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terça-feira, 24 de dezembro de 2024

Guiné 61/74 - P26307: Contos com mural ao fundo (Luís Graça) (36): uma guerra que também era... ototóxica!

Uma preciosidade, uma relíquia farmacêutica: o célebre medicamento contra o paludismo, Pirimetamina, 25 mg,, LM (iniciais de Laboratório Militar)... 

Havia duas tomas semanais (a pastilha à base de quinino era dissolvida em meio copo de  água),  às quintas e domingo, segundo o nosso camarada médico, Rui Vieira Coelho... A imagem é do António Tavares (ex-fur mil, CCS/BCAÇ 2912, Galomaro, 1970/72).

 Havia diversos "mitos" à volta deste "profilático", e que levavam à recusa em tomá-lo: um deles é que “fazia mal...à tusa”!...

Segundo o nosso camarada Rui Vieira Coelho (ex-alf mil médico BCAÇ 3872 e BCAÇ 4518, Galomaro, 1973/74, hoje médico, reformado, natural do Porto ou a residir no Porto), "nas crises palúdicas o tratamento era feito com Resochina em soro polielectrolítico e aplicação endovenosa e dava sempre uma incapacidade de alguns dias, sobrecarregando os colegas e diminuindo a capacidade operacional do grupo de combate a que pertenciam ou levando á substituição por outro pessoal o que moral e eticamente era reprovável no caso de serem feridos em combate" (...) (*)

Foto: © António Tavares (2014). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Luís Graça & Camaradas da Guiné.]



Uma guerra que também era... ototóxica

por Luís Graça


Um dia sonhaste que tinhas uns 'ouvidos novos' . Ou melhor, sonhaste que tinhas encontrado no lixo uns 'ouvidos novos'... e que os mandaste recuperar. De outra vez, o sonho era que tinhas recebido em "herança", de um amigo querido que acabara de morrer, um par de próteses auditivas novinhas em folha, além de uns  "mocassins" (que ele nunca chegou a usar)...

Surdo que nem uma porta, o teu amigo nunca se habituara aos malditos aparelhos. Deixou de conviver, de aparecer na tertúlia dele, isolou-se e morreu sem um ai nem um ui, vítima do Covid-19...

Afinal, tens má consciência por toda uma vida em que foste predador do planeta. Agora, tarde e a mais horas, 'andas numa de reciclagem', gozam contigo os teus filhos e os teus amigos. Reciclas tudo o que podes, até querias pôr "ouvidos novos", reciclados, imagina!... (Pois é, não sabes que raio de planeta vais deixar para os teus netos e bisnetos, se os tiveres.)

− Rins, fígados, corações, e outros órgãos, dá para transplantar... Mas ouvidos, ó senhor professor ?!... Implantes cocleares, queria o senhor dizer − gozou contigo o otorrino.

− Có... quê ?! ... Ouço mal, desculpa.

Foste fazer um audiograma, mas primeiro passaste pelo otorrino, teu velho amigo e conhecido, para limpar a merda dos ouvidos. Um deles tinha "favos e favos de mel e cera". 

−  Mais cera do que mel. Ou era só cera ?... 

− Um "pedregulho"! − disse ele, para teu espanto, apresentando-o na cabeça do dedo mindinho.

Ficaste assustado. Costumavas usar cotonetes...

− Qual quê ?!... Os ouvidos limpam-se com os cotovelos... E também podes usar um óleo, até o creme Nívea, para lubrificar o ouvido... Todos os dias, um bocadinho.

Há já uns anos que ouvias mal, já não ouvias os alunos da terceira fila na sala de aulas. Muito menos o safado e emproado locutor de serviço ao telejornal. Deixaste de ouvir e ver televisão, que, além disso,  só te trazia más notícias.

Nem podias ir ao teatro, que os atores só falavam para eles e entre eles e o ponto. E a primeira fila era só para os convidados, os críticos e os amigos bons de ouvido. E mesmo para ouvir a tua querida 9.ª sinfonia tinhas que levar um "funil" (punhas a mão atrás da orelha, a fazer de funil), o que irritava o espetador da fila de trás. E logo tu que eras um melómano... Então, música de câmara, só sentado na primeira fila. o o pescoço esticado e a mão em funil.

Desististe.

− É mau sinal um gajo começar a desistir. De fila em fila acabas na última. E depois é o corredor do hospital, o terminal da morte.

Mas não eras tão melómano como aquele professor do conservatório nacional de música que te garantia que de vez em quanto tinha que ir a Berlim "limpar o ouvido"...

− "Limpar o ouvido" ?...

− Sim, ouvir a orquestra filarmónica de Berlim.

O sacana do otorrino, teu amigo, há uns anos atrás, lá no consultório dele, encolheu os ombros, e interpelou-te:

− Mas o que é o senhor professor quer que eu lhe diga ?!... A idade não perdoa, meu caro, a perda auditiva é irreversível"...

− Merda para a idade, senhor doutor!... E então os milagres das novas ciências médicas para cujo peditório também dei durante anos e anos ? Eu quero uns ouvidos novos, quero uma anca nova, quero uma recauchutagem do esqueleto, como deve ser, da cabeça aos pés... Tudo a que tenho direito...

O otorrino riu-se à gargalhada.

− A saúde custa cada vez mais caro. É já um bem de luxo. Nunca será para todos.

Nunca foste egoísta, agora estás a sê-lo... Andaste cinquenta anos a descontar para a ADSE (e continuas a descontar), nunca tomaste um medicamento, nunca foste à faca, nunca gastaste um chavo ao SNS, nem ao provedor da santa casa da misericórdia lá dá tua terra de que eras irmão... Foste amigo de ministros da saúde. Tinhas saúde para dar e vender. Nunca meteste uma cunha a Deus nem ao Hospital de Todos os Santos, também nunca te calhou o euromilhões ou a sorte grande, mas a verdade é que também não jogavas, e quem não arriscava não petiscava, lá dizia o saloio do Zé Povinho, que aprendeu a acender uma vela a Deus e ao Diabo....

Não jogaste, não ganhaste, não arrombaste os cofres da santa casa da misericórdia quando foste mesário. Agora andas a fazer as contas à vida: tanto para os ouvidos, tanto para a anca, tanto para os joelhos, tanto para a farmácia...

− E que Deus nos livre do raio do Alzhemeir! − pediste tu, à tua médica de família como "prenda de Natal"....

E no outro dia foste à audiologista:

− Otites líquidas, teve em pequeno? −perguntou-te ela, inquisitorial.

− Minha querida, quem as não teve, em pequenino, ou no Portugal pequenino em que nasci, vivi e cresci ?

E depois acrescentaste:

− E o meu médico era a ti'Gertrrudes, minha vizinha, da minha rua, guardadora de segredos terapêuticos milenares... Do sarampo à varíola, da pleurisia aos furúnculos, do quebranto à espinhela caída, tinha soluções milagrosas para tudo...

Algumas "repugnantes", como a merda de galinha em compressas no peito...

− Médicos ?... Só havia um lá na terra, e a gente só o chamava no estertor da morte ou nalgum parto de má hora.

