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segunda-feira, 20 de novembro de 2023

Guiné 61/74 - P24869: (In)citações (260): Ainda os Esquecidos. Para o António Silva, Soldado Paraquedista morto em Angola em 1963 (Juvenal Amado)

Lobão da Beira, Tondela, 2017 > Funeral do Soldado Paraquedista António Silva

1. Em mensagem de 19 de Outubro de 2023, o nosso camarada Juvenal Amado (ex-1.º Cabo Condutor Auto Rodas da CCS/BCAÇ 3872, Galomaro, 1971/74), fala-nos dos (combatentes) Esquecidos, nós todos afinal, mortos ou vivos.


Ainda os Esquecidos

Para o António Silva, Soldado Paraquedista morto em Angola em 1963

Patriotismo é querermos o melhor para o nosso país.
Nacionalismo é querermos o país só para nós.

Os dois foram homenageados na Assembleia da República por diferentes razões a meu ver. Mereceram a homenagem?

Um era esquivo, não tinha travões na língua, discreto quanto à sua vida pessoal, rico dono de uma cadeia de supermercados, que se enchem quase todos os dias de gente que o enriqueceu e promete continuar a enriquecer os seus familiares nos anos mais próximos. Dizem que à custa de salários baixos e de o defender com a boca toda, era responsável pelo fecho de milhares de pequenas empresas, lojas, talhos, mercearias, retrosarias e até ao definhar de mercados tradicionais, onde os produtores vendiam os seus produtos directamente ao consumidor.

Digno de todas a honras, para além de entender que devia pagar o menos possível aos seus trabalhadores, também não estava de acordo com a tributação devida no seu país e passou a sede das suas empresas para a Holanda, onde paga menos. Era comendador pelos serviços prestados ao nosso país, aliás como muitos que o merecem, e outros tantos ou mais que o não merecem, como se veio a comprovar-se nos anos seguintes.

Quanto ao outro que vi actuar desde cedo como músico, era como dizem, um gajo porreiro, amigo do seu amigo, que integrado numa banda primeiramente punk e depois rock, que quer se goste ou não, marcou trinta e tal anos das nossas vidas, pois a sua música não nos atingiu a nós, atingiu os nossos filhos e também netos. Na verdade ele não explorou ninguém, não enriqueceu (quem é que enriquece pela música em Portugal?) mas levava milhares de apreciadores atrás dele para onde fosse, como eu fui testemunha disso. Quando ele estava no palco sabíamos que conhecia muita gente que ali estava e nós, tínhamos a sensação de pertencermos ao seu núcleo de amigos sem nunca termos estado a menos de trinta metros dele. Tenho pena que ele tenha morrido, do outro tenho uma dualidade entre o lamento e a embirração.

No dia que eram homenageados na AR, chegava a Portugal finalmente o soldado paraquedista António Silva morto em combate Angola 1963. Morreu por uma Pátria que já não existe.

Essa Pária alterou no seu conceito, já não tem guerra, modernizou-se, encheu-se autoestradas, dos tais supermercados, de temas musicais que não lhe diriam possivelmente nada, tem uma juventude que não sabe o que é ter guerra estar longe de casa sem telefone por vezes sem água e com uma alimentação que faria torcer o nariz a qualquer jovem frequentador de centros comerciais de hoje.

O soldado António Silva por lá esteve morto e enterrado 11 anos antes da viragem do seu país e, se voltou no dia 6 de Dezembro de 2017 a pisar solo pela Pátria, pela qual deu a vida, não foi o Estado que lhe prestou esse derradeiro e devido serviço.

No dia em que homenagearam dois, talvez, discutíveis portugueses na AR, esqueceram aquele que morreu pela Pátria, lamentavelmente não lhes mereceu uma só palavra, que era indiscutível.

Os esquecidos, continuam isso mesmo, esquecidos.

Feliz Natal e um Grande Ano para todos os camaradas.

Escrevi em 2017 mas como continua actual cá vai.
Juvenal Amado

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Foto: Nuno André Ferreira - Com a devida vénia ao Correio da Manhã
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Nota do editor

Último poste da série de 18 DE NOVEMBRO DE 2023 > Guiné 61/74 - P24860: (In)citações (259): Depois da "mina A/P" que me atirou, em 29/10/2023, para um leito de hospital, com o fémur partido, estou de regresso à vida, à luta, a escrita, enquanto a a recuperação prossegue (José Saúde, Beja)

quinta-feira, 6 de outubro de 2022

Guiné 61/74 - P23678: In Memoriam (454): Jorge da Cunha Fernandes (23/4/1942 - 02/10/2022), ex-Alf Mil Paraquedista da CCP 121/BCP 12 (Guiné, 1966/68) (Mário Beja Santos)

I N  M E M O R I A M

Jorge da Cunha Fernandes (23/04/1942 - 02/10/2022)
Ex-Alf Mil Paraquedista da CCP 121/BCP 12, Guiné, Dezembro de 1966 – Maio de 1968 

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1.
Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 6 de Outubro de 2022:

Queridos amigos,
É mais uma perda de um peso pesado do meu coração. Enquanto folheava esta história de paraquedistas e da atividade operacional que experienciou o Jorge da Cunha Fernandes pensava nos disparates sistemáticos que impunemente se escrevem sobre as atividades desenvolvidas durante o período da governação de Schulz, ainda recentemente Bernardo Futscher Pereira no seu importante ensaio sobre a política diplomática do Estado Novo, Orgulhosamente Sós, voltou a referir que este Comandante-Chefe se limitou a atividades defensivas, recorrendo a bombardeamentos aéreos, olha-se só para o que fizeram os paraquedistas e questiona-se que investigação se fez ou anda a fazer.
E abraço o meu querido Jota que partiu para as nuvens, e que tanto bem me fez e aos meus.

Um abraço do
Mário



In memoriam:
Jorge da Cunha Fernandes (23/04/1942 - 02/10/2022), Alferes Miliciano Paraquedista, CCP 121/BCP 12, Guiné, Dezembro de 1966 - Maio de 1968


Mário Beja Santos

Foi através de um dos irmãos que me chegou a nefasta notícia de mais uma perda: o Jota, que estava numa unidade de cuidados paliativos, morrera serenamente ao amanhecer daquele dia. De imediato contactei os irmãos, pedindo-lhes encarecidamente que se acaso aparecesse o seu processo militar me autorizassem a consulta para honrar este bravo paraquedista. Como convivi desde criança com os sete filhos dos meus padrinhos de batismo, recebi do Jota, ao longo da vida, provas de imenso carinho e solicitude. Tive mesmo o privilégio de usar as suas roupas até a adolescência, não mais se puderam aproveitar os sapatos, ele quedou-se nos 42 e eu disparei para o 45, acresce que subi mais uns centímetros, os suficientes para que nenhuma costureira pudesse fazer o milagre da multiplicação da roupa. Com elevado sentido prático, tinha dedo para canalizador, eletricista, reparador de miudezas domésticas, uma forte atração por carros, que montava e desmanchava sistematicamente. Foi-se tornando um tanto bizarro, deixou crescer as barbas como se fosse um missionário (era impressionante a parecença dele com um tio da minha madrinha, Monsenhor Alves da Cunha, ainda hoje figura grada na memória dos angolanos), tornou-se acumulador compulsivo, como eu comprovei. Andava a preparar o segundo volume do meu Diário da Guiné, apareceu-me uma folha, no meio da papelada de antanho, em que lera um livro de William Faulkner e um livro de poesia de Jorge de Sena, oferta do meu padrinho, com envio para a Guiné, livros devorados pelo fogo numa flagelação, telefonei ao Jota, prontamente me respondeu que os tinha e que me os oferecia, marcou o dia e hora no seu apartamento em Benfica, por ali andei espavorido por carreirinhos, havia tralha até ao cimo das paredes, e pela primeira vez vi na vida um chassi na mesa de cozinha… era assim o meu saudoso Jota.

