Foto nº 3
Fot0 nº 4
Guiné > s/l > s/d (c. meados de 1963) > O alf mil art José Álvaro Carvalho (que ainda não conseguimso identificar nas duas fotos) com o seu pelotão de infantaria, de uma companhia de intervenção, sediada em Bissau, para onde ele foi em rendição individual, e que já tinha um ano de comissão (ou seja, era de 1962).... Na foto de cima, um exemplar do "famoso granadeiro"...
Fotos: © José Álvaro Carvalho (2024). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]
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José Álvaro Carvalho, Angola, ponte do rio Cuanza (em contrução), c. 1971 |
1. O alf mil José Álvaro Carvalho, embora sendo de artilharia, cumpriu os primeiros meses (basicamente o ano de 1963), comandando um pelotão de infantaria de uma campanhia de intervenção, de caçadores, sediada em Bissau.
Recorde-se que ele entrou recentemente para a Tabanca Grande, sentando-se à sombra do nosso poilão no lugar nº 890 (*)
Ainda não descobrimos a companhia onde ele foi colocado, por volta do 1º trimestre de 1963, em rendição individual, nem ele se lembra apesar da sua notável memória aos 85 anos...
No princípio de 1963, havia 9 Companhias de Caçadores no CTIG: CCaç 74, 84, 90, 91, 152, 153, 154, 273 e 274. Temos representantes, no nosso blogue, das CCAÇ 84, CCAÇ 153, CCAÇ 274... O que é pouco.
A CCAÇ 273 (açoriana, tal como a CCAÇ 274, mobilizadas pelo BII 17, Angra do Heroísmo, e BII 18, Ponta Delgada, respetivamente) esteve no CTIG desde janeiro de 1962 e acabou a comissão em janeiro de 1964. (Nessa altura, a comissão na Guiné era de 24 meses). Sabe-se que teve um pelotão destacado no Olossato, por períodos variáveis, em 1963. Era comandada pelo cap inf Jerónimo Roseiro Botelho Gaspar.
Mas demos-lhe a palavra ao Zé Álvaro (*):
"Meu pai sempre me chamou por C. Sendo esse o nome que dei ao livro. (...)
"Estava no 2º ano do serviço militar em África [ou seja, em 1964] . O primeiro não tinha sido passado como artilheiro, mas como alferes duma companhia de intervenção, para onde tinha vindo em rendição individual.
"Na altura, essa companhia já tinha um ano de serviço em África e quando após mais um ano acabou a comissão e se retirou para a metrópole (...), [ o alferes Carvalho ou Carvalhinho, como ficará conhecido mais tarde no decurso da Op Tridente] ficou a aguardar funções no QG, oferecendo-se para o grupo de comandos, em formação nessa altura, por já conhecer as condições duras e difíceis do mato e parecendo-lhe preferível entrar em operações arriscadas mas ter a sede na capital e o consequente conforto".
(...) "Entretanto foi requisitado um alferes artilheiro para comando dum pelotão de soldados africanos com dois obuses de 88mm e, quando menos esperava, foi parar ao Sul com ele, operando como independente, junto dum batalhão de cavalaria [BCAV 490] .
"Os soldados, indisciplinados, deram-lhe algumas dores de cabeça logo na 1ª operação e as coisas só começaram a funcionar normalmente com a ameaça de prisão ou mesmo fuzilamento dos mais rebeldes.
"Bebiam quase todos demais e na 1ª operação só levou cerca de metade porque os outros bêbados não se tinham de pé" (...)
Em maio de 1965, foi louvado e agraciado com a cruz de guerra de 3ª classe, pelo desempenho como oficial de artilharia, em campanha, em diversas operações, incluindo a Op Tridente (a mais longa operação realizada no CTIG, entre janeiro e março de 1974);
(...) "Louvo o Alferes Miliciano de Artilharia, José Álvaro Almeida de Carvalho, da BAC, porque, durante o período de catorze meses em que esteve destacado no Batalhão de Caçadores nº 619, foi sempre um Oficial zeloso, dedicado e muito competente, salientado-se a sua acção, principalmente, no campo operacional, em que foi utilíssimo o apoio, sempre eficaz, que soube dar com o seu pelotão em todas as operações em que interveio, nomeadamente, nas "Tridente", "Broca", "Macaco", "Tornado" e "Remate", contribuindo assim, dentro do seu âmbito, para o prestígio da Arma a que pertence. (...).
Mas antes de irmos com ele para a região de Tombali, vamos acompanhar as andanças do Zé Álvaro, como "infante", por Bissau, Mansoa e Olossato...
No texto a que tivemos acesso ("Livro de C", versão manuscrita, revista, melhorada e aumentada) (*), o autor apenas refere os topónimos pelas iniciais: (C de rio Cacheu, B de Bigene, O de Olossato, etc.). Não sabemos em data precisa em que esteve no Olossato, mas deve ter sido já em meados de 1963.
