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sexta-feira, 12 de julho de 2024

Guiné 61/74 - P25737: Memórias de um artilheiro (José Álvaro Carvalho, ex-alf mil, Pel Art / BAC, 8.8 cm, Bissau, Olossato e Catió, 1963/65) - Parte II: 15 minutos, de ferro e fogo, no K3, em meados de 1963


Foto nº  5


Foto nº 6


Foto nº 6A

Foto nº 6B


Foto nº 7

Guiné > s/l > s/d > O alf mil art José Álvaro Carvalho  (1º trimestre de 1963/meados de 1965) > Nestas fotos do seu álbum ainda não conseguimos identificá-lo: talvez possa ser o militar que se vê na foto nº 6B, em segundo plano, de pefil, de óculos.




Angola > Ponte do rio Cuanza (em contrução, desenhada pelo eng. Edgar Cardoso) > c. 1971 > O José Álvaro Almeida de Carvalho, diretor do departamento de trabalhos externos da empresa L. Dargent Lda. Aqui ainda no início da montagem do tabuleiro da ponte...Viveu 5 anos em Angola (até depois do 25 de Abril de 1974).

Fotos: © José Álvaro Carvalho (2024). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. O José Álvaro Carvalho, 85 anos, natural de Reguengo Grande, Lourinhã, entrou recentemente para o nosso blogue. Senta-se à sombra do nosso poilão no lugar nº 890 (*). 

Não dispondo da sua caderneta militar (diz que nunca a teve), o Zé Álvaro (como eu o trato, afetuosamente), não sabe exatamente em que data chegou ao CTIG, para render um alferes de uma companhia de intervenção, sediada em Bissau. Aponta para a primavera de 1963, escassos depois da guerra ter "oficialmente" começado, na "narrativa" do PAIGC,  com o ataque  a Tite, na região de Quínara, em 23 de janeiro de 1963.

Já estava há 26 meses na tropa. E deve ter cumprido mais uns 26 ou 27, no CTIG, entre o primeiro trimestre de 1963 e o segundo semestre de 1965. Passou por Bissau, Olossato e Catió, aqui já a comandanr um Pel Art / BAC, obus 8.8 (a duas bocas de fogo).


O alf mil Maurício Saraiva,
nascido em Sá da Bandeira,
quando ainda frequentava
 o curso de comandos,
em Luanda, em 1963.
Foto de Virgínio Briote
(2015)
No CTIG era popularmente conhecido pelo seu nome artístico do fado, "Carvalhinho" (*) . O Mário Dias, o Manuel Luís Lomba, o Virgínio Briote são (ou ainda são) do seu tempo e rconhecem-no.  O Armor Pires Mota (ex-alf mil, CCAV 488/BCAV 490, Bissau, Ilha do Como, Jumbebem, 1963/65) também era do seu tempo (ligeiramente mais novo: jul 63/ ago 65). Era também amigo do então alferes  'comando' Maurício Saraiva, que será depois visita da sua casa, em Lisboa (foto à direita, em q963, quando frequentava, em Angola, o curso de comandos).De acordo com as as suas memórias de guerra, ao oitavo mês de Guiné, o Carvalho (ou "Carvalhinho") ainda estava no Olossato. E no excerto que passamos a reproduzir. preparava-se para fazer uma golpe de mão ao K .  
Por sua conta e risco, tanto quanto dá para perceber. (K, leia-se K3 / Saliquinhedim: 
Saliquinhedim ao Km 3 da estrada Farim-Mansabá, será ocupado mais tarde, no último trimestre de 1965, pela  CCaç 1421).

Na versão, digital, que nos facultou, em formato pdf,  das suas memórias de guerra, os topónimos da Giné aparecem só com as iniciais (como é o caso  de O, 
de Olossato). Não há nomes de militares.  Nem datas.  Esclarecimentos  e informações  complementares têm sido obtidas através das  nossas conversas na Praia da Areia Branca (onde reside atualmente).

Pelas nossas contas (e apenas com base dos livros da CECA), essa companhia para a qual ele terá ido, inicialmente, em rendição individual,  pode ter sido a CCAÇ 273 (mo
bilizada pelo BII 17, Angra do Heroísmo): esteve no CTIG desde janeiro de 1962 e acabou a comissão em janeiro de 1964. (Nessa altura, a comissão na Guiné era de 24 meses.)  

Sabe-se que a CCAÇ 273 teve um pelotão destacado no Olossato, por períodos variáveis, em 1963. Era comandada pelo cap inf Jerónimo Roseiro Botelho Gaspar.

Mas voltemos às memórias do Olossato, destacamento que ele vai reforçar,  dois meses depois de estar em Bissau, a fazer segurança a Bissalanca (de 3 em 3 dias) e patrulhamentos nos arredores.  

De acordo com o poste anterior, ele  tinha saído em coluna auto,  para uma missão na região do Cacheu, de que foi desviado, para o Olossato, ao chegar a Mansoa, por ordem do QG (**): 

(...) "O pelotão para aí destacado, não conseguia não só defender o povoado, como até impedir que o inimigo, encurralando-o de metralhadoras apontadas a cada porta do edifício do quartel, um antigo celeiro de amendoim rodeado de arame farpado a distância conveniente, se passeasse impunemente na aldeia, entrando nos dois estabelecimentos comerciais existentes, abastecendo-se do que bem entendia, em troca de requisições supostamente válidas, após ganha a guerra e exercendo junto da população civil branca ou africana as mais variadas formas de propaganda e intimidação.

"Após confirmar por rádio para o QG as ordens que acabara de receber, desviou a marcha no sentido da povoação de 
O[lossato] , entrando na região onde a guerrilha tinha começado a atuar recentemente e era constituída por um polígono com cerca de 120 kms de comprimento na sua maior dimensão e oitenta na outra , cuja principal estrada, que o atravessava em diagonal, estava obstruída por árvores derrubadas assim como todos os pontões e pequenas pontes já destruídas que atravessavam as linhas de água, que eram muitas em todo o território por ser este a foz dum rio importante, que se dividia por grandes e pequenos canais que se ligavam e entrelaçavam entre si." (...)