Não descansei enquanto não encontrei algo para aqui o homenagear. Fui até à Biblioteca da Liga dos Combatentes e o Dr. João Horta obsequiou-me com pesquisas, encontrou a "História das Tropas Paraquedistas Portuguesas", Volume da Guiné, agora é mais fácil mostrar-vos o Jota, como ele é merecedor de lembrança (consta que só morremos definitivamente quando ninguém fala de nós).

Temos aqui uma fotografia dele a bordo do "Manuel Alfredo", estamos em dezembro de 1966, o BCP 12 vai entrar em funções, tem duas companhias operacionais, a CCP 121 e a CCP 122. O Jota faz parte da 121, comandada por Nuno Mira Vaz. Chegam e ficam grandemente dependentes da Base Aérea n.º 12. Escreve-se neste documento que as instalações eram precárias, a cozinha improvisada sob a capa de um vetusto de poilão, com algumas tábuas e ramos de palmeira, construiu-se um refeitório conjunto para oficiais, sargentos e praças. Este documento dá-nos uma síntese da atividade operacional das CCP121 e 122. O BCP 12 fazia parte das forças de reserva à ordem do Comandante-Chefe. Logo no treino operacional houve captura de armamento. A primeira operação digna de registo é a "Barracuda", decorreu em 3 de fevereiro de 1967, houve captura de civis e armamento; seguiu-se a "Piranha I", na área de Bigine, andaram pelo leito do rio Fulacunda, caíram no lodo, ficaram encurralados, foram recuperados por LDP’s que estavam ancoradas em Bolama. Até meados de 1968, estas unidades de paraquedistas foram utilizadas em ações de helitransporte de assalto, emboscadas e batidas de curta duração. Realizaram também ações conjuntas com militares de outros ramos das Forças Armadas, são disto exemplo as operações "Parafuso" e "Bom Sucesso". Intensificaram o seu ritmo operacional ao longo de 1967, a obra releva duas operações classificando-as como notáveis, a "Phoenix I" e a "Trovão", a primeira na região de Paiunco e a segunda na região de Bedanda, aqui o carregamento de material capturado em vários helicópteros demorou mais de quatro horas. Terá sido em fevereiro de 1968 que os militares do BCP 12 irão travar o mais violento dos combates, em Cafal e Cafine.

O comandante do BCP 12, Tenente-Coronel Costa Campos, acompanha sempre estas operações e, no caso da operação de fevereiro de 1968, destroçou-se o bigrupo que atuava naquela região do Cantanhez. A última operação de combate foi a "Barracuda III", que se realizou em 13 de maio de 1968, numa base na região de Quínara. Pelos seus atos de destemor, solicitude e abnegação foi condecorado com a Cruz de Guerra de 3.ª Classe.

Preferia não acrescentar nada mais sobre o afeto que sempre guardei a alguém com quem convivi por tanto tempo e de quem beneficiei da sua estima. Não resisto a contar que estando em férias na Foz do Arelho (onde o Jota passou a viver em permanência depois de fechar a baiuca em Lisboa) com a família, telefonou-me eufórico, encontrar uma caixa com latas de sardinha do Algarve Exportador, íamos preparar uma comezaina, perguntei-lhe como é que era possível as sardinhas ainda estarem boas várias décadas depois de embaladas, eu que não me preocupasse, haveria pitéu. Como houve, guardámos fotografia desse dia, lá estamos todos sorridentes, o Jota olhando-nos fixamente com as suas barbas de missionário.

Fica-me a recordação de alguém que serviu denodadamente a Pátria, desapareceu mais um herói, fica no altar supremo das minhas saudades. Jota, que tudo te corra bem por esse mar de nuvens onde seguramente contemplas Deus.
O Jota é o primeiro à direita de cócoras, terá medo de apanhar lêndeas e piolhos na Guiné, grande é a carecada, não sorri para nós, sorri para os camaradas
O Jota é o primeiro à esquerda, de cócoras, seguramente deixou de ter receio das lêndeas e piolhos, deixou crescer o cabelo, a gente pergunta-se se todos estes homens viveram passados 365 dias de vida operacional na Guiné

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Nota do editor

Último poste da série de 1 DE OUTUBRO DE 2022 > Guiné 61/74 - P23660: In Memoriam (453): Júlio Martins Pereira (1944-2022), ex-sold trms, CCAÇ 1439 (Enxalé, Missirá e Porto Gole, 1965/67)... Natural de Paredes, vivia em Valongo... Nosso grã-tabanqueiro nº 653... Nascemos no mesmo dia, 12/6/1944 e conhecemos as mesmas estações do inferno (João Crisóstomo, Nova Iorque)

quarta-feira, 16 de junho de 2021

Guiné 61/74 - P22288: Consultório militar do José Martins (67): “Companhias de Caçadores Especiais” - Unidades de Infantaria criadas em 1959, que iriam ter como missão principal, a defesa das Províncias Ultramarinas - Parte I


O nosso camarada José Martins (ex-Fur Mil TRMS, CCAÇ 5, Gatos Pretos, Canjadude, 1968/70), em mensagem de 14 de Junho de 2021, enviou-nos mais um dos seus trabalhos de pesquisa histórica, desta vez dedicado às antigas Companhias de Caçadores Especiais, as primeiras Unidades militares a serem enviadas para a Guerra do Ultramar no início dos anos sessenta.


(Continua)
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Nota do editor

Último poste da série de 15 DE JUNHO DE 2021 > Guiné 61/74 - P22284: Consultório militar do José Martins (66): Implementação do Estatuto do Antigo Combatente - Actualizações

segunda-feira, 7 de outubro de 2019

Guiné 61/74 - P20213: Notas de leitura (1224): História das Tropas Pára-Quedistas Volume IV, é dedicado à Guiné e tem como título História do Batalhão de Caçadores Paraquedistas n.º 12; responsável pela redação e pesquisa Tenente-Coronel Luís António Martinho Grão; edição do Corpo de Tropas Paraquedistas, 1987 (2) (Mário Beja Santos)



1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 30 de Janeiro de 2017:

Queridos amigos,
Esta saga sobre os paraquedistas na Guiné aparece redigida sob um documento muito contido, factual, sem enxúndia nem pompa. Mas há os picos de orgulho, e justificados. Caso daqueles dias de Agosto de 1968, em Gandembel, esta tropa especial lança-se num ataque aos guerrilheiros do PAIGC, este procura ripostar, quatro homens tombam, mas a força resiste, repele os guerrilheiros.
E escreve-se: "Cai a noite quando, quase no limite das suas forças, chegam a Gandembel. Transportam os seus feridos e mortos e algumas centenas de quilos de material de guerra capturado. Formados na parada do quartel, sombras cambaleantes curvadas pelo dor e exaustão, escutam o seu comandante de pelotão que pede voluntários para bater na madrugada próxima toda a zona onde se tinham desenrolado os combates. Perfilando-se orgulhosamente, olhos cintilando nas faces cavadas, cansaço vencido, todos avançam como se fossem um só homem".
Esta a história de 11 anos de uma força especial cujo desempenho foi crucial para a luta que se travou nas matas e bolanhas da Guiné.

Um abraço do
Mário


História das tropas paraquedistas na Guiné (2)

Beja Santos

“História das Tropas Paraquedistas Portuguesas”, Volume IV, é dedicado à Guiné e tem como título História do Batalhão de Caçadores Paraquedistas n.º 12, é responsável pela redação e pesquisa o Tenente-Coronel Luís António Martinho Grão, edição do Corpo de Tropas Pára-Quedistas, 1987.

A segunda parte da obra, que vamos analisar, coincide com o período entre 1968 e o termo das hostilidades, 1974. Spínola irá introduzir alterações na política do emprego operacional das tropas do BCP 12. Como se escreve no documento, “às missões de combate helitransportadas, de curta duração e sob comando directo do seu comandante, irão suceder-se as operações em que os militares pára-quedistas se vão manter durante períodos muito dilatados em áreas distintas do seu aquartelamento em Bissau, em missões de reforço de tropas de quadrícula”. Em Agosto de 1968 assume o comando da Zona Aérea de Cabo Verde e Guiné/BA 12 o Coronel Tirocinado Piloto-Aviador Diogo Neto.