Memórias de um artilheiro (José Álvaro Carvalho, cmdt, Pel Art / BAC, 8.8 cm, Bissau, Olossato e Catió, 1963/65)
Parte I: De Bissau ao Olossato
A pequena festa na Messe de Oficiais da Marinha decorria alegremente. Eram quatro e só ele do exército. Outras tantas raparigas tinham sido convidadas para jantar e dançar, e, coisa rara, tinham aceite, apesar da opinião das respetivas famílias, que por principio não confiavam em militares, o que é natural.
Os efetivos da marinha eram ainda muito poucos, pelo que o ambiente nesta Messe era simpático e agradável.
A certa altura alguém o informou de que o Oficial de Dia ao Quartel General o mandara procurar. Tinha havido nessa noite a primeira emboscada no Norte. Até esse dia a guerrilha só atuara no Sul.
Resolveu aguardar pelo final da festa para se apresentar. Pareceu-lhe desculpável não ter pressa de enfrentar uma realidade preocupante. Por outro lado, era miliciano, indisciplinado, e pouco vocacionado para militar.
Talvez o Oficial de Dia o viesse a contatar antes do fim da festa. Se assim fosse, paciência. Continuou a divertir-se mas agora sempre a pensar no que o esperava. Era o alferes mais novo da Companhia de Intervenção e o seu pelotão seria o primeiro a avançar em qualquer caso de emergência.
Penso que esta regra tinha como justificação enviar primeiro os menos aptos, os mais novos, os mais inexperientes, a carne para canhão e só depois os mais aptos, os mais sabedores, caso os primeiros falhassem. Mas em situações de guerra como esta os mais aptos, os mais experientes e sabedores, deviam avançar primeiro, não os mais novos. Era uma guerra ainda mal conhecida que caminhava à margem dos conhecimentos militares tradicionais.
Havia uma semana que a guerrilha iniciara operações no Norte (**). No Sul já há muitos meses que se estabelecera, sendo para lá que todo o esforço militar se dirigira até essa altura.
Aí já se tinha algum conhecimento da sua forma de actuar.
No dia em que tinha ocorrido a primeira emboscada no Norte, a cerca de 120 kms da capital (dia da festa na messe da marinha) tinha avançado para o local um outro pelotão da companhia, em lugar do seu, e cujo comandante, por essa razão, durante algum tempo deixou de lhe falar.
Passada uma semana recebeu ordens, para preparar uma coluna a fim de avançar com o seu pelotão como primeiro elemento da transferência de toda a companhia para o Norte do território. Deveria em seguida apresentar-se na Repartição de Operações do Q.G. para receber mais ordens, o que aconteceu alguns dias depois.
Tendo-lhe sido entregue um envelope lacrado com a indicação "Confdencial" ( a abrir após o incio da marcha na direcção Norte que deverá ter inicio 24 horas após a entrega deste documento).
Iniciou a marcha a partir do QG, nessa direcção, às seis horas. Levava um jipe, um todo o terreno Unimog e 3 camiões GMC a abarrotarem de equipamento de primeira necessidade e armamento médio, munições, combustível e géneros. O pessoal tinha sido distribuído pelas viaturas e arrumado com dificuldade.
Este pessoal que já tinha um ano de operações, era constituído por um pelotão desfalcado de quinze soldados, reforçado por um cozinheiro e ajudante e pelos condutores do Unimog e dos três camiõesde guerra da marca americana GMC.
A primeira coisa que fez já em andamento, foi abrir o envelope lacrado da Repartição de Operações do QG conforme instruções que recebera. Confirmou assim o conhecimento que já tinha, baseado na troca de impressões que tivera com o comandante da companhia.
No dia anterior tinha jantado com um oficial da marinha seu amigo, que comandava a lancha patrulha do rio C[acheu], o mais importante do Norte, e tinha-lhe dito que em breve avançaria com o seu pelotão para essa zona, possivelmente para uma povoação de valor estratégico a defender nas margens desse rio.
- Amanhã também devo regressar à lancha (a lancha era um pequeno navio de guerra bem armado e preparado para patrulhar os rios, em todos os principais havia uma) e, se souber que estás em B[igene, frente a Ganturé, na margem direita do Rio Cacheu], quando lá passar, convido-te para jantar. Tenho agora um cozinheiro de primeira.
Depois da partida, ainda na cidade, cruzou-se com o Wolkswagen negro que levava este seu amigo para o cais, e, mesmo com os carros em andamento, conseguiu confirmar-lhe a conversa que tinham tido.
Os camiões roncavam no único troço de estrada alcatroada da região (60 kms), no fim do qual se encontrava uma pequena cidade [Mansoa] , onde chegaram cerca das nove horas. Nesta cidade, junto ao aquartelamento da companhia aí estacionada, o capitão que a comandava esperava a coluna. Mandou-o parar e disse-lhe que a missão fora alterada e tinha de se dirigir para a povoação de O[lossato] .
O pelotão para aí destacado, não conseguia não só defender o povoado, como até impedir que o inimigo, encurralando-o de metralhadoras apontadas a cada porta do edifício do quartel, um antigo celeiro de amendoim rodeado de arame farpado a distância conveniente, se passeasse impunemente na aldeia, entrando nos dois estabelecimentos comerciais existentes, abastecendo-se do que bem entendia, em troca de requisições supostamente válidas, após ganha a guerra e exercendo junto da população civil branca ou africana as mais variadas formas de propaganda e intimidação.
