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terça-feira, 4 de novembro de 2025

Guiné 61/74 - P27384: A nossa guerra... a petromax (1): Quem é que ainda se lembra dos candeiros a petróleo ? Em 1964, em Guileje, Gadamael, Ganturé, Sangonhá, Cacoca, Cameconde... Em 1967/68, em Ponate, Banjara, Cantacunda, Sare Banda, Ponta do Inglês...



Candeeiro antigo a petróleo Hipólito de 350 velas
(Com a devida vénia, OLX: anúncio já não disponivel)


Guiné > Zona Leste > Região de Bafatá > Sector L1 (Bambadinca) >  Destacamento da Ponte do Rio Udunduma > Setembro de 1973 > CART 3494 (Xime e Mansambo, 1971/74) > Uma foto rara : assinalado a amarelo está um candeeiro a petróleo de camisa, um petromax, possivelmente de 350 velas, que era fabricado em Portugal pela Casa Hipólito, de Torres Vedras. 

"A mesa polivalente, onde se comia, escrevia, lia,  jogava e conversava. Em suma: o espaço de socialização e de partilha. Da esquerda para a direita: Gregório Santos, José Sebastião, Ricardo Teixeira e eu [Jorge Araújo] participando no 'mata-bicho' das tardes, preparando-nos para mais uma noite de muitas estrelas."

Foto (e legenda): © Jorge Araújo  (2017). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar:  Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]
 




Capa do livro "Casa Hipólito : história, memórias e património de uma fábrica torriense / Joaquim Moedas Duarte ; pref. José Amado Mendes ; rev. cient. Jorge Custódio. - 1ª ed. - Torres Vedras : Associação para a Defesa e Divulgação do Património Cultural de Torres Vedras : Associação Portuguesa de Arqueologia Industrial, 2017. - 376 p. : il. ; 23 cm



1 Quem se lembra do velho "petromax" que iluminou muitas das nossas noites de breu na Guiné ? E nomeadamenmet nos primeiros anos da guerra, em destacamentos perdidos no mato ...

Eu nunca tive o "privilégio" de ter um pretomax no destacamento da ponte do rio Udunduma, na missão do sono em Bambadincanzinho, nas tabancas fulas em autodefesa que fui reforçar ou no destacamento do reordenamento (de população balanta e mandinga) de Nhabijões !... 


Fonte: Anúncio do OLX
Mas há quem se lembre... O petromax, das fotos acima, era da  Casa Hipólito, de Torres Vedras. Era um candeeiro a petróleo, de camisa.. Havia vários modelos, todos a petróleo/querosene, só mais tarde evoluiu para o gás...  

Havia candeiros de 150 velas, 250 velas, 350 velas, 500 velas... Pelo que vejo nos anúncios do OLX, estes candeeiros antigos podem ainda hoje valer entre os 50 e os 150 euros...Os modelos novos podem custar 300, 400, 500 euros...

O de 500 velas (ou CP="candle power") era o de topo de gama. 

O de 150 velas dava para 10 horas (1 litro de querosene / petróloe). Aplicaçáo: Uso doméstico, iluminação de tenda pequena ou posto de sentinela;

O de 250 velas tinha um autonomia de 7 horas, dava para iluminar um secção do perímetro de
arame farpado, uma cozinha de campanha, um ficina.

O de 350 velas (5 horas de autonomia) iluminava um de pátio, um pequeno acampamento, uma enfermaria.

O de 500 velas (4 horas de autonomia) iluminava superfícies maiores: quartéis, destacamentos, missões religiosas, médios / grandes acampamentos. Um candeeiro Petromax de 500 CP (ou velas) é comparável, em brilho, a quatro lâmpadas incandescentes de 100 W, mas concentrando a luz num feixe mais intenso.

Náo sabemos qual(quais) o(s) modelo(s) disponibilizado(s) pela Intendência. Mas pelo menos o de 150 velas já existia em 1967, 

"Petromax" era/é  uma marca registada, de origem alemã, fabricada em Portugal sob licença,a partir de 1949. Mas a Hipólito também tinha modelos próprios.