E por descargo de consciência, ainda a esclareceste, a tua audiologista, sobre o teu passado:

− Depois disso, estive no século passado na Guiné, na guerra, ouviu falar ?... A menina é jovem, já nasceu depois do 25... E mesmo que fosse antes, nunca iria para a tropa. Só se fosse enfermeira paraquedista, conheci algumas na Guiné... Mas contavam-se pelos dedos as mulheres que foram à guerra...

− Já nasci nos anos 90, mas ouvi falar! − ripostou ela.

−  De quê, da guerra ?...

E enumeraste um rol de situações que só se viam nos filmes:

− Tiros, explosões, emboscadas, minas anticarro, acidentes com viaturas, quedas mais ou menos aparatosas, picadas, solavancos, cabeçadas, cones de fogo nas trombas, trambolhões, bezanas, esquentamentos, febres palúdicas... sabe como são estúpidas as brincadeiras da guerra, quando se tem vinte anos, sangue na guelra e as hormonas a rebentar a pele...

− Ah!, já sei!... Quinino, ototoxicidade!

− O quê... ?

− Há certos medicamentos que são otóxicos... Já passaram por aqui alguns antigos combatentes da guerra do Ultramar que se queixavam do mesmo mal... Surdos que nem uma porta!

− Ah!, o quinino, a pastilha LM, do Laboratório Militar, que a gente tomava regularmente, às refeições... Por causa das sezões,  malária ou paludismo... Lembro-me !

E, retomando o fôlego:

− Eureka!... Se me lembro !... Um pacotinho de sal e outro de quinino, ao almoço!... O quinino, pelo menos duas vezes por semana.

−Parece haver evidência científica de que o quinino pode provocar danos ao sistemas coclear e/ou vestibular"...

− Desculpe, não percebo nada da anatomia e da fisiologia do ouvido... Mas com essa do quinino, é que a menina me estar a lixar!... Não sabia, mas devia saber, porra, afinal andei anos e anos a falar de saúde e segurança do trabalho, de surdez profissional, de efeitos extra-auditivos do ruído como o stress..

− Não sou farmacêutica, mas há para aí mais do que uma centena de medicamentos ototóxicos. Acrescente-lhe o antibiótico, a penicilina, medicamentos oncológicos...

− Porra, tomávamos aos milhões, a penicilina...

− Agora, não há remédio, e não precisa de dizer palavrões... Sou sensível de ouvidos... Ou melhor: felizmente há remédio. Deixe isso comigo.

− Remédio ?!...

− Vamos lá ver o audiograma e, depois, pôr estes "brinquinhos" no ouvido, devidamente regulados...

− Com essa é que me tira o sono, que a guerra era tóxica, eu já o sabia, mas que também podia ser ototóxica, não me passava pela cabeça (nem pelo ouvido)!... Devia pedir uma indemnização ao Estado!...

− É mau para o Estado... mas é bom, para nós, multinacionais que vendemos aparelhos auditivos, um negócio de milhões (aqui para nós que ninguém nos ouve)... − e olhou para a porta do gabinete para confirmar que estava fechada.

Não podias estar mais grato à tua  jovem audiologista:

− Já percebi, é bom que os antigos combatentes não saibam certas coisas que faziam mal à saúde... Afinal, só os juízes é que são cegos, surdos e mudos como o macaco...

− E têm que ser bem pagos por isso... − arrematou a audiologista.  
− Administrar a justiça sem olhar a quem.

− Minha querida, estou encantado por ouvi-lo... Sabe, estou até a simpatizar consigo!.

... Saíste da loja com uns 'ouvidos novos'. Feliz como o gaiato, que acaba de receber um brinquedo novo. Podias agora ouvir todas as conversas, mesmo baixinhas... Até as bisbilhotices e as conversas dos espiões!... Mais importante: podias ouvir o mar no mês de agosto, e o vento a dar nos búzios dos moinhos da tua infância...

Algumas conversas bem tu as dispensavas, é certo... Mas não há mundos perfeitos... Não se pode ter tudo. Mais vale, afinal, andar neste mudo de muletas do que no outro em carretas...

Em boa verdade, compraste uns aparelhos novos. Os do teu amigo, esses, é que foram para a  "pubela",  para a reciclagem... Que desperdício!.,. Também não quiseste  os sapatos do defunto, uns belíssimos e confortáveis "mocassins" que ele comprara em Paris... Por superstição, por preconceito, por respeito .... Ias lá usar sapatos e próteses auditivas de um morto!

Mas queixaste-te, à menina audiologista, que era era indecente pedirem-te 8 mil euros por um aparelho auditivo XPTO... Mesmo com desconto de 50% por seres conhecido da casa... e a tua patroa já ser cliente da marca.

Preferias uns, em segunda mão, reciclados. Do teu amigo defunto, que nunca os usou, se vencesses a repugnância da morte e dos mortos. Sentiste  -te ofendido com o preço altamente inflacionado do raio dos aparelhos, tu que lutaste na guerra pela tua Pátria e que, se calhar, foras vítima da ototoxicidade provocada pelas drogas antimaláricas do Laboratório Militar... Agora, sim, confirmavas as tuas suspeitas: médicos e enfermeiros davam "pastilhas LM", "mezinho", a toda a gente, brancos e pretos. Algumas eram talvez placebos, outras podiam ser "ototóxicas"...

Em vez de uma cruz de guerra, o Estado devia dar-te uns 'ouvidos novos', como tu chamavas às próteses auditivas... Humor negro à parte, pagaste e não bufaste!... Quatro mil euros, já com desconto e com IVA. A ADSE deu-te mil e tal e já está. Ainda estás, afinal,  a pagar a p...da fatura da guerra. (**)

_________________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 16 de outubro de 2014 > Guiné 63/74 - P13743: Os nossos médicos (80): Memórias do Dr. Rui Vieira Coelho, ex-Alf Mil Médico dos BCAÇ 3872 e 4518 (12): Até a Maria Turra dizia que o antipalúdico Pirimetamina, do Laboratório Militar, fazia mal à tusa...

(**) Último poste da série > 6 de novembro de 2024 > Guiné 61/74 - P26119: Contos com mural ao fundo (Luís Graça) (35): Nunca digas "coragem!", ao ouvido de quem está a morrer e sabe que vai morrer

terça-feira, 17 de dezembro de 2024

Guiné 61/74 - P26276: Coisas & loisas do nosso tempo de meninos e moços (33): Um presépio de há 60 anos, na Lourinhã, com um Menino Jesus muito "elétrico"... (Horácio Mateus, 1950-2013)

 


 Capa do livro "Apontamentos de Etnografia", de Horácio Mateus (1950-2013). Lourinhâ: GEAL - Grupo de Etnologia e Arqueologia da Lourinhã, 2014, 56 pp.  (Foto da capa: o autor) (Com a devida vénia...)






1.  Fez este ano 40 anos o Museu da Lourinhã. `À sua criação e à sua história está indissoluvelmente ligada a figura do lourinhanse Horácio Mateus (1950-2013). Meu conterrâneo, amigo e vizinho, já não foi à guerra, fez a tropa. 

Em vida, foi etnólogo, espeleólogo, arqueólogo, paleontólogo, museólogo...Amador. Por paixão. Por muito amar a sua terra, a sua gente, o seu património cultural, material e imaterial.

