Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
sábado, 23 de novembro de 2024
Guiné 61/74 - P26182: Parabéns a você (2330): José Saúde, ex-Fur Mil Operações Especiais da CCS / BART 6523/73 (Nova Lamego, 1973/74)
Nota do editor
Último post da série de 19 de novembro de 2024 > Guiné 61/74 - P26166: Parabéns a você (2329): Mário Migueis da Silva, ex-Fur Mil Rec Inf (CCS/QG/CTIG, BART 2917 e CCAÇ 2701 - Bissau, Bambadinca e Saltinho, 1970/72)
terça-feira, 12 de novembro de 2024
Guiné 61/74 – P26146: (Ex)citações (430): Habitações palacianas de Gabu (José Saúde)
1.
O nosso Camarada José Saúde, ex-Fur Mil OpEsp/RANGER da CCS do BART 6523 (Nova
Lamego, Gabu) - 1973/74, enviou-nos a seguinte mensagem.
Camaradas,
Tenho
lido textos no nosso blogue – Luís Graça & Camaradas da Guiné - de
camaradas que visam literalmente a antiga Nova Lamego, atual Gabu. Digo-o, sem
o mínimo de uma dúvida que porventura me suscitava hesitações, pois eles são
tão claros que não retiro uma vírgula aos escritos aqui lançados pelos seus
signatários, que Gabu tem, naturalmente, a sua própria história existencial.
Quando
lancei o livro – “UM RANGER NA GUERRA COLONIAL – GUINÉ-BISSAU 2973/1974 –
MEMÓRIAS DE GABU” – ocorreu-me em procurar a razão de como tudo terá
acontecido. Ou seja, a razão da sua existência e de que como tudo terá evoluído
até ao presente.
É óbvio que pelo meio ficou a nossa presença aquando da guerra colonial, mas ficarão também imagens que jamais esqueceremos. Por isso, aqui vos deixo a história de Gabu e dos então peiriquitos que ousaram explorar os recantos da então Nova Lamego.
Habitações
palacianas de Gabu
Denominada
como Nova Lamego, sobretudo ao longo da guerra colonial, Gabu é uma região
cujas fronteiras confinam a norte com o Senegal, a Leste e a Sul com as regiões
de Tombali e a Oeste com Bafatá.
Recorrendo
a dados históricos contemplados na Wikipédia, enciclopédia livre, Gabu foi a
capital do Império Kaabu, um reino Mandinga que existiu entre os anos de 1537 e
1867 e que se chamava Senegâmbia. Antes, tinha sido uma província do Império
Mali. No século XIX a etnia fula impôs a sua supremacia na região e colocou
ponto final no domínio de Kaabu.
Gabu
é, igualmente, a pátria do chão fula (79,6%), existindo ainda a etnia mandiga
(14,2%) que se espalha por toda a zona, mas numa menor escala. Foi-me dado a
oportunidade em conhecer alguns dos princípios éticos de uma população que
prima pela honra de uma herança que assumem como um indeclinável direito.
No
plano territorial Gabu possui uma área de 9.150 kms2 e tinha no ano de 2004 uma
população que se estimava em 178.318 almas, sendo, por isso, considerada uma
das maiores, senão a maior, das regiões do país.
Introduzo
como credível uma nota de rodapé que após a independência do país Gabu
recuperou o seu nome tradicional existindo, atualmente, um pequeno núcleo
urbano de inspiração colonial.
Detentora
de clima tropical, quente e húmido, a região de Gabu é composta por uma
população em que a doutrina praticada aponta como alvo principal a religião
muçulmana (77,1%).
As
temperaturas rondam, normalmente, os 30/33 graus durante o dia e os 18/23 à
noite. As estações anuais definem-se como as das chuvas que vai de maio a
novembro e a de seca de dezembro a abril. Dezembro e janeiro são considerados
os mais frescos. Por outro lado, a economia assenta no comércio, agricultura e
pecuária.
Os
usos e costumes das gentes de Gabu derrapam para primórdios éticos onde é
visível uma hierarquia humana que não abdica do erário tribal transmitido de
gerações para gerações.
Redijo
este tema sobre um “estágio” obrigatório nessa zona e na qual me foi
proporcionado observar algo mais ao longo da minha comissão em solo guineense,
embora encurtada devido à Revolução de Abril de 1974, uma vez que fui um dos
cerca de 45 mil militares dos três ramos das Forças Armadas – Exército, Força
Aérea e Marinha – quando por lá prestava serviço. Conheci, portanto, a guerra e
a paz e um pouco das vivências tradicionais das suas gentes.
