sábado, 9 de dezembro de 2023

Guiné 61/74 - P24932: E depois da peluda... a luta continua: as minhas escolas (Joaquim Costa) - Parte III: Primeiro, Santo Tirso, a seguir, Portalegre e logo... Santarém (onde fiz a minha formação pedagógica)


Santarém > Escola Industrial e Comercial de Santarém >  c. 1978/79 > "A nossa obra maior: Um 'supercomputador'...  Com esta mesa didática (construída de raiz por estes 5 “estarolas” ) se simulavam todas as operações em instalações elétricas.




Santo Tirso > c. 1975/76 > Foto de grupo:  o Joaquim Costa (algures) mais os seus colegas professores (e destes, quantos não terão passado também pela Guiné?!)

Fotos (e legendas): © Joaquim Costa (2023). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



1.Continuação da nova série do Joaquim Costa:, "E depois da peluda... a luta continua: as minhas escolas"... (*)

(i) ex-fur mil at armas pesadas inf, CCAV 8351, "Tigres do Cumbijã" (Cumbijã, 1972/74);

(ii) membro da Tabanca Grande desde 30/1/2021, tem cerca de 7 dezenas de referências no blogue;

(iii) autor da série "Paz & Guerra: memórias de um Tigre do Cumbijã (Joaquim Costa, ex-mil arm pes inf, CCAV 8351, 1972/74)" (de que se publicaram 28 postes, desde 3/2/2021 a 28/7/2022) , e que depois publicou em livro ("Memórias de um Tigre Azul - O Furriel Pequenina", por Joaquim Costa; Lugar da Palavra Editora, 2021, 180 pp);

(iv) tirou o curso de engenheiro técnico, no ISEP - Instituto Superior de Engenharia do Porto;

(v) foi professor do ensino secundário, tendo-se reformado como diretor da escola secundária de Gondomar;

(vi) minhoto, de Vila Nova de Famalicão , vive em Rio Tinto, Gondomar;

(vii) tem página no Facebook.


E depois da peluda... a luta continua: as minhas escolas (Joaquim Costa)  - Parte III:  

Primeiro, Santo Tirso, a seguir, Portalegre,  e logo... Santarém (onde fiz a minha formação pedagógica)


Depois de Portalegre segue-se Santarém, para fazer a minha formação pedagógica na Escola Industrial e Comercial de Santarém (c. 1978/79, LG).

Era um CF constituído por professores de várias formações e grupos disciplinares.
Reconheço que foi um ano muito enriquecedor. Formadores de excelente qualidade, grande camaradagem e entreajuda com os mais de 30 estagiários oriundos de todo o país, com muitos jantares (muita sopa da pedra) em conjunto já que a maioria só regressava a casa ao fim de semana. 

Aqui se estudou até à exaustão a Teoria Cognitiva de Piaget e a taxonomia dos objetivos educacionais de Bloom (Taxonomia de Bloom).

Os seis elementos do meu grupo disciplinar, no qual se incluía o orientador, eram todos do Porto e viviam na mesma casa. Mais parecia uma segunda recruta.
Foi um ano de muito trabalho, com muita colaboração, mas também alguma competição. A nota final do estágio podia ditar, no concurso para efetivo, ficar longe ou perto de casa. O trabalho começava às oito da manhã e muitas vezes só terminava de madrugada.

Poucas vezes jantávamos fora já que o ordenado era curto, como tal o jantar era feito em casa. Cada um tinha a sua especialidade: mm sabia cozinhar, outro tinha jeito para as compras, outro para as limpezas (as casas de banho era rotativo) e quem não tinha jeito para nada lavava a loiça.

O especialista da cozinha não deixava nada ao acaso, pois na quantidade de água no arroz, do tempo de cozedura ou quantidade de sal utilizava sempre uma fórmula matemática com o auxílio de uma régua de cálculo (os engenheiros gostavam mais das réguas de cálculo do que das primeiras "texas").