C0mo  eu disse na oração fúnebre, aquando da sua despedida terrena, ele foi "um exemplo de paixão pela vida, pela terra, / pelos seres que o habitam ou habitaram, / pelas artes e ofícios dos nossos antepassados, / pelas pedras das suas casas, / pelos muros dos seus caminhos, / pelas árvores dos seus campos"... Cultivou "a paixão pela história, / pela ciência, /pela cultura, / pelo património de todos nós" (*)

"Não gostava de escrever", dizia a viúva, infelizmemnte também já desaparecida, a Isabel Mateus (1950-2021). Mas, com muito amor foi ela quem juntou e organizou  estes apontamentos de etnografia, histórias e notas que oo Horácio  foi 5registanbdo na memória e fixando no papel, associadas à riquíssima coleção etnográfica do museu, cuja recolha se deve em grande parte a ele... 

Mas mais do que as peças, em risco de se perderem para sempre (da bicleta do ourives ambulante aos rótulos e e recipientes da "fábrica de pirolitos",  ou das ferramentas dos correeiros e dos ferradores), interessavam-lhe as histórias dos seus donos, a começar pelo seu pai que  era o "pitrolino" (vendedor ambulante de petróleo, azeite, sabão, aguardente e outros produtos de uso doméstico)  e pelo sr. Garcia, taberneiro e amola-tesouras, galego de Ourennse, fugido  da guerra civil espanhola de 1936-1939...


Brasão de armas da Lourinhã

Histórias que foram as da nossa infància, como a do presépio que se montava todos os anos (e ainda hoje de monta) na Igreja Matriz da Lourinhã. Em homenagem ao meu amigo, e para enriquecer a série "Coisas & loisas do nosso tempo de meninos e moços" (**), foi repescar esta história do presépio, que remonta à primeira metade da década de 1960, já a guerra tinha "rebentado" em Angola, e depois na Guiné e em Moçambique, e já a Lourinhã tinha alguns dos seus filhos mortos, feridos e até aprisionados (como foi o caso da Índia, em finais de 1961),

O Vigário aqui referido era o padre António Pereira Escudeiro (Tomar, 1917-Lisboa, 1994), que veio de Alcanena para a Lourinhã em 1953 (e onde permaneceu até 1983). (Fundou e dirigiu na Lourinhã,  os jornais quinzenários regionalistas "Redes e Moinhos, em 1954, e depois o "Alvorada", em  1960; fundou e dirigiu também o Externato Dom Lourenço, em 1958. Quanto ao outro protagonista da história, era o José Andrade de Carvalho, hoje veterinário.









Excerto do livro "Apontamentos de Etnografia", de Horácio Mateus (1950-2013). Lourinhã: GEAL - Grupo de Etnologia e Arqueologia da Lourinhã, 2014. pág. 31. (Com a devida vénia...)

___________________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de > 19 de fevereiro de 2021 > Guiné 61/74 - P21918: Manuscrito(s) (Luís Graça) (199): Elegia para Isabel Mateus (Soure, 1950 - Lourinhã, 2021)

(**) Último poste da série > 1 de dezembro de 2024 > Guiné 61/74 - P26220: Coisas & loisas do nosso tempo de meninos e moços (32): da "pubela"... ao vidrão, sem esquecer a "cesta-secção" e a "poubellication" (Luís Graça)


sexta-feira, 15 de dezembro de 2023

Guiné 61/74 - P24956: E depois da peluda... a luta continua: as minhas escolas (Joaquim Costa) - Parte IV: Enfim, em casa!... Famalicão, a minha terra...

 


Foto nº 1 > Vila Nova de Famalicão > Edifício, emblemático,  da Câmara Municiap (1961), da autoria do arquiteto Januário Godinho.


Foto nº 2 > Vila Nova de Famalicão >   O Edifício da Lapa, antigo hospital, e posteriormente liceu da cidade, hoje sede da Universidade Lusíada.
 


Foto nº 3 > Vila Nova de Gaia > 2023 > O Joaquim Costa, num esplanada ribeirinha, com o casarinho histórico da sua amada "Invicta"  ao fundo.

Fotos (e legendas): © Joaquim Costa (2023). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

 

1. Continuação da nova série do Joaquim Costa:  "E depois da peluda... a luta continua: as minhas escolas"... (*)


(i) ex-fur mil at armas pesadas inf, CCAV 8351, "Tigres do Cumbijã" (Cumbijã, 1972/74);

(ii) membro da Tabanca Grande desde 30/1/2021, tem cerca de 7 dezenas de referências no blogue;

(iii) autor da série "Paz & Guerra: memórias de um Tigre do Cumbijã (Joaquim Costa, ex-mil arm pes inf, CCAV 8351, 1972/74)" (de que se publicaram 28 postes, desde 3/2/2021 a 28/7/2022) , e que depois publicou em livro ("Memórias de um Tigre Azul - O Furriel Pequenina", por Joaquim Costa; Lugar da Palavra Editora, 2021, 180 pp);

(iv) tirou o curso de engenheiro técnico, no ISEP - Instituto Superior de Engenharia do Porto;

(v) foi professor do ensino secundário, tendo-se reformado como diretor da escola secundária de Gondomar;

(vi) minhoto, de Vila Nova de Famalicão , vive em Rio Tinto, Gondomar;

(vii) tem página no Facebook.


E depois da peluda... a luta continua: as minhas escolas (Joaquim Costa) - Parte IV:  Enfim,, em casa!... Famalicão, a minha terra...


Enfim, em casa!!!

O sonho de qualquer professor é ser colocado na sua terra (Foto nº 1). Contudo, eu não aconselho.

Ser professor de filhos de colegas, de familiares, de conhecidos, etc. não é tarefa fácil. Seja em casa, no café, na rua, no jardim, na feira ("ó mãe,  olha o meu professor!"), mil olhos sempre postos em nós. Nunca podíamos pôr o pé na "poça".

Por todas estas razões estavam criadas as condições para não ser um ano fácil. E assim foi:

− Só um 4 para o Francisco!?

− Médio, Médio, Médio, Médio! Ao menos um Elevado!!

− Na reunião do conselho de turma um pouco de água benta para a Maria!

Algumas das amizades azedaram um pouco e alguns familiares deixaram de me convidar para os batizados.

Fiquei ao menos de consciência tranquila, não obstante acabar por reconhecer que alguns destes alunos acabaram por ser prejudicados porque me coloquei, algumas vezes, no papel de mulher de César: "Não basta sê-lo,  é preciso parecê-lo."

A coisa não correu bem logo no meu primeiro dia.

Apresentei-me ao diretor, que me recebeu cordialmente, pois, embora não fosse alguém das minhas relações de amizade,  conhecíamo-nos por frequentar o mesmo café. Perguntei se se encontrava na escola um colega professor, meu amigo, de longa data, de nome António.

Resposta pronta do homem:

−  Se é o que eu penso está na cadeia. 

Fiquei atónito. O António na cadeia!? Ainda há dois dias estive com ele!

Estava eu a digerir aquela bombástica notícia, com suores frios e as pernas a cederem, enquanto o homem com toda a calma do mundo e um sorriso cândido procurava o meu horário no meio de uma selva de papeis.