2. Ter um petromax em casa, no meu tempo de miúdo, era uma novidade, uma  coqueluche. Usava-se na pesca aretsanal e na pesca ao candeio (o pescador mais "abonado"; ainda me lembro da lanterna, luminária  ou lampião a carbureto)... Nas oficinas, para trabalhar à noite. E os mais remediados passaram a substituir o velho candeeiro a petróleo pelo petromax, enquantio não chegava a eletricidade de Castelo de Bode (a barragem foi inaugurada em 21/1/1951).

A palavra "petromax" entrou no nosso vocabulário nos anos 50. E o termo já está hoje grafado nos  nossos dicionários.

Temos diversas referências ao uso do "petromax" na iluminação das nossas instalações militares no CTIG (a par das garrafas de cerveja que, depois de vazias,  eram cheias de petróleo, levavam uma tampa  furada por onde passava uma mecha, torcida ou pavio funcionando à noite como luminária ou candeeiro improvisado).

Segundo a descrição da Wikipédia, "consta de um depósito, onde está introduzida uma bomba de pressão, do qual sai um tubo tendo na extremidade um vaporizador e fixa a este uma camisa em seda em forma de lâmpada, protegida por um cilindro em vidro. No cimo tem uma chaminé por onde saem os gases." (Vd, imagem acima).
 
Para quem quiser saber mais, aconselha-se uma visita à página do Facebook Memórias da Casa Hipólito de Torres Vedras, da autoria de Joaquim Moedas Duarte, criada no âmbito do Mestrado em Estudos do Património, da Universidade Aberta de Lisboa. 

Sabemos que esta grande empresa metalúrgica (o maior empregador da região) forneceu diversos equipamentos de iluminação para as Forças Armadas. Começou por ser uma pequena oficina de latoaria no início do séc. XX. Algumas décadas depois era já uma grande metalúrgica, com 1400 colaboradores.


3. Vejamos algumas referências ao petromax no CTIG:

Já temos uma série "A minha guerra a petróleo" (*), da autoria do ex-cap art (hoje coronel na reforma) António J. Pereira da Costa, membro da nossa Tabanca Grande.

Iremos citá-lo em próximo poste. Inspirados naquele título, é que nos lembrámos de repescar postes com referência a este descritor, "petromax". 

Em todo o caso, convém lembrar que a "A minha guerra a petróleo" (título que o autor voltou a usar no livro de memórias que publicou, sob a  chancela da Chiado Books, em 2019) tem um sentido metafórico e irónico. Mais diria que é também  uma amostra da literatura "pícara" que se tem publicado sobre a nossa guerra.

 Temos que revisitar esta série. Mas para já registe-se que o tom  que o nosso Tó Zé (para os amigos da Amadora)  usa, é  muitas vezes reflexivo e sarcástico, evocando as dificuldades logísticas e humanas da guerra (por exemplo, o combustível escasso, o calor, o esforço físico e moral, a burocracia). Neste contexto, a expressão “a petróleo” serve também para sublinhar   o carácter absurdo, tecnicodependente e mecanizado da guerra moderna,  que não funcionaria sem máquinas, motores, material, combustível, e sobretudo sem  uma máquina pesada que se impõe sobre o indivíduo. Aliás, nenhuma guerra.

Física e metaforicamente falando, foi de facto uma "guerra a petróleo", a nossa... Nalguns caso, um pouco mais evoluída, do ponto de vista da tecnologia com a introdução do "petromax " e a seguir do "gerador elétrico"...

Tudo indica, entretanto, que nos primeiros anos da guerra, na Guiné, o uso do "petromax" (ou lanterna de incandescência...)  fosse mais generalizado, servindo inclusive para iluminar o perímetro de defesa dos aquartelamentos, como no caso de Bedanda, por exemplo, ao tempo do nosso camarada Rui Santos, em 1963, bem como outros aquartelamentos  e destacamentos.