Enuncia-se a atividade operacional entre Junho de 1968 a Dezembro de 1971, destaca-se a criação dos Comandos Operacionais, onde se vão integrar uma ou mais companhias do BCP 12. Tem destaque a operação Júpiter, que se estendeu por quatro períodos, desde Agosto até Dezembro de 1968. Atua-se nas regiões de Guileje, Mejo, Gandembel e Porto Balana, sob o comando do COP 2, cuja missão era a de reorganizar o dispositivo das forças aquarteladas. No final do primeiro período da operação Júpiter estas tropas paraquedistas tinham causado ao PAIGC 33 mortos, um prisioneiro e um número incontrolável de feridos, com a apreensão de grandes quantidades de armamento, os paraquedistas sofreram dois mortos, um ferido grave e dois ligeiros, e as tropas em quadrícula sofreram dois feridos graves. São descritas as sucessivas fases desta operação e a resposta do PAIGC, logo com um poderoso ataque contra Gandembel. No dia 11 de Setembro, das 20 horas desse dia até às 5 horas do dia seguinte, rebentaram na área do aquartelamento de Gandembel mais de 500 granadas de morteiro 120, 82 e de canhão S/R. Desde as 3h30 da manhã, tentaram o assalto ao aquartelamento, após rebentar as redes de arame-farpado com torpedos bengalórios; repelido, voltou por mais duas vezes à carga, houve mesmo grupos suicidas que tentaram ultrapassar as últimas defesas das nossas tropas, só ao amanhecer é que os atacantes retiraram, e os paraquedistas lançaram-se na sua perseguição. Segue-se um ataque a Guileje e de novo a Gandembel. Os atos de coragem praticados pelas tropas paraquedistas e pelos militares da CCAÇ 2317 mereceram destacadas citações individuais. A campanha de Gandembel, extenuante, chegará ao fim em Dezembro, o COP 2 será extinto, encerrando-se a operação Júpiter. Em 1969 é criado o CAOP 1, com sede em Teixeira Pinto, aposta-se no Chão Manjaco, cujas populações concediam escasso apoio ao PAIGC. Sucedem-se as operações Aquiles 1, Titão, Orfeu, Talião, Adónis, na operação Jove é capturado o capitão cubano Pedro Rodriguez Peralta. A par da intervenção em Teixeira Pinto, o corredor de Guileje merecia destaque na atividade operacional do BCP 12, a operação Crocodilo Negro foi um enorme sucesso, em 17/18 de Janeiro de 1970, na região de Porto Balana.

Sucedem-se as operações enquanto as companhias paraquedistas intervêm no CAOP 1, no COP 6 e 7, irão ganhar fôlego operações helitransportadas.

O documento, com o título “A Escalada”, reporta a atividade operacional entre Janeiro de 1972 a Dezembro de 1973. O novo comandante da unidade, a partir de Dezembro de 1969 foi o Tenente-Coronel Paraquedista Sílvio Araújo e Sá que manifestou reticências ao modo como estavam a ser utilizadas as tropas paraquedistas. “Em sua opinião, o comandante do BCP 12 deveria dispor sob seu comando directo e em permanência, de duas Companhias de Pára-quedistas. Só assim seria possível lançar operações frequentes e rápidas nas áreas mais sensíveis do teatro de operações, devolvendo às tropas pára-quedistas as suas verdadeiras características operacionais de forças de intervenção”. Mas Spínola não o ouviu. Merecem realce a operação Mocho Verde, realizada na região do Sara, os paraquedistas entraram na chamada “Barraca de Mantém” após uma aproximação apeada de cerca de 15 km. Recuperaram-se 12 elementos de população e apreendeu-se um número significativo de material. A operação mais importante realizada pelo BCP 12 durante o ano de 1972 teve o nome de código “Muralha Quimérica”, e decorreu na região de Unal-Guileje. Para esta operação convergiram três companhias de paraquedistas, duas companhias de comandos africanos, três companhias de caçadores e um grupo especial COE. Dispersou-se temporariamente a força inimiga e apreendeu-se um número impressionante de armamento.

Segue-se a descrição das operações em 1973, até que se chegou à grande ofensiva lançada pelo PAIGC em torno de Guileje e Guidage. As tropas paraquedistas foram lançadas em Gadamael-Porto e atuaram para contrair o cerco de Guidage. O aqui se relata é hoje matéria desenvolvida em diferentes livros, o dado mais significativo é o comportamento admirável dos paraquedistas na defesa de Gadamael e as missões de patrulhamento que posteriormente desenvolveram até interromper a pressão sobre Gadamael-Porto.

O derradeiro capítulo é dedicado à extinção do batalhão, desvelando a atividade operacional entre Janeiro a Maio de 1974. Em Janeiro o comando do BCP 12 passa a ser assegurado pelo Tenente-Coronel Pára-quedista António Chumbito Ruivinho. Os paraquedistas vão participar na operação Gato Zangado 1, sobre o controlo operacional do CAOP 2, que decorrer na região de Bajocunda-Copá-Canquelifá. A última operação militar das forças paraquedistas foi a denominada “Obstáculo Hermético”, levada a cabo entre Abril e Maio na região de Canquelifá. Chegara-se se ao fim da guerra, em Agosto as tropas paraquedistas regressaram a Portugal. As instalações do BCP 12 passaram então a ser utilizadas pelas tropas do Exército que aguardavam transporte de regresso a Portugal. No dia 13 de Outubro de 1974 findou a presença militar das tropas paraquedistas na Guiné, o Capitão Albuquerque Pinto fez a entrega a um representante do PAIGC de todas as instalações do BCP 12. Em 15 de Outubro do mesmo ano um decreto-lei do Conselho dos Chefes de Estados-Maiores das Forças Armadas consumou a extinção legal do BCP 12. Assim se encerravam 11 anos de vida e presença efetiva das tropas paraquedistas na Guiné.

Um "Pára" ferido em combate aguarda a evacuação

Canhão S/R B-10 apreendido durante a operação Muralha Quimérica

Enfermeira do PAIGC capturada pela CCP 121
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Nota do editor

Poste anterior de 30 de setembro de 2019 > Guiné 61/74 - P20190: Notas de leitura (1222): História das Tropas Pára-Quedistas Volume IV, é dedicado à Guiné e tem como título História do Batalhão de Caçadores Paraquedistas n.º 12; responsável pela redação e pesquisa Tenente-Coronel Luís António Martinho Grão; edição do Corpo de Tropas Paraquedistas, 1987 (1) (Mário Beja Santos)

Último poste da série de 4 de outubro de 2019 > Guiné 61/74 - P20205: Notas de leitura (1223): Missão cumprida… e a que vamos cumprindo, história do BCAV 490 em verso, por Santos Andrade (26) (Mário Beja Santos)

segunda-feira, 30 de setembro de 2019

Guiné 61/74 - P20190: Notas de leitura (1222): História das Tropas Pára-Quedistas Volume IV, é dedicado à Guiné e tem como título História do Batalhão de Caçadores Paraquedistas n.º 12; responsável pela redação e pesquisa Tenente-Coronel Luís António Martinho Grão; edição do Corpo de Tropas Paraquedistas, 1987 (1) (Mário Beja Santos)



1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 24 de Janeiro de 2017:

Queridos amigos,
A Biblioteca da Liga dos Combatentes continua a reservar-me surpresas e leituras inesperadas. Tanto quanto me é dado saber, esta obra é a primeira iniciativa de levantamento do que foi a atividade do BCP 12 e seus antecedentes.
Trata-se de uma edição cuidada, relevando as operações em que os paraquedistas capturaram material, guerrilheiros, tiveram combates extremamente sofridos. E também se analisa a lógica seguida durante o governo de Schulz e o que se alterou com Spínola. Fica bem claro, a despeito do esforço mediático que envolveu a governação de Spínola, tropas como as paraquedistas desenvolveram atividades ofensivas de caráter notável ao tempo de Schulz. Mas no seu todo, toda a governação de Schulz continua envolta em bruma, o que é lamentável.