Uma
rua
Aliás,
num trivial conhecimento com os nativos que muito me estimulou, pessoas simples
que viviam no interior de um adensado mato e entre as duas frentes da guerra,
usufrui da possibilidade em conhecer alguns dos seus expeditos hábitos, assim
como as memórias que nós combatentes incessantemente recordaremos.
Vamos,
pois, ao encontro de conteúdos passados em pleno palco da guerrilha.
A
população em movimento
Passeio
na “5.ª Avenida”
Suavizavam
o ar com o odor de uma “penugem” que os então pe9riquitos, nome usado pela tropa
mais velha para identificar os recém-chegados a solo guineense, lançavam para o
infinito de um horizonte inimaginável e onde surgiam quadros pesarosos pintados
pelo negro de uma incerteza. Porém, a incubação nos ovos chegava ao fim.
Tínhamos avezinhas. Um esticão de asas, um apalpar no escuro, uma vertigem dos
mais fracos, o vociferar dos conteúdos da guerra, o trocar opiniões sobre os
estratagemas do inimigo, as emboscadas, as minas, os ataques noturnos aos
quartéis, entre tantos outros motes aflorados, davam azo a uma conversa sempre
indeterminada entre o grupo acabado de chegar ao Leste da Guiné.
Cenário:
a “5.ª Avenida” de Nova Lamego, quais turistas a passearem-se pelas ruas chiques
das grandes metrópoles americanas! Ao fundo da dita cuja (“5ª Avenida”), eis o
grupo a abancar no bar da Pensão Mar e a refrescar-se com as aprazíveis sagres.
Era o princípio de uma jornada por terras de além-mar. Outras fainas se
seguiriam!
A Guiné parecia apenas um sonho. Aliás, jamais
me tinha ocorrido à ideia de que o meu futuro militar me reservasse, como
virtual conjetura, conhecer um dia a realidade da guerrilha no terreno
guineense e as suas famosas bolanhas.
Falava-se
da Guiné como o diabo foge da cruz. A guerra naquela província do Ultramar era
terrível. Traçavam-se cenários mórbidos. A rapaziada comentava e a mensagem
passava de boca em boca. Mas o destino contemplou-me e eu, tal como grande
parte dos rapazes desses tempos, não fugi a esse fim. Fui e voltei tal como
parti, restando resquícios de histórias que contemporizam o meu calendário de
vida.
Camaradas
houve, e foram muitos, que já não usufruem, infelizmente, do prazer de
partilhar momentos de convívio e narrar as suas histórias de vida. Uns,
morreram em combate na densidade de um mato cerrado; outros, faleceram numa
emboscada; outros, encontraram a morte em ataques aos quartéis; outros,
fecharam definitivamente os olhos em famigerados rebentamentos de minas
anticarro e antipessoal e, ainda, há aqueles que morreram em momentos de pura
infelicidade. Desastres com viaturas militares ou armas de fogo, carimbaram o
seu derradeiro fim.
Convivi
com situações que me deixavam apreensivo quando em causa esteve a razão do
último adeus. Momentos fatídicos, mórbidos, de camaradas que ousaram abusar do
facilitismo e se deixaram cair, inadvertidamente, em fatídicos fins proibidos.
Exemplifico o infeliz que encontrou a morte a limpar a arma esquecendo,
entretanto, que tinha deixado uma bala na câmara e outros em estúpidos
acidentes com viaturas militares, todos, ou quase todos, temos histórias desta
estirpe para contar.
Olho,
atentamente, para duas fotos do meu álbum – Guiné - e revejo um passeio pela
“avenida” principal de Nova Lamego, nos primeiros dias em que ali “ancorámos”.
O clique foi justamente dado em frente a uma casa onde residiam duas irmãs
cabo-verdianas que eram professoras primárias na escola local.
Vivendo
momentos de uma juventude no seu auge, alguns furriéis e alferes, andavam
doidos com as meninas que, por sinal, eram boas como o milho. Recordo que a
malta andava mesmo vidrada com aquele duo de airosas donzelas mestiças.
Parceiros? Não lhes conheci. Passemos à frente…
O
grupo de turistas, todos janotas, embevecidos com a beleza natural que os
rodeava e o cheiro a África a inalar as nossas narinas, eis o grupo de
periquitos, à civil, sentados a uma mesa do bar da Pensão Mar. Um nome que nada
tinha a ver com a realidade deparada. O mais indicado, na nossa conceção, seria
substituir Mar por Bolanha. O mar, lá longe, nem vê-lo. A bolanha era, isso
sim, o afrodisíaco mosaico constatado em terrenos circundantes, bem como em
quase todo o território guineense. Mas aceitava-se a decisão do seu mentor.
África
é sumptuosa no consumo de bebidas, principalmente cerveja. O calor afirma-se
como um aditivo determinante pelo prazer de consulares gargantas ressarcidas.
