sábado, 20 de junho de 2009

Guiné 63/74 - P4554: Blogoterapia (109): O que leva 130 a reunirem-se hoje, em Ortigosa, Monte Real, no encontro nacional de um blogue ? (Luís Graça)

Já pela madrugada dentro, em Leiria, onde jantei com amigos, abro o meu portátil e vejo que o número de inscritos no IV Encontro Nacional do Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné já atingiu os 130. E que pelo menos houve uns 22 que gostariam de poder vir mas não podem, por conflito de agenda... E que o último camarada a inscrever-se foi o Manuel Amante da Rosa (*), diplomata caboverdiano a trabalhar em Macau e que de momento está de passagem por Lisboa...

Deixem-me começar por dar as boas vindas, ao Manuel Amante e a todos os demais camaradas que se inscreveram no encontro anual do nosso blogue pela primeira vez. Uma saudação especial, naturalmente, é devida a todos aqueles que estão cá este ano e àqueles que nunca falharam nenhuma edição anterior (Ameira-Montemor o Novo, 2006; Pombal, 2007; Ortigosa, Monte Real, 2008).

Um saudação especialíssima é devida ao Paulo Raposo (foto à esquerda) e ao Vitor Junqueira (foto à direita) que realizaram o I e o II Encontros, respectivamente, e que este ano não estarão, fisicamente, junto de nós... (Paulo e Vitor: vocês são já senadores na nossa Tabanca Grande, com aquele estatuto de privilégio de quem pode entrar e sair em qualquer altura sem pedir licença a ninguém... mas vamos ter saudades vossas).

Não é o número que me surpreende e me sensibiliza. Os inscritos podiam aliás ser muito menos ou até muito mais. O que me interpela é o facto de 130 pessoas, dos mais diversos pontos do país (de Trás os Montes aos Açores) quererem estar juntas, almoçar, conviver, conhecer-se (a maior parte, pela primeira), a pretexto de um blogue...

Para já, eu não sei nem não quero dar a resposta à pergunta, formulada no título ou subtítulo deste poste... Ou como logo me dirá o Torcato Mendonça, que vem do Fundão (com memórias de Mansambo...), mais a sua Ana, a resposta é "fácil e longa"... Isto é, a resposta é um paradoxo!!!

Quanto ao Embaixador Manuel Amante da Rosa (vd. foto ao lado) , queria só informar os nossos camaradas e amigos, que ele é actualmente secretário-geral adjunto do Fórum para a Cooperação Económica dos países lusófonos com a China, e está em Macau.

Nasceu em Bissau a 19 de Dezembro de 1952. O pai era proprietário de uma ou mais embarcações, civis, que faziam o percurso do Rio Geba, de Bissau até Bambadinca (ou mesmo Bafatá). Foi militar (1973/74), do recrutamento local, no CIM de Bolama onde fiz a recruta e especialidade antes de ser colocado no QG (Chefia dos Serviços de Intendência) em Bissau.

Graduado pela Academia Diplomática Brasileira –Instituto do Rio Branco – (1977/80), foi (i) embaixador de Cabo Verde em Angola, Moçambique, S. Tomé e Príncipe, Namíbia, Zâmbia e Zimbabwe, (ii) observador Internacional da OUA no processo de democratização na República da África do Sul (1993-1994),(iii) encarregado de Negócios junto do Governo da ex-URSS, (iv) membro da Missão Permanente de Cabo Verde junto das Nações Unidas em New York, (v) Delegado de Cabo Verde na Segunda Comissão da Assembleia Geral, entre muitas outras funções ou cargos...

Até mais logo, camaradas. São horas de ir escansar um pouco. L.G.

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Nota de L.G.:

(*) Vd. de 27 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1787: Embaixador Manuel Amante (Cabo Verde): Por esse Rio Geba acima...

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Lista dos 130 magníficos... tabanqueiros e convidados inscritos para o IV Encontro Nacional

Abel Rei e Maria Elisete (Marinha Grande)
Agostinho Carreira Gaspar (Leiria)
Alberto Branquinho (Lisboa)
Alberto Bártolo (Almada)
Álvaro Basto e Fernanda (Leça do Balio)
Amadu Bailo Djaló (Lisboa)
Américo Pratas (Coimbra)
António Barbosa (Gondomar)
António Barroso (Valadares)
António Batista (Matosinhos)
António Carvalho e Maria de Fátima (Gondomar)
António Dâmaso (Odemira)
António Fernando R. Marques (Cascais)
António Graça de Abreu (Cascais)
António J. Pereira da Costa e Isabel (Mem Martins / Sintra)
António M. Sucena Rodrigues (Oliveira do Bairro)
António Martins de Matos (Lisboa)
António Paiva (Lisboa)
António Pimentel (Porto)
António Sampaio (Alfândega da Fé)
António Santos e Graciela (Loures)
António Silva e Alvina (Estarreja)
António Sousa (Montemor-o-Velho)
Artur Soares (Figueira da Foz)
Augusto Martins Pacheco (Rio Tinto)
Belarmino Sardinha e Antonieta (Odivelas)
Benjamim Durães (Palmela)
Carlos Marques Santos (Coimbra)
Carlos Silva e Germana (Lisboa)
Carlos Valentim e Margarida (Proença-a-Nova)
Carlos Vinhal e Dina (Leça da Palmeira / Matosinhos)
Constantino Neves e Judite (Almada)
Coutinho e Lima (Lisboa)
David Guimarães e Lígia (Espinho)
Delfim Rodrigues (Coimbra)
Eduardo Campos (Maia)
Eduardo Magalhães Ribeiro e Fernanda (Porto)
Fernandino Ferreira Leite (Maia)
Fernando Calado (Lisboa)
Fernando Franco e Margarida (Amadora)
Fernando Gouveia e Regina (Porto)
Fernando Oliveira e Maria Manuela (Porto)
Francisco Godinho (Seixal)
Henrique Matos (Olhão)
Hernâni Acácio Figueiredo (Ovar)
Idálio Reis (Cantanhede)
Jaime Machado e Maria de Fátima (Lavra / Matosinhos)
Joaquim Mexia Alves (Monte Real / Leiria)
Joaquim Peixoto e Margarida (Penafiel)
Jorge Cabral (Lisboa)
Jorge Canhão (Oeiras)
Jorge Picado (Ílhavo)
Jorge Rosales (Monte Estoril / Cascais)
José Barros Rocha (Penafiel)
José Brás (Montemor-o-Novo)
José Carlos Neves (Leça da Palmeira / Matosinhos)
José Casimiro Carvalho (Maia)
José Eduardo Alves e Maria da Conceição (Leça da Palmeira)
José Fernando Almeida e Suzel (Óbidos)
José Manuel Lopes e Luísa (Régua)
José Manuel M. Dinis (Cascais)
José Marcelino Martins e Maria Manuela (Odivelas)
José Pedro Neves e Ana Maria (Lisboa)
José Zeferino (Loures)
João Carlos Silva (Almada)
João Lourenço (Figueira da Foz)
João Seabra (Lisboa)
Juvenal Amado (Fátima)
Luís Graça e Alice Carneiro (Alfragide / Amadora)
Luís R. Moreira (Lisboa)
Luís Rainha (Figueira da Foz)
Manuel Amante (Macau) e Sobrinha (Lisboa)
Manuel Amaro (Amadora)
Manuel António Rodrigues (Mortágua)
Manuel Augusto Reis (Aveiro)
Manuel Resende e Isaura (Cascais)
Manuel Traquina e Fátima (Abrantes)
Miguel e Giselda Pessoa (Lisboa)
Miguel Falcão (Porto)
Nelson Domingues (Monte Real / Leiria)
Pedro Lauret (Lisboa)
Raul Albino e Rolina (Vila Nova de Azeitão / Setúbal)
Ribeiro Agostinho e Elisabete (Leça da Palmeira / Matosinhos)
Rui Alexandrino Ferreira (Viseu)
Santos Oliveira (V. N. de Gaia)
Sebastião Dias e Cecília (Gondomar)
Semião Ferreira (Monte Real)
Tomás Carneiro (São Miguel / Açores)
Torcato Mendonça e Ana de Lourdes (Fundão)
Valentim Oliveira e Maria (Viseu)
Vasco da Gama (Figueira da Foz)
Vasco Ferreira e Margarida (V. N. de Gaia)
Victor Barata (Vouzela)
Virgínio Briote, Maria Irene e Irene Fleming (Lisboa)


Lista dos 22 que já manifestaram o seu pesar por este ano não poderem ir...