Um abraço do
Mário


História das tropas paraquedistas na Guiné (1)

Beja Santos

“História das Tropas Paraquedistas Portuguesas”, Volume IV, é dedicado à Guiné e tem como título História do Batalhão de Caçadores Paraquedistas n.º 12, é responsável pela redação e pesquisa o Tenente-Coronel Luís António Martinho Grão, edição do Corpo de Tropas Paraquedistas, 1987.

A primeira parte da obra é dedicada à geografia física, notas históricas, a geografia humana, estruturas administrativas, económicas e sociais, dados que o leitor manifestamente conhece, muitas obras aqui versadas abordam à exaustão estes diferentes aspetos. A segunda parte é dedicada à luta armada, começando pela pacificação da ilha de Bissau, as campanhas do Oio, a pacificação das regiões do Cacheu e do Churo, seguindo-se a história dos movimentos políticos emancipalistas, dados igualmente conhecidos pelo leitor do blogue.

Entramos seguidamente na história do Batalhão de Paraquedistas, dá-se relevo à presença de tropas paraquedistas na Guiné em 1959, em 10 de Agosto desse ano um pelotão de paraquedistas foi transportado para Bissau, acabaram por simbolizar uma missão de paz. É com a situação de conflito armado em 1963 que um pelotão de paraquedistas é enviado para a zona aérea de Cabo Verde e Guiné, com a missão fundamental da defesa do AB 2, o Aeródromo Militar de Bissau. Também nesse ano chegou à Guiné um pelotão de paraquedistas que ficou a fazer parte da companhia mista “Páras-Polícia Aérea”. No início de 1964 é enviado para Bissau um segundo pelotão de paraquedistas. O batismo de fogo ocorre em Agosto de 1963, no Sul. Em Fevereiro de 1964, as tropas paraquedistas sofreram o seu primeiro morto em território guineense. Com a intensificação da luta armada, em Fevereiro de 1964, é colocada na Guiné uma companhia de paraquedistas, os pelotões vão chegando ao longo do ano. Cria-se a Esquadra de Defesa Mista, composta pela companhia de paraquedistas, efetivos pertencentes à Polícia Aérea e por um pelotão reforçado de artilharia antiaérea, sob o comando do Capitão Tinoco de Faria. Em 1966, os paraquedistas estão em permanente atividade no corredor de Guileje. É na operação Grifo que é atingido mortalmente Tinoco de Faria.

Em Maio de 1964, Arnaldo Schulz chega à Guiné e solicitará mais tropas, será assim criado o BCP n.º 12. O livro dá conta da atividade operacional que decorreu entre Janeiro de 1967 a Maio de 1968.
Registe-se a observação:  
“As tropas paraquedistas, mercê da sua grande mobilidade e poder ofensivo, foram empenhadas pelo Comando-Chefe em operações e curta duração, onde o poder de fogo e a manobra rápida contavam decisivamente para o êxito nos ataques a bases e concentrações de guerrilheiros. Até meados do ano do 1968, os paraquedistas foram utilizados em ações de helitransporte de assalto, emboscadas e batidas de curta duração. As tropas do BCP 12 atuavam quase sempre em operações independentes sob comando operacional de um oficial superior paraquedista. O seu comandante, Tenente-Coronel Costa Campos, comandou quase todas as operações em que os militares paraquedistas tomaram parte”.
Ao longo do relato faz-se o sumário de operações onde se obtiveram êxitos significativos ou se travaram duros combates: a Operação Trovão, em que o carregamento de material capturado, em vários helicópteros demorou cerca de quatro horas; a Operação Ciclone I, em Caboxanque; Operação Barracuda III, realizada em Maio de 1968, mais uma vez o volume de material capturado foi de tal envergadura que exigiu várias horas para a sua total evacuação. O BCP, em Fevereiro de 1968 recebeu uma companhia de milícias que deu-lhes instrução, foi assim formada a companhia de milícias que operava ao lado dos paraquedistas.

O documento relata igualmente um grave incidente ocorrido com os fuzileiros, formara-se uma associação desportiva denominada ASA, sob o patrocínio dos Comandos da BA 12 e do BCP 12. Houvera até então um excelente clima de amizade entre paraquedistas e fuzileiros. Em 3 de Junho de 1967 paraquedistas e fuzileiros envolveram-se em violenta desordem que custou a vida a dois paraquedistas, os Comandos encerraram a associação desportiva ASA. Faz-se igualmente destaque para a atividade aeroterrestre, a construção de infraestruturas e destaca-se as condecorações recebidas.

Dá-se entretanto a alteração em Maio de 1968 dos comandos superiores, chega Spínola e um novo tenente-coronel para comandar o BCP 12. É instituída uma nova lógica para a atividade dos paraquedistas:  
“O novo Comandante-Chefe iria, de imediato, introduzir alterações de emprego operacional das tropas do BCP 12; às missões de combate helitransportadas, de curta duração e sob comando direto do seu comandante, irão suceder-se as operações em que os militares paraquedistas se vão manter durante períodos muito dilatados em áreas distintas do seu aquartelamento em Bissau, muitas vezes sob comandos estranhos ao BCP 12, em missões de reforço de tropas de quadrícula”.
Neste novo contexto, a atividade operacional dos novos efetivos do BCP 12 desenrola-se no itinerário Bula-Có, tratava-se de proporcionar aos novos elementos do Batalhão um primeiro contacto com o terreno da Guiné. Em Agosto desse ano, Spínola criou os Comandos Operacionais nas áreas mais críticas e/ou vulneráveis à ação do inimigo. As tropas paraquedistas, tal como outras forças de intervenção do Comando-Chefe, passaram então a ser empenhadas, durante largos períodos, conjuntamente com unidades de quadrícula do exército. Os Comandos Operacionais integravam, normalmente uma ou mais companhias do BCP 12, sendo o seu comando atribuído, com frequência, a oficiais superiores paraquedistas. Neste novo ambiente, as tropas do BCP 12 são usadas em operações de grande risco nomeadamente no Sul. Por esse tempo, o PAIGC passou a concentrar o seu esforço ofensivo sobre Gandembel, para contrariar a atividade guerrilha do PAIGC as nossas tropas iam lançando ações diárias de patrulhamento nas imediações dos aquartelamentos de Gandembel, Porto Balana, Guileje e Mejo. O PAIGC reage, é um período de inferno sobre Gandembel.

(Continua)


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Nota do editor

Último poste da série 27 de setembro de 2019 > Guiné 61/74 - P20183: Notas de leitura (1221): Missão cumprida… e a que vamos cumprindo, história do BCAV 490 em verso, por Santos Andrade (25) (Mário Beja Santos)

terça-feira, 26 de março de 2019

Guiné 61/74 - P19623: (In)citações (127): A Comissão Especial da ONU e outros embustes… (Manuel Luís Lomba, ex-Fur Mil Cav)


Fundação Mário Soares / Documentos Amílcar Cabral > Abril de 1972 > Região de Tombali > "Visita da Missão Especial da ONU a Cubucaré [, a sul do Rio Cacine,] distinguindo-se Fidelis Cabral de Almada e José Araújo. Com a inscrição manuscrita a lápis no verso: Recebida, com entusiasmo pela população, a missão especial chega ao local de um grande meeting popular, em Cubucaré". Guiné-Bissau, 2 a 8 de Abril de 1972."


1. Mensagem do nosso camarada Manuel Luís Lomba (ex-Fur Mil da CCAV 703/BCAV 705, Bissau, Cufar e Buruntuma, 1964/66) com data de 22 de Março de 2019, sendo publicada com o poste na série (In)citações (**):


A Guerra da Guiné:

A Comissão Especial da ONU e outros embustes…

A ONU, Organização das Nações Unidas, é uma entidade enformada por humanos, tanto pode praticar as melhores virtudes como cometer os erros mais comezinhos. E sendo as guerras actividades humanas e o homem a única espécie animal que mente, a verdade é a primeira vítima delas.