Num convívio saudável ficou uma tarde de passeio na apelidada “5ª Avenida”, o
alforge recheado de cervejas bebidas e um conhecimento mais profícuo de uma
urbe onde as bajudas passeavam os seus corpos embrulhados em pedaços de panos
garridos que torneavam a preceito os seus joviais e esbeltos físicos. O militar
– periquito – apreciava e… imaginava cenários quiçá inexequíveis de alcançar.
Coisas de uma juventude irreverente.
Refastelados
à volta de uma mesa o grupo de furriéis ressarciam-se com as cervejolas
fresquinhas
Periquitos desbravavam o ambiente da “avenida”. Da esquerda para a direita: o Cardoso, Operações Especiais/Ranger, Eu, o Santos, Minas e Armadilhas, Freitas e o Rui, Operações Especiais/Ranger
Abraços camaradas e um até breve.
José Saúde
Fur Mil Op Esp/RANGER da CCS do BART 6523
___________
Nota de
M.R.:
Vd.
últimos postes desta série em:
20 de
abril de 2024 > Guiné
61/74 – P25415: Os 50 anos do 25 de Abril (10): Até sempre, Nova Lamego! (José
Saúde, ex-fur mil op esp/ranger, CCS / BART 6523, 1973/74)
quinta-feira, 5 de setembro de 2024
Guiné 61/74 - P25913: Blogues da nossa blogosfera (195): "Portugal Portal," em neerlandês, de Henk Eggens: publicou em 19/7/2024 um artigo do José Saúde ("Een militair keert naar huis terug"/ "Uma soldado volta para casa")
Portugal Portal, de Henk Eggens, em neerlandês. Cópia da página de 19 de julho de 2024, "Um soldado volta para casa, de Henk Eggens e José Saúde.
1. Há uma página na Net que se chama Portugal Portal e que se publica em neerlandês, sendo editada por um amigo de Portugal e da Guiné-Bissau, o médico Henk Eggens, lusófono, por sinal casado com uma portuguesa... Merece ser conhecida...
Mas demos-lhe a palavra:(....) Trabalhei na Guiné-Bissau como médico de 1980-1984. Os primeiros anos estava baseado na Fulacunda, Quínara. Vivi na casa do comandante no antigo quartel. Era o único médico na região, desde Tite até Empada. Sem hospital, com poucos recursos. Foi uma aventura valiosa.
Desde aquele tempo fiquei ligado mentalmente com Guiné-Bissau e o povo lá. Assim sigo o blogue de Dr. Luís Graça. Aparecem reflexões equilibradas sobre aquele tempo difícil, como o Senhor descreveu bem. (...)3. O artigo do Zé Saúde, em holandês (ou melhor, neerlandês, como agora se diz), saiu em 19 de julho passado: |
Caro Sr. José Saúde,
Queria informa-lhe que o seu artigo em holandês foi publicado no dia 19 de julho 2024. https://www.portugalportal.nl/een-militair-keert-naar-huis-terug/ (**)
Espero que o senhor tenha a possibilidade de ler a tradução.
Agradeço a oportunidade de poder publicar sua mensagem de memórias traumáticas no final de sua estadia na Guiné. Para o leitor holandês, longe das vossas experiências na tropa, dá, acho eu, para perceber melhor aquele episódio da história tão importante dos Portugueses e das Portuguesas.
Henk Eggens
Redactie Portugal Portal
Portugal Portal
Durante a minha estadia em Portugal conversei com vários portugueses que viveram a guerra, a maioria deles na Guiné, mas também em Angola e Moçambique. A maioria eram recrutas e, após um rápido treinamento militar básico, foram transferidos para um país africano estrangeiro. Lá era esperado que eles defendessem a pátria contra os turras, os terroristas (eu os chamo de lutadores pela liberdade). Foram criados com a ideia de que o grande império português também tinha de ser defendido contra os comunistas noutras partes do mundo.
Muitos deles ficaram desmotivados durante a sua longa permanência em situações de guerra. A desmotivação levou à resistência contra a política portuguesa prevalecente. O resultado foi a revolta dos 'Capitães de Abril' que desencadearia a Revolução dos Cravos.
O slogan “25 de Abril começou em África” contém um fundo de verdade.
José Saúde, que viveu o 25 de Abril de 1974 como militar proveniente de uma unidade de elite (Rangers), tendo feito a sua comissão militar em Nova Lamego (atual Gabu, Guiné-Bissau) e tem registado as suas memórias num blog de veteranos de guerra portugueses (Luís Graça & Camaradas da Guiné).