Este foi um ano em que o arroz faltou em quase em todo o país pelo que o especialista das compras, por sugestão do merceeiro, levou arroz integral. O cozinheiro aplicou a fórmula habitual para a quantidade de água, tempo de cozedura e quantidade de sal. Já o bife tinha "voado" e o arroz ainda não tinha chegava à mesa, pelo que, fomos à cozinha ver o que se estava a passar com o cozinheiro. Vimo-lo todo vermelho, com o suor a cair-lhe da testa dentro da panela e a régua de cálculo feita em pedaços no chão num canto da cozinha. Quanto mais água punha na panela mais ela desaparecia e o arroz sempre duro...

Um belo dia comemos na cantina algo que não nos caiu bem, pelo que decidimos fazer para o jantar uma canja de galinha. O cozinheiro colocou tudo na panela, aplicando as suas fórmulas com a ajuda da régua de cálculo (já colada com fita cola) e foi arejar um pouco já que se sentia um pouco indisposto. Os restantes elementos começaram a mexer a canja e (sem régua de cálculo) concluíram que a porção das pevides de massa era muito pouca pelo que a cada "mexidela" lá ia mais um mão cheia de pevides para a panela. 

Quando o cozinheiro chegou, gritou furioso: "quem esteve a mexer na panela? Vão ser todos obrigados a comer esta mistela!"

 E assim foi, todos comemos a canja de galinha às fatias e de faca e garfo.

Como fazíamos várias noitadas na escola, fomos avisados por colegas mais antigos que o guarda noturno, para além de uma grande pancada, fazia a ronda sempre de pistola (#), pelo que o devíamos informar sempre que ficássemos a trabalhar até de madrugada. Assim sempre fizemos. Contudo, numa altura em que se estava a esgotar o tempo para apresentar um trabalho de equipa, pedimos a chave ao chefe dos funcionários para trabalharmos na escola num dia feriado. Era nossa intenção trabalhar só da parte da manhã, mas a coisa complicou-se e arrastou-se pela noite dentro.

Embrenhados no trabalho nem nos lembramos do guarda noturno. Era uma da manhã quando ouvimos passos ao longe, ficamos brancos como um fantasma, pois o homem caminhava na nossa direção como nos filmes de terror. Ficamos sem saber o que fazer. Se gritássemos,  assustávamos o homem e ainda levávamos um balázio, se não nos dessemos a conhecer a coisa ainda poderia piorar. 

Entretanto ouve-se um tiro (##) e,  ato contínuo, todos começamos a gritar (eu fui o único que se deitou no chão - ainda reflexos dos tempos de Guiné): "Somos nós, Sr. João, não dispare pelo amor de Deus!". 

O homem lá nos reconheceu, também ficou aliviado, mas nós ficamos sem conseguir falar durante uns bons minutos.

Joaquim Costa
____________

Notas do autor:

(#) Todas as escolas, mais antigas, ainda têm no seu inventário uma pistola e um carregador cheio de balas, guardado a sete chaves no cofre (fala quem sabe!)

(##) O homem de facto usava a pistola carregada e pronta para disparar, mas o tiro foi de uma pistola de feira, de fulminantes, que também usava como primeira abordagem à situação.
____________


Vd. também poste de 20 de novembro de 2023 > Guiné 61/74 - P24865: E depois da peluda... a luta continua: as minhas escolas (Joaquim Costa) - Parte I: Santo Tirso, o dono da "tasca"

5 comentários:

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Joaquim, foi o caminho de muitos de nós até assentarmos raízes... Outros, muitos mais,tiveram que trilhar os caminhos ainda mais duros da emigração...

Foi a Pátria que nos calhou na rifa (e continuamos a gostar dela). Boas Festas. (Já compraste o bacalhau lascudo? !... 'Tá caro, pra carago!... Vou aí ao Norte comê-lo, no Sul não há pencas! )

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Já agora, Joaquim, assinala à gente onde estás na foto de grupo em Santo Tirso. E confirma o ano, se puderes. Ab., Luís.

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Deixa-me adivinhar: na foto de grupo, estás na fila de trás, a meio, de perfil, óculos de sol, barbudo, e com um livro debaixo do braço... Certo ?

Anónimo disse...

Meu cara Luís, nessa altura era tudo barbudo e cabeludo, pelo que estás desculpado com o "tiro" ao lado. Sou o terceiro da fila de trás (sentado no muro) da esquerda para a direita.
~Um abraço.

Anónimo disse...

Queria dizer da direita para a esquerda.