Portanto, quando chegou ao Olossato, com o seu pelotão, a "guerra subversiva" tinha começado na região do Oio. Estava-se já na época das chuvas. (E na sua terra, Lourinhã, estava-se em plena época balnear.) É uma narrativa, quase telegráfica, incisiva, "pura e dura", que me faz lembrar as crónicas do "Tarrafo",  o livro de 1965, do Armor Pires Mota, que também andou por aqueles lados (sector de Farim), além de ter estado na Ilha do Como (Op Tridente).



Guiné > Região do Oio > Carta de Farim (1954) > Escala 1/50 mil) > Pormenor: localização de Saliquinhedim / K3, entre o Olossato e Farim. (Não confundir com o verdadeiro Olossato, que fica a sudoeste de Farim, e que está localizado na carta de Binta.)



Guiné > Carta da Província (1961) (Escal: 1/500 mil) > Posição relativa do Olossato, em pleno coração da região do Oio... Do Olossato a K3 / Saliquinhedim eram c. 20 km por estrada. (A o
cupação de Saliquinhedim ao Km 3 da estrada Farim-Mansabá foi feitta pela  CCaç 1421 no final do ano de 1965.)

Infografias:  Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2024)



Memórias de um artilheiro (José Álvaro Carvalho, ex-alf mil, Pel Art / BAC, 8.8 cm, Bissau, Olossato e Catió, 1963/65) 

Parte II:   15 minutos, de ferro e fogo, no K3, em meados de 1963



Durante as sestas, depois do almoço , o sono era calmo e repousado. Mas agora era noite e não conseguia dormir.

− Eles aí estão,  meu Alferes!!!

Choviam tiros por todo o lado. As metralhadoras dos postos principais matraqueavam o mais que podiam à medida que aumentavam os pec-bum dos disparos contrários.

Pegou numa granada de mão e, curvado, correu para o posto mais próximo.

 
Deixem-nos vir!!!

As metralhadoras calaram-se. As palmeiras suavam humidade, indiferentes aos homens e aos ruídos da noite.

Ouviam-se rebentamentos ao longe.

  Estão a estoirar com os acessos!!!

Tinham medo que alguma ajuda fosse pedida, mas não corriam esse risco. À noite o teto de nuvens era tão baixo que o rádio só emitia ruídos.

Chamou o furriel mais próximo.

 
− Não quero mais tiros! Deixem-nos chegar à vedação e depois acendam as luzes exteriores e abram fogo de novo. Por cada tiro quero um homem ferido ou morto! Se se vão embora sem "levar na tromba",  amanhã estão cá de novo!

No dia seguinte:

− Encontrámos alguns rastos de sangue.

− Quantos?

− Quatro.

− Já não foi mau.

O sol a pique aquecia a humidade excessiva, para que as plantas vivessem prósperas, numa inundação de verdura que era preciso destruir diariamente, à volta do celeiro de amendoim, único edifício do aquartelamento.

Durante o dia, a carne dos homens ficava mole. Ainda bem que só havia ataques à noite.

Era a hora do rancho. Os quinze homens do pelotão desfalcado, os nove da secção que o reforçava e os quatro condutores juntaram-se à volta das panelas fumegantes na cozinha de campanha instalada ao fundo do edifício, para receberem a sua ração e irem em seguida para a mesa de refeições, num compartimento separado por divisórias de esteira com 2 metros de altura como todos os outros que formavam as instalações do pelotão.

O impedido aproximou-se:

−  Meu Alferes, o jantar está pronto.

Trazia-lhe a amostra: sopa de feijão, batatas com bacalhau, bolachas, café instantâneo e vinho.

Provou e disse:

 Está bom.

Sentado com os três furriéis à volta duma mesa de caixotes, aguardava em silêncio que o impedido lhe trouxesse a refeição, a pensar que o tempo nunca mais passava. 

Tinha tido 26 meses de serviço militar na metrópole e já estava em África havia oito meses.

O operador rádio trouxe-lhe uma mensagem cifrada do pelotão do alferes que comandava uma guarnição a Norte, a guarnição de B
 [Bigene],  que havia pouco tempo ali tinha estado a contar-lhe do almoço com o comandante da lancha patrulha do rio C[acheu]

Tinha-lhe dito que esse comandante era uma óptima pessoa, uma vez que,  mesmo sem o conhecer, tinha atracado a lancha no cais e convidara-o para um excelente almoço. 

Não lhe apeteceu dizer que aquele almoço se destinava a ele, conforme tinha sido previamente combinado mas não tivera oportunidade de informar o comandante da lancha do desvio que lhe fora imposto e da alteração das instruções do quartel-general.

Na referida mensagem indicava-se em pormenor todo o percurso dos guerrilheiros treinados num campo junto à fronteira do S
 [enegal]. que passavam na região Norte, atravessavam no rio junto à povoação de
K[3],  onde recebiam apoio logístico e seguiam depois por um trilho a corta-mato até à estrada que passava a alguns km do seu aquartelamento, entrando depois na zona que o inimigo pretendia dominar, lutando por ocupar e controlar um território que lhe parecia estrategicamente propício.

Depois do café disse aos furriéis :

− Vamos arrasar o 
K[3].

− Fica a 30 kms.

 Por isso não nos esperam.

Levantou-se da mesa e foi fumar um cigarro sentado do lado de fora do edifício. Não havia vento. O calor continuava a encharcar-lhe o corpo. Tinha anoitecido. As estrelas mal se descortinavam por entre a humidade do ar. Devia ser aí que habitavam as coisas certas e decentes. Dentro em pouco viria mais uma das repentinas trovoadas da época, a descarregar água por todo o lado, a inundar tudo.

Já deitado, pensava que com alguma sorte a operação correria bem. O 
K[3] era a passagem obrigatória dos abastecimentos e dos homens do inimigo, treinados junto à fronteira, que diariamente reforçavam os efectivos da região. Ali se devia esconder todo o apoio necessário à travessia do rio: canoas e barcos de borracha,  como dizia a mensagem cifrada. Nas palhotas da aldeia próxima, ouvia-se o choro de crianças assustadas.

***

Eram 4 horas da manhã. O sargento de ronda que o antecedia, foi acordá-lo:

− Meu alferes, está na hora.