Foi um Abril que “rejuvenesceu ao som de um cravo vermelho”. Jovens encantados com o sucedido e preparados para voltar rapidamente para casa. Era Abril, e seu cravo vermelho a renascer de um tempo onde proliferava a escuridão. Éramos filhos das longas manhãs de profundas indecisões, mas onde a esperança da liberdade permanecia permanentemente nos nossos corações. Fomos, também, filhos de gente humilde, que passou por um período difícil (HE: No texto original: que comeram o pão que o diabo amassou), mas de pais que nos criaram e que fizeram nós homens para um amanhã melhor.
Porém, os tempos sombrios impediram muitos dos nossos pais darem aos filhos o ensino secundário ou superior, porque os recursos financeiros da família eram demasiado limitados. Somos filhos de um regime totalitário, o Estado Novo, onde civis inocentes foram colocados sob ordens estritas enquanto muitas pessoas simplesmente pediam trabalho, mesmo que fosse apenas sazonal.
Os tempos eram diferentes! Tempos em que faltava liberdade para expressar opiniões pessoais e em que os mais destemidos eram enviados para ‘campos de férias’, onde as grades de uma prisão se apresentava como uma realidade inegável. Pessoas sérias e honestas, algumas com apenas a quarta classe do ensino primário, outras analfabetas, mas cuja coragem própria resultou em prisão política. Pessoas que estavam comprometidas de coração e alma com uma crença que consideravam justa e onde tinham em mente o bem-estar do seu povo. Mas, por outro lado, sempre existiram os agentes leais de um regime que não mostrou piedade para com o cidadão honesto.
Éramos crianças alegres, brincávamos na rua, jogávamos futebol em campos inóspitos, às vezes com bola de trapo ou com uma bexiga de porco e tantas outras brincadeiras que ainda hoje lembramos. Crescemos ouvindo falar de atrocidades onipresentes do regime, de agentes da PIDE que dominavam tudo ou quase tudo, conhecemos o sofrimento incalculável de famílias marcadas pelos mandamentos estritos de pessoas vestindo fatos caros, à Príncipe de Gales, e com gravatas de seda pura.
Assistimos à guerra colonial como muitos milhares de camaradas, no nosso caso em território guineense. O conflito começou em Angola em 1961 e estendeu-se a Moçambique e à Guiné, terminando com a queda do regime liderado pelos capitães de Abril. Nós, jovens rapazes, fomos enviados para o cenário de uma guerra onde os soldados, quando confrontados com a realidade guerrilha, ficavam enfurecidos, protestavam violentamente e proferiram, por vezes, maldições. A frustração levou-os a um quadro virtual onde estava escrita a simples frase: Matar para não morrer!
Sim, como sabeis camaradas, muitos perderam a vida no campo de batalha, outros em picadas, ou numa emboscada, outros nos seus quartéis em consequência de ataques noturnos inimigos e quando descansavam sobre um aparente aliviar de tréguas. Muitos ficaram mutilados; muitos outros portadores de doenças mentais crónicas devido às circunstâncias completamente inesperadas em que viveram.
Quando rebentou a Revolução de Abril e soou o som do clarinete para nos reunir, este vosso camarada estava a cumprir a sua missão militar na Guiné, mais precisamente em Nova Lamego, hoje Gabu.
Saudações deste velho camarada!
José Saúde
—————-
O Portal Portugal já prestou atenção aos soldados portugueses que lutaram na guerra colonial.
______________
Notas do editor:
(*) Vd. 20 de abril de 2024 > Guiné 61/74 – P25415: Os 50 anos do 25 de Abril (10): Até sempre, Nova Lamego! (José Saúde, ex-fur mil op esp/ranger, CCS / BART 6523, 1973/74)
(**) Último poste da série > 5 de maio de 2024 > Guiné 61/74 - P25483: Blogues da nossa blogosfera (194): Recuperando parte dos conteúdos do antigo sítio da AD Bissau - Parte VII: mulheres pescadores do rio Cadique (foto de Ernst Schade)
quarta-feira, 29 de maio de 2024
Guiné 61/74 - P25578: Efemérides (439): Inauguração do Monumento aos Antigos Combatentes do Concelho de Beja, levado a efeito no passado dia 9 de Maio de 2024 (José Saúde, ex-Fur Mil Op Esp)
1. Mensagem do nosso Camarada José Saúde, ex-Fur Mil Op Esp da CCS do BART 6523 (Nova Lamego, Gabu, 1973/74), com data de 28 de Maio de 2024:
Inauguração do Monumento aos Antigos Combatentes do Concelho de Beja
Homenagem os Antigos Combatentes
Realizou-se no pretérito dia 9 de maio, 2024, feriado municipal da cidade de Beja, a inauguração do Monumento aos Antigos Combatentes da Guerra Colonial – Angola, Moçambique e Guiné -, onde perpetuamente nele permanecerão registados os nomes dos mortos naturais do concelho.