Cite-se, na região de Tombali, e ao longo da fronteira  com a Guiné-Conacri,  no 1º semestre de 1964, destacamentos como  Guileje, Gadamael, Ganturé, Sangonhá, Cacocca, Cameconde, etc.

Mas também na zona Leste, na região de Bafatá: Ponta do Inglês,no subsector do Xime (setor L1), Banjara, Cantacunda, Sare Banda, etc., no subsector de Geba (sector L2)... Ou na região do Cacheu, Ponate, por exemplo...

Em sítios isolados (destacamentos, tabancas em autodefesa, etc.), o uso do "petromax" levantava questões de segurança. Era um alvo fácil . E talvez por isso fosse distribuído com parcimónia. Não sabemos, por exemplo, quantos camaradas nossos morreram, de tiros isolados, à noite, disparados por "snipers". Ou de ataques junto ao arame farpado, como Sare Banda, 1968.

Depois vieram os geradores e passou a haver luz elétrica, pelo menos à noite... Mas, nos destacamentos, em Ponate, em 1966,  em Banjara, em 1967, na Ponta do Inglês, em 1968, no Biombo, em 1970, no rio Udunduma, em 1973, etc. continuava a recorrer-se ao "petromax".


Sangomhá, 1964 (**)

(...) "Depois de, em Ganturé, existirem as condições mínimas de sobrevivência para a instalação das tropas que aí permaneciam, o Pel Rec Fox 42 juntamente com tropas recém chegadas à Guiné [CART 640 ] e com um Pelotão de Milícias rumou até Sangonhá a 21 de maio de 1964.

Como de costume segue-se a capinagem, a vedação de arame farpado em volta da tabanca, que seria agora um quartel, a colocação de cavaletes para instalação dos candeeiros a petróleo (petromaxes), a que alguns “valentes” iam dar pressão de ar durante a noite, sempre que necessário." (*)

.
Sare Banda ,8 de setembro de 1968 (***)

(...)  Sare Banda (...) estava perto de Sinchã Jobel (importante base do PAIGC, e muito bem equipada, como é claro pelo material que deixaram), e é natural que fosse atacada.

O alferes morto foi o Carlos Alberto Trindade Peixoto. O outro morto foi o Furriel Raul Canadas Ferreira. Mas as circunstâncias da morte deles não estão devidamente relatadas.

Foi assim: este, como todos os destacamentos da CART 1690, não tinha luz eléctrica, nem mesmo um miserável gerador. Eles estavam os dois numa tenda a jogar às cartas, com um petromax aceso (depreende-se, aliás, do relatório as péssimas condições de instalação). Para os guerrilheiros foi muito simples, foi só apontar o RPG2. (...)


Banjara, 1967 (****)

De qualquer modo, as companhias deviam ter, em "stock", este precioso utensílio... mas era preciso garantir a disponibilidade de querosene/petróleo iluminante e de "camisas"...
 .




Guiné > Zona leste > Geba > Banjara > CART 1690 (1967/69) > Excerto de uma requisição de material, com data de 9/6/67, feita pelo alf mil Alfredo Reis,  na altura a comandar o destacamento de Banjara.

Alguns dos artigos requisitados (excerto):
  • fósforos, 
  • palha de aço,
  • camisas para petromax de 150 velas.
  • torcida e vidro (?) para o frigorífico (...),
  • pregos para pregar as chapas,
  • aerogramas,
  • selos, 
  • 12 esferográficas (uma vermelha e as outras azuis),  
  • bloco de cartas,
  • Omo e sabão, 
  • uma garrafa de whisky, 
  • Sumol ou outros sumos [...]