Levantou-se cheio de sono, e acendeu um cigarro que apagou depois de saborear algumas fumaças com força. Deu a volta a todos os postos e parou por fim no último.

− Tudo bem?!

 
− Tudo bem, meu alferes.

Para lá do arame farpado pouco se via além do reflexo das poças de água onde centenas de rãs coaxavam no silêncio da noite. Sentou-se ao lado da sentinela a sacudir os mosquitos que lhe mordiam o corpo por cima do fato de combate.

Já no seu compartimento, estendeu-se na cama à espera do café.

Pensava nas praias da sua terra, naquela altura cheias de gente e sol e paz. Deu-lhe vontade de rir o facto da vida poder ser tão diferente.

O rádio, em escuta, fazia a zoada do costume. Ouviu o ruído dos homens a acordar e foi até à cozinha.

 Quer provar o café,  meu alferes?

 Não, obrigado.

Depois de comer chamou os 4 furriéis ao seu compartimento. Apontou um deles e disse:

 Você entra comigo no centro da aldeia.

Apontando outro disse:

 Você fica no aquartelamento.

Apontando os dois restantes disse:

 
− Vocês entram à direita e à esquerda. 100 balas a cada homem, quatro granadas de mão, uma ração de combate. Levantar às zero horas, partida à uma. Caras sujas com rolha queimada.

Apontou no mapa e disse:

 Seguimos por aqui a corta-mato durante cerca de 20 kms até onde se situa a estrada que conduz ao 
K[3].. Nesta altura estamos a 2 kms do objectivo. Seguimos a pé. Os carros estacionam escondidos. Os motoristas aguardam no máximo 8 horas pelo nosso regresso. Se não regressarmos ao fim desse tempo, voltam para o aquartelamento pela estrada. Se forem descobertos ou tiverem suspeitas disso regressam também de imediato. Se mandar retirar e dispersar, o local de reunião será sempre junto do estacionamento das viaturas mesmo depois destas terem partido. O ataque não pode demorar mais do que 15 minutos. Ao fim desse tempo retiramos à minha ordem. Se houver algum tiro prévio que nos denuncie, abandonamos o objetivo, dispersamos e retiramos para o ponto de reunião sem atacar. Vamos entrar de Este para Oeste,  destruindo tudo o que for útil ao apoio do inimigo.

Apontou um furriel e continuou :

 − O Furriel J, da 1ª secção que entra pela esquerda, vai passar no rio e com granadas de mão o seu pessoal, destrói todas as canoas assim como qualquer outro tipo de embarcação. A segunda secção dá-lhe apoio. Hoje à tarde quem não estiver de serviço deita-se e procura dormir. Podem retirar-se.   [...]

 Na madrugada seguinte, á saída da povoação  [do Olossato],  entraram no mato. As viaturas, ligadas entre si por correntes, roncavam no trilho enlameado estreito demais para elas. A vegetação rompia as capotas. Os homens seguiam em silêncio. O domínio do medo torcia-lhes as caras pintadas. De quando em quando era necessário que os guias indígenas procurassem melhores trilhos explorando o caminho mais à frente. e, em cada uma destas paragens, os soldados saltavam e escondiam-se no mato. Os motores ferviam. 

Ao fim de 3 horas, encontraram a estrada que levava a K[3]. Esconderam as viaturas e dentro em pouco os gritos da floresta tornaram-se normais. Caminhavam curvados, a um e outro lado da estrada em fila indiana, em silêncio. Parecia participarem num jogo de segredos fora do tempo, em que jogavam a vida.

A humidade diluía o suor, tornando-lhes o corpo peganhento, as roupas pesadas, repulsivas, a cara negra com riscas brancas. Pousavam os pés no chão com todo o cuidado, e investigavam com os olhos, reflexos e sombras. Sabiam bem o que os podia denunciar. 

Há mais de 1 ano que andavam metidos naquelas andanças. Agora davam mais importância  vida, porque a morte, na guerra é sempre uma derrota.

 [Ele, o alf Carvalho], seguia à frente com os guias. Em cada curva do caminho levava dois homens e avançava algumas dezenas de metros. Só depois o resto do pelotão avançava.

A terra exalava humidade e calor. Os mosquitos não os largavam há muito. Zumbido enlouquecedor,  ávido de sangue quente.

Perto da aldeia, abandonaram a estrada e redobraram as cautelas. O céu, com rasgos de luz menos escura, anunciava os sons da manhã.

Progrediam agora a dois e dois, de abrigo em abrigo. A alguns metros das primeiras cubatas, sentada no chão e encostada a um tronco velho, a primeira sentinela dormitava. Foi engolida em silêncio pelas facas de dois soldados.

Alguns cães ladraram. Farejavam sarilho. Rebentou a primeira granada. Daí em diante foram sombras vertiginosas, respirações de morte, ferro e fogo, gritos, ferro e fogo, confusão, instantes infernais, ferro e fogo, palavrões, guinchos, ferro e fogo, gemidos, correrias, aflições, ferro e fogo, e cubatas a arder reflectidas na água mole e suja do rio e tiros, tiros e explosões.

Veio depois o silêncio da retirada dispersa e rápida, corrida louca para o ponto de encontro junto das viaturas, com tiros ocasionais a persegui-los. Contou os homens já com os motores em marcha. Estavam todos. Regressaram.

***

Levantou-se. Tomou o pequeno almoço e foi passear pela povoação.

 
− Bum dia, noss' alfero.

As poucas casas dispostas dos dois lados da estrada faziam-lhe lembrar a aldeia onde tinha nascido.

O inimigo lutava o mais que podia para arranjar simpatizantes e para isso não molestava a população civil,  branca ou negra. Só em ultimo caso empregava a força.

Homens e mulheres faziam a sua vida de todos os dias como se nada houvesse, mas,  por de trás dos olhos de cada um, lá estava o terror, a duvida, a ansiedade, a insegurança da hora seguinte. Os nervos tensos à espera do mínimo sinal para fugir, recolher ao abrigo possível.