O evento mereceu as honras oficiais, civis e militares, tendo-se verificado a presença de muitos antigos camaradas que lutaram nas três frentes do conflito ultramarino, tendo também sido homenageados dois dos antigos camaradas e sócios da Liga dos Combatentes.
Sendo o momento de imagens não irei, por isso, alargar-me com o texto, mas deixar-vos um conjunto de fotografias que enalteceram o tão prestigioso evento. Resta, porém, dizer-vos que houve discursos, nomeadamente do presidente da câmara municipal de Beja, Paulo Arsénio, e também por parte da Liga dos Combatentes.
Abraço, camaradas
José Saúde
_____________
Nota do editor
Último post da série de 29 DE MAIO DE 2024 > Guiné 61/74 - P25577: Efemérides (438): 10 de Junho, Dia de Portugal - Homenagem Nacional aos Combatentes, Igreja de Santa Maria de Belém, nos Jerónimos e junto ao Monumento aos Combatentes do Ultramar, em Lisboa
sábado, 20 de abril de 2024
Guiné 61/74 – P25415: Os 50 anos do 25 de Abril (10): Até sempre, Nova Lamego! (José Saúde, ex-fur mil op esp/ranger, CCS / BART 6523, 1973/74)
Abril em Nova Lamego
por José Saúde
Abril, e o seu cravo vermelho!
José Saúde
Fur Mil Op Esp/RANGER da CCS do BART 6523
__________
Nota de M.R.:
Vd. último poste desta série em:
19 de abril de 2024 > Guiné 61/74 - P25410: Os 50 anos do 25 de Abril (9): "Factum": c. 170 das melhores fotografias do Eduardo Gageiro, no Torreão Nascente da Cordoaria Nacional, até ao próximo dia 5 de maio
segunda-feira, 18 de março de 2024
Guiné 61/74 – P25283: Efemérides (431): 51º Aniversário de instruendos que passaram pelo CIOE, em Penude, Lamego (José Saúde)
1. O nosso Camarada José Saúde, ex-Fur Mil Op Esp/RANGER da CCS do BART 6523 (Nova Lamego, Gabu) - 1973/74, enviou-nos a seguinte mensagem.
Um tempo, sem tempo, que ainda ousa reunir camaradas de armas e seus familiares
Não obstante os agrestes e eventuais contratempos que porventura nos surgem pelo caminho, existe, porém, a certeza que quando o “comandante” Alberto Grácio toca o reunir as tropas, 1º Curso/Turno de 1973 de Operações Especiais/Ranger em Penude/Lamego, nós antigos militares e combatentes da antiga guerra colonial que se espalhou por Angola, Moçambique e Guiné, respondemos, com prontidão e, num tom fortemente unissonante, respondemos: SIM, presente!
Desta feita, o evento, o 13º, teve lugar em Palmela e por lá apareceram muitos camaradas, sendo que alguns deles se fizeram acompanhar por familiares. Foi, no fundo, trazer às nossas reminiscências o que fora a dureza de uma especialidade que nos acompanhou ao longo das nossas vivências militares, assim como o palco de guerra por onde andámos.
Ali falou-se de tudo um pouco. Dos bons e dos maus momentos pelos quais passámos. Éramos jovens e essa postura militar, sendo então obrigatória, foi-nos mais enriquecida pela passagem pelos Rangers, que nos deu novas “armas” para enfrentarmos as mais díspares situações que nos surgiram pela frente nos campos onde as batalhas naturalmente proliferavam.
Mas o mundo no qual hoje vivemos, a guerra, aquela em que os vossos avós e pais foram obrigados em participar, são agora guardados em baús onde essas memórias foram paulatinamente corroídas com o evoluir das épocas passadas, ainda que elas não sejam assim tão distantes no tempo. Todavia, existe uma nuvem negra que tenta escamotear a realidade pela qual infalivelmente passámos.
Atualmente o pouco que resta a este povo português, que parece esquecido do recente conflito armado em terras de além-mar, sejam relatos escritos em livros que avivam as memórias dos ainda interessados numa valorização dos seus conhecimentos pessoais.
Catarina Gomes, jornalista/escritora, trouxe a público um livro chamado “Pai, tiveste medo? Uma obra que cita, precisamente o camarada Gomes, já falecido, pertencente ao nosso Curso, 1º de 1973, que prestou serviço militar em Angola, como alferes. Paz à tua alma, camarada. Ah, houve um momento em que se fez silêncio pela tua inesperada partida. Ficou o simplório gesto dos companheiros com os quais partilhaste as dificuldades, físicas e mentais, no sopé da Serra das Meadas. Nós, os teus camaradas, já septuagenários, que, por ora, continuam a fazer peso à terra, prosseguirão essa divina missão em rever os presentes e, singelamente, recordar os ausentes, isto é, aqueles que um dia partiram para o infalível caminho rumo a outros nimbos, mas com outras dimensões, sendo estas deveras cruéis.