Foto: © Alfredo Reis (2007). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

(Continua)

(Revisão / fixação de texto, itálicos, negritos: LG)
____________

Notas do editor LG:


(*) Vd, poste de 6 de maio de 2019 > Guiné 61/74 - P19752: Notas de leitura (1175): A Minha Guerra a Petróleo, por António José Pereira da Costa, Chiado Books, 2019 (Mário Beja Santos)
(***) Vd. poste de 28 de maio de 2005 > Guiné 63/74 - P28: Um ataque a Sare Banda (1968) (A. Marques Lopes)

(****) Vd. poste de 20 de novembro de 2015 > Guiné 63/74 - P15388: Álbum fotográfico de Alfredo Reis (ex-alf mil, CART 1690, Geba, 1967/69) (3): O que é um homem precisava no mato, num miserável destacamento como o de Banjara, em 1967 ?

terça-feira, 5 de novembro de 2024

Guiné 61/74 - P26117: (In)citações (268): Antigos combatentes e capelães... "Confessores da Pátria 'versus' Confessores da Fé" (Manuel Lopes, ex-cap inf, CCAÇ 3396, "Lenços Negros", Moçambique, 1971/73)



Foto nº 3 > Anadia > Moita > 42º convívio anual do pessoal da CCAÇ 3396, "Lenços Negros" (Moçambique, 1971/73) > 25 de maio de 20214 > igreja Matriz de Moita > Foto de grupo, no final da celebração litúrgica.


Fotos (e legendas); © Manuel Lopes (2024). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Por mail do passado domingo dia 27 de outubro, o cor art ref António J. Pereira da Costa, nosso tabanqueiro de longa data (12/12/2007) e  om 203 referências no blogue, chamou-nos a atenção para um curioso texto divulgado por um seu camarada do curso da Academia Militar, do ano de 1964, Manuel Lopes, e que tem por título "60º Aniversário da entrada na Academia Militar: Confessores da Pátria 'versus' Confessores da Fé".

O Tó Zé (TZ, como é conhecido por alguns de nós) ou PK (pelos seus camaradas da AM) sugeriu que o texto poderia eventualmente ter interesse para o blogue.

E até mais: "Lembrei-me de propor ao blogue a atribuição  [do título] de 'Confessores da Pátria' aos padres das Companhias que amparavam a malta nas suas diferentes dificuldades espirituais."

E uma vez obtida a autorização do autor (Manuel Maria Martins Lopes, cor inf ref, ex-cmdt da CCAÇ 3369, "Lenços Negros", Moçambique, 1971/73), aqui vão os dois textos em questão. 


 (i) 60º Aniversário da entrada na Academia Militar: Confessores da Pátria 'versus' Confessores da Fé

por Manuel Lopes (cor inf ref)

Caros camaradas:

No final da celebração da missa, adentro do programa das comemorações do 60º Aniversário da nossa entrada na Academia Militar, tive oportunidade de prestar uma singela homenagem à Igreja que esteve sempre presente durante a nossa atividade militar, lembrando também o Padre Gamboa, o nosso capelão que nos recebeu à chegada.

Evoquei depois o testemunho recente do Padre Vitor Espadilha, que na celebração da missa (dia 25 de maio, na Igreja Matriz de Moita,  Anadia) do 42º Convívio anual de ex-combatentes, revelou que a Igreja tinha uma distinção especial para aqueles que se sacrificaram e deram a vida pela causa da Fé. Chamam-se os 'Confessores da Fé'.

Por isso, para nós que nos sacrificámos e jurámos dar a vida pela Pátria, o Padre Vitor Espadilha distinguiu-nos com a designação de 'Confessores da Pátria'.

Assim, registar as nossas vivências militares faz parte da nossa condição de 'Confessores da Pátria'.

Abraço amigo.

Lisboa, 26 de outubro de 2024

Manuel Lopes

 

(ii) 'Lenços Negros', Confessores da Pátria 'versus' Confessores da Fé

por Manuel Lopes


À semelhança de anteriores convívios anuais organizados pelos ex-combatentes da CCaç 3396, 'Lenços Negros', mobilizados para Moçambique de 1971 a 1973, teve lugar na Moita, Anadia,  no passado dia 25 de maio, como tem sido habitual em todos os convívios, a
celebração de uma Missa por intenção daqueles que já partiram.

