
A Companhia do azar
em Farim continuou.

Houve boatos daqui e de além
já se sabe o que é a rapaziada
todos queriam abalar da porrada
porque na guerra ninguém estava bem.
Em Farim, Cuntima e Jumbembem
houve muitas aflições
mas deixando as operações
e começando pela 3.ª Companhia
vai o Batalhão de Cavalaria
deixando estas regiões.

Na 488 se aguentaram
até chegar a sua vez
e no dia 13 deste mês
aquela povoação deixaram.
Mulheres e crianças choraram
e tudo à tropa se abraçou.
Em Cuntima o mesmo se passou
quando chegámos à hora de abalar
e deixando tudo a gritar
para Brá se abalou.

Alguns homens do Comando
regressaram de avião
e outros vieram numa embarcação
pelo Geba navegando.
Ao cais de Bissau chegando
em Brá vamos aquartelar.
É lá que vamos aguardar
o dia que mais se ambicionou
mas por enquanto ainda não chegou
a Companhia do azar.

A 487 se exibiu
com mais uma mina que encontrou
o furriel Cravo alevantou
após o Joel que a viu.
Noutra vez que se saiu
mais uma arma se apanhou.
Ao fim da comissão se chegou
sempre arriscados à morte
e a Companhia da pouca sorte
em Farim continuou”.

********************

Aproxima-se o fim da comissão do BCAV 490, procure-se, em nome da clareza, entreabrir as portadas deste cenário em que decorreram as suas atividades. Há um antes, aquele despertar nacionalista que transita do fim da década de 1950, quando Amílcar Cabral parte para o exílio, ficando ali perto, em Conacri, outros, na órbita de Rafael Barbosa, sublevam no interior da Guiné Portuguesa. Organizou-se o partido e organizou-se a guerrilha, formaram-se guerrilheiros e com o primeiro armamento desencadeou-se a luta armada, surpreendendo as forças portuguesas que esperavam acometidas nas regiões fronteiriças, acreditava-se que se iria reproduzir o que se passara em Angola a papel químico. O BCAV 490, é este o modesto entendimento do companheiro do bardo, vai viver o período crucial da expansão do PAIGC por zonas de onde, ao longo de toda a guerra, só sairá para regressar: nas matas do Sul, em toda a região do Morés, no Corubal. O contingente português vai crescendo, de mil militares chegará rapidamente a dez mil, depois a vinte mil, e crescerá ainda mais. O PAIGC dinamitou a economia, no final de 1964 já pouco restará das serrações e das atividades comerciais da CUF e da Sociedade Comercial Ultramarina. O PAIGC não intimida somente, procura mobilizar as populações rurais, o líder fundador é muitíssimo claro, estas populações são fundamentais para alojar e até para alimentar os contingentes da guerrilha. Há dados seguros sobre este crescimento. Voltamos hoje a referenciar “Guerra Colonial & Guerra de Libertação Nacional, 1950-1974, o caso da Guiné-Bissau”, o essencial da tese de doutoramento de Leopoldo Amado, IPAD – Instituto Português de Apoio ao Desenvolvimento, 2011. A título complementar, passaremos para a “Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África”, os livros dedicados à Guiné.

Leopoldo Amado recorda que a partir de março de 1963 todo o Sul está em sobressalto: destruição de pontões nas áreas de Tite e de Buba, flagelações na península de Empada com corte de acessos à povoação e aos locais de embarque para Bolama, incêndio do barco a motor da carreira Bolama-Ponta Bambaiã, ataques às tabancas, flagelações de Cufar e Fulacunda. E nos meses seguintes chega-se a Cacine, a Gadamael, a Cacoca e Sangonhá. Atravessa-se o Corubal e ataca-se o Xime; e a guerrilha escolhe com sucesso o Oio, o quadrilátero Mansoa-Bissorã-Olossato-Mansabá é uma zona de florestas densas e quase sem estradas, melhor refúgio não podia haver. No final do primeiro semestre de 1963 avança-se para Bissorã e Barro, para Binta e Farim, montam-se emboscadas entre Mansoa e Bissorã, destroem-se pontões na estrada Olossato-Mansabá. A destruição económica parece imparável, o principal eixo rodoviário da região, a estrada Mansoa-Mansabá-Bafatá vai ficando inutilizável. No final do ano, o armamento soviético começa a chegar às carradas, as atividades de guerrilha consolidam-se no canal do Geba, há bases que permitem atuar entre Porto Gole, Enxalé, Xime e ao Norte de Bambadinca, o PAIGC instala-se numa capilaridade que vai de todas as bases do Morés até Sambuiá, Sarauol, Belel, alastra a sua atuação em novas direções, para Bula e Binar, procura atingir, ainda que com pouco sucesso, a região dos Manjacos.