Amigos de sempre e para sempre, lembremo-nos que as vidas, sendo demasiado curtas, serão, contudo, elevadas com celebridade enquanto as nossas vozes solfejem o condão de estarmos vivos. Para trás ficaram memórias, de todo inesquecíveis, numa guerra que nos foram demasiado cruéis, quer em Angola, Moçambique ou Guiné, onde muitos destes camaradas presentes no evento por lá militaram.
Que venha o próximo Convívio, este a Norte!
Eu, Zé Saúde, com o meu companheiro por terras de Gabu, Guiné, Rui Álvares, onde comandamos, em simultâneo, o mesmo grupo de intervenção
Alberto Grácio, o “Comandante” em pleno campo de “batalha” e a preparar as “armas” para um “assalto à mão” a uma mesa recheada de “rações de combate”. Grácio, um antigo combatente na Guiné
Os convivas
Uma outra parte da sala
Catarina Gomes a partir o bolo do nosso 13º Convívio
Abraços camaradas e um até breve.
José Saúde
Fur Mil Op Esp/RANGER da CCS do BART 6523
___________
Nota de M.R.:
Vd. últimos postes desta série em:
26 DE FEVEREIRO DE 2024 > Guiné 61/74 - P25214: Efemérides (430): O "making
of" do livro de Spínola, "Portugal e o Futuro", publicado há 50
anos (revelações do biógrafo, Luís Nuno Rodrigues)
domingo, 11 de fevereiro de 2024
Guiné 61/74 – P25159: (Ex)citações (427): Pequeno texto referenciado no meu livro “UM RANGER NA GUERRA COLONIAL – GUINÉ/BISSAU 1973/1974" (José Saúde)
1. O nosso Camarada José Saúde, ex-Fur Mil OpEsp/RANGER da CCS do BART 6523 (Nova Lamego, Gabu) - 1973/74, enviou-nos a seguinte mensagem.
Camaradas,
Os tempos de vida, os nossos, lá vão caminhando por
uma estrada cada vez mais apertada. Ambicionamos, e sempre, um presente
ajustado às nossas capacidades físicas e intelectuais, assim como um amanhã
onde suplicamos um bem-estar para a nossa presença neste planeta chamado Terra.
A idade não perdoa. Sim, é verdade que tempo voa. Ainda assim, lá vamos remexendo em histórias que nos enviam, em particular, para a nossa estadia forçada na guerra colonial da Guiné, ou aquando um dia partimos de Lisboa rumo ao conflito guineense, mas com a curiosidade a suscitar dúvidas em relação à futurologia que nos esperaria. Neste contexto, deixo-vos camaradas imagens por todos certamente relembradas.
Angola, Moçambique e Guiné, hoje países
independentes, foram outrora palcos de guerrilha que marcaram uma juventude que
vivia em plenos anos de autêntica exaltação. Nesses tempos, os clamores
evocados pelos jovens desembocavam numa encruzilhada de cavaqueiras cujo
destino se fixava amiudadamente com a guerra do Ultramar.
A tropa assumia-se, para todos nós, como um beco
sem saída. A necessidade premente ao recurso de seres humanos que engrossavam
as fileiras do exército, impunham colaterais apuramentos dos mancebos. Não
olhassem ao aspeto físico da criatura e nem tão-pouco a pequenos defeitos
congénitos que o rapaz, com 20 anos, apresentava. O apuramento da rapaziada era
transversal. Os livres foram chãos que já tinham dado uvas.
Aportei em solo guineense cerca das 14 horas
locais no dia 2 de agosto de 1973. Ao descer do avião deparei-me, de
imediato, com um bafo deveras incomodativo. Faltava-me o ar e o suor
escorria-me pelo rosto abaixo. A minha respiração parecia ávida dos ares
lusitanos. O cheiro a África era-me uma realidade completamente desconhecida. O
clima parecia de todo adverso. Confesso que o calor sempre me fascinou,
todavia, este apresentava-se com contornos adversos e literalmente sufocante,
assim sendo o meu ego de pronto interiorizou o que lhe ia na alma: “eis-me num
território agreste onde a guerra se apresentava como uma irreversível
realidade”.
Os primeiros contactos com os nativos
transmitiam odores natos de gentes que se predispunham a contemplar aqueles
tímidos jovens que chegavam. Na pista do aeroporto de Bissalanca, e com o
Boeing 727 que nos transportara a preparar-se para efetuar a viagem de regresso
a Lisboa, deparei-me com uma verdade diametralmente diferente daquela que
dantes havia idealizado.