A passagem pela Igreja Matriz da Junta de Freguesia da Moita ficaria assim indelevelmente marcada pela saudação especial protagonizada pelo Senhor Padre Vitor Espadilha, na presença de ex-combatentes, familiares e amigos, que aqui destacamos:

“Ao ver os vossos cabelos brancos (alguns já os perderam!...), eu imagino vocês rapazinhos novos, há uns anos atrás, convivendo e sonhando e depois com a vida mais entroncada pelo problema da guerra!...

"Tivestes que ir para lá, sim, não, sim?!...

"Aquilo que foi o Portugal colonial e a separação da Mãe, do Pai, da esposa que ficava!...

"As notícias que chegavam e não chegavam!...

"Saudades da Terra!...

"As diferentes complicações que provocamos e dobramos nos sonhos de qualquer rapaz jovem!...

"Mas será que vocês estavam sós?!

"Agora está alguém ao vosso lado, a vossa esposa, os vossos filhos, os vossos netos!...

"Outros não chegaram, lembramo-los hoje também.

"Celebramos a gratidão e o dom da Vida!...

"Nósm na Igreja, temos uma distinção, com os mártires como São Sebastião. São os que morreram por causa da Fé, são representados com uma palma na mão, são os Confessores que foram para uma situação de luta, arriscando a Vida, prontos a morrer, fortes a dar
ajuda. Esses que estavam dispostos a dar a Vida, chamam-se na Igreja 'Confessores da Fé'.

"Então vocês são 'Confessores da Pátria', por quem lutaram, a quem estavam dispostos a dar a Vida.”


Continuando a celebração da Missa o Senhor Padre Vitor Espadilha convidou os ex-combatentes para se juntarem à sua volta no altar:

“Quando a gente vai num barco ou num avião, o destino do barco ou do avião, é o destino daqueles que lá vão, de todos que o ocupam!

"Ou chega ao porto ou não chega!...

"E vocês que estavam na Companhia, o destino era igual, não é?! Era uma Unidade que vocês criaram, que vos liga profundamente para o resto das vossas Vidas!!...

"Então quero que vocês dêem as mãos e rezem comigo!”




Foto nº 1 > Anadia > Moita > 42º convívioo anual do pessoal da CCAÇ 3396, "Lenços Negros" (Moçambique, 1971/73) > 25 de maio de 20214 > greja Matriz de Moita > Comunhão e partilha em torno do altar


E o Senhor Padre Vitor Espadilha continuou a surpreender-nos com o pedido seguinte:

“Queria que ficasse na Igreja um símbolo da vossa presença!...

"Eu vou pedir a um de vocês que me dê um Lenço Negro!...

"Quem me dá um Lenço Negro?!

"Por favor, não coloque aqui no altar, vai entregar a Ela, a Nossa Senhora de Fátima, para que continue sempre nas mãos Dela!"...


Carlos Costa, organizador do Convívio, subiu então para uma cadeira a fim de colocar um Lenço Negro nas mãos da imagem de Nossa Senhora de Fátima que tinha sido colocada no altar no início da celebração da Missa.

"A partir de agora ficará sempre na Paróquia!!", anunciou o Senhor Padre Vitor Espadilha.



Foto nº 2 > Anadia > Moita > 42º convívio anual do pessoal da CCAÇ 3396, "Lenços Negros" (Moçambique, 1971/73) > 25 de maio de 2024 > Igreja Matriz de Moita > Um Lenço Negro nas mãos de Nossa Senhora de Fátima



Seguiu-se o Cântico entoado e aplaudido por todos os presentes:

Miraculosa, rainha dos Céus,
Sob o teu manto tecido de Luz,
Faz com que a guerra se acabe na Terra,
Paz entre os homens, a Paz de Jesus!
Pelas crianças, flor em botão,
Pelos velhinhos, sem Lar, sem Pão,
Pelos Soldados que à guerra vão,
Senhora,  aceita minha oração!