Com a voz trémula ainda afirmei: 

− Tem a certeza?!...

Entretanto entra no gabinete outro elemento da direção a quem o diretor pergunta:
 

 Ó Francisco, o professor António está na cadeia, não está?!

Responde a criatura,  parecendo-me com voz de compaixão:

− Ainda hoje estive lá a conversar um pouco com ele. 

Fiquei de rastos, o meu amigo António na cadeia, o que terá feito de tão grave?!

Entretanto o Diretor lá encontra a agulha no palheiro (o meu horário) e afirma com um sorriso de menino:

− E o colega também vai para a cadeia!

É então que olho para o meu horário e vejo escrito no lugar do nome da sala de aula a palavra: CADEIA.

Assim mesmo, a escola funcionava no antigo hospital (a sede) (Foto nº 2).   e na antiga cadeia, que distava 500 metros da sede. Embora eu já não residisse na cidade há vários anos,  tinha conhecimento que o antigo liceu funcionava no hospital, mas desconhecia em absoluto que também funcionava na antiga cadeia e mesmo que existia.

Aqui a sala de professores funcionava no antigo recreio dos reclusos e as salas de aula nas antigas celas. O edifício não sofreu nenhuma alteração estrutural da antiga cadeia, pelo que as salas de aulas (as celas) mantinham uma pequena abertura junto ao teto, onde entrava apenas um fio de luz. Mantinha a porta de ferro reforçada que pesava uma tonelada, que fechava só da parte de fora com uma ferragem dos anos 30.
 
Todos os professores davam aulas de porta aberta.

Eu, para além de dar as aulas de porta aberta, ficava sempre de pé junto à mesma com medo que alguém a fechasse, pois sempre sofri de claustrofobia. Era uma brincadeira frequente quer de alunos quer mesmo de professores.

Com a massificação do ensino, com muita imaginação, se encontraram soluções de recurso para acomodar tantos alunos: antigos hospitais, antigas cadeias, antigos tribunais bem como os famosos pavilhões pré-fabricados em madeira.

Joaquim Costa (Foto nº 3)

(Revisão / fixação de texto: LG)
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Nota do editor:

Último poste da série > 9 de dezembro de 2023 > Guiné 61/74 - P24932: E depois da peluda... a luta continua: as minhas escolas (Joaquim Costa) - Parte III: Primeiro, Santo Tirso, a seguir, Portalegre e logo... Santarém (onde fiz a minha formação pedagógica)

sábado, 9 de dezembro de 2023

Guiné 61/74 - P24932: E depois da peluda... a luta continua: as minhas escolas (Joaquim Costa) - Parte III: Primeiro, Santo Tirso, a seguir, Portalegre e logo... Santarém (onde fiz a minha formação pedagógica)


Santarém > Escola Industrial e Comercial de Santarém >  c. 1978/79 > "A nossa obra maior: Um 'supercomputador'...  Com esta mesa didática (construída de raiz por estes 5 “estarolas” ) se simulavam todas as operações em instalações elétricas.




Santo Tirso > c. 1975/76 > Foto de grupo:  o Joaquim Costa (algures) mais os seus colegas professores (e destes, quantos não terão passado também pela Guiné?!)

Fotos (e legendas): © Joaquim Costa (2023). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



1.Continuação da nova série do Joaquim Costa:, "E depois da peluda... a luta continua: as minhas escolas"... (*)

(i) ex-fur mil at armas pesadas inf, CCAV 8351, "Tigres do Cumbijã" (Cumbijã, 1972/74);

(ii) membro da Tabanca Grande desde 30/1/2021, tem cerca de 7 dezenas de referências no blogue;

(iii) autor da série "Paz & Guerra: memórias de um Tigre do Cumbijã (Joaquim Costa, ex-mil arm pes inf, CCAV 8351, 1972/74)" (de que se publicaram 28 postes, desde 3/2/2021 a 28/7/2022) , e que depois publicou em livro ("Memórias de um Tigre Azul - O Furriel Pequenina", por Joaquim Costa; Lugar da Palavra Editora, 2021, 180 pp);

(iv) tirou o curso de engenheiro técnico, no ISEP - Instituto Superior de Engenharia do Porto;

(v) foi professor do ensino secundário, tendo-se reformado como diretor da escola secundária de Gondomar;

(vi) minhoto, de Vila Nova de Famalicão , vive em Rio Tinto, Gondomar;

(vii) tem página no Facebook.


E depois da peluda... a luta continua: as minhas escolas (Joaquim Costa)  - Parte III:  

Primeiro, Santo Tirso, a seguir, Portalegre,  e logo... Santarém (onde fiz a minha formação pedagógica)


Depois de Portalegre segue-se Santarém, para fazer a minha formação pedagógica na Escola Industrial e Comercial de Santarém (c. 1978/79, LG).

Era um CF constituído por professores de várias formações e grupos disciplinares.
Reconheço que foi um ano muito enriquecedor. Formadores de excelente qualidade, grande camaradagem e entreajuda com os mais de 30 estagiários oriundos de todo o país, com muitos jantares (muita sopa da pedra) em conjunto já que a maioria só regressava a casa ao fim de semana. 

Aqui se estudou até à exaustão a Teoria Cognitiva de Piaget e a taxonomia dos objetivos educacionais de Bloom (Taxonomia de Bloom).

Os seis elementos do meu grupo disciplinar, no qual se incluía o orientador, eram todos do Porto e viviam na mesma casa. Mais parecia uma segunda recruta.
Foi um ano de muito trabalho, com muita colaboração, mas também alguma competição. A nota final do estágio podia ditar, no concurso para efetivo, ficar longe ou perto de casa. O trabalho começava às oito da manhã e muitas vezes só terminava de madrugada.

Poucas vezes jantávamos fora já que o ordenado era curto, como tal o jantar era feito em casa. Cada um tinha a sua especialidade: mm sabia cozinhar, outro tinha jeito para as compras, outro para as limpezas (as casas de banho era rotativo) e quem não tinha jeito para nada lavava a loiça.

O especialista da cozinha não deixava nada ao acaso, pois na quantidade de água no arroz, do tempo de cozedura ou quantidade de sal utilizava sempre uma fórmula matemática com o auxílio de uma régua de cálculo (os engenheiros gostavam mais das réguas de cálculo do que das primeiras "texas").

Este foi um ano em que o arroz faltou em quase em todo o país pelo que o especialista das compras, por sugestão do merceeiro, levou arroz integral. O cozinheiro aplicou a fórmula habitual para a quantidade de água, tempo de cozedura e quantidade de sal. Já o bife tinha "voado" e o arroz ainda não tinha chegava à mesa, pelo que, fomos à cozinha ver o que se estava a passar com o cozinheiro. Vimo-lo todo vermelho, com o suor a cair-lhe da testa dentro da panela e a régua de cálculo feita em pedaços no chão num canto da cozinha. Quanto mais água punha na panela mais ela desaparecia e o arroz sempre duro...

Um belo dia comemos na cantina algo que não nos caiu bem, pelo que decidimos fazer para o jantar uma canja de galinha. O cozinheiro colocou tudo na panela, aplicando as suas fórmulas com a ajuda da régua de cálculo (já colada com fita cola) e foi arejar um pouco já que se sentia um pouco indisposto. Os restantes elementos começaram a mexer a canja e (sem régua de cálculo) concluíram que a porção das pevides de massa era muito pouca pelo que a cada "mexidela" lá ia mais um mão cheia de pevides para a panela. 