Postulante à Assembleia Geral da ONU do envio dessa Comissão Especial (*), Amílcar Cabral, num exercício de génio político, nem a acompanhou nem penetrou na fronteira da Guiné Portuguesa. Se o desafio corresse mal, haveria um culpado - o seu “marechal de campo” Nino Vieira. A superação do medo do risco dessa troika onusiana foi trabalho dos drs. Fidelis Almada e José Araújo, do Comité Executivo de Luta, formaram um grupo de 6 e desceram de Conacri para Boké-Kandiafara, fizeram-se ao caminho até à fronteira de jipe, fardados de “boinas azuis” e escoltados pelo grupo de experientes guerrilheiros comandados pelo decidido Abdulai Barri, passaram linha invisível da fronteira a pé, foram recebidos na margem do rio Balana pelo comandante Pedro Pires, que acabara de substituir o comandante Constantino Teixeira no cargo de Comissário Político da Frente Sul e de “controleiro” de Nino Vieira.

Havia dois anos que a tropa deixara de içar a bandeira de Portugal naquele troço do longo Corredor de Guileje. Amílcar Cabral embirrou com a posição e, na sua sobranceria de militar clássico, convencional, em 1970, o General António de Spínola negligenciara a valia táctica das posições de “impermeabilização” daquela fronteira, dando preferência à perseguição dos intrusos com operações “à general”, com forças terrestres, navais e aéreas, evacuando as suas guarnições (Ponte Balana, Gadembel, etc).

Na mata da margem desse pequeno rio Balana também os esperava Nino Vieira, o eficiente Chefe de Operações do PAIGC, correspondente ao posto de Comandante-Chefe, nos exércitos clássicos, que lhes deu orientações tácticas, traçou-lhes a rota orientada a leste, eles começaram a marcha na direcção de Daresalam, com dois bi-grupos em segurança avançada, comandados por Constantino Teixeira, e desandou apressado (Luís Cabral escreveu por sofrer de maleita nos pés), mas no desempenho do seu cargo do mais alto comando operacional das FARP (Forças Armadas Populares) e com a missão de despistar à tropa de Bissau a sua porta entrada, a sua progressão e na cobertura à sua estada, com manobras de flanco, enquanto o Comandante-Chefe General António de Spínola correspondia à intrusão desencadeava, a partir de Aldeia Formosa (Quebo) a Operação Muralha Quimérica, entre Unal e Gadembel, investindo agrupamentos de tropas especiais e do contingente geral - as Companhias de Pára-quedistas 121, 122 e 123, duas Companhias de Comandos Africanos, as Companhias de Caçadores, 19, 3399, 3477 e as imprescindíveis parelhas de aviões Fiat G-91, de ataque ao solo, cerca de 800 operacionais, brancos, pretos e mestiços. Atente-se na premonição da nomenclatura dessa operação. (***)

Lançados na procura da sua peugada e comandados pelos valorosos oficiais pára-quedistas Tenente-Coronel Araújo e Sá e Capitão Mira Vaz, aqueles insofridos operacionais andaram 12 dias a pentear aquele inóspito território, como quem procura agulhas em palheiro, enquanto o intuitivo e bem informado Nino Vieira, ao comando dos seus bisonhos 400 combatentes nacionalistas, enquadrados por cubanos, com a sua lendária sorte e pelas suas audaciosas manobras de diversão, ofensivas e defensivas, conseguiu manter à distância e garantir o desencontro de toda aquela tropa com esses intrometidos “emissários especiais”. A segurança próxima de Abdulai Barri e segurança alargada de Constantino Teixeira não dispararam um tiro.

Em 10 de Abril, em Conacri e, a seguir, em Nova Iorque e noutras arenas internacionais, aqueles emissários diplomáticos clandestinos proclamaram, na certeza de colher a condescendência da generalidade das chancelarias que, nos 5 dias e 6 noites da sua visita à Guiné (da sua imaginação) percorreram cerca 200 km a pé em “áreas libertadas, e apenas de noite – uma média de 30 km por cada dessas curtas noites tropicais, superior à alcançada em corridas pedestres em pista – proeza de super-homens! – que estiveram em 9 localidades libertadas, em contacto com as populações na inspecção das estruturas que enformam os Estados – serviços da administração, saúde, justiça, educação, obras de reconstrução, economia, assembleia nacional, etc (seriam portadores de óculos de visão nocturna?). E que, a simbolizar a missão cumprida arvoraram a bandeira da ONU no galho duma árvore, algures na península de Cubucaré/Bedanda.

Essa mistificação dessa missão internacional a uma imaginativa Guiné custou ao PAIGC a destruição do “hospital” e da “loja do povo”, razão por que não as visitaram, importante armamento aos 400 duros combatentes do comandante-chefe Nino Vieira e 47 baixas, entre mortos, feridos e prisioneiros. O fotógrafo oficial da ONU, o japonês Youtaca Nagata, voluntariara-se para a essa missão, mas não terá tirado a foto pró-memória do acontecimento, prevenindo-se do seu do contraditório, enquanto o relatório e seus anexos, para uso da Comissão de Descolonização, do Secretário-Geral, da Assembleia Geral e do Conselho de Segurança da ONU denunciam a mão do PAIGC.

Essa visita da Comissão Especial da ONU à Guiné foi um embuste - protagonizou o maior acto de hipocrisia diplomática da Comunidade das Nações. Não fora mandada com a missão de observar, mas para satisfazer o formalismo da apresentação dum relatório, circunstancial de modo e de lugar. Ainda há pouco alguns ex-quadros do PAIGC se descaíam, em privado, em como esses onusianos apenas puseram os pés nas bordas do chão bissau- guineense.

Testemunhos espontâneos de veteranos combatentes diziam que aquele grupo onusiano apenas se aventurara a pequenas deslocações, ao longo da fronteira, sempre de noite, a penar os tormentos da guerra, sempre com o credo na boca. Penetrados 5 km no mato da Guiné, a audição dos rebentamentos, a sua intensidade e o roncar dos Fiat's fizeram o diplomata Kamel Belkhiria, secretário da missão permanente da Tunísia, avaliar o risco que incorriam, manifestou-se renitente à aventura e tornara-se recorrente nas tentativas de não só não avançar mais como de voltar para trás. Tendo em conta que Boké dista cerca de 80 km da fronteira, aos apregoados 200 km palmilhados terão de ser subtraídos os 160 km de ida e volta, percorridos de viatura em território estrangeiro. A máxima distância em linha recta, entre Bissau e o ponto fronteiriço mais distante, como Buruntuma ou Guileje, será pouco superior a 100 km...

Essa desavergonhada missão internacional, porque clandestina e nocturna, em favor ao reconhecimento dum Estado também ele ausente, nocturno e clandestino, ter-se-á limitado ao acto de dependurar a bandeira da ONU no galho duma árvore além rio Balana, ao Cantanhez – esse santuário da Natureza Bissau-guineense, entrado em processo de desertificação demográfica, que a conjugação das adversidades naturais com as tormentas daquela guerra transformaram em “inferno verde” para os seres vivos – animais, guerrilheiros, tropa e populações.

 Essa Comissão da ONU aterrou em Conacri, então a capital da Guiné-Bissau, e poderia ter aterrado em Bissau ou nas 60 pistas de aterragem activas, espalhadas pela Guiné Portuguesa. A sua precedente aterrara em Bissau, em Julho de 1971, observara os 12 mil aldeamentos sociais espalhados pelo território, construídos pelo Batalhão de Engenharia de Bissau e pelas guarnições das suas quadrículas, e não escondeu o seu espanto, pelo sucesso do PAIGC em revertê-los em seus secretos pontos logísticos. O PAIGC tinha “comissários” nesses aldeamentos; a sua circulação era quase livre…

Se não fosse tão “especial”, essa missão teria podido deslocar-se por terra, mar e ar, aos quatro cantos da Guiné, teria avaliado “a guerra de guerrear” do PAIGC, eficiente em criar dificuldades e na disrupção da vida das populações rurais guineenses, pela minagem das picadas e trilhos, teria observado a sua eficácia a dar combate, em encontros de primeiro grau, como as emboscadas de bate e foge às patrulhas, colunas-auto da tropa ou os ataques, em regra nocturnos, aos seus aboletamentos; teria visto mortos, feridos ou estropiados de um e de outro lado, em particular nas áreas florestais e suas acessibilidades.