Depois da sesta da tarde, verificou a situação de todas as medidas defensivas instaladas. Esperava uma represália. Passou o resto da tarde a estudar a forma de melhorar as defesas existentes e implementar métodos de ataque em situação de fogo como sair do aquartelamento através de trincheiras etc.

A noite adivinhava-se pesada, escura, trovejante, desagradável. São estas noites que escondem medos e vergonhas, disfarces e desumanidades. Mas não são noites de guerra, porque a falta de claridade dificulta os movimentos.

Pensava em tudo isto depois de dar ordem de prevenção, e se encostar solitário junto ao abrigo duma sentinela.

Estava tudo a postos para mais um jogo de morte.

O pequeno Unimog blindado com chapas de bidão endireitadas, tinha a traseira encostada à porta principal do celeiro de amendoim que servia de aquartelamento. 

Junto a esta porta, o piso do edifício era sobrelevado em relação ao chão cerca de 1,2 metros, a fim de permitir o carregamento fácil dos camions de transporte que em tempo aí se abasteciam.

A corda amarrada ao “cavalo” de arame farpado que na vedação servia de porta, estava estendida no terreiro e entrava no interior do edifício de modo a que daqui, puxando-a,  se desobstruísse a entrada e o Unimog pudesse sair.

As metralhadoras das duas portas foram abastecidas com mais caixas de munições. Os dois morteiros, um atrás e outro à frente,  entrincheirados também.

Fora enviado para ali porque o destacamento anterior tinha sido várias vezes encurralado no aquartelamento com fogo cruzado inimigo que,  após enfiar uma metralhadora a cada porta, se passeava no povoado abastecendo-se nos estabelecimentos existentes, a troco de improvisadas requisições supostamente válidas, alardeando o seu poder e exibindo a sua melhor propaganda.

Tinha esperança de que com o seu pelotão isso nunca acontecesse.

Todas as máquinas de guerra do destacamento luziam limpas e oleadas, possivelmente satisfeitas por poderem vomitar fogo tão frequentemente. Tinham-nas feito para isso.

(Continua)

(Seleção, revisão / fixação de texto, itálicos e negritos, parênteses retos: LG)
_____________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de  
26 de junho de  2024 > Guiné 61/74 - P25684: Tabanca Grande (560): José Álvaro Almeida de Carvalho, ex-alf mil art, Pel Art / BAC, obus 8.8 m/943 (1963/65) , adido 14 meses ao BCAÇ 619 (Catió, 1964/66): senta-se no lugar nº 890, à sombra do nosso poilão

quarta-feira, 26 de junho de 2024

Guiné 61/74 - P25684: Tabanca Grande (560): José Álvaro Almeida de Carvalho, ex-alf mil art, Pel Art / BAC, obus 8.8 m/943 (1963/65) , adido 14 meses ao BCAÇ 619 (Catió, 1964/66): senta-se no lugar nº 890, à sombra do nosso poilão


Angola > Ponte do rio Cuanza (em contrução) > c. 1970/73 > O José Àlvaro Almeida de Carvalho, diretor do departamento de trabalhos externos da empresa L. Dargent Lda. Aqui ainda no início da montagem do tabuleiro da ponte...



Angola > Ponte do rio Cuanza (em contrução) > 25 de dezembro de 1973  >

Fotos: © José Álvaro Carvalho (2024). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Conheço o José Álvaro Almeida de Carvalho, da Lourinhã, é meu conterrâneo, cantor, autor de fados (pelo menos uns 26...) e exímio tocador de guitarra. 

Durante muito tempo tocou numa velha casa de fados, o "Cantinho da Amizade",  escondida, ali na Rua da Cruz da Carreira, 38, na colina de Santana, ali perto do Campo dos Mártires da Pátria. (Vd. aqui página no Facebook)

Quadro técnico superior, com uma larga experiência no setor da metalomecânica pesada, reformado, vive na Praia da Areia Branca. Aos fins de semana, encontramo-nos no VIGIA - Grupo dos Amigos da Praia da Areia Branca. Conversa puxa conversa, vim a saber que tinha também estado na Guiné, em 1963/65, tendo passado por Bissau, Olossato, Catió e Ilha do Como (tendo inclusive participado na Op Tridente, dando apoio de artilharia).

Com os seus 85 anos (n. 1939), tem uma ótima cabeça e é grande contador de histórias. É uma apaixonado pela vida. E tem um riquíssima história de vida, que gosta de partilhar com os outros.

Por outro lado, ele também em comum comigo o conhecimento de Angola, onde viveu e trabalhou. Estava lá quando se deu o 25 de Abril. A sua empresa, a L. Dargent Lda, de que  o Zé Álvaro era diretor do departamento de trabalhos exteriores, fez a montagem da superestrutura metálica e cabos de suspensão da ponte na foz do Rio Cuanza em Angola.

A ponte do rio Cuanza (que alguns angolanos grafam como Kwanza), perto da foz, e que servia de ligação entre os antigos distritos (hoje províncias) de Luanda e Bengo, foi construída entre 1970 e 1973. O projeto é do eng. Edgar Cardoso. Fica a 75 km da capital.

Construída em aço e betão, esta ponte também conhecida como a ponte da Barra do Cuanza, tem em 400 metros de tabuleiro com 47 metros de altura, dois vãos externos de 70 metros e outro com 260 metros. O dono da obra na altura era a Junta Autónoma de Estradas de Portugal (JAEP).

O Zé Álvaro viveu, então, com a família (esposa e duas filhas), em Luanda no bairro da Sagrada Família, enquanto decorreu a obra (os trabalhos da empresa foram dados por comcluídos em março de 1974). 

Pouco tempo depois do 25 de Abril voltou a Lisboa. Continuou a ir a Angola, sempre que era preciso... Entretanto, conheceu outras empresas, a começar pela Sorefame: é, por isso, um ator e uma testemunha privilegiada das grandezas e misérias da nossa indústria metalomecânica pesada, cujas empresas, muitas delas, se afundaram com o pós-25 de Abril, as mudanças económicas, sociais e políticas operadas, a par da crise financeira, bem como da descolonização e, depois, com a entrada na Comunidade Económica Europeia (CEE), já em1986...