Quando o cozinheiro chegou, gritou furioso: "quem esteve a mexer na panela? Vão ser todos obrigados a comer esta mistela!"

 E assim foi, todos comemos a canja de galinha às fatias e de faca e garfo.

Como fazíamos várias noitadas na escola, fomos avisados por colegas mais antigos que o guarda noturno, para além de uma grande pancada, fazia a ronda sempre de pistola (#), pelo que o devíamos informar sempre que ficássemos a trabalhar até de madrugada. Assim sempre fizemos. Contudo, numa altura em que se estava a esgotar o tempo para apresentar um trabalho de equipa, pedimos a chave ao chefe dos funcionários para trabalharmos na escola num dia feriado. Era nossa intenção trabalhar só da parte da manhã, mas a coisa complicou-se e arrastou-se pela noite dentro.

Embrenhados no trabalho nem nos lembramos do guarda noturno. Era uma da manhã quando ouvimos passos ao longe, ficamos brancos como um fantasma, pois o homem caminhava na nossa direção como nos filmes de terror. Ficamos sem saber o que fazer. Se gritássemos,  assustávamos o homem e ainda levávamos um balázio, se não nos dessemos a conhecer a coisa ainda poderia piorar. 

Entretanto ouve-se um tiro (##) e,  ato contínuo, todos começamos a gritar (eu fui o único que se deitou no chão - ainda reflexos dos tempos de Guiné): "Somos nós, Sr. João, não dispare pelo amor de Deus!". 

O homem lá nos reconheceu, também ficou aliviado, mas nós ficamos sem conseguir falar durante uns bons minutos.

Joaquim Costa
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Notas do autor:

(#) Todas as escolas, mais antigas, ainda têm no seu inventário uma pistola e um carregador cheio de balas, guardado a sete chaves no cofre (fala quem sabe!)

(##) O homem de facto usava a pistola carregada e pronta para disparar, mas o tiro foi de uma pistola de feira, de fulminantes, que também usava como primeira abordagem à situação.
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Vd. também poste de 20 de novembro de 2023 > Guiné 61/74 - P24865: E depois da peluda... a luta continua: as minhas escolas (Joaquim Costa) - Parte I: Santo Tirso, o dono da "tasca"

terça-feira, 18 de agosto de 2020

Guiné 61/74 - P21265: Manuscrito(s) (Luís Graça) (189): A Alice Carneiro, Rainha do Dia e Por um Dia...


Alice Carneiro, em 2020, em plena pandemia de Covid-19...Faz hoje anos e diz... que mais vale ser a Rainha do Dia, e por um Dia, do que ... Duquesa Toda a Vida. Um"selfie" para a história... Vd. página da Maria Alice Carneiro, no Facebook.


No 75º aniversário da minha Chita / nossa Alicinha

 

D’zoito d’ agosto está no nosso coração,

Nasceu em quarenta e cinco uma Alicinha,

Não foi em berço de ouro de princesinha,

Mas em casa farta… de vinho e de pão.

 

Aventureira, veio cá para o sul,

Sendo ela do Norte, da Casa de Candoz,

E logo se afeiçoou a todos nós,

E ao seu príncipe, que não era de sangue azul.

 

Sua segunda terra fez da Lourinhã,

Adora aqui  receber os filhos e a neta,

Sempre foi uma grande amiga e anfitriã.

 

Mesmo com três quartos de século em cima,

Ainda se acha uma boa atleta,

E está grata… p’lo nosso amor e estima.


Lourinhã, 18 de agosto de 2020

75º aniversário da minha / nossa Alicinha,

Rainha do Dia e por Um Dia

(… que mais vale sê-lo, 

do que… Duquesa toda a vida!)

 

O Príncipe Com Sorte,  Luís Graça


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Aviso ao Povo:

Estes versos (um soneto escrito pelo Príncipe com Sorte) foram feitos a pensar nos convivas de um projetado almoço, plebeu, mais alargado, que poderia juntar, hoje, a família da aniversariante e alguns dos seus amigos, mais à mão, aqui da Lourinhã & arredores, incluindo o aniversariante do dia seguinte Dom Orlando Rolim, alcaide da praça forte da Praia da Areia Branca.

A DGS chumbou o plano de um repasto no restaurante "Atira-te ao Mar", no Porto das Barcas, Atalaia, Lourinhã, pertença da ilustre "Casa do Cadaval", invocando razões de higiene e segurança e sobretudo limitações da lotação da sala de comes & bebes. A lista de possíeis comensais   era enorme e não havia cadeiras para todos.

Depois, a ementa, à base de produtos "gourmet",  cá da nossa região ( batatada de peixe seco - raia, safio, sapata, cação, tamboril...). também não era do agrado da maioria... Parece que não era comida para gente de sangue azul ou. como diz o fado, não é coisa que vá à mesa de Reis & Rainhas...

Por fim, os filhos e a neta reclamaram. de viva voz, nesse dia, a presença e o usufruto, em exclusividade, da Senhora Sua Mãe e Avó... 

Dito isto, e não tendo, como Deus, o dom da ubiquidade, a Rainha do Dia ( com o consentimento informado do seu Príncipe Com Sorte, que vai atrás do real séquito ) teve que se render aos argumentos da "dentadura do proletariado"... e do "fascismo sanitário".

Fica, pois, por decreto real, adiada a batatada, esperando-se por um melhor dia do calendário, mas autorizando-se desde já, a partir da meia-noite, o início dos festejos natalícias da nossa amada Rainha Alicinha.

75 anos é muita realeza e o povo tira-lhe o barrete mas não a máscara que, essa, já faz parte do busto (, dizem que talvez até morrer...).

Há uns meses atrás ainda havia força para gritar: "Abaixo a Covid"... Agora, por detrás da máscara, espera-se que o povo ainda consiga sussurrar: "Deus Abençõe a Rainha e Lhe Dê Longa Vida Com Saúde... porque a gente quer continuar a beneficiar do seu amor, amizade, afeição e estima."

E até os poetas e os bobos da Corte gritam: "Esperemos ainda cá poder estar todos/as para o Centenário"!... 

a) Assina: P'los presentes e ausentes, e em nome do Príncipe Com Sorte, o poeta e bobo da corte ao serviço.de Sua Majestade a Rainha do Dia e do Por um Dia. 

(Assinatura ilegível)

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Nota do editor:

quinta-feira, 23 de julho de 2020

Guiné 61/74 - P21194: Manuscrito(s) (Luís Graça) (188): Ficarão as moscas quando eu morrer


Selfie. © Luís Graça (2011)


Ficarão as moscas quando eu morrer


Aumento o som do aparelho dos ouvidos
só para captar as vocalizações dos golfinhos.
A vinte mil léguas submarinas dos meus tímpanos doridos.

Pobre de mim se fosse um golfinho bebé
com uma prótese auditiva,
e andasse perdido pelo mar largo e profundo.
Ou fosse apanhado pelos corsários de Salé.