Mas, em lugar algum dessa Guiné real encontraria Amílcar Cabral ou qualquer um da cúpula dos mandantes dos seus insofridos combatentes da liberdade. Viviam em Conacri. O próprio Nino Vieira viva em Boké. Em abono da verdade, seriam obrigados a reportar que o atraso da Guiné portuguesa era ligeiramente superior ao do Portugal europeu, que a colonização portuguesa era algo mental e pouco económica, que a capital da Guiné do PAIGC e as suas instituições políticas e militares funcionavam em Conacri e noutras cidades no estrangeiro e que as dimensões atribuídas às “áreas libertadas” eram criações fantasiosas, propaganda mediática.

Estavam os intrusos onusianos a pisar a margem do rio Balana e o Comandante-Chefe comparecera no palco da quimérica operação que desencadeara. No dia seguinte ao conhecimento que já tinham abandonado o território, que lhe chegara pela diligente propaganda radiofónica do PAIGC, os voos rasantes de reconhecimento duma parelha de jactos Fiat anunciavam a sua visita à área dessa visita e um “zingarelho” da base aérea de Bissalanca poisou nela.

O general, carismático pelo seu monóculo e pela teimosia de ir aos locais onde o PAIGC já tinha ido, chegava ao encontro com a ONU, atrasado mas não clandestino, a lavar, com a sua presença, o enxovalho da ONU dirigido à terceira nação mais antiga do mundo e aos seus soldados; e só então mandou calar a metralha, que havia 12 dias punha o Cantanhez a ferro e fogo, por terra, água e ar, já Nino Vieira manobrava o Terceiro Corpo de Exército das FARP pelo troço no estrangeiro do famigerado “Corredor de Guileje”, para as suas bases de retaguarda, de Kandiafara e Boké.

Os mesmos populares que o PAIGC havia coagido a sair dos seus esconderijos, a seco e em segredo, para fazer de cenário a esse evento onusiano, foram os mesmos a acorrer à aterragem do Comandante-Chefe, que animou a malta, presenteando-os com dois garrafões de aguardente de cana.

Os naturais da Guiné são naturalmente hospitaleiros e nunca desperdiçam a oportunidade dum ronco (uma festa); e esses mesmos figurantes para o evento da ONU rufaram o “bombolom” nos seus tambores, convocatório a nova reunião, ora de celebração à presença do “homem grande de Bissau” e em gratidão à sua dádiva aguardenteira, enquanto os 800 militares dos agrupamentos de tropas especiais e normais da Operação Muralha Quimérica começavam a recolher aos seus aquartelamentos, mortos de cansaço físico e psíquico pelos esforços e sofrimento individual que lhes foram exigidos, a custo de um morto e sete feridos graves. Estariam longe de imaginar ou de qualquer pressentimento que acabavam de abordar uma emergência transcendental e que dois garrafões de aguardente de cana-de-açúcar da “Apsico” do Comando-Chefe fizeram mais pela “Guiné Portuguesa” que os seus 12 dias de canseiras, sofrimento e combates.

Como as operações combinadas dos três ramos são planeadas pelos Comandantes-Chefes, no outro lado, no Índico, o Comandante-Chefe General Kaúlza do Arriaga, o oposto do General Spínola, com a sua Operação Fronteira embargou 13 vezes ao Comité dos 24 da ONU, as suas tentativas de penetração clandestina em Moçambique…

À maneira de “um general no seu labirinto”: o espião das informações em que o Comando-Chefe baseou o planeamento da Operação Muralha Quimérica e o guia para o avanço do seu desencadeamento haviam-lhe sido “fornecidos” pelo PAIGC. Luís Cabral escreveu terem tomado precauções militares e “conspirativas”... Dizem que o tempo e a História devolvem a gratidão aos povos. Os nossos netos verão em Bissau uma estátua a homenagear o General António Spínola “Por uma Guiné melhor”?
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Notas do editor:

(*) Vd. poste de  16 de março de 2019 > Guiné 61/74 - P19592: (D)o outro lado do combate (48): A Missão Especial da ONU na Guiné - Abril 1972 (António Graça de Abreu / Luís Graça) - III (e última) Parte II: capa + pp. 9-11.

Postes anteriores:


14 de março de 2019 > Guiné 61/74 - P19586: (D)o outro lado do combate (46): A Missão especial da ONU na Guiné - Abril 1972 (António Graça de Abreu / Luís Graça) - Parte I: capa + pp. 1-3

quinta-feira, 10 de janeiro de 2019

Guiné 61/74 - P19390: In Memoriam: Os 47 oficiais oriundos da Escola do Exército e da Academia Militar mortos na guerra do ultramar (1961-75) (cor art ref António Carlos Morais da Silva) - Parte IV: Manuel Jorge Mota Costa (Porto, 1937 - Bongo, Angola, 1961)


Lisboa > Academia Militar > Palácio da Bemposta ou Paço da Raínha, na Rua do Paço da Rainha > Festival Todos , 7ª edição, 2015 > 12 de setembro de 2015 > Visita guiada, pelo cor art ref Vitor Marçal Lourenço, professor da Academia Militar.

É aqui a sede da Academia Militar (, antiga Escola do Exército, fundada en 1837), que tem como patrono o general Bernardo de Sá Nogueira, Marquês de Sá da Bandeira. Há também um polo na Amadora.

O seu lema é: "Dulce et decorum est pro Patria mori" (É doce e honroso morrer pela Pátria). Na escadaria de acesso ao piso superior (biblioteca. museu, galeria de comandantes...) estão inscritos os nomes dos antigos alunos mortos durante a guerra colonial (1961/74), nos vários teatros de operações. Na lista, os 3 primeiros são:  (i) Cap Inf  Abílio Eurico Castelo da Silva; (ii) Ten  Inf. Jofre Ferreira dos Prazeres; (iii) Alf Pqd Manuel Jorge Mota da Costa.

Foto (e legendas): © Luís Graça (2015). Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].

quarta-feira, 24 de outubro de 2018

Guiné 61/74 - P19135: Efemérides (293): Homenagem aos paraquedistas que completaram 50 anos de brevet (1968-2018): Tancos, 27 de setembro de 2018 (Jaime Bonifácio Marques da Silva, ex-alf mil pára, 1ª CCP/BCP 21, Angola, 1970/72)


Tancos, Regimento de Paraquedistas > Monumento aos mortos em combate > Inaugurado em 3 de julho de 1968... O conjunto arquitetónico é da autoria do arquiteto Aleixo Terra da Mota; a  escultura é de Domingos Soares Branco; e a pintura e a decoração são de Hernani de Oliveira.

Foto (e legenda): © Jaime Silva (2018). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



1. Mensagem, com data de ontem, de Jaime Bonifácio Marques da Silva, membro da nossa Tabanca Grande, natural de (e residente em) Seixal, Lourinhã, preofessor de educação física, docente reformado do ensino superior politécnico, ex-alf mil pqdt, BCP 21, Angola, 1970/72 [, foto à esquerda]


Caro Luís
Vai aqui o texto de que te falei.
Vê se se adequa ao espírito do blogue.
Vai foto, se bem que poderás encontrar melhor na Net.
Abraço, Jaime.



Regimento de Paraquedistas, Tancos,- 27 de setembro de 2018


HOMENAGEM AOS PARAQUEDISTAS QUE COMPLETARAM 50 ANOS DE BREVET 1968 – 2018: Cursos 45.º, 46.º, 47.º, 48.º, e o 8.º de Enfermeiras Paraquedistas.


No passado dia vinte sete de setembro o Regimento de Paraquedistas e a União Portuguesa de Paraquedistas homenagearam os paraquedistas que completaram 50 anos de Brevet (Cursos 45.º, 46.º, 47.º, 48.º, e o 8.º de Enfermeiras Paraquedistas).

Esta cerimónia realiza-se anualmente desde que o 1.º Curso (1955) comemorou os seus 50 anos (2005).

Este ano tive o privilégio de estar presente a convite do meu camarada e amigo Joaquim Maria Inácio. Fizemos parte do 3.º Pelotão da 1ª CCP do BCP 21 em Angola e durante os dois anos de comissão cimentámos a nossa amizade nas dificuldades que fomos ultrapassando nas operações de combate realizadas no Norte e Leste de Angola.