No final o Padre Vitor Espadilha, qual Lenço Negro, juntou-se à fotografia à saída da Missa na Igreja Matriz, tendo à sua frente o Mateus, neto do Aníbal Duarte Santos, organizador local do Convívio   (Fot0 nº 3, vd. acima).

Alguns dias mais tarde tivemos oportunidade de enviar este email de agradecimento ao Senhor

"Padre Vitor Espadilha:

"Bom dia Senhor Padre Vítor, Lenço Negro:

"Só agora tive conhecimento do seu email, por isso aqui estou a dar notícias.

"Antes de mais os meus agradecimentos, em meu nome, de todos os ex-combatentes, familiares e amigos dos Lenços Negros. A sua benção no altar e a oferta de um Lenço Negro a Nossa Senhora de Fátima serão sempre referências indeléveis do nosso 45º Convívio anual.

"A CCaç 3396 que já tinha sido consagrada a Nossa Senhora em 1971, volta de novo ao seu Convívio, passados 53 anos, reconfortados com a sua mensagem de Paz.

"Obrigado. Vamos continuar em contacto. Vou convidá-lo para a nossa página de 'Moçambique, Lenços Negros' para nos continuar a acompanhar com a sua profunda mensagem de estima, compreensão e solidariedade.

"Obrigado. Abraço. Manuel Lopes"



O Senhor Padre Vitor Espadilha não tardou a responder assim:

"Boa noite. Fico muito honrado...vocês são nossos HERÓIS... contem comigo... sempre..."

Ao fim de 45 Convívios anuais da CCaç 3396, "Lenços Negros", e em tempo de comemoração dos 50 anos do 25 de Abril, nunca nos tinham apelidado de HERÓIS, quais Confessores da Pátria.

A Igreja, como nenhuma outra Instituição através do Padre Vitor Espadilha, soube interpretar e sublimar o tempo de guerra e os sacrifícios que lhe estão intimamente associados.

Habituado a identificar os ex-combatentes como Heróis da Liberdade, foi reconfortante ouvir da parte do Padre Vitor Espadilha a sua identificação como HERÓIS, remetendo-nos para a importância da Igreja e dos valores religiosos a ela ligados que nos acompanharam nos
diferentes teatros de operações.

Bem haja,  Senhor Padre Vitor Espadilha.

Foi reconfortante, salutar e estimulante a nossa passagem pela Igreja Matriz da Moita, marco indelével das nossas vivências de guerra e de Paz.

Lisboa, 16 de junho de 2024.

Manuel Lopes

PS - No programa do Convívio estava a deposição de uma coroa de flores junto ao Monumento dos ex-combatentes, a visita ao Museu do Vinho e a realização de um almoço no Restaurante D. Sancho. Mas o essencial já tinha acontecido na Igreja Matriz da Moita.

(Revisão / fixação de texto, título do poste: LG)

_______________

Nota do editor:

Último poste da série >31 de outubro de 2024 > Guiné 61/74 - P26100: (In)citações (267): Memorando sobre a Escola São Francisco de Assis, em Timor, entregue ao primeiro-ministro Xanana Gusmão através do embaixador Dionísio Babo Soares, representante do país nas Nações Unidas (João Crisóstomo)

terça-feira, 4 de junho de 2024

Guiné 61/74 - P25600: O armorial militar do CTIG - Parte I: Emblemas dos Pelotões de Caçadores Nativos: dos gaviões aos leões negros, das panteras negras às águias negras...sem esquecer os crocodilos



Pel Caç Nat 51


Pel Caç Nat 52, "Os Gaviões" (Matar ou Morrer)


Pel Caç Nat 53 ("Continuaremos")



Pel Caç Nat 54, "Águis Negras"




Pel Caç Nat 55, "Panteras Negras" (Audaces Fortuna Juvat
A Sorte Favorece os Audazes)



Pel Caç Nat 57, "Os Intocáveis"



Pel Caç Nat 60 ("Fortuna, Audácia")


Pel Caç Nat 63


Pel Caç Nat 64, Bafatá ("Os Leões Sempre Prontos para Tudo")



Pel Caç Nat 65, "Leões Negros"

Pel Caç Nat 67


Pel Caç Nat 69


1. "Armorial" é, segundo o dicionário, "o livro de registo dos brasões". A expressão  "armorial militar" refere-se a um conjunto de brasões, escudos, símbolos, emblemas ("armas", no plural, na terminologia da heráldica)  utilizados pelas forças armadas, permitindo identificar e distinguir unidades ou subunidades específicas (batalhões, companhias, pelotões, etc.). Estes símbolos podem incluir logotipos, bandeiras, insígnias, divisas ou outros elementos visuais, representando a unidade militar e sua história.

Aceitando o desafio do Augusto Silva Santos(*), vamos "revisitar" os brasões, guiões e crachás das unidades e subunidades que passaram pelo TO da Guiné, destacando aquelas que, por um razão ou outra (nome, emblema, divisa...), pode parecer mais original, bizarra, excêntrica, engraçada... E vamos começar pelos Pelotões de Caçadores Nativos (Pel Caç Nat).

No nosso blogue temos referências a 16 Pelotões de Caçadores Nativos, com destaque para o Pel Caç Nat 51, 52, 53, 54 e 63 (com mais de 30 referências, cada um):

Pel Caç Nat 51 (35)
Pel Caç Nat 52 (196)
Pel Caç Nat 53 (61)
Pel Caç Nat 54 (57)
Pel Caç Nat 55 (16)
Pel Caç Nat 56 (24)
Pel Caç Nat 57 (5)
Pel Caç Nat 58 (12)
Pel Caç Nat 59 (3)
Pel Caç Nat 60 (26)
Pel Caç Nat 61 (6)
Pel Caç Nat 63 (100)
Pel Caç Nat 65 (14)
Pel Caç Nat 67 (8)
Pel Caç Nat 69 (2)
Pel Caç Nat 70 (1)

Na coleção do nosso camarada Carlos Coutinho (que teve a infinita paciência de recolher, identificar, selecionar, tratar, digitalizar e divulgar centenas de brasões, guiões e crachás de unidades e subunidades do exército, de todas as armas e dos três teatros de operações)  faltam os emblemas de uma parte dos Pel Caç Nat (no ficheiro que ele nos cedeu gentilmente  há largos anos):  56, 58, 59, 61, 62, 66, 68 e 70. (Se alguém os tiver, que nos mande ao menos uma cópia, em formato digital.)

Também não há, nos livros da CECA (Comissão para o Estudo das Campanhas de África) , fichas destas subunidades, pelo que é difícil reconstituir a sua história e saber quem por lá passou, por onde e quando. E também omissa a sua atividade operacional.

Mas sabemos, pelo nosso colaborador permanente, o José Martins, em que ano se formaram:

(...) "A partir de 1966, os africanos foram chamados a uma intervenção mais activa no esforço de guerra. Foi iniciada a constituição de Pelotões de Caçadores Nativos (Pel Caç Nat) tendo sido formados sete pelotões numerados de 51 a 57

"Estas unidades eram comandadas por um oficial com a patente de alferes, coadjuvado por furriéis e praças especialistas europeias, uma estrutura adaptada à sua dimensão - entre 30 a 40 homens. Neste ano subiu, para 3.952, o número de tropas locais em serviço.

"O ano de 1967 foi um ano de viragem. As companhias de Caçadores existentes foram redenominadas e transformaram-se nas CCaç 3 (ex-1ª CCaçI), CCaç 5 (ex- 3ª CCaçI) e CCaç 6 (ex- 4ªCCaçI), além da formação de mais um Pel Caç Nat, o nº 58.