Com Angola, a Guiné, o fado... e a história do trabalho e da indústria, como interesses em comum, temos sempre tema de conversa, enquanto passamos tardes agradáveis na varanda do VIGIA, que é reconhecidaente umas das mais fantásticas para se assistir a um pôr do sol sobre o Atântico: tem uma vista de 180 graus, do cabo Carvoeiro e Berlengas a norte/noroeste, e Santa Cruz, a sul...

2. O que eu não sabia é que o Zé Álvaro também era um talentoso escritor, tendo inclusive já publicado, em 2019, na Chiado Books, um livro autobiográfico ficcionado, o "Livro de C" (710 pp.), disponível em papel e em ebook. É um livro difícil de catalogar, logo à primeira leitura... A editora classificou-o como "não ficção".

O autor cedeu-me uma com cópia digital do manuscrito, que consta de duas partes. Trata-se de uma nova versão, aumentada, revista e melhorada.

O autor é o José Carvalho, o título mantém-se o mesmo, Livro de C. Em formato pdf, está dividido em dois volumes: volume 1 (328 pp) e volume 2 (357 pp.).  É um livro com múltiplas narrativas, desfasadas no tempo e no espaço. A separá-las, o autor teve a ideia de inserir fados em formato mp3, e acompanhados com a respetivas letra. 

Diz ele: cada volume é "reconstruído com alguns fados gravados, ao longo da vida, aqui inseridos como separadores e ornamento de narrativa".  Parte das letras (e algumas músicas) são  da sua autoria. Teremos ocasião de voltar a falar deste projeto singular, original, onde há lugar também para as memórias de guerra.

O Zé Álvaro aceitou o meu convite para integrar a nossa Tabanca Grande e autorizou-me a reproduzir excertos do seu manuscrito, entretanto, revisto e aumentado. (Não conheço o livro em papel, mas ele vai-se oferecer um exemplar, autografado.)

Falaremos mais, oportunamente, sobre este projeto literário  e o autor. C (inicial de Carvalho) era a letra do alfabeto pelo qual o pai, comerciante, o tratava. "Livro de C" tem, pois, um cunho marcadamente autobiográfico. Mas o livro é mais do que isso.



Foto nº 1


Foto nº 2

Guiné > s/l > s/d > c- 1963/65 > Fotos, sem legenda, do ex-alf mil art, José Álvaro Almeida de Carvalho, BCAC, Pel Art obus 8.8, m/943, que esteve 14 meses adido ao BCAÇ 619 (Catió, 1964/66). Em Catió, seguramenyte que conheceu o João Sacôto, da CCAÇ 617/BCAÇ 619 (Catió, Ilha do Como, Cachil, 1964/66).


Fotos: © José Álvaro Carvalho (2024). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


3. O José Álvaro Almeida de Carvalho foi alferes miliciano de artilharia, pertenceu ao BAC (1963/65), esteve na Guiné, adido ao BCAÇ 619 (14 meses em Catió). Mas, antes, em Bissau também pertenceu a uma companhia de intervenção, de que comandava um pelotão, operando em Bissau e arredores. Esteve destacado no Olossato, com o seu pelotão de infantaria.  (E fez um assalto ao K3!).

Veio originalmente em rendição individual. Quando essa companhia de caçadores, acabou a comissão, o Zé Álvaro ficou no QT, em Bissau, a aguardar nova colocação. 

Sei que, nessa altura,  também pensou em oferecer-se para os comandos do CTIG, conheceu o Saraiva e o Godinho, do tempo do nosso Virgínio Briote. É possível até que tenham estado juntos, o Briote e o Carvalho.

Mas foi no sul, na região de Tombali, em Catió, como oficial de artilharia do BAC (Bateria de Artilharia de Campanha, obus 8.8 cm m/943) que ganhou a sua cruz de guerra de 3ª classe. (Curiosamente, o seu primo direito, meu conterrâneio, vizinho e amigo de infância, João Patrício, viria a ser  colocado em Catió, dez anos depois, como alf mil, CCS/BCAÇ 4510/72, jun72/jul74)(um batalhão que só tinha comando e CCS, não dispunha de subuniddaes operacionais orgânicas).

Cruz de Guerra, 3ª Classe Alferes Miliciano de Artilharia JOSÉ ÁLVARO ALMEIDA DE CARVALHO | BAC | GUINÉ

Transcrição da Portaria publicada na O.E. Nº 15 - 2ª série, de 1965.

Por Portaria de 29 de Maio de 1965:

Condecorado com a Cruz de Guerra de 3ª classe, ao abrigo dos artigos 9º e 10º do Regulamento da Medalha Militar, de 28 de Maio de 1946, por serviços prestados em acções de combate na Província da Guiné Portuguesa, o Alferes Miliciano de Artilharia, José Álvaro Almeida de Carvalho, do Quartel-General do Comando Territorial Independente da Guiné.

Transcrição do louvor que originou a condecoração. (Publicado na OS nº 42, de 21 de Maio de 1965, do CTIG):

Louvo o Alferes Miliciano de Artilharia, José Álvaro Almeida de Carvalho, da BAC, porque, durante o período de catorze meses em que esteve destacado no Batalhão de Caçadores nº 619, foi sempre um Oficial zeloso, dedicado e muito competente, salientado-se a sua acção, principalmente, no campo operacional, em que foi utilíssimo o apoio, sempre eficaz, que soube dar com o seu pelotão em todas as operações em que interveio, nomeadamente, nas "Tridente", "Broca", "Macaco", "Tornado" e "Remate", contribuindo assim, dentro do seu âmbito, para o prestígio da Arma a que pertence.

Várias vezes se ofereceu para acompanhar o pessoal infante em operações, deslocando-se às zonas de contacto, para assim ver, "in loco", novas posições para as suas bocas de fogo, demonstrando a sua nobreza de carácter, a sua coragem e o desprezo pelo perigo.

Contribuiu imenso e com o seu pessoal, nunca se poupando a esforços, para o aperfeiçoamento dos trabalhos de organização do terreno e defesa do aquartelamento.

Pelas qualidades apontadas, este Oficial tornou-se digno de apreço e estima dos seus superiores e subordinados.