Lembro de sobrevoar o deserto do Saara e olhar as
dunas lá do alto, os oásis e as pequenas aldeias isoladas num extenso areal.
Tudo observado a uma distância que minusculamente não contemporizava uma visão
autêntica com o espaço visualizado. Ficava a imaginação de um jovem que cruzava
fronteiras aéreas a caminho da guerra.
Todas as histórias têm um vínculo que nos
transporta a vidas dispersas ao cimo deste imenso globo universal chamado
Terra. Nesta obra relato factos verídicos por mim vividos enquanto prestei
serviço militar obrigatório, sendo o fim uma comissão numa fase em que a luta
atormentava o mais incauto comum dos mortais. Felizmente tive, aliás, tivemos a
sorte que nos instantes finais do conflito nos deparássemos com dois tempos
diametralmente oposto: a guerra e a paz.
A guerrilha na Guiné tinha contornos buliçosos.
As condições do terreno, o clima e a forma como o PAIGC atuava, formava um
tridente que não dava tréguas ao mais astuto militar da metrópole. É verdade
que o exército português jamais se apresentou como uma arma maleável para o IN
(inimigo). Comprovámos, sempre, que as nossas capacidades de reação foram
evidentes nos campos de batalhas.
Do conflito da Guiné há retratos que ao longo
dos anos têm chegado ao nosso conhecimento, com testemunhos verídicos, que
relatam de como foi dura a peleja guerrilheira. Sabendo nós, principalmente
aqueles que conviveram o dia-a-dia com os problemas da escaramuça, que o
contingente luso na Guiné registava cerca de 45 mil efetivos nos três ramos das
Forças Armadas – Marinha, Força Aérea e Exército -, enquanto o PAIGC dispunha,
nos tempos finais, perto de 10 mil, logo, numa análise feita à pressuposta quantidade
de operacionais que cada exército dispunha, o cenário parecia favorável às
forças lusitanas.
Teoricamente seria essa a intenção dos homens de
Comando, indivíduos que instalados nos seus gabinetes estudavam o conflito,
mas… ao longe. Examinavam os mapas de cada região ao pormenor e idealizavam
ações no palanque operacional, mas no interior de quatro paredes. Era, quiçá, a
guerra operacional dos galões amarelos.
Porém, a prática dizia-nos uma verdade oposta.
As condições deparadas na frente de batalha, essencialmente a forma como a
guerrilha atuava a que acresce a maneira como o IN conhecia o palco real e a
forma como os seus movimentos no mato se desenhavam, deixavam a nossa tropa
perplexa diante a imprevisibilidade de um eventual contacto direto.
Hoje, e com a distância do tempo a prevalecer,
faço uma visita aos corredores da minha já apertada memória e vergo-me perante
a coragem de antigos companheiros que, de uma ou de outra forma, conseguiram
dissuadir as intenções do IN no momento em que o ziguezague das balas se
cruzavam no infinito do horizonte. Neste contexto, é justo enaltecer o valor
individual de cada combatente no instante em que o confronto se pautava pela
dureza.
Sabe-se que foram muitos os que morreram no
palco da peleja, outros que ficaram estropiados e outros que regressaram,
felizmente, sem nenhuma beliscadura. Há, igualmente, aqueles que ainda hoje
padecem de distúrbios mentais que o conflito lhes proporcionou.
O stress de guerra é há muito uma patologia aguda que tem levado muitos dos ex-combatentes a um pasmo de dificuldades que conduzem o potencial portador da doença a situações variadas. Conflitos a nível do emprego e familiares, designadamente, traduzem que os valores herdados da guerra têm transformado intelectos que evidenciam quebras memoriais, resultantes de hostis ensejos deparados perante ocasionais instantes de autêntico desespero.
Abraço, camaradasJosé Saúde
Fur Mil Op Esp/RANGER da CCS do BART 6523
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Vd. último poste desta série em:
11 DE FEVEREIRO DE 2024 > Guiné 61/74 - P25158: Blogpoesia (797): "Mãos de hoje que foram de sempre", por Adão Cruz, ex-Alf Mil Médico da CCAÇ 1547 / BCAÇ 1887 (Canquelifá e Bigene, 1966/68)
domingo, 4 de fevereiro de 2024
Guiné 61/74 - P25134: A 23ª hora: Memórias do consulado do Gen Bettencourt Rodrigues, Governador e Com-chefe do CTIG (21 de setembro de 1973-26 de abril de 1974) - Parte II: A carestia do arroz em fins de 1973, e a intervenção do Governo, regulando o mercado e fixando o preço que passa de 5$50 para 7$00/kg
Gen de três estrelas, Bethencourt Rodrigues
(Funchal, 1918 - Lisboa, 2011) (*)
1. Uma "batata quente" que estalou nas mãos do novo Governador-geral e Com-chefe da Guiné, o Gen Bettencourt Rodrigues, foi a carestia de vida, provocada pelo aumento da generalidade dos bens essenciais para o abastecimento tanto da tropa como da população civil, na sequência do choque petrolífero e da crise económica de finais de 1973. Teve consequências na economia, no aumento dos preços, na inflação que disparou, no aumemto das despesas militares e da administração civil, nas acrescidas dificuldades de transporte de tropas e material, no fornecimento de combustíveis, enfim, na logística, na alimentação e no moral da tropa, na ação psicossocial, etc. 1974 foi o "anus horribilis" de Marcello Caetano mas também o do governador-geral e com-chefe da Guiné.