Não creio que a minha mãe, em situação tão aflitiva,
me pudesse valer, encontrar e resgatar neste mundo.
Muito menos a santa casa da misericórdia
a quem cabe remir os cativos.

Imprevidente, devia ter trazido o sonar,
o chapéu de sol, e o gel,
e o livro do código fonético internacional.
Ah!, e o sextante, e 
o útero materno,
que quem vai para o mar 
avia-se em terra.
Mas não faz mal,
na Mauritânia Deus é grande 
e o oceano ainda é maior.

Terei muito que esperar pelos golfinhos,
que andam atrás das traineiras de sardinhas.
Fazem pela vida os golfinhos
e os pescadores de sardinhas,
ah!, e os comedores de sardinhas.

Eu arrisco a pele, ou melhor, o cancro de pele.
Mas já não tenho pernas 
para bater a costa de lés a lés.

Estão sentados à mesa da esplanada,
os comedores de sardinhas,
à espera que chegue o peixeiro.
São, de resto, muito mais peixeiros do que carneiros.

Não sei se os golfinhos comem sardinhas, grelhadas,
dizem que eles preferem o choco frito
com sumo de limão.

Como os corsários, afiam as facas
e os dentes de marfim, já muito gastos,
os comedores de sardinhas.
Aguardam pela iguaria que lhes sabe pela vida.

Há quem troque a vida por um bom prato de sardinhas,
ou por um saque, 
que ainda é bem melhor.

Há naus que levam escravos 
da Guiné para o Novo Mundo.
E regressam, ao Velho, 
com quinquilharia de ouro e prata.
E um pó branco a que chamam açúcar
(ou, em árabe, as-sukkar)

Contam os cêntimos os pescadores, na lota.
E já ninguém grita, de punho erguido,
que a luta continua.
Chui!, ninguém dá mais.
Fecha-se a porta à morte
ao dobrar o cabo Branco atrás do goraz.

O preço justo, camarada da companha ?
É o da lei da sobrevivência,
dizem os caçadores de escravos.

Pagam-lhes, aos "dealers",
com cavalos brancos, puros sangues árabes,
imunizados contra a peste equina africana,
diz a propaganda.
Afinal, a vida tem muito mais de arte & manha
do que de ciência.

Não há epistemologias que nos salvem,
muito menos a exata epidemiologia do nascer e do morrer
em África, com o Atlântico pelo meio,
a estrada da globalização à minha frente,
e os corsários ingleses e holandeses atrás de mim.

Em Mogador fui senhor,
em Essouira fui cativo.
Do nascer ao morrer vai um tiro de obus.
Infeliz, já nasceu, catrapus, já morreu.

Ninguém escolhe pai e mãe.
Nem os saarauís o deserto do Sara,
nunca mais ouvi falar deles, pobres coitados,
foram extintos com a partilha do planeta.
Confesso que simpatizava com eles,
cheguei a dar-lhes batatas da minha terra
em troca dos gorazes do mar deles.

Bolas, também não trouxe comigo a tabela
das equivalências. Nem a máscara.
Dizem que aqui o uso de máscara é obrigatório.

Mas, afinal, quanto pesa uma alma ?

Nem sei se a balança de pesar almas
estará devidamente calibrada.

Até no "hall" de entrada do purgatório
devia haver um aferidor (oficioso) de pesos e medidas.

Quantas toneladas de corpos
serão precisas para salvar uma alma ?,
perguntava o padre jesuita António Vieira,
nos engenhos de açúcar do Maranhão.
E quanto vale um império, em corpos e almas ?
Ou um herói ?

Que penosa essa cena
do Santo António a pregar aos golfinhos,
como se fossem predadores do topo da cadeia alimentar.

Da peste, da fome e da guerra… e do santo da nossa terra,
Libera nos, Domine!
Foi pregar para outros mares,
disputado entre Lisboa e Pádua.
Santos da casa nunca foram milagreiros.

Dos comedores de sardinhas, agora desconfinados,
sigo o rasto olfativo:
estão sentados à mesa da esplanada
num dos bairros populares, ribeirinhos,
salvos do camartelo camarário,
e por fim reordenados.

Mas será que as sardinhas já estão gordinhas ?
Há sempre uma dúvida existencial,
para o "chef", agora em "lay-off":
serão portuguesas ou espanholas, 
frescas ou congeladas ?

Vão-se os anéis, opulentos, do real erário,
ficam os magros dedos da saúde pública
e as luvas descartáveis.

Cega, surda e muda,
segue em procissão a santa senhora da saúde,
colina acima, rua abaixo.
Não vai segura, nas vielas da Mouraria,
por prevenção vai mascarada.
E queixa-se de que não ganha para o desinfetante.

Também não vale a pena gritar "Aqui-d'el-rei!",
que a corte já seguiu, lesta, para Santarém,

a toque de caixa.
Em caso de peste (de que Deus nos livre!),
aplique-se sempre o regimento:
"Meninos e meninas, chichi e cama!".

Em fila, os comedores de sardinhas,
em mesas intercaladas,
uma sim, outra não,
por causa do PPC, o processo da pandemia em curso.

Há um guarda-mor da saúde em cada porta da cidade,
a pôr carimbos: "Clean & Safe".
Por causa dos turistas do Mar do Norte que são fóbicos,
e temem que se acabe o desinfetante.

Não há moral na história, escrita ou por escrever,
de Salé à Guiné,
só os golfinhos há muito que não conhecem fronteiras
nem respeitam a zona económica exclusiva
nem as quarentenas 
nem sequer os cercos sanitários.

Gosto do internacionalismo proletário dos golfinhos,
velozes, roazes, vorazes.

Tenho pena que não sejam mais solidários.

Golfinhos e cachalotes de todos os mares, (re)uni-vos.
Não sei se eles entenderão a velha palavra de ordem,
outrora verdadeira declaração de guerra contra Neptuno:
uniform november india
victor oscar sierra.


São livres mas indefesos, 
temem as redes dos pescadores
como os chimpanzés do Bóe
temem os caçadores furtivos
e os negros os navios negreiros
e as baleias os arpões dos baleeiros
e os tubarões os cortadores de barbatanas.


No fim, perco o rasto aos golfinhos
já ao largo das Berlengas,
no regresso a casa,
e eu próprio me perco no mar da meia via,
a meio da minha história de vida.

Afundo-me com a minha nau de quimeras,
entre os restos de vírus e bactérias, em saldo,
da última pandemia.

Seria reconfortante saber
se os heróis vão para o olimpo,
e os sociopatas para o inferno.
Mas que sei eu do além ?! 
E sobretudo da justiça escatológica ?!

Regressam os pescadores a Peniche, à luta, à lota.
Há um golfinho que dá à costa, exausto, já cadáver.

Na mesa da esplanada ficam as cabeças e as espinhas
das sardinhas.
E as moscas.

Ficarão as moscas quando eu morrer.