Excertos de Portugal. Estado-Maior do Exército. Comissão para o Estudo das Campanhas de África, 1961-1974 [CECA] - Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África (1961-1974). 5.° volume: Condecorações Militares Atribuídas, Tomo II: Cruz de Guerra (1962-1965). Lisboa, 1991, pág. 475.


4. Finalmente, e embora nos falte uma foto mais atual, e legendas para as fotos do seu álbum (que é diminuto), eu quero apresentar o José Álvaro Carvalho como o grão-tabanqueiro nº 890. É o seu lugar, sentado, à sombra do nosso poilão. 

Passa a ser mais um dos n0ssos "veteraníssimos", um dos poucos (com o Mário Dias e o João Sacôto, por exemplo) que participou na Op Tridente (jan / mar 1964).

sábado, 18 de maio de 2024

Guiné 61/74 - P25538: O Cancioneiro da Nossa Guerra (20): Nemíades e bolanhíades, as "ninfas" ao estilo camoniano imaginadas pelos "Cobras" da CCAÇ 2549 (Cuntima, Nema e K3 Farim, 1969/71), do ex-cap inf Vasco Lourenço


Capa do livro de Vasco Lourenço - N6o regressso vinham todos: relato da Companhia nº 2549. Lisboa: Editorial Notícias, 1997, 103 pp.  (1ª edição, 1975) (A guerra colonial em livros, 3). (*)


1. Não
 temos muitas referências à CCAÇ 2549 (Cuntima, Nema e K3, 1969/71): apenas 15. O que se explica por uma razão: não temos nenhum representante dessa subunidade do BCAÇ 2879 (Farim, 1969/71) na nossa Tabanca Grande. O seu comandante, o então  cap inf Vasco Lourenço  (**) e uma das figuras mais conhecidas do MAF (Movimento das Forças Armadas),  tem também apens 26 referências.

Uma dos primeiros livros a sair ao 25 de Abril de 1974 com testemunhos da experiência da  guerra colonial foi justamente o "No regresso vinham todos":  o ex-cap Vasco Lourenço dá a cara, o livro tem o contributo de outros graduados:

  • alf mil Ferreira (Manuel do Carmo Ferreira)
  • alf mil Carvalho (Luís Fernando da Silva Carvalho)
  • alf mil Sampaio (João Borges Frias Sampaio)
  • fur mil Leonel
  • fur mil Paulo (Armindo Aníbal Pinto da Costa Paulo)
  • fur mil Brotas (Francisco António Brotas)
  • fur mil Mano Nunes (António Manuel Mano Nunes)

O mais representado nas 103 páginas do livro é o ex-alf mil Ferreira, de seu nome completo Manuel do Carmo Ferreira (**). E é da sua autoria,  as estrofes que a seguir se reproduzem e que são uma paródia, inspirada nos nossos "Lusíadas", do Luís de Camões. Destaque para as figuras mitológicas criadas pelo Ferreira: as "nemíadas" (referência a Nema, nos arredores de Farim) e as "bolanhíadas" (de "bolanha)... (Ou sejam: as "ninfas" de Nema e das bolanhas...) .O tom, poético-burlesco, é o de outras letras "parodiadas", em que se exaltam os "perigos" e "trabalhos esforçados" e se anseia pelo regresso a casa. 

O Ferreira é decidifdamente nortenho pelo uso da variante regional "désteis" e "fizésteis" (2º pessoa do plural do pretérito perfeito dos verbos "dar" e "fazer").


Nemíadas

Da piriquitagem afastada,
Se narra com verdades e conscicência
A vida triste desventurada
Dos heróis da paciência;
Como à força de tanta calcadela
Perdendo a malta a potência,
Fugiu de Cuntima que alto berra:
Pobre Companhia, quem te desterra ?

E vós, bolanhíadas minhas,
Que às pernas energia tirais,
Ajudai-me a preencher estas linha
Com umas verdades cruais, reais;
Deixemos de lado as queixinhas,
Sejamos connosco sicneros, leais,
Diagmos a verdade. Nada nos demove...
Falemos dos lixados da 49!!!

De Cuntima connosco veio
A má sina o esgotamento;
O trabalho não encontra freio
Ao mirarmos o novo aquartelamento,
E monumentos tão cheio,
Que as obras têm seguimento.
É operacional ? É de Engenhria )
ão, é construtora. É de Infantaria...

Do outro lado que a distância cala
Nos destinam ruinas em montão;
E vê-lo se estremece, se perde a fala,
Nos pôem em mãos um trabalhão;
E o que mais nos irrita, nos abala,
Era saber só em Cuntima a inspeção.
É mesmo de encarar este desmando:
Como é possível tão perto do comando ?

Há tanta coisa p'ra fazer
Nesta vila tão trópica, tão pacata
Que a Compnhia tem de  oferecer
Quatro diáras para arranjar a sucata,
Mas mais tarde vão verde
Os ditos que lançará a malta
- Vós,  da 49, que ajuda désteis ?
Nada tendes a dizer, nada fizesteis...

Narro agora as colunas, narro as picadas,
De uma companhia tão lixadsa
Que durantte um ano só viu emboascadas,
Sonhou vida mais regalada;
Que gramou constantes chuvasdas
E ferradelas da atroz mosquitada.
Que, matando a febre de Sitató,
Foi pilhada na bolsa de Faringó.

Meses de tragalho e esgotamento
Ficam lembrados neste papel;
De Cuntima, o reordenamento,
Em Nema, emboscando Lamel.
Que mais teremos de tormento ?
Qual será o róximo pimcel ?
Deixemos a roleta rodar,
Até quando podem as forças durar ?

Trista sina nos fazem acarretar
Não lobrigo a vida folgada:
A Companhia continua a penar,
Há sempre mais trapalhada.
Quando acabaremos de emboscar
Essa maldita carreirada ?
Estou a ver isto tantas vezes
Que penso só daqui a nove ou dez meses...