HOMENAGEM AOS PARAQUEDISTAS MORTOS DO 46.º e 47.º CURSO

O programa do encontro incluiu uma cerimónia de grande significado cívico e de recolhimento junto ao monumento erguido no Regimento em memória dos Paraquedistas mortos durante a Guerra do Ultramar pertencentes ao 46.º e 47.º Curso de paraquedistas: A “chamada dos mortos” em combate, respondendo os participantes na cerimónia – PRESENTE – sempre que cada um dos nomes era “chamado”.

Relação dos paraquedistas que tombaram na guerra
i) Curso n.º 46:

BCP 31: 

Alf. Mili. Pára Luís Filipe Corte Real – 19.12.19 (CBT)

Sol/Pára Engrácio de Jesus Meio Tostão rato – 21.2.1970 (ACV)

BCP 21:

Sol/Pára Ernesto Rocha Casaca – 20.2.1971 (CBT)

Sol/Pára Joaquim Ferreira Fonseca – 17.6.1970 (CBT)

Sol/Pára Vitalino da Silva Gomes – 16.6.1970 (CBT)

Sol/Pára António da Silva Ramos – 25.6.1970 (CBT)

ii) Curso n.º 47:

BCP 12

1.º Cab/Pára Gabriel Parreiras Campilho- 26.3.1970 (CBT)

Foi um momento de grande emoção para todos os presentes que têm bem viva na memória os amigos que tombaram a seu lado.

O primeiro nome a ser “chamado” foi o do Soldado Paraquedista António da Silva Ramos do 46.º Curso e que tombou em combate a 25.6.1970. Pertencia ao meu Pelotão – 3.º Pelotão da 1ª  CCP do BCP 21.

O Ramos foi abatido numa operação que decorreu nos Montes Mil e Vinte, na região do Onzo, no Norte de Angola. Recordo-me dessa operação como se fosse hoje: Dois aviões da FAP (Fiat G91) lançaram quatro bombas de Napalm sobre o acampamento IN, ao mesmo tempo que o helicóptero SA 330 se aproximava do objetivo e largava o meu grupo de combate nas imediações do mesmo.

O Pelotão atuou de acordo com Ordem de Operações que tinha recebido: assaltar, destruir, capturar. Enfim, o trivial para as circunstâncias. Percorremos parte do acampamento (um dos maiores que já tinha visto) e decorrido pouco tempo, o grupo foi atacado, resultando daí a morte do Ramos (o único morto do pelotão em toda a comissão).

Depois da evacuação do corpo do Ramos pelo Helicóptero (Aluette 3), percorremos a zona, montámos nova emboscada e pernoitámos no local. No dia seguinte, quando nos preparávamos para abandonar a mata a fim de preparar o local para o Heli nos recolher, fomos fortemente atacados pelos guerrilheiros que nos tinham emboscado. Foi um dos momentos mais delicados que o 3.º pelotão teve para resolver durante a comissão, no confronto com os guerrilheiros.

Sem qualquer réstia de tiques de heroísmos injustificáveis hoje, como sempre, estou seguro que nesse momento veio ao de cima toda a mentalização psicológica e o resultado do treino duro a que os paraquedistas foram sujeitos durante a instrução. Lembro-me do comportamento de dois homens nesse momento: Um, homem com “H” grande,  e outro (e não era soldado) com “h” bem pequeno. O primeiro foi o Cruz, o HOMEM da HK 21 (o outro!).

Enfim, memórias vivas que só a morte se encarregará de levar!

Ainda hoje me interrogo, como responsável por aquele grupo de jovens como eu, o que poderia ter feito para que o Ramos não tombasse e o Santos não pisasse a mina que lhe levou a perna!


MONUMENTO AOS MORTOS EM COMBATE
REGIMENTO DE PARAQUEDISTAS EM TANCOS


Não posso deixar de registar o quanto significa para nós Paraquedistas, aquele Monumento. Vi-o, pela primeira vez, em julho de 1969 quando entrei no RCP para fazer provas de acesso ao curso de paraquedismo, vindo da EPI [, em Mafra,] e reparei que todos os militares, quando passavam na sua frente, faziam a continência. Foi- me explicado o seu significado e simbologia pelo Diretor do meu Curso o, então, capitão António Ramos.

No entanto, a apreensão do seu verdadeiro significado só foi interiorizado quando regressei a Tancos após ter cumprido a minha comissão de serviço. Nessa altura, sim: quando olhei para aquele monumento senti que podia ser eu, também, um dos que tombaram. Só a vivência da guerra e a morte dos camaradas ao nosso lado no mato, nos fazem fazer compreender verdadeiramente a essência do seu significado.

Aquele monumento, ao evocar a memória daqueles que tombaram, honra os Paraquedistas e lembra a todos os que por ali passarem, o sacrifício de uma juventude que deu o melhor de si mesmo à sua Pátria - a sua vida. E não foram, assim, tão poucos os que tombaram em cada um dos três teatros de operações onde combatemos:

Durante a Guerra do Ultramar morreram 210 Paraquedistas.  Guiné – 67. Angola 65. Moçambique - 78.

O Monumento aos Mortos em Combate foi inaugurado em 3 de julho de 1968 com a presença do Presidente da República Almirante Américo Tomás. À data, o Comandante do RCP era o Coronel Paraquedista Mário Monteiro Robalo que, a determinada altura do seu discurso, disse:

“(...) Ficaram mais pobres as suas famílias, com a sua morte.
Ficou mais rica a terra portuguesa, com o seu sangue.
Mas ficou-nos, sobretudo, a todos o exemplo da grandeza do seu sacrifício.
Sacrifício que não podemos permitir que se venha a tornar inútil, que não poderá ser, jamais, traído!

(…)Há que fazer opções sobre a aplicação mais rentável de, pelo menos, uma parte da nossa juventude.” (in: “BOINA VERDE” – Setembro de 1968)



Até parecia que o Comandante adivinhada o desfecho da inutilidade daquela guerra!

Como nota final: O conjunto arquitetónico foi da autoria do Arquiteto Aleixo Terra da Mota. A escultura de Domingos Soares Branco. A pintura e decoração de Hernani de Oliveira.

Na base do monumento a inscrição: “AQUELES EM QUEM PODER NÃO TEVE A MORTE”

Jaime Bonifácio Marques da silva

(Ex- Alf. Paraquedista - 1ª CCP / BCP 21, Angola, 1970/72)

segunda-feira, 15 de outubro de 2018

Guiné 61/74 - P19104: Notas de leitura (1110): Os oficiais milicianos paraquedistas da FAP, volume I: os que combateram em África (1955-1974)- Um trabalho sério, rigoroso e honesto de mais de 2 anos, de José da Fonseca Barbosa, em homenagem a uma geração de portugueses que ajudaram a escrever algumas das mais belas páginas de sacrifício e abnegação da nossa história contemporânea (Jaime Silva, ex-alf mil pqdt, BCP 21, Angola, 1970/72)


Capa do livro de José da Fonseca Barbosa, "Oficiais milicianos pára-quedistas da Força Aérea Portuguesa: volume I: Os que combateram em África, 1955 a 1974. Porto: Fronteira do Caos, 2018, 343 pp.


Jaine Silva: leste de Angola (c. 1970/72)
1. Nota de leitura do nosso camarada Jaime Bonifácio Marques da Silva, membro da nossa Tabanca Grande, natural de (residente em)  Lourinhã, preofessor de educação física, docente reformado do ensino superior politécnico, ex-alf mil pqdt, BCP 21, Angola, 1970/72 [, foto à direita]


 Introdução

José da Fonseca Barbosa  fundamenta e aborda com grande seriedade e objetividade o papel dos oficiais milicianos paraquedistas que participaram na Guerra em África.

 “Dos milicianos, no geral, diz-se que ... 'não se sabe quase nada'...". Enfim, "a sua história ainda está por fazer.” (...) "Na História, são praticamente ignorados e o seu sacrifício a Pátria ignora”.  talvez porque “ quando se faz a história, são os QG que a escrevem, logo ...”