Como represália, os países árabes organizados na OPEP (criada em 1960 pela Arábia Saudita, Kuwait, Irão, Iraque e Venezuela) o preço do petróleo aumemntou em mais de 400%. Em março de 1974, os preços nominais tinham subido de 3 para 12 dólares por barril (a preços atuais, de 14 para 58).
O Canadá, o Japão, a Holanda, o Reino Unido e os Estados Unidos foram os principais alvos do embargo inicial que se estendeu depois a Portugal, a Rodésia e a África do Sul. Os efeitos económicos e financeiros, a nível internacional, fizeram-se sentir de imediato. Por exemplo, em Portugal, o litro de gasolina super passa de 7,5 escudos para 11 escudos (o equivalente, a preços atuais, a 2,32 €). Esta crise, de 1973, ficou conhecida como o "primeiro choque petrolífero". Outro se seguiu em 1979. (Fonte: Wikipédia > Crise petrolífera de 1973).
No caso de Portugal, tiveram tremendas consequências económicas, financeiras e político-militares, que já não cabe aqui analisar, mas que vão desembocar, indiretamente, no golpe de Estado do 25 de Abril de 1974 e no fim da guerra colonial, numa altura em que a situação militar, no terreno (incluindo na Guiné) estava longe de ser desfavorável para o exército português.(**)
"Reduzida a produção local a cerca de 50% das necessidades,
por aumento do consumo e diminuição da produção, como consequência da guerra e
dum certo afastamento do trabalho na terra por parte da população, em especial
da mais jovem, desde fins de 71, princípios de 72, a importação passou a
encontrar dificuldades crescentes, por
forças da escassez de cereais dos mercados mundiais e da elevação de preços quer do produto, quer dos transportes.
"Assim, em fins de 1973 houve necessidade de contingentar a distribuição e
de elevar o preço tabeladom de 5$50 para
7$00 escudos, suportando, embora o Governo
um encargo não inferior a 2$50 / kg.
"Estas medidas não foram naturalmente recebidas com grande
pela população, apesar do arroz ser vendido nos territórios vizinhos a preços
muito superiores ao praticado na Guiné (Senegal, 14$00, e República da Guiné.
22 a 26$00) e de ter havido um aumento do preço de aquisição ao produtor local
de cerca de 25%.
"Para atenuar uma situação de abastecimento com tendência
para se agravar, dada a progressiva retração do mercado mundial,
independentemente de custos, várias ações foram empreendidas, como a
diversificação da dieta alimentar tradicional, para o que se recorreu à
importação de milho e feijão, a recuperação de bolanhas e uma intensificação do
esforço para aumento da produção, pelo apoio à cooperativização dos
agricultores, distribuição de sementes de arroz seleccionadas e de adubso e apoio
técnico dos Serviços Provinciais de Agricultura, além do aumento dos preços de
aquisição ao produtor." (...)
Fonte: excertos de Gen. Bethencourt Rodrigues, "Guiné", in Joaquim da Luz Cunha et al. "África: a vitória traída" (Lisboa, Editorial Intervenção, 1977), pp. 111/112.
2. Comentário de Cherno Baldé ao poste P25130 (*):
(...) Ainda antes do 25A74, o tal arroz de abastecimento do mercado local chegou, mas por algum motivo ligado a sua qualidade, a população dos centros urbanos que já estavam dependentes do arroz importado, deram-lhe o nome de "arroz Bettencourt", talvez em forma de protesto pela qualidade inferior relativamente ao que estavam habituados durante o consulado do gen Spínola.De salientar que, na altura, a dieta das populações do interior, especialmente do Leste, Norte e Nordeste, era a base do milho e folhas de vegetais (milheto, milho Brasil, cavalo, sorgo, entre outros) e um pouco do arroz de sequeiro e o produzido nas bolanhas.
3 de fevereiro de 2024 às 10:24
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Notas do editor: