Foto nº 5
Foto nº 4
Foto nº 8
Foto nº 7
Guiné > Bissau > Santa Luzia > QG/CTIG > 1967 > "Biafra" e outras instalações do "Clube de Oficiais" (messe, piscina, esplanadas...) >
Fotos (e legendas): © Virgílio Teixeira (2025). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]
1. Mensagem do Virgílio Teixeira, segunda, 9/06/2025, 23:44
Boa noite, Luis,
Antes de chegar o dia 10, o Dia de Portugal e dos antigos combatentes, estou a enviar aquele poste que foi o mais difícil e trabalhoso, dado o seu melindroso tema.
Ando há um mês com isto, e já iniciei o fim da estória em 1 de junho, agora já acho que é tempo de mais e quero trabalhar noutras coisas.
Espero que não vamos abrir aqui uma fenda, entre os privilegiados e os outros. Mas foi assim, e tudo o que está escrito, salvo erro de algumas datas ou omissão de outros comentários, fiz aquilo que sei, e para quem não teve esta oportunidade, fica aqui a saber como foi no meu tempo.
Atenção que eu não vivia lá, no "Biafra", só uma vez por mês no máximo, e aproveitava o que podia.
Penso que depois, nos anos seguintes e pelo que já vi por aí em novas fotos dos anos 70 e tal, de outros camaradas, as coisas mudaram muito para melhor, e abriram as portas à classe de sargentos, não havia justificação de ser um espaço elitista.
Os dormitórios não sei como se aguentavam, falo do "Biafra", como parte do "Clube de Oficiais"...
Abraço, Virgilio
2. A Bissau do Meu Tempo > "Biafra" (Fotos de 1 a 9)
Sabado, dia 01 Junho , 20h50
ARQUIVO SOBRE BISSAU > BIAFRA – CLUBE MILITAR DE OFICIAIS DO QG – PISCINAS – MESSE DE OFICIAIS
Nota de introdução:
O presente Poste sobre este tema pode ferir a suscetibilidade de alguns antigos combatentes, que não se reveem nestas fotos e descrição das mesmas.
É um tema que esteve sempre guardado, por respeito àqueles que não tiveram estas oportunidades, posso até dizer que pode ser um atentado a todos que tiveram uma guerra que não esta.
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Uns excessivamente mais dura, mas há muitos que também tiveram melhor vida.
A minha Vida em Bissau:
O nome de "Biafra" foi das primeiras noções sobre a Guiné desde que aterrei em Bissau no dia 21 set 67 pelas 9h da manhã.
O "Biafra" era o nome dado ao barracão de madeira, com cobertura de zinco, onde pernoitavam naquele tempo os oficiais milicianos subalternos, alferes e tenentes.
Para os restantes oficiais existiam vivendas com quartos individuais de qualidade razoável.
A conotação vinha exatamente do apoio dado por Portugal à guerra do Biafra que se desenrolava na Nigéria (#), tal como depois a guerra do Catanga no Zaire (ex-Congo Belga).
Quando parei no Sal onde pernoitamos, encontravam-se dois aviões diferentes que logo soubemos que iam para o Biafra, nome que já conhecia antes, tal como o Catanga.
Este barracão era dotado de nada, apenas camas de ferro, colchão verde de espuma. E, para quem o conseguisse, podia ter uma rede mosquiteira, para nos salvar dos mosquitos indesejáveis. Beliches de dois andares, sem limpezas nenhumas. E, como já foi dito, era um calor sofucante, que nem as portas abertas resolviam o ambiente brutal de cheiros.
Não era uma prisão porque não havia presos especificos e condenados, pois todos que tinham o azar de cair na Guiné, já eram presos à nascença sem culpa formada, mas condenados a 2 anos de pena efetiva, não beneficiavam de pena suspensa, como a maioria dos fora-de-lei exceto aqueles que cairam no terreno, mortos ou feridos e evacuados.
Como comodidades havia um espaço de casas de banho, sem sanitas, à caçador, e julgo que 2 ou 3 chuveiros para o duche. Havia uns lavatórios, não havia sabão nem toalhas, nada.
Isto era o "Biafra" que conheci, e onde fui parar logo na primeira noite do dia 21set67.
Nos anos seguintes era a mesma coisa, com a agravante da degradação por ausência de obras.
Este barracão-dormitório, destinado àqueles que chegavam em rendição individual, ou que partiam e regressavam de férias à metrópole, ou regressados pós-consultas externas e
tratamentos no Hospital da Estrela, entre outras situações, eram por isso mal dotados em tudo.
Mas diga-se que na minha cabeça pairava outro cenário bem pior, por isso não fiquei com traumas, aceitei aquilo que tinha.
Este pessoal não ia para as instalações dos Adidos (o Depósito Geral de Adidos) em Brá, porque aí só ficavam as unidades completas, que chegavam ou partiam.
Era este o meu caso, que, embora não tivesse ido em rendição individual, parti antes do
embarque do Batalhão em avião militar C6, juntamente com o comandante, o oficial de
operações, dois alferes milicianos de duas companhias operacionais e os dois respetivos sargentos do quadro.
Embora não venha a propósito do tema, quando lá voltei à Guiné em outubro de 1984, fui hospedar-me naquele empreendimento, que era o Hotel 24 de Setembro, com poucas modificações introduzidas. No local do barracão, o "Biafra", foram construídas meia dúzia de pequenas vivendas iguais às que já existiam do tempo da tropa, para os oficiais superiores, mas tudo era muito pior do que antes.
Voltando e para falar do "Biafra", o barracão- dormitório, mal amanhado: fazia parte de um grande complexo, a que se dava o nome pomposo de "Clube de Oficiais" do QG – Quartel
General – ou de "Santa Luzia".
Faziam parte do Clube, além do dormitório, um amplo espaço de ruas asfaltadas, com valas fundas para o escoamento de águas, jardins por todo o lado, bem tratados por pessoal profissional.
Completavam as instalações uma dúzia ou mais de pequenas vivendas individuais, para os oficiais superiores e famílias, muito bem tratadas e ajardinadas.
Além disso tinha então um amplo e grande espaço, a "Messe de Oficiais", um edificio para as refeições, os bares, as salas de jogos e filmes, salas de conferências, tudo espaços de lazer
impecáveis, que toda a oficialada frequentava, servidos por pessoal civil, empregados locais, de luva branca, e outros mimos que, pela minha parte, não conhecia.
Cá fora um amplo espaço de "Esplanadas e Bar", para as tardes quentes e as noites húmidas inundadas por carradas de mosquitos, que atormentavam o pessoal.
A luz era fraca, e havia aquelas coisas que não me lembro do nome, que queimavam e faziam um fumo indesejável à mosquitada [o repelente antimosquito, o mais conhecido era o de marca
"Lion Brand"].
Muitos sofriam as agruras das picadelas, e os efeitos nas peles brancas. Por acaso, eu fui um sortudo, a minha pela escura era um tampão às picadelas, não me faziam nada de especial, embora as quantidades enormes chateavam pela sua presença.
Finalmente tinhamos a "Piscina privada do Clube", uma boa piscina diga-se em abono da verdade. Dotada de bar e instalações sanitárias completas.
À volta tudo ajardinado com relva sempre bem tratada, àrvores de frutas, sombras, alguns equipamentos de ginástica.
Tudo isto era o chamado complexo do Clube, que não era o "Biafra", este era apenas o barraco- dormitório dos oficiais milicianos de passagem.
Todo o complexo era gerido por um coronel de Administração Militar a quem davam o pomposo nome de "O Lavrador", por ele se dedicar muito a tudo que dizia respeito às plantas,
flores, relvas, árvores e frutas. Nunca falei com ele, apesar de o ver muitas vezes, era gordo e anafado.
Mas tinha, a complementar tudo, a sua bela filha Suzy, uma rapariga nova que ornamentava as vistas da piscina, com quem tive uma relação próxima, sem nunca lhe ter tocado.
Poucas mais mulheres brancas se viam, mas algumas, poucas, eram as esposas de oficiais que ali viviam na sua comissão de serviço.
Vivia ali muita gente, ligados quer ao QG, às Companhias de Intervenção, alojadas no quartel, ali ao lado, a que se dava o nome de ‘O 600’, por ter sido construído por esta companhia ou batalhão.
O QG tinha todos os serviços, todas as REP , o Serviço de Justiça, a Chefia de Contabilidade, a Chefia da Intendência, a CHERET, com muita gente, empregados civis, muitos.
A entrada para o complexo, era feita pela estrada de Santa Luzia, que partia cá de baixo junto ao Pilão, e acabava na Porta de Armas. E para lá chegar havia uma viatura militar de hora a
hora, para baixo e para cima, para o transporte do pessoal apeado.
Eu pouco usufruí disso, pois em pouco tempo já tinha o meu próprio meio individual de transporte motorizado, de duas rodas.
Além dos residentes habituais, eram enviados para lá os oficiais que tinham de ir a Bissau, e por Guia de Marcha iam lá parar. Depois da apresentação, acho que ficava lá o meu nome (bem como o dos outros) como comensal habitual, e eram mais as vezes que ficava fora do que lá dentro, por isso podia ser um bom filão de receitas colaterais.
Ali bem perto, a uns 100 metros tive a oportunidade de conhecer a primeira amiga cabo-verdiana, e ganhar uma relação de amizade, que acabou mal para ela, por razões de iintimidades com um militar do quadro.
Isto é aquilo que eu conheci, tal e qual com estes nomes, nos anos de 67, 68 e 69. É natural que muita coisa se tenha alterado, mas não no meu tempo. Isto era o que eu conhecia.
Foi o primeiro local que visitei quando cheguei, vindo diretamente do aeroporto , em jipe militar, e feita a minha apresentação às Autoridades Superiores do QG, onde cheguei, com a farda número um, incluindo o blusão, completamente encharcado dos cabelos aos pés.
Recebido num gabinete que mais parecia uma casa mortuária, era um congelador onde vivia aquela gente, e no pouco tempo que lá passei a tiritar de frio, ainda hoje me lembro como a
pior experiência climática da Guiné. Daí para diante comecei a ter problemas com os dentes, e nunca mais suportei em toda a minha vida, presente e futura, o chamado ar condicionado.
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Nota de VT/LG:
(#) A Guerra do Biafra (também conhecida como Guerra Civil da Nigéria, Guerra Civil Nigeriana, Guerra Nigéria-Biafra...) prolongou-se de 6 de julho de 1967 a 13 de janeiro de 1970; foi um conflito político causado pela tentativa de cessação ou separação das províncias ao Sudeste da Nigéria, como a autoproclamada República do Biafra. Traduziu-sde numa imensa tragédia humanitária com mais de 2 milhões de mortos, e muitos mais deslocados e refugiados, devido a guerra e á fome.
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As Fotos:
F01 – O "Biafra" que encontrei quando ali cheguei. Tem uma cruz, era a porta onde eu fiquei. O acesso nem tinha um passeio ou coisa parecida, era um caminho, que já todos depois lhe chamavam de picada. Ao lado parece que tem um aparelho de ar condicionado, mas é uma
simples ilusão de óptica.
F02 – O "Biafra" com telhado em zinco, bom para aquecer mais, e uma vista da rede mosquiteira. Agora vendo melhor, pensei que era mais fina, mas parece-me agora um pano
grosso, tipo um lençol, que abafava a boca e protegia dos mosquitos.
F03 – A entrada para o "Clube de Oficiais" do QG, com muro separador e uma vista geral da
messe. Foi a primeira imagem que tive, no dia 21set67, ainda estava em melhoramentos. No dia seguinte, 22 de setembro, segui de Dakota para Nova Lamego, para a minha tomada de posse do CA (Conselho de Adminiustração) cessante do BCAV1915.
A primeira missão que me deram à noite, ou foi por acaso, mas agora me lembro que podia ser uma praxe para os periquitos que chegavam. Fazer ou comandar um grupo de militares numa cerimónia de Velório a um militar num caixão de chumbo. Não fiquei com traumas por isso, mas preferia ir beber uns copos com a malta que estava de saida e conhecer alguns que nunca os vi.
Passados 2 dias voltei para Bissau, para receber mais instruções do major, Chefe da Chefia de Contabilidade. Ele ficou tão atrapalhado com a minha total ignorância, pois soube que eu nunca tinha estado num CA, quer lá quer cá, nunca tive estágio nem a formação, que mais tarde ele foi lá a Nova Lamego pessoalmente para ver como eu me desenrascava. Tive sempre ali um amigo. Mas nem sei o nome dele.
F04 – A Piscina do Clube, quase nova. Parece-me que nem água tinha, visto agora, mas tem
uma boa sombra ao fundo.