Ver-se-á adiante que Louro de Sousa e Schulz, à luz dos meios, da incapacidade de prever a estratégia do PAIGC, foram atamancando, procurou-se expulsar os grupos do PAIGC no Sul, no Norte, impedir os abastecimentos vindos da República da Guiné e do Senegal, só que os efetivos do PAIGC alastravam-se, chegava novo armamento. Em maio de 1964 ocorre a primeira colocação de minas, chegam os morteiros e até as minas de anticarro armadilhadas, o Xime é atacado à bazuca, passa a ser corrente flagelar os aquartelamentos e as tabancas em autodefesa com morteiros e metralhadoras, mais tarde virão os canhões sem recuo. A Guiné, também nos vem recordar Leopoldo Amado, foi o mais importante e o único teatro de operações onde a ação da Armada Portuguesa foi vital, não só em termos estratégicos como táticos.
E recorre a uma citação de um trabalho de António José Telo:
“À volta de 80% de toda a carga ou pessoal movimentado seguia por via marítima ou fluvial, só cerca de 18% seguia por estrada e 2% por via aérea. No final da guerra, quando o transporte por terra era mais difícil, as vias fluviais e marítimas asseguravam cerca de 85% de toda a carga e passageiros. Esse transporte era igualmente vital para o PAIGC, pelo que a acção de interdição e fiscalização da armada era tão importante como a de transporte. Na realidade, podemos dizer que uma das poucas formas de qualquer dos lados vencer militarmente a guerra na Guiné seria ali impedir o uso dos cursos de água com fins logísticos e de transporte pelo outro”.

Louro de Sousa apela aos recursos disponíveis, Arnaldo Schulz receberá muitíssimo mais, e dos três ramos das Forças Armadas, apercebe-se que tem poucos contingentes bem preparados para a natureza daquela guerra, resolve o dilema do número crescente da população sobre duplo controlo recorrendo à disseminação de aquartelamentos, à preparação de milícias e a uma política de tabancas em autodefesa, sob vigilância das forças posicionadas em destacamento, virão forças especiais, desde fuzileiros a paraquedistas, os bombardeamentos atordoarão todas essas matas onde se acantonam os guerrilheiros e as populações suas apoiantes. É fácil acusar Schulz de que não tinha uma ideia de manobra bem definida, veja-se o contexto em que ele chega à Guiné em 1964, há já dois importantes santuários, o Cantanhez e o Oio-Morés. O que se julgava importante no início da guerra, caso da ilha do Como, esvazia-se com as novas preocupações do avanço do PAIGC em direção ao Boé, o corredor de Guileje passa a ter um papel crucial no abastecimento, as forças portuguesas tudo tentarão para expulsar essas linhas de abastecimento, sem êxito algum. Schulz recorrerá à propaganda, às emissões radiofónicas, ao Boletim Informativo das Forças Armadas, uma comunicação com diferentes direções, incluindo a opinião pública em Portugal. Às ações da guerrilha, procurava-se reagir, ensaiava-se um dispositivo militar para reocupar a zona fronteiriça desde a Aldeia Formosa a Cacine e Campeane. O dispositivo de informações do Exército Português era muito elementar, o uso de informadores dava os seus primeiros passos. Daí a surpresa de certos ataques, como aqueles que começaram a surgir nas regiões fronteiriças, no Norte e no Leste. No final de 1964, a luta armada é cada vez mais persistente à volta de Bula e de Teixeira Pinto, de Bissorã e de Mansabá. Nessa altura, Guileje é já um local que o PAIGC pretende reduzir a pó.