Abílio Machado (Maia)
Albano Costa (Guifões / Matosinhos)
Arsénio Puim (S. Miguel / Açores)
Beja Santos (Lisboa)
Cátia Félix (Maia)
Filomena Sampaio (Guimarães)
Helder Sousa (Setúbal)
Humberto Reis e Teresa (Alfragide / Amadora)
Jorge Teixeira (Portojo)(Porto)
José Armando F. Almeida e Teresa (Albergaria-a-Velha)
José Luís Vacas de Carvalho (Lisboa)
José Paracana (Aveiro)
José Teixeira (Matosinhos)
Luís Borrega (Pinhal Novo)
Luís Dias (Lisboa)
Manuel Maia (Matosinhos)
Mário Fitas (Estoril / Cascais)
Patrício Ribeiro (Guiné-Bissau)
Paulo Santiago (Águeda)
Sousa de Castro (Viana do Castelo)

sexta-feira, 19 de junho de 2009

Guiné 63/74 - P4553: Memórias do Chico, menino e moço (Cherno Baldé) (1): A primeira visão, aterradora, de um helicanhão

Publicamos hoje a primeira de cinco pequenas histórias que o Cherno Baldé, novo membro da nossa Tabanca Grande, nos enviou, com memórias da sua infância e adolescência :


1. A primeira visão de uma máquina voadora

por Cherno Baldé (**)

Foi naquela época que, na idade de 4 ou 5 anos, aconteceu a minha primeira visão de uma máquina voadora, que terá sido, provavelmente em meados de 1964, precisamente na altura em que estávamos em Samagaia, pouco tempo antes do ataque à zona que nos obrigaria a deixar a aldeia para nos refugiarmos em Cambajú, onde o meu pai já se encontrava a trabalhar alguns anos antes.

Estava com o meu irmão mais velho, Ibraima, a pastar as vacas nas imediações da aldeia, quando de repente ouvimos um ruído potente que vinha de cima. Quando nos virámos para ver, o avião já estava em cima das nossas cabeças, não dava para fugir, instintivamente, meti-me por baixo de umas raízes enormes de um poilão que estava por ali perto. Escondi-me o melhor que pude mas, foi por pouco tempo. 

Como o meu irmão estava a espreitar o avião e não lhe acontecia nada, sai também para ver. Na altura, os meus olhos viam com bastante nitidez e o avião voava a baixa altitude o que me permitiu ver, após uma breve inclinação deste, as pessoas sentadas, dois à frente e um na abertura lateral com as mãos apoiadas no que parecia ser uma metralhadora.

Esta visão ficou para sempre gravada na minha memória. Estranhamente, era também a visão da guerra que se alastrava pouco a pouco e que mudaria o cenário da vida, aparentemente pacífica, que levávamos até aí e mudaria, de forma inesperada, o caminho dos nossos destinos, criando, mais tarde, a incompatibilidade e a confusão entre o futuro que tínhamos vislumbrado na infância e ao qual queríamos dar continuidade e a nova realidade para onde nos tinha empurrado um destino diferente, passando pela escola portuguesa e enfrentando, assim, um futuro incerto e completamente desconhecido que nos levaria primeiro para Bafatá e mais tarde à capital, Bissau, onde funcionava o único liceu, na altura, e mais tarde para terras distantes e desconhecidas, no estrangeiro.

Uma vida feita de aventuras interessantes e também de sofrimentos, de conquistas e derrotas, de descobertas e imposições, de solidariedade e mercantilismo, sempre em ambientes de opressão cultural permanente e de recuo impossível, fruto da rápida transformação e globalização a que fomos sujeitos pela máquina de dominação Europeia e Ocidental.

Cherno Abdulai Baldé, Chico
Natural de Fajonquito,
Sector de Contuboel,
Região de Bafatá

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Notas de L.G. :

(*) Vd. poste de 18 de Junho de 2009 >Guiné 63/74 - P4550: Tabanca Grande (153): Cherno Baldé (n. 1960), rafeiro de Fajonquito, hoje quadro superior  em Bissau...

(**) Próximas histórias:

2. CAMBAJU: O primeiro contacto com o mundo exterior

3. Os homens brancos.

4. Ataque ao aquartelamento de Cambaju

5. FAJONQUITO: Terra da minha adolescência

quinta-feira, 18 de junho de 2009

Guiné 63/74 - P4552: Convívios (149): Encontro das CCAÇ 2367, CCAÇ 2368 e CCAÇ 2313 (1968/69), (Albino Silva)




1. Mensagem de Albino Silva, ex-Soldado Maqueiro da CCS/BCAÇ 2845, Guiné, 1968/70, com data de 16 de Junho de 2009:
Camaradas,


Um grande abraço a todos os Tertulianos que, aqui na “Tabanca Grande”, vão contando as suas estórias, aventuras e os “saberes”, tal como eu sempre que tenho uma oportunidade.



Não percam nunca, nem a Força, nem a Moral e desabafem porque faz bem (digo eu).


Hoje vou fazer o mesmo, pois entendo que a Nossa Historia é “linda” e merece ser contada, para todos os nossos leitores, mesmo para aqueles que nos desprezam.


Esses não andaram lá, de certeza, e “esquecem-se” propositadamente de nós.


Camarada Carlos Vinhal, já vai longo o tempo em que te contacto, se calhar por vício meu, mas vou continuar este contacto, pois tenho aqui mais “trabalhos” relacionados com as companhias, em que participei nos seus mais recentes Convívios.


São elas a CCAÇ 2367, a CCAÇ 2368 e a CCAÇ 2313.


Foi esta última que me fez sair para o mato, em Teixeira Pinto, quando eu já pensava que não sairia mais do arame farpado para fora, pois contava já com 13 meses de Guiné.


O endereço do blogue onde se podem ver estes maravilhosos convívios é o seguinte: batcac2845guineteixeirapinto.blogspot.com


O meu muito obrigado por me terem vindo a aturar há tanto tempo, mas eu prometo que mesmo assim vos vou continuar a sobrecarregar (risos), por isso, não irei desistir.


Um grande abraço,
Albino Silva
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Nota de M.R.:

Vd. último poste da série em:


Guiné 63/74 - P4551: Vindimas e Vindimados (José Brás) (3): O Santinhos da Artilharia

1. Terceira história da série Vindimas e Vindimados do nosso camarada José Brás, ex-Fur Mil da CCAÇ 1622, Aldeia Formosa e Mejo, 1966/68, baseada no seu livro "Vindimas no Capim" (*)

Carlos
Cá vai o terceiro (para cumprir o ritmo).
Quanto às fotografias é um problema. Eu sempre convivi mal com elas, quer a ficar (nelas), quer a fazê-las.
De qualquer modo, vou tentar que te cheguem um grupo na Guiné e cá no puto.
São muito más e não sei se aproveitarás alguma coisa.

Um abraço
José Brás


José Brás à civil


Fooooo...go!

O Santinhos era um gajo curioso. Study of case, pode dizer-se hoje, tempo diferente em quase tudo do de então, democratizada que está a informação sobre as coisas da vida em geral e em específico, dizem alguns que para melhor nos mentirem.

Mas não importa isso, aqui e agora, importa, sim, falar-vos do Santinhos, Alferes comandante das peças de obus que guarneciam os quatro lados do quase quadrado da nossa convivência em Medjo naquele tempo.

Alferes e competente, dizia-se por lá, no acerto daquilo sempre que era necessário apontá-los a alvos definidos. Sob a sua orientação se construíram uns espaldares que exteriorizavam a paliçada, desbordando-a em semicírculo, com o cano sobrando no-de-fora para tiro directo para zonas que dessem tempo ao salto da cavilha entre o disparo e a cabeçada do percutor contra qualquer obstáculo.