Eles, escreve ainda o autor, “estão  entre os que contribuíram para que as Tropas Paraquedistas portuguesas deixassem escritas. a letras de ouro, páginas duma história que já leva 60 anos de existência, é justo e inteiramente merecido que se refira o conjunto de oficiais Milicianos Paraquedistas”.

Alicerça o seu trabalho na pesquisa que efetuou nos arquivos das Tropas Paraquedistas, nos testemunhos de um grande número de Oficiais Milicianos que fizeram a guerra e na bibliografia disponível,  alusiva ao tema.

Na minha modesta opinião, considero a obra de José da Fonseca Barbosa  de inegável valor histórico e pedagógico, não só pela seriedade com que fundamenta e organiza a pesquisa , mas também   pelo importante contributo que dá para o estudo e compreensão do papel dos Oficiais Milicianos Paraquedistas durante a guerra colonial.  

O seu trabalho alerta ainda, por analogia, para que  o país não  esqueça  o  contributo de todos os outros oficias milicianos que serviram nos restantes Ramos das Forças Armadas Portuguesas nas três frentes da  Guerra em África. Sem o contributo dos Oficiais Milicianos, seguramente que o decisores políticos e militares não conseguiriam aguentar por tantos anos essa guerra, reconhecidamente travada “fora do  tempo histórico” em que se realizou.


Sobre o autor:

José da Fonseca Barbosa viveu em Angola  até 1975. Depois de concluir o COM na EPI (Mafra), ingressou nas tropas Paraquedistas em 7 de junho de 1976. Pertenceu ao 92.º curso de Para- quedismo,  tem o Brevet n.º 13436 e serviu nas Tropas Paraquedistas até março de 1983.

Nas Paraquedistas desempenhou várias funções nomeadamente a de instrutor militar, chefe do Centro de Treino Físico, 2.º comandante e comandante de subunidades de Apoio de Serviços, designadamente de destacamento de Apoio e Serviços de missão portuguesa na IFOR/SFOR na Bósnia Herzegovina, durante o ano de 1996.

 Do seu currículo consta, ainda: “ A sua formação militar inicial foi marcada pela influência da geração que combateu em África, pela história que construiram, pela forma como o fizeram. Do legado dos combatentes retirou luzeiros que orientaram toda a sua carreira militar.
Passou à situação de reserva em 31 de dezembro de 2002".


Sobre a obra:

O autor apresenta o seu trabalho ao longo de 343 páginas e, depois da “Dedicatória”,  “Agradecimentos” , “Introdução – Razões e Retrospetiva” e “Notas do  Autor”, desenvolve o objeto do seu estudo em seis capítulos.

Dedica o seu trabalho a todos os oficiais Milicianos Paraquedistas de ontem, de hoje e a todos os que fizeram dele soldado, paraquedista, boina verde e o acompanharam como oficial e militar e agradece a todos os paraquedistas ou não que o ajudaram a levar por diante este empreendimento.

Refere, ainda, as dificuldades  que encontrou na recolha da informação e as opções que teve de  tomar para organizar a obra e esclarece a razão por que decidiu dividir o trabalho em dois volumes:

O Volume I, referente ao período de 1955 -1974, é dedicado aos que combateram em África, perfazendo um total de 197 brevetados;   e o Volume II,  referente ao período 1975 – 1993, corresponderá  à geração pós Império, com 97 brevetados. 


Notas do autor (pp.. 11 – 14)

"A organização da informação pesquisada e recolha ao longo de 25 meses, bem como a redação do texto, são da minha responsabilidade", escreve o autor.

Alerta o leitor para não esperar encontrar na sua obra histórias, análises profundas e/ou reflexões demasiado elaboradas e muito menos juízos de valor sobre atos e atores, mas outrossim, cópias, transcrições, relatos e testemunhos feitos por quem viveu um determinado período de História das Tropas Paraquedistas com o estatuto de oficial miliciano..

A fundamentação do seu trabalho, escreve, está comprovada em todas as Ordens de Serviço (BCP/RCP/BET e BCP 21/ BCP 31/BCP 32/ BCP 12) que foram passadas página a   página  de 1956 a 1978, bem como testemunhos que recolheu e na bibliografa existente da especialidade.

Alerta o leitor, ainda, para as dificuldades que encontrou na numeração de Brevet que não coincide com o números do diploma,  as divergências que encontrou, também,  na numeração sequencial dos cursos de paraquedismo e as imprecisões quanto à data do início das Comissões de Serviço no Ultramar.


Capitulo 1 - COMO FOI (pp. 15 - 86)

No capitulo 1 o autor enumera, primeiro, por ordem cronológica, o número de cursos de paraquedismo e de oficiais milicianos participantes  desde   o primeiro curso terminado em
Alcantarilha a 15 de abril de 1955 até ao último curso em 1974.

 Na segunda parte deste capítulo o autor aborda com grande oportunidade todos as fases da formação pelas quais tiveram de percorrer  e ultrapassar os  oficiais  Miliciano paraquedista, desde as “as  razões pelas quais quiseram servir nos Paraquedistas”  até à enumeração de todos os fatores que prevaleceram até hoje e são únicos na identificação de um Paraquedista como: “Tradições ... Princípios e valores ... identidade”.


Capítulo 2 - QUEM FORAM E QUEM SÃO (pp. 87 - 181)

Para a concretização do seu trabalho José da Fonseca Barbosa, com os condicionalismos que encontrou e  mencionou na sua “Introdução”, apresenta os testemunhos recolhidos entre alguns dos milicianos, concretamente: “o que nos dizem alguns dos que deram o seu testemunho escrito
individualizando (...), o que fizeram/ fazem depois de cumprido o serviço militar como oficiais milicianos.”

Para além de um quadro síntese, analisa individualmente o percurso de vida de cada um por curso, terminando com as fotografias (rostos com nome) e a lista nominal.


Capítulo 3 - O QUE FIZEERAM E COMO FIZERAM ( pp. 183 - 234)

O autor introduz o capítulo com um subtítulo bem a propósito - Uma História por fazer? - e afirma: “Dos milicianos, no geral, diz-se que ... não se sabe quase nada...”

Ao longo do capítulo descreve as “funções desempenhadas” pelos milicianos (para além de comandantes de pelotão), enumera em cada ano, a partir de 1961, “Quem e Quando Foram” prestar serviço em cada uma das Unidades no Ultramar e “O papel que tiveram na guerra” e termina com a lista de “Aqueles, que pelos ilustres feitos foram condecorados”


Capítulo 4 - IMAGENS DE UM TEMPO PASSADO (pp. 235 - 315)

Neste capítulo o autor dá a palavra às imagens. Durante 80 páginas documenta, numa primeira parte, com uma sequência fotográfica as várias etapas da formação de um paraquedista, evocando nas restantes, figuras e nomes de muitos dos milicianos que contribuíram para a história dos paraquedistas.


Capítulo 5 – O BALANÇO FEITO (pp. 317 - 331)

O autor, através do testemunho de alguns milicianos,  faz o balanço do que foram aqueles anos vividos há meio século para alguns e dezenas de anos para outros.

Termina o seu trabalho com um voto.

“Voto a fechar: Que os atuais e vindouros Oficiais Milicianos Para-quedistas saibam aproveitar o melhor que lhes foi legado e que sejam dignos descendentes e continuadores da obra dessa plêiade de homens que ajudaram a escrever das mais belas histórias de sacrifício e abnegação da nossa História Contemporânea.”


Jaime Silva
CAPÍTULO 6 - AQUELES QUE PELO “LAJEDO DO SACRIFÍCIO”, POR LÁ SEQUEDARAM.

Em África tombaram seis: Três na Guiné, dois em Angola e um em Moçambique.


Jaime Silva

[Cumpriu o Serviço Militar Obrigatório nas Tropas Paraquedistas como Oficial Miliciano, sendo mobilizado para uma comissão de serviço em Angola no BCP 21 (1970/1972); tem cerca de meia centena de referências no nosso blogue, foto atual à esquerda]