E Leopoldo Amado escreve:
“Em finais de Novembro de 1964, o PAIGC atacou por três vezes, e violentamente, o aquartelamento de Guileje, sendo o ataque de 29 de grande envergadura. Iniciado às quatro da manhã, durou cerca de duas horas, período durante o qual os guerrilheiros utilizaram todas as armas novas que possuíam. No dia seguinte, deu-se novo ataque, que provocou novas baixas, demonstrando não somente que o PAIGC teria decidido ocupar em força a povoação de Guileje por ser estratégica, mas também para fazer uma demonstração de força, usando os novos armamentos com que a partir dessa altura já contava: morteiros, metralhadoras ligeiras, espingardas automáticas, minas anticarro de fabrico russo”.

Todo o restante ano de 1964 vai revelando um gradual poder combativo do PAIGC. Para além dos acometimentos sistemáticos em Madina do Boé e Guileje, a maior parte dos destacamentos do Sul são flagelados e prosseguiu a destruição de pontões, dificultando a mobilidade das forças portuguesas. De toda esta evolução, Arnaldo Schulz dará conta aos seus superiores, vai-se instituindo a contrainformação militar, melhorou a ação psicossocial, são aprovados planos de desenvolvimento, como novos alojamentos em bairros de Bissau. E entrarão em cena helicópteros com helicanhões. Trata-se de uma realidade que já não será acompanhada pelo BCAV 490. Como é óbvio, a tese de doutoramento de Leopoldo Amado prossegue até 1974, o que significa que está fora do contexto que analisamos.

O companheiro do bardo socorre-se de belas páginas da obra-prima de Armor Pires Mota, “Estranha Noiva de Guerra”, Âncora Editora, 2010, para se dar o ambiente do que era uma flagelação clássica, nela ainda não são referidos os foguetões e muito menos a aproximação de viaturas, como acontecerá anos mais tarde:
“Um tiro solitário saltitou, estalando fino. Já não tive tempo para disparar outro e outro. As sentinelas abriram, de imediato, fogo cerrado para o mato. O ataque começava. Só tive tempo de enfiar a G3 em bandoleira e as cartucheiras. Correndo, de torso curvado, quase arrasando o chão, fui acaçapar-me em abrigo. A fuzilaria feroz e cerrada vinha de todos os lados, dos morros de bagabaga, de árvores bem copadas, da pista de aterragem, até da tabanca, os morteiros mais ao largo. Via-se que estavam perto. As armas espirravam estrondos, faiscavam pirilampos de fogo devastador, mesmo à boca do mato. As tarimbas rangeram. Em menos de um ámen, todos enfiaram o capacete, as cartucheiras. O ânimo também. Em menos de um ámen, empurraram as armas para o quadril, arrastaram cunhetes de bala e granadas de mão. Alguns, nem sequer tiveram tempo de pensar que iam de berimbau ao léu ou mesmo de cuecas. Tanto fazia morrer nu como vestido (…). Um vulto começou a correr aos ziguezagues na direcção onde eu estava. Os olhos faiscavam. Firmei a arma bem no ombro. Suspendi ainda a respiração. Como se fosse o meu último minuto de vida. Premi o gatilho e abati-o como uma rajada seca de seis tiros. O rapaz dançou no ar, como um boneco de palha. Por outros locais, os gajos tentavam forçar a barreira, vomitando fogo e apostando em fazer das suas (…). O ataque tinha duas partes. Assim, ao recomeçar o tiroteio, verificou-se logo uma intenção mais violenta por parte do IN, a que correspondeu a tropa com fogo nutrido. O pior é que o IN se acobertava e protegia com as casas de tabique da aldeia à nossa guarda e o capitão recusava-se a bater a aldeia com os morteiros. Algumas granadas dos morteiros de calibre 82mm do IN começavam a espirrar com mais força sobre a caserna e a escola. A escola era a messe e a casa de habitação do capitão”.

Em todas as circunstâncias, o contraditório e o complementar são obrigatórios para melhor procurar entender como se ia desencadeando aquela guerra, como reagia a estratégia portuguesa a toda esta carga avassaladora da guerrilha. Por isso se seguirão referências ao que se escreve na “Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África”. E fica-se rapidamente a perceber que há lacunas fundamentais a preencher para que todas estas peças do caleidoscópio melhor se agreguem para dar uma explicável figura.