Depois de tantaas fornicadelas,
Há de vir por força a bonança,
E então firmes nas canelas
Acabará para todos a estafança;
E em copos afogaremos todas elas
Quando deixarmos esta matança.
E a caminho da nossa terra
Gritaremos: camaradas,  acabou a guerra! (***)

Alferes miliciano Ferreira (Manuel do Carmo Ferreira) (****)

(Revisão  /  fixação de texto: LG)


(Foto à esquerda: o nosso camarada Manuel do Carmo Ferreira, ainda cadete em Mafra, c. 1968; cortesia de Carlos Silva,  poste P2525)





2. Ficha de unidade  CCAÇ 2549 / BCAÇ 2879

Identificação; BCaç 2879
Unidade Mob: RI 2 - Abrantes
Cmdt: TCor Inf Manuel Agostinho Ferreira | TCor Inf António José Ribeiro | TCor Inf Carlos Frederico Lopes da Rocha Peixoto
2.° Cmdt: Maj Inf Alexandre Augusto Durão Lopes
OInfOp/Adj: Maj Inf Lourenço Calisto Aires

Cmdts Comp:
CCS: Cap SGE Manuel Landeiro | Cap Mil Art José Manuel Lopes do Nascimento
CCaç 2547: Cap Mil Art José Fernando Covas Lima de Carvalho |! Cap Mil Art João José Pires de Almeida Loureiro
CCaç 2548: Cap Mil Inf Luís Fernando da Fonseca Sobral
CCaç 2549: Cap Inf Vasco Correia Lourenço
Divisa: -
Partida: Embarque em 19ju169; desembarque em 25Jul69 | Regresso: Embarque em 26jn71

Síntese da Atividade Operacional

Em 4ago69, substituindo o COP 3, assumiu a responsabilidade do Sector O2 (Oeste Dois), novamente transferido para esta zona de acção, com a sede em Farim e abrangendo os subsectores de Cuntima, Jumbembém, Canjambari e Farim. 

Em 25abr71, foi incluída na zona de acção do sector a área do destacamento de Binta, transferida do COP 3. As suas subunidades mantiveram-se sempre integradas no dispositivo e manobra do batalhão.

Desenvolveu intensa actividade operacional, particularmente orientada para a contrapenetração nas linhas de infiltração de Lamel e Sitató, para a segurança e controlo dos itinerários, para impedir a instalação de bases inimigas na sua zona de acção e ainda para a segurança, defesa e construção de aldeamentos e promoção socioeconómica das populações.

Pelos resultados obtidos e pela acção continuada de contrapenetração, destacam-se as operações "Camélia", "Caminhos Detidos", "Barragem Contínua" e "Corvina", entre outras.

Do armamento capturado mais significativo, salienta-se: 2 canhões sem recuo, 6 metralhadoras ligeiras, 43 pistolas-metralhadoras, 25 espingardas, 3 LGFog, 660 granadas de armas pesadas e mais de 155 mil munições.

***

A CCaç 2549 seguiu em 30jul69 para Cuntima, a fim de efectuar o treino operacional e render a CCaç 1789, assumindo a responsabilidade do respectivo subsector em 4ag069 e ficando integrada no dispositivo e manobra do seu batalhão.

Em 17Ju170, por troca com a CCaç 2547, foi colocada em Farim, com um pelotão destacado em Saliquinhedim /K3, assumindo a responsabilidade do respectivo subsector e colaborando também no esforço de contrapenetração no corredor de Lamel.

Em 12jun71, foi rendida pela CArt 3358 e recolheu seguidamente a Bissau, a fim de efectuar o embarque de regresso.

Observações - Tem História da Unidade (Caixa n." 110 - 2ª Div/4ª Sec, do AHM).

Fonte: Excertos de Portugal. Estado-Maior do Exército. Comissão para o Estudo das Campanhas de África, 1961-1974 [CECA] - Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África (1961-1974). 7.º volume: Fichas das Unidades. Tomo II: Guiné. Lisboa: 2002, pp. 127/129.

Sobre Cuntima, ver a carta de Carolina do Norte (1956), escala 1/50 mil
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Notas de  leitura:


(***) Último poste da série > 17 de maio de 2024 > Guiné 61/74 - P25535: O Cancioneiro da Nossa Guerra (19): O "soneto do artilheiro" (17º Pel Art + CCAÇ 6, Bedanda, 1971/73)

domingo, 9 de abril de 2023

Guiné 61/74 - P24212: Fotos à procura de... uma legenda (174): Legendas para as fotos do Ramadão de 1971, na tabanca de Saliquinhedim (K3) (José Carvalho, ex-Alf Mil Inf / Cherno Baldé)

1. O nosso amigo Cherno Baldé prontamente respondeu ao nosso pedido de legendar as fotos que o camarada José Carvalho nos enviou, e que foram publicadas no poste P24207.
O nosso obrigado a ambos.
Ficam agora devidamente ordenadas e legendadas:


Foto 1 - Chegada e antes do início da reza que se inicia com a chegada do Imame acompanhado dos seus discíplos. O grupo deve posicionar-se de acordo com as regras da tradição islâmica, os mais doutos, com maior idade e experiência ficam a frente, junto do Imame. A lógica é simples, nenhum humano é perfeito e infalível, em caso de evidentes falhas ou impossibilidade, deve-se substituir o Imame sem interromper o ritual da reza. A seguir vem o grupo dos mais novos, mulheres e crianças.
Foto 2 - Após a chegada do Imame, dá-se início a reza com a leitura, pelo Imame, de alguns Surats do sagrado Corão, como recomenda a Sunna (prática) do Profeta do Islão, em fileiras unidas e bem compactas, fazendo lembrar o período conturbado do início do Islão no meio de rivalidades, guerras, traições e assassinatos, sobretudo no período que se seguiu a morte do Profeta em Medina.
Foto  3 - Após a leitura dos Surats, os participantes inclinam-se para a sua frente, imitando o Imame, em sinal de submissão e devoção a Alláh, o todo poderoso e misericordioso.
Foto  4 - A seguir à inclinação, o grupo levanta-se ao mesmo tempo para de seguida se prosternar, e com a testa no chão, numa postura de total submissão e devoção a Alláh e ao seu Profeta.
Foto 5
Foto 6
Foto 7
Foto 8
Fotos 5 a 8 A - Na parte final da reza tem lugar o que chamam de "Cutuba" ou Sermão com a participação de um grupo seleto de discíplos e pessoas dedicadas a causa da religião na comunidade, todos do sexo masculino, durante o qual é revisitada a longa história do Islão dos primórdios a actualidade, incluindo partes do periodo Judaico e dos textos do antigo testamento do Cristianismo com particular destaque as peripécias do antes, durante e após a fuga dos Hebreus do Egipto e a épica ou mitológica travessia do mar vermelho com o Profeta Moísés (Mussa para os Árabes) a frente da nação rumo ao deserto do Sinaí e que culmina com a vida e obra do Profeta Muahammad.
Esta parte é a mais importante, mas também é a mais monótona e menos interessante para a rapaziada que já está com os sentidos voltados para as comidinhas que, entretanto, estariam a preparar em casa de maneiras que, não raras vezes, só ficam os mais velhos a acompanhar esta longa narrativa prenhe de recomendações dogmáticas sobre a religião, a vida em comum e a necessidade e fundamentos da preservação dos ensinamentos e da tradição islámicas, a bem da comunidade.