Após confirmar por rádio para o QG as ordens que acabara de receber, desviou a marcha no sentido da povoação de O[lossato] , entrando na região onde a guerrilha tinha começado a atuar recentemente (***) e era constituída por um polígono com cerca de 120 kms de comprimento na sua maior dimensão e oitenta na outra , cuja principal estrada, que o atravessava em diagonal, estava obstruída por árvores derrubadas assim como todos os pontões e pequenas pontes já destruídas que atravessavam as linhas de água, que eram muitas em todo o território por ser este a foz dum rio importante, que se dividia por grandes e pequenos canais que se ligavam e entrelaçavam entre si.
O piso, na maré vazia era formado na sua maior parte principalmente por lama de alguma profundidade, coberta por uma mata cerrada própria que é costume chamar por mangal. Na maré cheia todo o território era inundado em cerca de 1/3 da sua dimensão.
Chegaram já de noite ao seu destino. O destacamento que ia substituir, já tinha partido, deixando uma secção para reforçar o seu pelotão desfalcado pela doença e combates.
A companhia já andava naquele território havia mais dum ano. Por esta razão quando viera para África substituir um alferes, a companhia já tinha um ano de comissão.
(Continua)
(Seleção, revisão / fixação de texto, parênteses retos: LG)
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Notas do editor
(*) Vd. poste de 26 de junho de 2024 > Guiné 61/74 - P25684: Tabanca Grande (890): José Álvaro Almeida de Carvalho, ex-alf mil art, Pel Art / BCAC, obus 8.8 m/943 (1963/65) , adido 14 meses ao BCAÇ 619 (Catió, 1964/66): senta-se no lugar nº 890, à sombra do nosso poilão
(**) Vd. CECA - Comissão para Estudo das Campanhas de África: Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África (1961-1974) : 6.º Volume - Aspectos da actividade operacional: Tomo II - Guiné - Livro I (1.ª edição, Lisboa, 2014). pp.91/92
(...) "Também ao norte do rio Cacheu as NT actuaram contra elementos inimigos que, provindo do Senegal, realizavam incursões no território da Guiné. Em 25mar63, após um forte ataque inimigo ao aquartelamento de Susana, o destacamento local, acompanhado da população de raça Felupe, perseguiu o inimigo até à fronteira causando-lhe numerosas baixas. Devido aos frequentes ataques, a população da região a norte da estrada de S. Domingos-Sedengal foi evacuada, passando essa área a ser considerada "zona interdita", procedendo-se ali à colocação de numerosas armadilhas e à montagem de frequentes emboscadas nas principais linhas de infiltração, verificando-se uma redução da actividade inimiga na área e o regresso da população à vida normal, a partir de Julho." (...) (pág, 91)
Enquanto decorriam as operações no Sul, verificaram-se algumas acções ln no Sector Oeste, entre a fronteira e o rio Geba. Assim, em 21abr63, o ln atacou a povoação de Canjandi (S. Domingos) não causando baixas à população e sofreu I morto, em face da reacção da população; no dia 26 atacou Brengalon (Sedengal) tendo explodido uma armadilha colocada pelas NT.
Mais tarde, em 5mai63, o aquartelamento de Bigene foi atacado de noite, tendo o ln causado 4 feridos ligeiros às NT; no dia 13, o ln atacou e incendiou uma viatura de passageiros que seguia de S. Domingos para a fronteira e na noite de 17/18 queimou a tabanca de Panta (Sedengal).
Neste Sector a actividade inimiga decaiu no mês de junho; no dia 07, incendiou, na região de S. Domingos, um camião dum cabo-verdiano, que foi encontrado morto e no dia 30 danificou a jangada de Barro, dirigindose depois a uma tabanca, próxima da estrada para Bissorã, queimando a
morança do chefe. (...) (pág. 92)
(***) Vd.CECA (2104):
(...) Diretiva n° 5 do Comandante-Chefe, de 27 de Agosto de 1963:
"Foi elaborada para a Operação 'Dardo' (...)
"Inimigo
a. A região de Olossato-Bissorã-Talicó-Mansabá, desde princípio de julho, é objecto de uma intensa actividade terrorista que tem como núcleos principais as matas do Dando, Fajonquito, Cã Quebo, Cai, Morés, Talicó e pretende:
- mediante ataques à população civil, coagi-las a tomar o seu partido ou pelo menos facultar apoio;
- posteriormente, conseguir o controlo da região e cortar as nossas comunicações para o norte e leste.
b. O ln dispõe de bom equipamento, no qualb. O ln dispõe de bom equipamento, no qual se incluem metralhadoras e é constituído por seis grupos com a seguinte localização:
- Fajonquito;
- Cã Quebo;
- Mansodé:
- Morés:
- Região de 2 pontes (Mamboncó);
- Dando." (...) (pág. 117)