Luís Graça

Lourinhã, Praia da Areia Branca, 19 de julho de 2020,

o ano da pandemia de COVID-19
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Nota do editor:

Último poste da série > 6 de julho de 2020 > Guiné 617/74 - P21143: Manuscrito(s) (Luís Graça) (187): Tabanca de Candoz, entre o pôr do sol e o nascer da lua cheia...

quarta-feira, 8 de abril de 2020

Guiné 61/74 - P20833: No céu não há disto... Comes & bebes: sugestões dos 'vagomestres' da Tabanca Grande (6): Da Tabanca da Lapónia com amor (e humor): (i) bolo de papel higiénico: (ii) sopa de grão; e (iii) poncha aquecida... Só faltam as... "côbinhas" quentes lá das nossas berças! (José Belo)


Sopa de grão com "poncha" sueca aquecida... antiviral


O popular ponche sueco, "Carlshamns Flaggpunsch"... antiviral. Parece que agora, desde 2019, é produzida na... Finlândia!


O humor sueco traduzido em pastelaria... 


Bolo de papel higiénico... Uma das contribuições (originais...) da Suécia para a luta contra...a COVID-19

Cortesia de Joseph Belo (2020)... Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné

1. Duas mensagens recentes. 28 de março e de 3 de abril, do José Belo, régulo da Tabanca da Lapónia, enviando-nos coisinhas suecas para aquecer  o estômago em tempo de solidão e, se calhar,  de fomeca, para alguns;

[José Belo ex-alf mil inf da CCAÇ 2381, Ingoré, Buba, Aldeia Formosa, Mampatá e Empada, 1968/70, e manteve-se no ativo, no exército português, durante uma década; está reformado como capitão inf do exército português: jurista, vive entre Estocolmo, Suécia, na região de Abisco, Kiruna, Lapónia, no círculo polar ártico, e Key-West, Florida, EU; em boa verdade, as renas nunca sabem, ao certo, onde está o régulo da Tabanca da Lapónia]


1. Não sei se por aí terá sido assim, mas na Escandinávia as populações,  preocupadas com o vírus e possíveis faltas de géneros de primeira necessidade, procuraram comprar dezenas de rolos de papel higiénico por pessoa.

Foram alguns dias estranhos em que nada faltava nos supermercados exceptuando o... papel higiénico.

Passados curtos dias tudo voltou à normalidade.

Este curioso pânico foi aproveitado pelos pasteleiros suecos da cidade de Eskilstuna para criarem um bolo apropriadamente em forma de rolo de papel higiénico.

Além do oportunismo da ideia,  o bolo é bom no seu recheio de chocolate e natas e.....tem-se vendido (como o papel higiénico) até se esgotar diariamente.

PS - Junto também duas fotos de uma "suôpa de grão" com punch aquecido... só faltam as nossas..."côbinhas" quentes!


2. Por aqui o vírus está concentrado nas cidades, mas também existe um pouco por toda a parte.

No início de março, há por aqui uma semana de férias escolares para permitir às famílias se deslocarem para as montanhas para praticar esqui. Estes deslocamentos familiares acabaram por espalhar ainda mais o vírus.

Mas na Lapónia apesar de ainda nevar bastante e as temperaturas continuarem nos negativos, o vírus também existe nas cidades costeiras do Báltico e no centro turístico de Abisko.

Felizmente que a minha casa está do outro lado do imenso lago que vai desde Kíruna até à Noruega.
Estou mais perto de Karesuando do que Abisko.

Um abraço.
J. Belo

segunda-feira, 29 de julho de 2019

Guiné 61/74 - P20017: Manuscrito(s) (Luís Graça) (158): Afinal a guerra também era ototóxica...

Infeliz o cego, surdo e mudo,
porque dele não será o reino de Neptuno


Estou surdo e não poderei ouvir-te em agosto.
Nem ouvir o que mais gosto em agosto,

o mês da festa de todos os sentidos,
ouvir o mar, a décima sinfonia do mar,
tocada pelo vento,

pelos golfinhos e pelos surfistas.
Ou só poderei captar meio som, 

com o meio ouvido que me resta. 

Estou surdo e por mais absurdo
que isso te pareça,
só poderei entender as palavras sibilinas, 

e as semifusas, que me escreveste,
em papel pautado, no teu último mail.

Aqui estou eu, especado, na areia, emparedado entre o
 Beethoven a fazer o pino 
e o desejo e a ameaça de Sibila,
enquanto espero o otorrino, 

à porta do consultório, na casa de praia,
e o sol que tarda 
nesta tarde do mês de Agosto.

Infelizes os surdos e os curdos
(que não têm mar nem pátria nem otorrino,

e muito menos casa de praia) 
e os duros de ouvido, como eu,
porque deles não será o Reino de Neptuno!

Sinto-me infeliz, no pico do verão,
meio surdo, meio huno, meio curdo,
à espera do pôr do sol
e do seu espetáculo de strip-tease,

e o otorrino que tarda em almoçar.

Aqui especado, parado, enterrado na areia,
à espera de qualquer coisa,
da iminência de acontecer qualquer coisa,
à espera da queda dos últimos restos
do sacro império romano do ocidente,
à espera que me caia, na cabeça,
uma prancha de surf,
um tubarão assassino,
um ultraleve publicitário,
à espera que haja uma notícia, 

que não seja falsa,
que dê um belo título de caixa alta
para ler amanhã com o café do pequeno almoço,
qualquer coisa que não me agrave ainda mais 
a minha surdez, o meu autismo...

Por favor, nada de ataques de pânico,
falsos alarmes de tsunami,
e muito menos ainda 

o crash na Bolsa de Nova Iorque,
o suicídio coletivo dos povos da Amazónia,
ou um magnicídio. 

Ao menos que eu fique à espera 
que dê à costa na maré cheia 
um pedaço da arrábida fóssil da Lourinhã,
em vez da cabeça do rei 
ou do Santiago de Compostela,
de preferência um duro osso de roer 

de um pachorrento jurássico dinossauro,
ou até quiçá uma boa chuva de meteoritos
made in China, transgénicos…

Emfim, aqui estou eu à espera dos bárbaros, 
à espera dos hunos,
à espera do meu otorrino,
à espera de ti, meu amor.
à espera do sol que teima em tardar,
à espera do FMI ou do FIM do planeta,
sem pachorra para os curdos,
sem piedade para com os surdos, 
muitos menos os cegos e os mudos,
agora sem o fio de Ariane.

À espera, enfim, da recuperação 
dos meus cinco sentidos,
à espera do fim da minha crise existencial,
à espera do som e da fúria 

da próxima praia-mar,
em noite de lua cheia
prenha de augúrios, fantasmas e medos.

Só não conquistaram o sol, nem a lua, 

os sacanas dos romanos,
que nos escravizaram e deram o ser,
nem os oceanos,
o Atlântico, a autoestrada da globalização, 

o sol que tarda em Agosto,
ou que alguém pôs no prego
para pagar dívidas ao fisco,
nem havia nesse tempo direito a férias pagas,
subsídio de invalidez 

por surdez, profissional,
nem muito menos o prémio 

por nascimento, batizado, casório e funeral.

Estou surdo, cego e mudo,
ou, se não estou surdo, cego e mudo, 

foi por um triz,
que o míssil passou rente ao arame farpado,
estou surdo e a fazer o luto 

pela morte do Estado-Providência
que me pagava o otorrino 

e as gotas para o nariz.

Aqui é o meu futuro, diz o novo huno,
o imigra que agora vende bolas de Berlim
em praias rigorosamente concessionadas
e outrora vigiadas pela ASAE. 