Fotos: © José Carvalho, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 2753
Legendagem: Cherno Baldé

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Nota do editor

Vd. poste de 7 DE ABRIL DE 2023 > Guiné 61/74 - P24207: Fotos à procura de... uma legenda (173): O Ramadão de 1971 na tabanca de Saliquinhedim (K3) (José Carvalho, ex-Alf Mil Inf)

sexta-feira, 7 de abril de 2023

Guiné 61/74 - P24207: Fotos à procura de... uma legenda (173): O Ramadão de 1971 na tabanca de Saliquinhedim (K3) (José Carvalho, ex-Alf Mil Inf)

1. Mensagem do nosso camarada José Carvalho, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 2753 (Brá, Bironque, Madina Fula, Saliquinhedim e Mansabá, 1970/72), com data de 20 de Fevereiro de 2023:

Caríssimos Luís Graça e Carlos Vinhal

Formulo votos de boa saúde.

Decorrendo o Ramadão, lembrei-me que no meu baú das memórias da nossa Guiné, existiam diapositivos sobre este período, celebrado pelos povos muçulmanos.

Estas fotos foram tiradas em Saliquinhedim (K3) no ano de 1971.

Na altura e mesmo agora os meus conhecimentos sobre o Ramadão são muito escassos, pelo que a sequência das fotos é perfeitamente intuitiva.

Assim, envio-vos estas fotos para se entenderem que se revela interessante a sua publicação, até com eventuais acréscimos de comentários de entendidos no assunto, fica à vossa consideração.

Desejo-vos uma Boa Páscoa.

Abraço,
José Carvalho


Foto 1
Foto 2
Foto 3
Foto 4
Foto 5
Foto 6
Foto 7
Foto 8
Foto 8A

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Comentário do editor:

Talvez o nosso amigo Cherno Baldé, especialista em assuntos étnico-linguísticos da Guiné-Bissau, nos possa legendar as fotos quanto aos momentos de oração aqui retratados, especialmente o momento da foto 8A.

Fotos: © José Carvalho, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 2753

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Nota do editor

Último poste da série de 2 DE ABRIL DE 2023 > Guiné 61/74 - P24185: Fotos à procura de...uma legenda (172): Ainda a tragédia do Quirafo, de 17 de abril de 1972: comparando as fotos da GMC destruída, de 2005 (Paulo / João Santiago) e de 2010 (Rogério Paupério / José António Sousa)

quarta-feira, 29 de março de 2023

Guiné 61/74 - P24174: In Memoriam (474): Domingos Miranda (1947 - 2023), ex-fur mil op esp, CCAÇ 2549, comandada pelo cap inf Vasco Lourenço (Cuntima e Farim, 1969/71)... Funeral, hoje, dia 29/3/2023, pelas 16h00, em Torres Vedras (Eduardo Estrela)






1. Mensagem do nosso amigo e camarada Eduardo Estrela (ex-fur mil at inf, CCAÇ 14, Cuntima e Farim, 1969/71; vive em Cacela Velha, a jóia da Ria Formosa, cantada por Sophia):

Data - 27 mar 2023, 13:49

Assunto - Mais um companheiro que parte

Boa tarde, Luís!

Acabo de receber a triste notícia do falecimento do camarada Domingos Miranda, através do seu filho Bruno Miranda.

O Domingos Miranda era o fur mil op esp da CCAÇ 2549/BCAÇ 2879 (Cuntima e Farim, 1969/71). comandada pelo cap inf Vasco Lourenço.

Estivemos juntos em Cuntima e, quando o meu grupo de combate reforçou a 2549 em Dezembro de 1970, era na cama dele que eu dormia dado o facto do grupo dele estar no K3 na margem esquerda do Cacheu.

Julgo que será justo prestarmos a um homem que deixou na Guiné dois bons anos da sua juventude, uma última homenagem, agradecendo eu desde já e em nome da família aos camaradas que possam estar presentes na despedida.(*)

Abraço fraterno e desejos, para ti, de continuadas melhoras.

Eduardo Estrela


 
Guiné-Bissau  > Região do Oio >  Farim > Nema > 2014 > Antigo quartel das NT, por onde passou a CCAÇ 2549. ["O monumento de Nema é da CCaç 2549 e tem lá o nome inscrito do seu comandante que deu o nome ao estádio que fica por trás: Vasco Correia Lourenço e muito mais. Basta consultar os postes que escrevi sobre o BCAÇ 2879". Legenda de Carlos Silva] (**)

Foto (e legenda): © Patrício Ribeiro (2014). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]
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Notas do editor:

(*) Último poste da série > 26 de fevereiro de 2023 > Guiné 61/74 - P24100: In Memoriam (473): António Cunha (Tony) (c. 1950 - c. 2022), ex-fur mil enf, 38ª CCmds, HM 241, CCS/BCAÇ 4514/72, e CCAÇ 6 (Bissau, Mansoa, Bolama e Bedanda, 1972/74): vivia nos EUA há mais de 40 anos (João Crisóstomo, Nova Iorque)


(**) Vd. poste de 17 de dezembro de 2014 > Guiné 63/74 - P14042: Memória dos lugares (278): Antigos quarteis de Farim e Nema (Patrício Ribeiro, sócio-gerente da Impar Lda)