F05 – O edificio da Messe, tudo muito novo, será que ainda não tinha aberto ao público? É uma que faço agora por ver as fotos com outros olhos.
F06 – Esta foto ainda em setembro 67, junto à piscina, ainda me parece tudo novo, e sem água ainda, porque estou vestido de roupa normal.
F07 – Já estamos em novembro de 67, e já se vê água e nadadores, já tinha os meus calções que nunca os larguei, mesmo depois de vir ainda usei uns anos, gostava do amarelo. Foi uma
sorte ter comprado no Rossio em Lisboa, na tarde de 19 de setembro, pois por causa de o avião não pegar, fiquei ali um dia, e lembrei-me que na Guiné devia haver também água!! Foi a visita de um camarada do Porto, da Escola e do Instituto Comercial e depois colega na EPAM no Lumiar.
Era um bom rapaz, assim transmontano, entroncado à minha beira, os pais tinham uma Pensão e Casa de Pasto, na Rua do Loureiro, ao lado da Estação de São Bento. Hoje está tudo em obras para novos hotéis e alojamentos de turistas. Ali ao lado paravam as camionetas que nos traziam de Mafra e Lisboa, e depois nos levavam no domingo à noite. Por amizade chamavamos de o "Artolas", pois foi um nome dado a 5 comparsas no curso, que ficavam na mesma tenda, onde eu me incluia também. Chama-se Policarpo e era alferes, mas não sei o que fazia lá, qual era a sua função. Mas, filho de peixe sabe gerir uma messe ou intendència!
F08 – No espaço da piscina, já com piso relvado, não se vislumbra ainda a água. Ainda em set67 junto de um trabalhador civil, que tratava da limpesa e arranjos de jardins e plantas.
F09 – Em 5nov67 já está a funcionar a piscina, e inicio eu a minhas maratonas de saltos em alturas, das pranchas para a água, era a minha habilidade. Mesmo sem saber formalmente nadar como uma pesoa normal, atirava-me sempre em mergulhos para a parte mais funda, depois já sabia o caminho debaixo de água para dar umas braçadas e apanhar umas escadas para me segurar.
Acho que depois de ir para Nova Lamego com o Batalhão, pelo Rio Geba acima, em 040ut67,
este mês não devo ter estado em Bissau, e em novembro já estou lá, para a prestação de contas na Chefia de Contabilidade, e já passo umas vezes pela piscina, ou estou lá instalado, ou noutro sitios de Bissau, como seja o meu preferido, o Grande Hotel, que era um Oásis no meio aquilo tudo. Tinha dormidas em quartos pessoais e independentes e Casa de Banho privativa, pequeno almoço na sala, e almoços e jantares para quem quisesse. Um excelente espaço de bar com muito artigos que nunca tinha visto nem comprado. Assim comprava roupa especial, camisas manga curta, polos Fred Perry, que não existia em Portugal, calças de ganga, cintos, canetas de marcas, isqueiros, charutos, cachimbos, tabacos para os mesmos, bebidas na sua aioria desconhecidas na metrópole, embora no aquartelamento , verdade seja dita, tinhamos a nossa dose mensal de distribuição militar de bebidas e tabacos importados.
O Grande Hotel" tinha uma esplanada uns degraus abaixo, com mesas à sombra das palmeiras, passeavam entre nós grandes sardões, que subiam e desciam das palmeiras, e pela primeira vez vi aterrar perto de mim, um grande jagudi que pegou numa peça morta e a levou para bem longe. Era um animal muito feio, mas muito útil para um ambiente sustentável, como se diz agora para tudo.
É a natureza a atuar como sempre fez e vai continuar, por isso não me atormentam os
terrores lançados pelos ambientalistas, pois a natureza tudo resolve.
Por coincidência hoje vi uma reportagem sobre os milhares de milhões de toneladas e plástico nos oceanos, e a ciência descobriu que existe uma fórmula para eliminar os plásticos, são absorvidos pelos fungos. Não sei se estou a dizer uma barbaridade mas foi o que percebi.
F10 – A segunda fase do salto, o lançamento pelo ar tipo pato bravo, a esperar-me uma barrigada na água, pois não tinha ainda a noção das posições, algum amigo encarregava-se de cá fora fazer as fotos, já com a máquina programada por mim, era só bater a chapa.
(Continua)
(Revisão / fixação de texto / negrit0s, título: LG)
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