A mim, observando os lugares dos rebentamentos da garrafa, após os ensaios realizados no fim da obra, arrepiou-se-me a alma na imaginação da coragem necessária para enfrentar os estilhaços que se semeavam à volta do local da explosão. Enormes, cortantes, divisores incontornáveis de corpos, ainda que fossem feitos de matéria mais resistente que esta carne que nos envolve o sonho.
Uma coisa desmanchava, contudo, esta imagem de Alferes competente que venho aqui a sugerir e vocês começavam já a assumir como projecto de homem e militar.

Bebia.

Gaita! Beber, gostar da pinga, nem é crime, nem reduz as grandezas humanas que todos possuímos, mesmo quando gostamos de beber.

Sejamos mais rigorosos. O Santinhos gostava de beber muito, usando aqui o advérbio de um modo que garanta que muito é mesmo muito, seja qual for o conceito que construamos sobre quantidade, dizendo eu isto, e, ouvindo-o cada um de vós.

Lembram-se das meias garrafas de cerveja, seis decilitros ou coisa assim, que pedíamos no bar ao Cabo Carneiro, aliás, pedia eu, pedia o Santinhos, pediam os oficiais, os sargentos e os soldados todos da minha Companhia 1622, e pediam vocês, nas vossas Companhias a Cabos com outros nomes. Se disse Carneiro, é porque depois da Guiné, Carneiro, para mim, é nome de Cabo barista, seja lá onde for que esteja, hoje e no futuro, tal qual eu sou Zé, apenas porque com esta minha cara, só podia mesmo era ser Zé.

Aonde eu queria chegar, desculpem vocês esta minha tendência para divagar, aonde eu queria chegar era ao número de garrafas daquelas que o Santinhos bebia durante um dia. Sei que não estou num concurso de televisão onde se fazem perguntas tão pategas como esta, mas não resisto à vontade de vos perguntar.

Respondam. Quantas?

Vinte e duas, vinte e três, vinte e quatro, dependia.

Mas não julguem que só de cerveja vivia o Santinhos. Isso era durante o dia. À noite, ele era scotch, ele era vodka, ele era cognac

Uma noite, tendo eu que levar mensagem urgente ao capitão, passei na secretaria a caminho dos quartos dos oficiais e quem é que eu topo?

Com o Santinhos deitado em novelo naquele espaço que há nas secretárias para meter as pernas, fileira vertical de gavetas à direita e à esquerda das ditas, quando em trabalho. Com ele, meia bebida, meia entornada, uma garrafa de aguardente velha.

Ninguém sabia onde metia o homem tanto álcool, numa figurinha de um metro e sessenta, magro e escanzelado.

Nunca o vi senão de jeens, quase sempre sujos, a cair-lhe do corpo, mostrando o anúncio da separação das nádegas, coberto apenas nas madrugadas de frio pelo dólmen da farda malhada.

Cabelo sempre comprido e sujo, barba dias e dias por fazer, deambulando pelo quadrado de olhar entre o vazio e o espantado.

Num dia de visitas de Bissau a Medjo, brigadeiros, coronéis e tal, descem do heli, entram no quartel e logo ali deparam com o espantalho que, desajeitado e hesitante, lhes bate uma palada cómica. E eu danado para largar à gargalhada na ópera cómica, ali à minha frente, fugindo de mãos na boca para evitar a bronca.

Mas nada disto de que tenho estado a falar tem importância. A importância dou-lhe eu no engano de vos fazer compreender melhor a encomenda do Santinhos no episódio burlesco que, desde o início vos quero relatar.

Comecemos pelo princípio!

Em certo tempo, que como vocês sabem não é o mesmo que tempo certo, em certo tempo foi programada em Bissau uma Operação das grandes, destinada ao assalto e ocupação de Salancaur. Tal Operação envolvia várias Companhias que passaram a noite deitados pelo chão do quartel de Medjo, bombardeamentos prévios nos dias precedentes pela aviação, jactos no ar à hora que devia ser do assalto, bombardeamentos com os obuses do quartel antes da entrada.

As quatro peças foram deslocadas dos seus espaldares para o exterior da paliçada, alinhadas lado a lado e apontadas ao objectivo com regulação do tiro a partir do voo de um DO.

Diz-se que o homem põe e Deus dispõe, querendo justificar-se a coisa torta. A Operação que deveria ser de um dia, naquela mata quase virgem, evitando sinais de picada à força de catana, chegou-se à ante-câmara do destino apenas na terceira madrugada. Fome, sede, medos, etc., esfrangalharam corpos e convicções. As evacuações começaram em catadupa, umas absolutamente justificadas e outras, provavelmente, oportunistas.

Na frente da tropa de assalto havia agora um enorme espaço de bolanha nua que era necessário passar para chegar ao objectivo.

Ordem para iniciar procedimentos de tiro de obus, tudo a postos, cada peça com seu apontador e municiador, eu ouvindo em PRC-10 as ordens do DO ao Santinhos e em wallkie talk, a comunicação entre o Santinhos e o apontador de cada obus, conversa para a qual peço a vossa inesgotável imaginação, recriando a manhã naquele lugar, quente e húmida, abafada ainda mais pelo stress da espera; meia dúzia de soldados que haviam ficado a garantir a segurança das peças encarrapitados na bancada da paliçada; o DO esvoaçando e dando indicações, não tão longe dali que não se pudesse enxergar-lhe a evolução a olho nu, a voz do Santinhos nas perguntas ao avião, nas ordens às peças, pastosa, embrulhada na língua, augurando tensões.

Primeira bateria?
Pronto meu alferes!

Segunda bateria?
Pronto meu alferes!

Terceira bateria?
Pronto meu alferes!

Quarta bateria? Quarta bateria? Quarta bateria?

Fooooo...da-se!

Buuum, ecoando inesperadamente nos meus ouvidos e no susto dos ocupantes do DO que voavam em frente, não muito acima da linha de tiro!

- Tirem-me daqui - esganiçou o Alferes. - Tirem-me daquiiiii!

Um médico de fora que por ali cirandava para a possibilidade de ter de servir na Operação, diagnosticou sintomatologia histeriforme e solicitou evacuação para o Alferes.

O helicópetero que o veio buscar carregou já para Medjo o seu substituto, outro Alferes, açoriano, diferente do Santinhos no talhe físico e na atitude.

Para aquele dia nem valia a pena a pressa da substituição.

A Operação havia acabado. Do DO para a tropa na orla da mata a ordem foi a de recuar, porque do outro lado eram muitos os morteiros prontos para bater a bolanha.

Não morreu ninguém, do nosso lado, pelo menos.

E do Santinhos, Alferes ou civil, engenheiro brilhante, segundo se dizia, e contestatário, nunca mais ouvi dizer fosse o que fosse.

JB
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Nota de CV:

(*) Vd. poste de 9 de Junho de 2009 > Guiné 63/74 - P4486: Vindimas e Vindimados (José Brás (2): Coágulos

Guiné 63/74 - P4550: Tabanca Grande (153): Cherno Baldé (n. 1960), rafeiro de Fajonquito, hoje quadro superior em Bissau...

Guiné-Bissau > Bissau > O  Cherno Baldé, na actualidade, no seu gabinete de trabalho, no Ministério das Infraestruturas, Transportes e Comunicações onde exerce as funções de director do gabinete de estudos e planeamento. 

Fez os meus estudos universitários, primeiro, na Ucrânia (ex-União Soviética) entre 1985/90 e depois em Portugal (Pós-graduação no CEA - Centro de Estudos Africanos /ISCTE).

Ex-URSS > Ucrânia > Kiev > Cherno Baldé, estudante, em 1989...


"Minha mulher, Geralda Santos Rocha, natural de Bissau, com quem sou casado desde 1992, período que coincide com a minha passagem por Lisboa (1992/94) para frequência do curso no ISCTE" (CB).


Guiné-Bissau > região de Gabu > Fajonquito > c. 1975 > "A nossa equipa de futebol de salão no quartel de Fajonquito entre 1974-1975, podendo-se ver em pé: Mamudo, Algássimo e o professor António Tavares; sentados: Eu (Cherno) e Aruna (filho do antigo padeiro) à minha esquerda" (CB)

Fotos: © Cherno Baldé (2009). Direitos reservados (*)

1. Mensagem de Cherno Baldé, com data de 15 do corrente:


Assunto - Saudações à Tabanca Grande

Caro amigo Luis Graça,

Navegando na internet, entrei por acaso neste blogue a que chamaram de Tabanca Grande. Procurei casualmente pela CCAÇ 1501 (**) que é das poucas recordações que ainda me restavam em memória sobre o período da guerra que entre nós ficou conhecida como a guerra colonial.

A pesquisa conduziu-me para o artigo de José Martins (*) e o assunto à volta do Furriel Andrade, despoletado por Filomena da Silva Correia, minha conterrânea de Fajonquito.

Antes vou me apresentar. Chamo-me Cherno Abdulai Baldé, nasci por volta de 1959/60. No quartel de Fajonquito chamavam-me Chico (de Francisco) e tinha amigos soldados que, na sua maioria, eram condutores ou mecânicos-auto. Tive as minhas primeiras aulas com oficiais Portugueses, em Cambajú e Fajonquito.

Aproveito para enviar uma saudação ao Furriel ou Cabo "Tintim" (CCAÇ 2435?), amigo do meu pai e meu primeiro mestre.

Na verdade, quando a minha família se transferiu para Fajonquito, a companhia 1501 já estava no fim ou já tinha terminado a sua comissão mas, na memória de todos, em Fajonquito, tinham ficado gravadas estas insígnias em forma de números que perduraram no tempo. No meu caso, não sei explicar as razões, ainda era muito pequeno, mas a insígnia ficou para sempre.

Conheci fisicamente o Capitão Carvalho que, na minha memória de infância, de criança que tinha mais fome da "sopa" que cabeça, guardo uma legenda, um mito. De qualquer modo, posso afirmar que era um oficial de verdade. Era um oficial militar que nós queríamos seguir as pisadas de bravura, quando fossemos homens e certamente soldados.

Ainda crianças pequenas, já tínhamos o gosto pela pólvora, a G3 e as granadas não eram nenhum segredo e, certamente, a nossa grande sorte foi a guerra ter terminado antes. Gostaria de saber mais sobre o seu destino. Houve vozes que chegaram até nós dando-o como morto em Angola ainda durante a guerra.


Conheci muita tropa que passou por Fajonquito entre 1968/74, em especial das companhias 3549 e 4514/72. (*) O rebentamento da(s) granada(s) que vitimara o saudoso Cap Figueiredo e seus companheiros de armas [da CART 2742] (*), apanhou-me a menos de 100 metros do local, quando estávamos a brincar perto da casa dos oficiais.

De todas as companhias, em especial, lembro-me da última que tinha sido transferida de Gadamael-Porto. Os soldados dessa companhia eram bastante melhores, do ponto de vista humano e das crianças indígenas da localidade porque foram os primeiros e únicos que, de uma forma geral, não nos deram pontapés no cu, às vezes sem qualquer motivo. Ao contrário dos outros, eles nos respeitavam de verdade. Intrigado com este comportamento exemplar nunca deixei de indagar as razões de fundo. A conclusão a que cheguei, mais tarde, é que eles tinham vivido a guerra de verdade, na frente, talvez, mais quente de toda a guerra da guiné.

Dessa companhia ainda me lembro do Cabo João e do Jorge, ambos condutores. Infelizmente não me lembro da companhia (será 4514 ?).

Juntamente envio um extracto de notas de memória daqueles tempos. Espero que sejam úteis, sobretudo que possam permitir aos protagonistas daquela época a percepção de como o outro lado os via e entendia a sua presença.

Como alguém disse, nesse blogue, realmente "o mundo é pequeno e o blogue... é grande".

Até a próxima,

Cherno A. Baldé


2. Mensagem de 17 de Junho de 2009:

Caro amigo Luis Graça,

Juntamente envio algumas fotos, uma da actualidade no meu gabinete de trabalho, no Ministério das Infraestruturas, Transportes e Comunicações, a segunda com a imagem da nossa equipa de futebol de salão no quartel de Fajonquito entre 1974-1975, podendo-se ver em pé: Mamudo, Algássimo e o professor António Tavares; sentados: Eu (Cherno) e Aruna (filho do antigo padeiro) à minha esquerda.

Um abraço,

Cherno Baldé

3. Mensagem de hoje:

Caro Luís,

Ontem enviei três fotos mas esqueci-me de dizer que a terceira era a imagem da minha mulher, Geralda Santos Rocha, natural de Bissau com quem sou casado desde 1992, período que coincide com a minha passagem por Lisboa (1992/94) para frequência do curso no ISCTE.

Hoje envio mais uma que é uma recordação dos tempos de estudante em Kiev, Ucrânia onde vivi e estudei entre 1996/90, após uma breve passagem por Kichinov (Moldávia) para aprendizagem da língua Russa.

Obrigado pela paciência que está a ter comigo e devo esclarecer que não estou a procura de ninguém em especial, só querendo fazer parte da Tabanca e compartilhar alguns sentimentos do passado e do presente.

Eu passei boa parte da minha infância entre a tropa que passou por Fajonquito (1968/74) e tive muitos amigos que, na verdade, logo esquecia para me concentrar nos récem-chegados.

Eu era desses raros pequenos rafeiros do quartel impossíveis de controlar e muito menos de afastar. Quando se fechavam os portões do quartel entrava, mesmo assim, por baixo do arame farpado. O dia e a noite faziam pouca diferença. Apanhava porrada de um ou outro quando deambulava pelo quartel, mas também, dava alguns trocos com emboscadas e pedradas a noite.

A língua ? Isso importava menos. Quando o meu amigo, o Dias, me perguntava "Hó Chiiico já limpaste as minhas botas?", eu respondia de imediato "Sim senhor, já limpaste" e depois ?"...

Nós nos compreendiamos muito bem e isso é que importava. Foi esta vida de cão de quartel no meio de jovens soldados endiabrados, acossados pela ansiedade do regresso a casa e o medo da morte que me moldou a vida e me preparou para enfrentar o mundo.

O fim da guerra foi para mim uma libertação mas também um choque terrível de que só tomei consciência passados os primeiros seis meses após a saída do último soldado português. Durante algum tempo ainda tudo continuou na mesma, havia a batata, o bacalhau já com muito mais arroz.

O maldito arroz era, cada dia, mais abundante nos pratos, mas o início da minha miséria começou mesmo foi quando a carne de macacos substituiu tudo o resto. Então, como bom rafeiro que era, olhei para o céu duas ou três vezes seguidas, como fazia sempre que estava em apuros, e compreendi que tinha chegado a hora da largada para outros destinos. Caminhei para casa e quando cheguei, enfrentei os meus pais olhos nos olhos e garanti-lhes que daquele dia em frente nunca mais faltaria às aulas da mesma forma que, também, não voltaria a pisar no quartel transformado em comedouro de macacos.

Espero não estar a exagerar nos desabafos e nas minhas possiveis alucinações.

Cherno A. Baldé

4. Comentário de L.G.:

Não te vou tratar por senhor dr. Cherno Baldé, por que a tua vontade é ingressares nesta Tabanca Grande, onde não há ou não deve barreiras (físicas, simbólicas, sociais, protocolares, étnicas ou culturais)... 

Tratemo-nos, pois, por tu, e vamos retomar as conversas e as brinqueiras com os tugas do teu tempo de Fajonquito (1968/74)... Também não te vou tratar por camarada porque não foste combatente, nem militar, tecnicamente falando... Em contrapartida, passaste pela mesma Escola que eu, o ISCTE, e isso reforça as nossas afinidades e cumplicidades... Estive além disso na CCAÇ 12 onde havia vários Chernos Baldé, gente do Cossé, de Badora, do Corubal...

Estás em casa, espero que sintas hoje muito mais confortável do que nesse tempo, em que matavas a fome com as sobras do quartel a troco de pequenos serviços... Como tu, houve milhares de jubis (como a gente dizia, referindo-se aos putos) que viviam literalmente nos nossos quartéis, estudaram e fizeram-se homens nos nossos quartéis...

Essa história de infância e adolescência merece ser contada...Mais, a tua história de vida, de luta, através do trabalho e do estudo, é um exemplo que nos comove a todos nós e que te deve orgulhar, a ti e à tua família...

Recebo-te, pois, de abraços abertos, meu amigo e meu irmãozinho, guineense, mesmo não tendo conhecido Fajonquito (do leste só conheci a região de Contuboel, Geba, Bafatá, Galomaro e Bambadinca, até ao Saltinho, passando por Xime, Mansambo e Xitole  e, a norte do Geba Estreito,  os regulados do Enxalé, Cuor, Joladu...).

Irei dar início, para a semana, à publicação das pequenas histórias que me mandaste. Até lá, mantenhas para ti e para a tua família. Que Deus te proteja, a ti e à nossa Guiné...L.G.
_________

Nota de L.G.:

(*) Há dias, devido a um "bug", estas fotos desapareceram do meu Álbum Picassa, e o poste teve que ser reeditado. Peço desculpa ao Cherno Baldé e aos nossos leitores por esta anomalia técnica, corrigida hoje (23/6/09).

Dear Picasa Web Albums user,

We wanted to let you know about a recent issue with your Picasa Web Albums account. As a result of a bug in our email notification system, some links and titles to unlisted albums and photos in your account may have been inadvertently sent to a limited set of other users -- those listed in your account as "Fans".

This involved unlisted photos only -- no 'sign-in-required to view' photos were involved. We fixed the issue within hours of identifying the problem.

To help remedy this bug, we have reset the unique web addresses for all albums that may have been affected. This helps ensure that these albums are inaccessible to anyone that attempts to view them using the outdated web address. If you would like to re-share these albums, please do so by clicking the "Share" button while viewing the album. Note, resetting the unique web addresses also broke image links for some affected photos in your Blogger blog -- you will need to re-post those images using Blogger. This applies to images uploaded from Wednesday evening to late Thursday night, Pacific Standard Time.

We're sorry for the trouble this may have caused. Although this issue only affected roughly 0.05% of Picasa Web Albums users, we want to assure you that we have treated this issue with the highest priority.

The Picasa Team

Some photos from the following unlisted albums may have been affected, so they have had their web addresses reset:

LuisGracaCamaradasDaGuine02 (Blogger)



(**) Vd. poste de 3 de Abril de 2009 >Guiné 63/74 - P4136: As Unidades que passaram por Fajonquito (José Martins)

(...) Companhia de Caçadores n.º 1501, comandada pelo Capitão de Infantaria Rui Antunes Tomaz, unidade orgânica do Batalhão de Caçadores n.º 1877, mobilizada em Tomar no Regimento de Infantaria n.º 15, assumiu a responsabilidade do subsector, rendendo a CCaç 1497, em 26 de Janeiro de 1967, vindo a ser substituída pela CCaç 1685 em 19 de Setembro de 1967.

Companhia de Caçadores n.º 1685, comandada pelo Capitão de Infantaria Alcino de Jesus Raiano, unidade orgânica do Batalhão de Caçadores n.º 1912, mobilizada em Évora no Regimento de Infantaria n.º 16, assumiu a responsabilidade do subsector, rendendo a CCaç 1501, em 19 de Setembro de 1967, vindo a ser substituída pela CCaç 2435 em 14 de Dezembro de 1968.

Companhia de Caçadores n.º 2435, comandada pelo Capitão de Infantaria José António Rodrigues de Carvalho e, posteriormente, pelo Capitão de Infantaria Raul Afonso Reis, unidade orgânica do Batalhão de Caçadores n.º 2856, mobilizada em Abrantes no Regimento de Infantaria n.º 2, assumiu a responsabilidade do subsector, rendendo a CCaç 1685, em 07 de Dezembro de 1968, vindo a ser substituída pela CCaç 2436 em 20 de Abril de 1970.

Companhia de Caçadores n.º 2436, comandada pelo Capitão de Infantaria José Rui Borges da Costa, unidade orgânica do Batalhão de Caçadores n.º 2856, mobilizada em Abrantes no Regimento de Infantaria n.º 2, assumiu a responsabilidade do subsector, rendendo a CCaç 2435, em 20 de Abril de 1970, vindo a ser substituída pela CArt 2742 em 13 de Agosto de 1970.

Companhia de Artilharia n.º 2742, comandada pelo Capitão de Artilharia Carlos Borges de Figueiredo e, posteriormente, pelo Alferes Miliciano de Artilharia Baltazar Gomes da Silva, unidade orgânica do Batalhão de Artilharia n.º 2920, mobilizada em Penafiel no Regimento de Artilharia Ligeira n.º 5, assumiu a responsabilidade do subsector, rendendo a CCaç 2436, em 13 de Agosto de 1970, vindo a ser substituída pela CCaç 3549 em 21 de Maio de 1972.

Companhia de Caçadores n.º 3549, comandada pelo Capitão Quadro especial de Oficiais José Eduardo Marques Patrocínio e, posteriormente, pelo Capitão Miliciano Graduado de Infantaria Manuel Mendes São Pedro, unidade orgânica do Batalhão de Caçadores n.º 3884, mobilizada em Chaves no Batalhão de Caçadores n.º 10, assumiu a responsabilidade do subsector, rendendo a CArt 2742, em 27 de Maio de 1972, vindo a ser substituída pela 2.ª Companhia do BCaç 4514/72 em 15 de Junho de 1974.2.ª

Companhia do BCaç 4514/72, comandada pelo Capitão Miliciano de Infantaria Ramiro Filipe Raposo Pedreiro Martins, unidade orgânica do Batalhão de Caçadores n.º 4514/72, mobilizada em Tomar no Regimento de Infantaria n.º 15, assumiu a responsabilidade do subsector, rendendo a CCaç 3549, em 15 de Junho de 1974, vindo a iniciar o deslocamento para Bissau a partir de 30 de Agoosto de 1974, tendo um pelotão efectuado a desactivação e entrega, ao PAIGC, do aquartelamento em 01 de Setembro de 1974. (...)

Guiné 63/74 - P4549: Agenda Cultural (18): O que se passa na Guiné-Bissau ? Conferência-debate, ISCTE, Lisboa, 19/6/2009


Guiné-Bissau > Região do Cacheu > Estaleiro de Construção da Ponte de São Vicente >

Texto e foto de Pedro Moço (com a devida vénia...):

"Manhã de 22 de Outubro [de 2007]. À porta do estaleiro do Soares da Costa, em S. Vicente, uma insólita proposta de venda.
"Uns habitantes locais tinham capturado um crocodilo nas imediações do estaleiro e propunham a sua venda. Preço? Não muito caro, 40 ou 60 mil francos CFA. O equivalente a cerca de 60 a 90 €. Negociáveis, claro, como tudo o resto por estas bandas. Acredito que o arrematássemos por 30 mil. Recusamos. Estão em causa valores fundamentais, como os dos direitos dos animais. E um outro valor fundamental, o da nossa vida. Quem cria um bichinho de estimação que, depois de adulto, nos pode confundir com um hamburguer? Hum, temos que viver o presente, mas não custa ter uma pequena preocupaçãozinha com o futuro. Assim como guardar algum para um qualquer maleita que venha. Só que neste caso, o problema da maleita estaria resolvido à partida, por constituir o bichinho, quando adulto o mal maior. Não, recusamos mesmo. De resto o pobre do bicho não trazia sapatos nem carteira, e portanto não devia ter valor comercial. E quanto a direitos dos animais, prefiro acreditar que, na falta de comprador, o devolveram ao seu lar"...

Comentário de L.G.:

A foto do crocodilho amordaçado tem um tremendo significado hoje, na Guiné-Bissau, representando a violência física e simbólica que se abateu sobre o pacífico e amável povo guineense... É também um pequena homenagem ao minhoto Pedro Moço e à sua equipa de engenheiros, geólogos, topógrafos, agentes técnicos, operarários especilizados ou não, portugueses e africanos, que construiram a ponte de São Vicente, sobre o Rio Cacheu (baptizada Euroafricana...), a ser inaugurada amanhã, dia 19, e que em princípio vai tornar a Guiné-Bissau mais próxima (?) de todos nós...

O Pedro Moço escreve muito bem, gostei muito do "último poste" que encerra o blogue... É gente de outra geração, são outros tugas, com outra qualificação, com mais qualificação que a nossa (e felizmente com outra missão...) mas com o mesmo jeito de ser e de estar em África, jeito que de algum modo já vem no nosso ADN...

Ao Pedro Moço, à sua equipa e ao seu blogue, que encerrou a 1 de Junho de 2009, o nosso Alfa Bravo (abraço) do tamanho do Cacheu ou do Rio Minho, tanto faz (*).


Centro de Estudos Africanos (**) >

"O que se passa na Guiné-Bissau?"

Conferência/Debate no âmbito da Pós-Graduação em Comunicação e Gestão de Crises

Lisboa, 19 Junho 2009,
18h, Auditório B203,
ISCTE-IUL
Av Forças Armadas, 1649-026 Lisboa
Portugal
(Metro: Entre-campos)

Intervenientes:
Cândida Pinto, jornalista (SIC),
Álvaro Nóbrega (profesor auxiliar, ISCSP/UTL) (***)
Eduardo Costa Dias (ISTE-IUL)
Dautarin Costa (ISCTE-IUL).

Entrada livre.
_______

Notas de L.G.:

(*) "Este é o meu último post, a ponte está pronta, a inauguração marcada. A tarefa está cumprida" (Pedro Moço > 1 de Junho de 2009 > Reflexos).


Vd. poste de 17 de Junho de 2009 >Guiné 63/74 - P4544: Blogoterapia (107): Olhar, pensar e sentir a Guiné - Ontem e hoje (Hélder Sousa)

(**) Centro de Estudos Africanos - ISCTE / IUL ( Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa / Instituto Universitário de Lisboa)

"O Centro de Estudos Africanos do ISCTE - Lisboa, fundado em 1981, desenvolve actividades no âmbito da investigação em ciências sociais sobre África, com especial ênfase nos países africanos de língua portuguesa.

"De entre estas actividades, destacam-se os projectos de pesquisa realizados por equipas multidisciplinares, a consultoria em Portugal e internacional em diversas áreas de especialização - nomeadamente na cooperação para o desenvolvimento, a organização de conferências e seminários, a publicação da Occasional Paper Series e dos Cadernos de Estudos Africanos.

"Encontra-se inserido em redes de cooperação nacionais e internacionais com instituições ligadas aos estudos africanos e com instituições africanas de ensino e investigação".


(**) Autor de Luta pelo poder na Guiné-Bissau

"Análise politológica sobre a problemática da luta pelo Poder na Guiné-Bissau que procura identificar as razões que servem de fundamento à intensidade da mesma".

Nº pp: 333
Ano de Edição: 2003.
Editor: ISCPS - Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas
Preço ao público: 15€ + IVA

Guiné 63/74 - P4548: Controvérsias (25): Como ajudei a "fabricar" três "desertores" (Jorge Teixeira/Portojo)




1. Mensagem de Jorge Teixeira, ex-Fur Mil do Pelotão de Canhões s/recuo 2054 (Catió, 1968/70), esteve adido aos BARTs 1913 e 2845, com data de 17 de Junho de 2009:

Camaradas,

Venho contar-vos uma estória sobre desertores, refractários ou como lhes queiram chamar.

O meu pelotão tinha a dotação oficial de 39 elementos e, mesmo com quase 2 anos de comissão aconteceu creio eu sinceramente, que entre o IAO (em Tomar), e o desembarque, houve entre estes rapazes alguns que nunca se conheceram.

Por várias razões (morte, evacuações, destacamentos para outras unidades, etc.).

Mas, durante a comissão, lá foi aparecendo pessoal para a dotação do pelotão, vindos a conta gotas.

Creio que já andávamos próximo de 1 ano de comissão e apareceu-me um rapaz com cerca de 28 anos.

Tinha emigrado muitos anos antes de Portugal para França, mas as saudades fizeram-no regressar, para visitar a família, e foi apanhado algures na fronteira.

Colocaram-no então nos Adidos, em Lisboa, melhor dizendo, na cadeia e despacharam-no no primeiro barco, para a Guiné.

O moço não sabia sequer o que era uma G3, mas a solidariedade entre os camaradas e alguma paciência, lá permitiu ensiná-lo, pelo menos, a manejar aquela “coisa”.

O seu estado psicológico não era bom. Conseguimos uma consulta externa cerca de 8 ou 10 meses depois, e foi então evacuado para se tratar em Lisboa.

Nunca mais soube nada dele. Mas a intenção foi essa mesma, a de que nunca mais pusesse os pés em África.

Mas ficou bem claro, que toda a malta do pelotão apoiou esta ideia.

Conseguimos de modo muito idêntico (evacuações para psiquiatria), “fabricar” mais dois "desertores".

Quanto a um deles, anos mais tarde, fui chamado a um tribunal militar, ou lá como se chamava a “coisa”, para depor sobre o que sabia do homem, pois este havia pedido a sua reforma.

Uma das perguntas que me fizeram lá - essa não esqueço facilmente -, foi porque motivo foi evacuado o soldado se não tinha sido vítima de ferimentos?

Respondi ao senhor capitão: Se o Sr. alguma vez passou pela Guiné, explique-me como poderia um homem com menos de 1,60 m de altura e 45 kg de peso, aguentar 2 anos a andar por bolanhas, carregar com uma espingarda, cartucheiras e granadas, para além de ouvir periodicamente uns foguetórios, comer mal e ter que andar feliz da vida?

Pois aqui está como ajudei a provocar a “deserção”, ou como queiram chamar-lhe, de 3 dos nossos homens.

Um abraço de amizade,
Jorge Teixeira
____________

Nota de M.R.:

Vd. último poste da série em:

Guiné 63/74 - P4547: Blogoterapia (108): Pais & filhos (Juvenal Amado / Luís Graça)

1. Mensagem do Juvenal Amado, agradecendo os parabéns que lhe mandámos e a surpresa que lhe fizemos (*):

Meu caro Luís: Não sei como te agradecer o teu cuidado e a tua amizade. Este dia está cheio de belos momentos, graças a ti e ao blogue que criaste, que tanto me tem dado.

A publicação do texto da minha filha (vd. foto à esquerda, gentileza da
Junta de Freguesia de Santa Maria de Belém) foi um momento sublime e de grande profundidade da tua parte. Ela é efectivamente dietista no S. Francisco Xavier, na área da medicina e cuidados intensivos. Infelizmente há alturas em que morrem a maioria com enfermidades, que não perdoam. Isso afecta-a imenso.

Teria dado uma excelente médica, se não estivessemos num país em que para ser médico se tem que ter uma média intolerável. Médicos que saiem desse crivo não interessa que tenham vocação para engenheiros ou advogados ou ainda economistas. Com 19 ou 20 valores tem que escolher medicina e a vocação que se lixe, não é? É o país que temos e que, também, é da nossa responsabilidade. Mais uma vez obrigado e até sábado.


2. Comentário de L.G.:

Juvenal:

Foi a minha primeira hipótese, a de dietista... O meu sexto sentido ía para aí... A sondas, os catéteres e a urgência atraiçoaram-me... Afinal, a tua Vanessa é a senhora doutora dietista... do ESCA e do Xico Xavier (*)... onde tenho amigos (o Dr. Luís Campos, por exemplo, que conheço há anos, e que é colaborador da nossa Escola, a ENSP/UNL) e onde tem estagiado o meu filho, médico interno... e violinista (dos Melech Mechaya)...

Mostrei-lhe, ao João Graça, a foto da tua Vanessa, e o meu filho reconheceu-a de imediato... Além de ser uma competentíssima profissional (ele trabalhou com ela, há um ano e tal atrás, com o Luís Campos, em Medicina 4, e deu-me as melhores referências dela), a tua Vanessa não passa despercebida... "É um borracho", diz ele...

Tenho, além disso, diversos amigos na área das ciências da nutrição, como o Dr. João Breda, e inclusive uma futura doutoranda em saúde pública de que poderei vir a ser o orientador...

Como vês, o mundo é pequeno e o nosso blogue.. é grande.

Bebo um copo, à tua saúde e à tua longevidade... Espero que contraries o provérbio, fatalista, do nosso povo que dizia: "Muita saúde, pouca vida, que Deus não dá tudo"... Dá um beijinho à tua filha, da qual não tenho o mail mas em cujo blogue foi deixar esta e a outra mensagem (*).

Já agora, e como humilde e singela prenda, para ti e para a tua filhota, aqui tens os links de uns textos meus sobre "representações sociais da saúde, da doença e dos profissionais de saúde nos provérbios populares", onde se incluem questões ligadas à alimentaçáo, nutrição, estilos de vida, hospitais, etc. (Para a Vanessa, que faz formação, são textos que lhe podem ser úteis...).

Estão na minha página pessoal: http://www.ensp.unl.pt/luis.graca/textos_papers.html

Concordo com o que dizes sobre o miserável sistema de recrutamento, selecção e formação dos nossos médicos... Acho que merecíamos melhor do que este sistema pseudo-meritocrático onde se privilegia um sistema de ensino/aprendizagem baseado no modelo da acumulação de conhecimentos...

O meu filho entrou, em medicina, com 19,5 valores e acho (mas sou suspeito) que tem vocação perfil, motivação, competências (humanas, sociais, técnicas) para o exercício da medicina... Mas deixa-me fazer-te uma (in)confidência: era o último curso do mundo que eu tirararia...

E, repara, para além do meu filho, tenho muitos médicos amigos, tenho muitos antigos alunos que são médicos e que são excelentes médicos... Mas sei que eu, pessoalmente, nunca passaria do primeiro mês do 1º ano do curso de medicina... Não tenho qualquer perfil psicológico e intelectual para a medicina... Era incapaz de estudar anatomia, por exemplo... Por outro lado, dou aulas também na Faculdade de Medicina e apercebo-me da profunda imaturidade (emocional, vivencial, humana...) de muitos dos estudantes de medicina, que entraram por este sistema de funil... que não selecciona, de facto, os melhores ... Mas também, devo dizer-te, não tenho aqui à mão nenhum sistema alternativo... O que me magoa é o eventual desperdício de talentos, a falta de equidade, a perversão do sistema...

No caso da tua filha, o que importa é que ela se sinta bem na pele de dietista e possa trabalhar, em equipa, com outros profissionais de saúde num sistema de saúde que ofereça a ela e aos demais jovens profissionais, motivos de orgulho, boas condições de trabalho, novos desafios e oportunidades. No que diz respeito à saúde, eu tenho, apesar de tudo, orgulho nos progressos que conseguimos, nestes últimos quarenta anos, nós, portugueses, e o nosso país, Portugal. (LG).

Até sábado, na Ortigosa. Luís

___________

Nota de L.G.:

(*) Vd. poste de 17 de Junho de 2009 > Guiné 63/74 - P4541: Os Nossos Seres, Saberes e Lazeres (9): Juvenal, como foste nessa de chamar Vanessa à tua menina ? (Luís Graça)

Guiné 63/74 - P4546: (Ex)citações (31): Tenho pena daquele povo afável que vive hoje na miséria absoluta! (J. Carlos Neves)

1. Mensagem de José Carlos Neves (*), ex-Soldado Radiotelegrafista do STM, Cufar, 1974, com data de 15 de Junho de 2009:

Assunto: Filme de George Freire 62/63

Olá a toda a tabanca!

Gostaria de felicitar o nosso camarada George Freire pelo belíssimo filme que fez da sua Comissão na Guiné. Atendendo às condições que havia na altura julgo poder dizer, como profissional da imagem, que está uma bela obra.

Além da recordação que terá para o George também para nós nos faz refelectir. Como era a Guiné antes da Guerra e como ficou depois!

Deixaria umas perguntas no ar. E faço-o com toda a modéstia pois posso estar errado pela falta de conhecimento. Não estaria o povo guineense agora bem melhor se tivessemos continuado lá e sem haver guerra? Será que éramos tão maus como colonizadores?

Julgo que quem ia para o Ultramar, ia para fazer vida lá e não para sacar, como outros povos o fizeram em Africa. Julgo que embora todo o povo tenha direito à sua independência, aquele não estava preparado para o ser. E vê-se por aquilo que ainda hoje se passa na nossa querida Guiné

Não pensem que sou a favor do outro regime, até porque foi o 25 de Abril que me safou as costas, mas tenho pena daquele povo afável que vive hoje na absoluta miséria!

Um Alba Bravo para toda a Tabanca e até Sábado

José Carlos Neves
Soldado Radiotelegrafista do STM
__________

Notas de CV:

(*) Vd. poste de 11 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4322: Tabanca Grande (138): José Carlos Neves, ex-Soldado Radiotelegrafista do STM, Cufar, 1974

Vd. último poste da série de 27 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4424: (Ex)citações (30): O meu pai só aprendeu as letras que o trabalho lhe ensinou (José da Câmara)

quarta-feira, 17 de junho de 2009

Guiné 63/74 - P4545: Alguns apontamentos sobre a acção da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4616 (Xitole, 1973/74) (1) (José Zeferino)



1. Mensagem de José Zeferino, ex-Alf Mil At Inf, 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4616, Xitole, 1973/74, com data de 11 de Junho de 2009:


Luís,
Finalmente consegui acabar o texto que tinha prometido.
Foi quase de memória - menos as datas indicadas.
Por isso poderá ser alvo de outras versões.


Envio-te para como é habitual dares-lhe o tratamento que entenderes.


Até dia 20, em Monte Real.


Com os melhores cumprimentos
José António dos Santos Zeferino




Alguns apontamentos sobre a acção da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4616 - 73-74 na Guiné


(i) BISSAU – de 20 de Dezembro 1973 a 4 de Janeiro 1974 - Chegada. A maior parte, como eu, a 2 Janeiro por avião.


(ii) CUMERÉ - 6 de Janeiro de 1974 – Início do IAO


Foto 1 > Cumeré 1974




(iii) MANSOA - 18 - 19 de Janeiro de 1974. Primeira acção do Batalhão. Segurança\emboscada nocturna itinerário Bissau – Farim.


(iv) CUMERÉ - 25 de Janeiro de 1974 - Primeira baixa no Batalhão: o Furriel Humberto, madeirense, da 3.ª Companhia que iria para Farim, suicida-se com a sua G 3. Por motivos sentimentais.


(v) XITOLE - 11 de Fevereiro 1974 - Chegada da 2.ª CCAÇ .


Foto 2 > Aspecto do Quartel do Xitole




(vi) A partir desta data deixa de haver dias de semana. Passam a ser contados por blocos de três dias: dois de patrulhamento e um de descanso. Um grupo de combate fixa-se na defesa da Ponte dos Fulas com rotação mensal.


Foto 3 > Ponte dos Fulas




(vii) XITOLE – 19 de Fevereiro de 1974 - Primeiro combate, na mata. Sem baixas. Indícios de baixas no IN.


(viii) MANSAMBO – 3 e 4 de Março 1974 - Grande operação no Fiofiol. Sem contacto IN.


(ix) XITOLE – 9 de Abril de 1974 - Segundo combate na mata. Baixas não confirmadas no IN. O alferes Araújo do 2.º GComb é evacuado para a psiquiatria do HMB. O meu GComb, o 3.º, estava na ponte nesta altura. Foi de onde tirei esta foto.


Foto 4 > Fogo do morteiro 10,7 do Xitole, batendo a retirada IN.




(x) XITOLE – 13 de Abril de 1974 - Visita do general Bettencourt Rodrigues. Transportado por héli Allouette IIIG


(xi) XITOLE – 22 de Abril de 1974 - Apresenta-se um guerrilheiro do PAIGC. Má altura, para ele, para desertar das suas fileiras.


(xii) XITOLE – 25 de Abril 1974 - madrugada, cerca das 6 horas:


- Zefruíno, alferes Zefruíno!!!


Era o Jamil, comerciante libanês com grande influência política, social e económica, tanto na Guiné como na restante família, árabe, dispersa por três continentes.


Estávamos a iniciar mais um patrulhamento, a dois GComb, talvez à zona do Duá.


Na varanda da sua casa, tipo colonial, claro, estendiam-se fios de antenas que acabavam num rádio antigo, de válvulas, por onde estava a ouvir a BBC em árabe.


Diz-me:


- Zefruíno, o (não me lembro, ou não quero, das palavras exactas) do Spínola está a fazer uma revolta.


O Jamil tinha tido um contencioso com o general Spínola: tinha querido transferir as suas casas de comércio na zona, para Bissau, no que foi impedido pelo general. Era uma base de apoio para as nossas tropas e para a população.


Foi assim que tive conhecimento do que se passava em Lisboa.


Regressámos de imediato ao quartel. Ficámos na expectativa nos dias seguintes. Patrulhamentos, só o mínimo indispensável-até Endorna. Montagem de segurança nocturna: poucas. Estávamos literalmente presos pela avidez dos comunicados.


Acreditámos que o fim da guerra era desejado pelas duas partes. Pelo menos para a população era-o. E muito.


Entretanto chegou ao nosso conhecimento, não me lembro como, que no PAIGC havia duas correntes: uma para atacar em força aproveitando uma possível desorientação nossa. Outra para entrar de imediato em conversações de paz no terreno.


(xiii) XITOLE – 15 de Maio de 1974 – Violento combate – emboscada. Duas baixas do nosso lado: o Alferes Aguiar e o Soldado de Transmissões Domingos. Cerca de uma dezena de feridos. Sinais de baixas IN.


(xiv) XITOLE – 30 de Maio de 1974 - São detectadas e levantadas várias minas reforçadas com granadas de RPG.


(xv) XITOLE – 5 de Junho de 1974 - Avistam-se grandes queimadas na margem esquerda do Corubal. Prenúncio de preparação do terreno para ataque de canhão?


Sob orientação de Bambadinca, via rádio, procedeu-se a um batimento de zona por morteiros 10,7 e 81.


Ao entardecer o pessoal de Transmissões capta mensagens em francês, creio, através de pequeno um rádio Onkyo que, como sabemos, não tem grande alcance. Sinal que havia movimentos estranhos perto.


As sentinelas são reforçadas. Já de noite uma rajada de G3 na porta de armas leva-nos às valas. Tinha sido avistado um elemento IN a tentar infiltração junto ao arame que nos separava da tabanca. nUma pequena força nossa sai, entra na população e regressa pouco depois, sem resultados. Passámos o resto da noite na expectativa.


(xvi) XITOLE - 6 de Junho de 1974 - Pelas 6 horas, nova rajada. Desta vez de uma sentinela junto ao espaldão do morteiro 81, na zona dos quartos dos oficiais e do abrigo da Breda.
Novamente nas valas avistámos, a umas dezenas de metros, uma coluna IN que se aproximava, vinda da tabanca, pela orla da pista de aviação. Sob o nosso fogo fugiram para o mato do outro lado da pista, deixando um deles ferido. Veio a falecer pouco depois na nossa enfermaria.


Foi este, realmente, o ultimo acto de guerra na zona e ainda hoje não o entendo totalmente.


(xvii) XITOLE – 15 de Junho de 1974 - Na picada, para lá da Ponte dos Fulas, suspensa de uma árvore, é encontrada uma carta com um maço de tabaco Nô Pintcha, e um isqueiro. Convidava o capitão a fazer a paz. O que foi feito no mesmo dia, perto do pontão do Jagarajá.


(xviii) XITOLE – de 16 de Junho a Setembro de 1974 - Começaram então as visitas de comandantes e comissários políticos do PAIGC para combinar a cerimónia da entrega do quartel, com o arrear da nossa bandeira e o hastear da deles. Vinham das matas da margem direita do Corubal – Mina, FioFioli, etc.


Foto 5 > Primeiro encontro no Xitole: de costas um comandante do PAIGC – não me lembro do nome, o nosso médico - Dr. Morgado, eu, o capitão Luís Viegas, o comissário politico Antero Alfama e o 1.º Sargento Pára-quedista Vaz


Houve um jogo de futebol entre nós e os guerrilheiros. Gostavam imenso de falar com o nosso pessoal chegando a trocar impressões sobre o material que tínhamos usado na guerra.

Creio que numa dessas conversas foi dito que quem preparou a tal emboscada de 15 de Maio teria sido castigado. Não aprofundámos a questão, pois se até ao 25 de Abril tínhamos tido alguns encontros, na mata, sem baixas do nosso lado o mesmo não se passava com eles.

Quase todos os dias apareciam guerrilheiros procurando refeições na nossa cantina geral. Aúnica exigência nossa: tinham que deixar a arma à entrada do quartel, no posto de sentinela.


Fazendo-se transportar por camionetas civis paravam sempre na casa do Jamil para o cumprimentar.


Foto 6 > Chegada ao Xitole de forças do PAIGC.


Estava com o Jamil na sua varanda numa dessas ocasiões quando me diz, referindo-se ao comandante de canhões que já se dirigia para o quartel depois de o ter saudado:

- Este… - também não me lembro do termo – foi meu empregado numa das lojas que tinha no Corubal!

Um padre foi até ao Xitole fazer a recolha dos ornamentos de prata e ouro e relógios deixados pelos camaradas das companhias anteriores na capela.

Numa das colunas, e em viatura civil, chegaram também duas prostitutas. Alguns aproveitaram.

Igualmente chegou um individuo com farda a estrear. Não falou com ninguém. Limitou-se a esperar pelo regresso da coluna. Informei-me sobre ele, não me lembro com quem, que me disse tratar-se de um desertor nosso, antigo, e que para limpar a caderneta tinha regressado à Guiné. Na altura um comandante do PAIGC, que estava presente e também interessado em saber quem era, disse, rindo:
- Manga de cu pequenino.

O Saltinho já tinha sido entregue.

Bastou um dia para ficarem sem gerador. Os novos ocupantes pedem ajuda ao Xitole para reparar o aparelho. Nesse dia à noite ficámos preocupados por a equipa que foi não ter chegado. Foram encontrados perto de Cambéssé com o Unimog espetado dentro do mato com vários guerrilheiros a tentar repô-lo na picada. O comandante deles, de nome Claude, ficou irritadíssimo quando nos viu. Já estava todo alterado. E foi a única expressão de ódio que registei em todos os contactos com elementos do PAIGC. Mas a nossa equipa foi muito bem tratada por eles.


Entretanto chegam-nos notícias de problemas em Bambadinca: Com as nossas milícias: queriam alimentos e com a CCAÇ 12 que não queria entregar as armas.


Depois… o tempo passou-se… lentamente. E entregámos o Xitole.


Foto 7 > Formados para a cerimónias : lado a lado


Foto 8 > Creio que , no lado esquerdo, se trata do comandante João Gomes.


Foto 9 > Inicio da saída do Xitole


(xix) BAMBADINCA – 2 de Setembro de1974 - Era o depósito do Leste. Todo o material vinha dar aqui para ser transportado para Bissau. Material e pessoas.


Foto 10 > Material no Xime


Foto 11 > Furriéis da 2.ª CCAÇ no Xime


Conhecemos alguns jornalistas cubanos que se sentavam à nossa mesa de refeições. Brindavam-nos, por vezes, com cantares do seu país.


Trabalho pesado para os soldados que faziam a estiva no Xime carregando as LDG.


Foto 12 > Mais material no Xime - este foi carregado manualmente


Ultima baixa na Companhia. Desta vez por doença: o soldado Vivas da Costa do meu Gr Comb, morre no HMB, vítima de paludismo.


(xx) BAMBADINCA – 7 de Setembro de 1974 - Já tínhamos entregue, também, este quartel quando, um dia resolvi ir até ao cais.


Em frente ao depósito de géneros trava-se uma discussão entre o comandante, guinéu, João Gomes e o comissário político, cabo-verdiano, Antero Alfama. Já os conhecia desde o Xitol e fiquei admirado.


Um queria distribuir os produtos alimentares de imediato pela população - claro o João Gomes. O outro queria controlar essa distribuição. De repente e acabando com a discussão o João Gomes vira-se para a pequena força que o acompanhava, uns dez soldados, e diz:
- Quem está comigo fica atrás de mim, quem não está vai para o lado dele…


No dia seguinte regressava a Bissau e depois a Lisboa. Esta já não era, de certeza, a minha guerra.


Foto 13 > BISSAU – 12 de Setembro de 1974 - Embarque no Uíge, para Lisboa.


José Zeferino
Aos 21 de Maio de 2009
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Nota de CV:


(*) Vd. poste de 17 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 – P4367: Ainda a última emboscada do PAIGC em 15 de Maio de 1974, no pontão do Rio Jagarajá, subsector do Xitole (José Zeferino)