(continua)
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Notas de leitura

Poste anterior de 21 de fevereiro de 2020 > Guiné 61/74 - P20672: Notas de leitura (1266): Missão cumprida… e a que vamos cumprindo, história do BCAV 490 em verso, por Santos Andrade (46) (Mário Beja Santos)

Último poste da série de 24 de fevereiro de 2020 > Guiné 61/74 - P20681: Notas de leitura (1267): “Autópsia de um Mar de Ruínas”, por João de Melo, 9.ª edição reescrita pelo autor; Publicações Dom Quixote, 2017 (1) (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P20690: Tabanca da Diáspora Lusófona (7): A história de mil anos de Portugal explicada numa hora à comunidade eslovena em Nova Iorque (João Crisóstomo) - IV (e última) Parte


Fonte: Cortesia de Luso-Americano, 19 de janeiro de 2018


[Foto à direita: O nosso camarada e amigo 

João Crisóstomo,luso-americano, natural de Torres Vedras, conhecido ativista de causas que muito dizem aos portugueses: Foz Côa, Timor Leste, Aristides Sousa Mendes... Régulo da Tabanca da Diáspora Lusófona, foi alf mil, CCAÇ 1439 (Enxalé, Porto Gole e Missirá, 1965/67): vive desde 1975 em Nova Iorque; é casado, desde 2013, com a nossa amiga eslovena, Vilma Kracun] 





Conversa sobre Portugal: 19 de janeiro de 2020, Comunidade eslovena em Nova Iorque

por João Crisóstomo


[ O autor tinha preparado um guião original, já com cortes, para uma conversa de meia hora; como o tempo disponível acabou, entretanto, por ser maior - cerca de uma hora - ele passou a ter liberdade para introduzir notas e comentários extra; a versão original está disponível em inglês, no final deste poste (*); o editor Luís Graça fez a tradução e adaptação livre para o blogue, com a devida autorização do autor ](**)

(Continuação)


De alguma maneira esta saída dos judeus de Portugal veio a ter muita relevância na América: sem estar com grandes detalhes permito-me enumerar e salientar alguns factos.



Os primeiros judeus que chegaram aos Estados Unidos vieram do Brasil, depois de, por razões já mencionadas, terem saído de Portugal. A eles se devem a criação da primeira comunidade judaica em Nova Iorque; a construção da primeira sinagoga em Newport, Rhode Island (a "Touro Synagogue"); e logo a seguir uma outra sinagoga em Nova Iorque, a primeira nesta cidade  ainda hoje chamada "The Spanish and Portuguese Synagogue" — onde durante muitos anos os serviços eram em ladino, como hoje podemos ver nos documentos originais. 

Em ambas as sinagogas a maior parte dos nomes daqueles que as construíram, e assim gravados em pedra, são bem portugueses.


A própria "Estátua da Liberdade” em frente a Nova Iorque tem uma vertente portuguesa: o conhecido poema "Deixai vir a mim os desterrados", que se pode ler na base desta estatua, é da autoria de Emma Lazarus [1849-1887], ainda de ascendência portuguesa; os seus antepassados pertenceram ao grupo daqueles saídos de Portugal depois da instituição da Inquisição. 



E, a título de curiosidade, o mesmo se pode dizer do maior autor de marchas militares americanas, John Philip de Sousa [1854-1932], de pais açoreanos, cujas marchas ouvimos sempre, queiramos ou não, no dia da Idependência e outros momentos solenes e assim pertinentes.



E já que estou mencionando pessoas e factos/acontecimentos relevantes, não posso deixar de mencionar alguns: Peter Francisco [1760-1831],   o conhecido gigante português, guarda-costas de George Washington, considerado por muitos o mais famoso do “Continental Army” e possivelmente até de toda a história militar dos Estados Unidos,  assim reconhecido num selo postal.

E porque não mencionar também a Pedra de Dighton, onde estão gravados em pedra os nomes de Corte Real, o escudo real português e outros testemunhos de que, antes dos ingleses chegarem a terras americanas,  havia muito tempo já que os portugueses aqui tinham chegado. E quem fez esta descoberta escrita na pedra não foi nenhum português, mas antes um professor americano, em 1920, Edmund Burke Delabarre, professor na Universidade de Brown em Providence, Rhode Island. Quem quiser ver a pedra e o seu pequeno museu, estes podem ser visitados a qualquer altura. 

Após a libertação da Espanha [, em  1 de dezembro de 1640], Portugal conseguiu recuperar a maioria das colónias invadidas durante a ocupação espanhola. E um ressurgimento se seguiu. Foi no Brasil, 150 anos antes do mesmo acontecer nos EUA, que ocorreu a primeira corrida do ouro nas Américas. Ouro, diamantes, tabaco e outras riquezas começaram a afluir a Lisboa novamente. 

E Portugal tornou-se novamente um país rico. Riquezas do Brasil foram usadas para construir uma enorme Basílica, Palácio e Convento em Mafra, perto de Lisboa, que hoje possui o maior corredor de qualquer palácio da Europa, incluindo Versalhes; uma grande e nova grande casa de ópera foi construída; e outros monumentos. 

Mas essas riquezas não foram usadas em proveito  do povo, mas apenas em benefício de alguns; e enquanto o Vaticano recebia uma luxuosa embaixada portuguesa, as condições de trabalho em Portugal eram muito próximas da escravidão. O fato é que, embora nas mãos de poucos, havia muita riqueza em Portugal. 

Mas em 1755 uma tragédia natural atingiu Portugal: um terramoto terrível, seguido por um tsunami e incêndios destruíram a maioria dos edifícios em Lisboa, sobretudo na Baixa, e outras cidades e povoações do litoral. Apenas em Lisboa houve cerca de 75.000  mortos (, as estimativas variam, conforme as fontes, entre 10 mil e 90 mil). 


A  reconstrução da cidade, sob a liderança do Marquês de Pombal, foi e ainda hoje é objeto de admiração para quem visita Lisboa. Mas logo outro revés ocorreu com três invasões sucessivas pelas forças francesas, quando Napoleão tentou levar Portugal à submissão como primeiro passo na sua luta com a Inglaterra. O rei português e sua corte conseguiram escapar para o Brasil, em 1807, em navios fornecidos pelos britânicos antes da chegada dos franceses, mas estes, ao chegarem, ocuparam Portugal por algum tempo, até serem forçados a recuar. Napoleão enviou imediatamente uma segunda força, que teve o mesmo destino da primeira. E uma terceira invasão se seguiu.

Foi em Torres Vedras, minha cidade natal, que as forças portuguesas e britânicas sob o comando de Arthur Wellesley,  futuro Duque de Wellington [1769-1852], deram o golpe final às forças francesas em Portugal, impedindo-as de ocupar Lisboa novamente e forçando-as a recuar pela terceira vez para não mais voltarem. Mas o que havia em Portugal de qualquer valor durante essas três invasões foi propositadamente destruído ou levado para a França. Recentemente, alguns mapas da costa africana e registos do desenho e construção de navios, roubados pelos invasores franceses, foram encontrados no departamento de Arquivos de Gironde, na França. 

Em 5 de outubro de 1910, os portugueses optaram por uma república, em vez de um sistema de governo de monarquia constitucional. Mas durante muito tempo Portugal foi um país muito pobre. 

Em 1932, Salazar foi escolhido pelo presidente para ser o novo primeiro-ministro. Ele conseguiu manter Portugal neutral  na Segunda Guerra Mundial e, por meio de medidas rigorosas e austeras, trouxe alguma estabilidade económica ao país. Mas enquanto as outras nações que haviam saído da guerra completamente destruídas, estavam no caminho de uma notável recuperação económica, investindo em educação e infra-estruturas, Salazar [1889-1970] não fez nada disso, mantendo o ouro que acumulou e economizou em reserva,  por razões que ninguém entendeu. 

Ele figurava entre os líderes autoritários mais antigos do mundo, mas quando morreu [, em 1970, depois de ter sido sustituído em 1968, sem nunca o saber, por doença grave], o seu regime [, o Estado Novo] conseguiu sobreviver, mantendo Portugal com o rendimento mais baixo da Europa Ocidental.

Por outro lado,enquanto outras nações estavam prontas para conceder autonomia e independência às suas colónias, ele resistiu aos movimentos de libertação nas colónias portuguesas (, que ele insistia em chamar de "províncias ultramarinas" ou extensões de Portugal), à custa de milhares de vidas, e perda de riqueza, numa longa e inútil guerra, que se prolongou de 1961 a 1974(, a guerra colonial).

Muito mais podia e devia ser dito. Mas não o posso fazer neste curto espaço de tempo. Não quero porém deixar de fazer uma menção ao papel de Portugal no que respeita aos refugiados durante a II Guerra Mundial.

Como mencionei atrás, Portugal conseguiu conservar uma posição neutral neste conflito. A sua posição geográfica porém fez dele o destino ideal como porto de saída para o resto do mundo. E Salazar por razões que a razão desconhece - por um lado tínhamos uma ligação de aliança com a Inglaterra, mas ao mesmo tempo Salazar era um admirador de Mussolini e de Hitler, mais do primeiro do que do segundo, é certo —, decidiu neste assunto alinhar-se com a maioria das nações, dificultando e mesmo proibindo, na maioria dos casos, e salvo raras excepções, a entrada de refugiados, especialmente os de origem judia, em Portugal.

E foi neste momento em que apareceu o grande humanista Aristides de Sousa Mendes [1885 - 1954]. Alegando que o dever de sua consciência cristã se sobrepunha a qualquer outra consideração, não hesitou em desobedecer às directivas directas do governo português e deu milhares de vistos a todos os refugiados que o procuraram,quando era cônsul em Bordéus, em 1940. O seu gesto corajoso, foi o primeiro e o maior a nível individual de todas as operações de resgate que se seguiram.


Muitos outros diplomatas, e até pessoas individuais, seguiram o seu exemplo depois em actos de corajosos resgates. É o seu pioneirismo que quero realçar, pois foi o facto de isto ter acontecido logo no início da guerra que forçou a abertura das portas que Salazar não teve mais coragem de fechar. Por estas portas passaram centenas de milhares de refugiados, muitos dos quais teriam perecido em Auschwitz e noutros campos de concentração, se não fora a coragem heróica deste português.


Como devem saber, Salazar (que,  acabada a guerra vangloriou de ter salvo muitos refugiados, dizendo ter pena de não ter feito muito mais), nunca perdoou a Aristides o que ele considerou um acto de desobediência, e Aristides veio a morrer como um pobre num auspício para pobres em Lisboa. 



Depois da morte de Salazar,    os portugueses aperceberam-se de que se impunha um novo rumo político para o país. E cedo ocorreu uma revolução em Lisboa [, em 25 de Abril de 1974]. Mas,  talvez porque cansados de guerra e de lutas, esta foi uma revolução quase pacífica , se assim se pode dizer, pois que não houve mortes, e viria a ser chamada "revolução dos cravos” pelas flores com que todas as armas eram "coroadas" por civis e depois mesmo pelos militares.



Foi uma recuperação longa e lenta desde 1974, quando um novo governo democrático foi instalado em Lisboa. Hoje, Portugal, conhecido por sua hospitalidade, vida simples e ambiente seguro, é hoje considerado um bom lugar para se viver e visitar. Eu, pelo menos, espero que continue assim. 

Obrigado! João Crisóstomo
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Bibliografia que consultei;


1. O livro de onde faço várias referências é o livro:” The First Global Village"- How Portugal changed the world , da autoria do escritor Inglês Martin Page, 12a edição. " Casa das Letras" ( comprei este aí em Portugal).



Outros livros que li e que “consultei" agora:


2. "Encompassing the World” Portugal and the World in the 16th and 17th Centuries. Um daqueles livros grandes em todo o sentido, de se lhe "tirar o chapéu, pelo seu conteúdo fabuloso em todos os aspectos. Publicaçao da “Arthur M.Sacckler Gallery( da Smithsonian Institute em Washington)

3. Lisbon - War in the shadow of the city of light, 1939-1945 da autoria de Neil Lochery

4. The First World Sea Power—1139-1521; volume 1o. Autor: Saturnino Monteiro

5. 1494 How a Family Feud in Medieval Spain Divided the World in Half . Autor:Stephen R. Bown ( St Martins Press, New York)

6. 1808 (5a edição) Autor: Laurentino Gomes ( jornalista brasileiro). Editora Planeta. Brasil

7. Os Pioneiros Portugueses e a Pedra de Dighton, do Dr. Manuel Luciano da Silva

8. Magellan autor ; Stefan Zweig,( version française) par Alzir Hella; Bernard Grasset- Paris

Jornais e revistas:

1. "Luso-Americano” uma série de artigos sobre esta exposição, da autoria do jornalista /escritor/editor principal do" Luso Americano". Publicadas neste jornal de 27 de Abri29 de Junho de 2007.

2. New York Times, Friday, June 29 2007

3. Washington Post, June 24 2007 e July 20 2007

4. "Portuguese in the making of America” da autoria de James H.Gill

5. Military History, July/August 2006, artigo do historiador Michael D. Hull, capa e artigo (páginas 24 a 31).

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Notas do editor:

(*) January 19, 2020; Slovenian community:Talk on Portugal…



(...) After the liberation from Spain Portugal was able to recover most of the colonies which had been invaded during the Spanish occupation. And a recovery followed. It was in Brasil, 150 years before the same would happen in US, that took place the first gold-rush in the Americas.



Gold, diamonds, tobacco and other riches started to flow to Lisbon again. And Portugal became again a wealthy country. Riches from Brasil were used to build a massive Basilica in Mafra, near Lisbon, which today boast the longest corridor of any palace in Europe, including Versailles; a great grand new opera house was built; and other. But these riches were not used for the people but just for a few; and while the Vatican was recipient of this Portuguese royal generosity, working conditions in Portugal were very close to slavery.

The fact is that, though in the hands of a few, there was much wealth in Portugal. But In 1755 a natural tragedy struck Portugal : a terrible earthquake, followed by a tsunami and fires destroyed most buildings in Lisbon, Porto and other places. Just in Lisbon there were 75,000 people dead.

The following reconstruction of the City was and is still today object of admiration for anyone who visits Lisbon. But soon another setback occurred with three successive invasions by French forces, as Napoleon tried to bring Portugal into submission as a first step in his fight with England. The Portuguese king and his court were able to escape to Brasil on ships provided by the British before the French arrived, but upon arrival they occupied Portugal for some time, until they were forced to retreat. Immediately Napoleon sent a second force, which had the same fate of the first one. And a third one followed.

It was in Torres Vedras my hometown that the Portuguese and British forces under the command of the future Duque of Wellington gave the final blow to the French forces in Portugal, preventing them from occupying Lisbon again and forcing them to retreat a third time not to come back any more.

But what there was in Portugal of any value during these three invasions was either purposely destroyed or taken to France. Just recently some maps of the African coast and records of the design and construction of ships which were stolen by the French invaders were found in the Archives department of Gironde in France.

In 1910 the Portuguese opted for a republic, instead of a monarchy system of government. But for a long while Portugal was a very poor country.

In 1932 Salazar was chosen by the President to be the new Prime Minister. He was able to save Portugal from entering WW II and by means of strict and austere measures brought some economic stability to Portugal. But while other nations which had come out of the war completely destroyed were in the road to a healthy recovery by investing in education and infrastructures, Salazar did nothing of this, keeping the much gold he had amassed and saved in storage for reasons nobody understood. 

He is among the the longest authoritarian leaders , but when he died, and for some years afterwards as the same regime continued, Portugal had the poorest income in Western Europe. While other nations were ready to grant autonomy and independence to their colonies, he resisted the liberation movements in Portuguese colonies, which he insisted in calling extensions of Portugal, at the cost of thousands of lives, and the loss of all he had amassed in a futile war that nobody understood.

It has been a long and slow recovery since 1974 when a new democratic government was installed in Lisbon. Portugal of today, well known for its people hospitality, simple living and safe environment, is considered now a good place to live and visit.

I for one hope it will continue so. Thank you!




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