Viva o fascismo sanitário, 
proclama o outdoor
da nova polícia das retretes e dos croquetes.

Estou surdo, sem dó nem piedade,
falta-me ficar cego e depois mudo,
para ser cego, surdo e mudo,
como a figura da deusa Justiça,

esculpida à porta do tribunal. 

Luís Graça,

[Lourinhã, Praia da Areia Branca, 13/8/2007. Revisto].


2. Comentário do autor:

Tenho 'ouvidos novos' que encontrei no lixo e reciclei. Tenho má consciência por toda uma vida em que fui predador do planeta. Agora, tarde e a mais horas, ando numa de reciclagem. Reciclo tudo o que posso, até pus ouvidos novos. Não sei que raio de planeta vou deixar para os meus netos e bisnetos, se os tiver.

Fui fazer um audiograma, mas primeiro fui ao otorrino limpar a merda dos ouvidos. Um deles tinha favos e favos de mel e cera. Mais cera do que mel. Ou era só cera ?...

Há já uns anos que ouvia mal, já não ouvia os alunos da terceira fila na sala de aulas. Muito menos o safado do locutor de serviço ao telejornal. Deixei de ouvir e ver televisão. Nem podia ir ao teatro, que os atores só falavam para eles e entre eles. E a primeira fila era só para os convidados e amigos bons de ouvido. E mesmo para ouvir a 9.ª sinfonia tinha que levar um funil.

O sacana do otorrino, há uns anos atrás, no hospital que devia ser um farol para os doentes, encolheu os ombros, e disse-me: "Mas o que é o senhor professor quer que eu lhe diga ?!... A idade não perdoa, a perda auditiva é irreversível"...

Merda para a idade, senhor doutor, e então os milagres da novas ciências médicas para cujo peditório também dei durante anos e anos ? Eu quero uns ouvidos novos, quero uma recauchutagem do esqueleto, como deve ser, da cabeça aos pés...

Nunca fui egoísta, agora estou a sê-lo... Andei cinquenta anos a descontar para a ADSE, nunca tomei um medicamento, nunca gastei um chavo ao provedor da santa casa da misericórdia... Fui amigos dos ministros da saúde. Tinha saúde para dar e vender. Nunca meti uma cunha a Deus e ao Hospital de Todos os Santos, também nunca me calhou o euromilhões ou a sorte grande, mas a verdade é que também não jogo, e quem não arrisca não petisca, diz o saloio do Zé Povinho....

Não joguei, não ganhei, não arrombei os cofres da santa casa. Agora ando a fazer as contas à vida: tanto para os ouvidos, tanto para a anca, tanto para os joelhos... E que Deus nos livre do raio do Alzhemeir!

"Otites líquidas, teve em pequeno?", pergunta-me a audiologista...

"Minha querida, quem as não teve, em pequenino, ou no Portugal pequenino em que nasci, vivi e cresci. E o meu médico era a ti'Adlina, minha vizinha da rua do clube, guardadora de segredos terapêuticos milenares... Médicos ?... Só havia dois na minha aldeia, e a gente só os chamava no estertor da morte ou nalgum parto de má hora"...

E acrescentei, por descargo de consciência:

"Depois disso, estive na Guiné, na guerra, ouviu falar ?... A menina é jovem, já nasceu depois do 25... E mesmo que fosse antes, nunca iria para a tropa. Só se fosse enfermeira paraquedista, conheci algumas na Guiné... Tiros, explosões, emboscadas, minas anticarro, acidentes com viaturas, quedas mais ou menos aparatosas, picadas, solavancos, cabeçadas, cones de fogo nas trombas, trambolhões, bezanas, esquentamentos, febres palúdicas... sabe como são estúpidas as brincadeiras da guerra, quando se tem vinte anos, sangue na guelra e as hormonas a rebentar a pele"...

"Ah!, já sei, quinino, ototoxicidade!

"O quê... ?"

"Há certos medicamentos que são otóxicos... Já passaram por aqui dezenas e dezenas de antigos combatentes da Guiné que se queixam do mesmo mal... O quinino, do Laboratório Militar, que vocês tomavam regularmente, às refeições... Por causa da malária ou paludismo... Lembra-se ?"


"Eureka!... Se me lembro !... Um pacotinho de sal e outro de quinino, ao almoço!!"...


"Parece haver evidência científica de que o quinino pode provocar danos ao sistemas coclear e/ou vestibular"...

"Não percebo nada da anatomia e da fisiologia do ouvido... Mas com essa do quinino, é que a menina me estar a lixar!... Não sabia, mas devia saber, porra, afinal andei anos e anos a falar de saúde e segurança do trabalho"...

"Não sou farmacêutica, mas há para aí mais do que uma centena de medicamentos ototóxicos. Acrescente-lhe a penicilina"...

"Porra, tomávamos aos milhões"...

"Agora, não há remédio, e não precisa de dizer palavrões... Ou melhor: felizmente há remédio. Deixe isso comigo. Vamos lá fazer o audiograma e, depois, pôr estes brinquinhos no ouvido, devidamente regulados"...

"Com essa é que me tira o sono, que a guerra era tóxica, eu já o sabia, mas que também podia ser ototóxica, não me passava pela cabeça!"...

"É bom para o Estado-patrão (e, para nós, multinacionais que vendemos aparelhos auditivos, um negócio de milhões, aqui para nós que ninguém nos ouve)... Enfim, é bom que os antigos combatentes não saibam certas coisas que faziam mal à saúde... Afinal, só os juízes é que são, coitados, cegos, surdos e mudos... E têm que ser bem pagos por isso"...

"Minha querida audiologista, estou encantaddo por ouvi-lo... Sabe, estou até a simpatizar consigo!".

... Ganhei uns 'ouvidos novos'. Posso agora ouvir todas as conversas, mesmo baixinhas... Até as conversas dos espiões!... Mais importante: posso ouvir o mar no mês de agosto, e o vento a dar nos búzios dos moinhos da minha infância...


Algumas conversas bem as dispensava... Mas não há mundos perfeitos... Mais vale andar neste mudo de muletas do que no outro em carretas... Obrigado ao 'morto' que me deixou uns 'ouvidos novos', comprados no OXL. A preço da uva mijona. É indecente que me peçam 4 mil euros por um aparelho auditivo XPTO... Prefiro um, em segunda mão, reciclado. A mim, que que lutei na guerra pela minha Pátria e que, se calhar, fui vítima da ototoxicidade provocada pelas drogas antimaláricas do Laboratório Militar...

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o·to·tó·xi·co |cs|
(oto- + tóxico)

adjectivo

[Medicina] Que tem efeito tóxico sobre o ouvido ou sobre órgãos ou nervos responsáveis pela audição e pelo equilíbrio.

"ototóxico", in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2013, https://dicionario.priberam.org/otot%C3%B3xico [consultado em 27-07-2019].

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Nota do editor:

Último poste da série > 18 de julho de 2019 > Guiné 61/74 - P19987: Manuscrito(s) (Luís Graça (157): Andamos à volta com os fantasmas de sempre, que, desde meninos, nos ensombram, uns, ou nos encantam, outros... Para o Jaime, ao km 73 dos passos em volta...