"Em 1968 foram criados 11 novos Pel Caç Nat, a quem foram atribuídos os números de 59 a 69, e em 1969 foram criadas as CCaç 11, 12, 13 e 14, a partir das CArt 2479 e CCaç 2590, 2591 e 2592, que já tinham uma constituição igual às anteriores companhias existentes do recrutamento local ou foram adaptadas.

"No período entre 1970 e 1973 foram constituídas mais sete companhias de recrutamento local, as CCaç 15, 16, 17 e 18 (em 1970), a CCaç 19, (em 1971) e as CCaç 20 e 21 (em 1973). Em 1973 foi, também, constituído o Pel Caç Nat 70." (...)


2. O Pel Nat Caç 52 é o que tem mais representantes no nosso blogue, a começar pelos seus sucessivos comandantes: Henrique Matos, primeiro comandante (Enxalé, 1966/68), Mário Beja Santos (Missirá  e Bambadinca, 1968/70),  Nelson Wahnon Reis (1971) ,  Joaquim Mexia Alves (Ponte Rio Udunduma, Mato Cão, 1972),  António  Sá Fernandes (1973), Luis Mourato Oliveira (Mato Cão e Missirá, jul 73/ ago 74).... (Todos são membros da Tabanca Grande, com exceção do Nelson Wahnon Reis, que era natural de Cabo Verde.)

O Pel Caç Nat 53 está associado ao nome do Paulo Santiago, seu comandente no Saltinho (1970/72). E o Pel Caç Nat 63 está profundamente ligado ao "alfero Cabral", o nosso saudoso Jorge Cabral (Fá e Missirá, 1969/71).

O José António Viegas representa, no blogue, o Pel Caç Nat 54 (1966/68), tal como o  Mário Armas de Sousa (Missirá, 1969/70).

O António Baldé passou pelo Pel Caç Nat 56 (São João, 1969/70). Tal como o José Câmara (Bachile e Teixeira Pinto, 1971/73).
 
Do  Pel Caç Nat 51 (Guileje e Cufar, 1969/70), temos o Armindo Batata,  seu ex-comandante.

O Hugo Guerra também representa o Pel Caç Nat 55 (Gandembel e Balana) e depois o Pel Caç Nat 60 (São Domingos), entre 1968 e 1970. O Manuel Seleiro também estebe no Pel Caç Nat 60 (Sáo Domingos e Susana, 1968/70). O António Inverno também passou por este Pel Caç (Sáo Domingos, 1972/74). 

Do Pel Caç Nat 57 temos o depoimento do ex-alf mil Fernando Paiva  (Mansoa, Bindoro e Bolama, 1967/69() que nos disse, aqui, que criou esta subunidade,   construiu o destacamento de Bindoro, a pá e pica, e viveu diaramente, ombro a ombro, com os balantas da região do Oio.

Do Pel Caç Nat 58 já sabemos que foi praticamente destroçado no fatídico dia 12 de outubro de 1970, na emboscada de Infandre, Zona Oeste, Setor 04 (Mansoa). 

O Luís Guerreiro, ex-fur mil CART 2410 ("Os Dráculas", "Ou vai ou racha", Guileje, 1968/70) também esteve no Pel Caç Nat 65 (Gadamael e Ganturé, 1968/70).

Quase todos os emblemas (desta amostra) baseiam-se num "animal de estimação":

 (i) aves de rapina ( o gavião, a águia) (Pel Caç Nat 52 e 54); 

(ii) felinos e outros predadores: a pantera (negra) (Pel Caç Nat  55); o leão (Pel Caç Nat 64); o leão negro (Pel Caç Nat 65)  e o crocodilo (Pel Caç Nat 67)... 

Ou então em imagens simbólicas: (iii) duas catanas cruzadas (Pel Caç Nat 51); (iv) uma mão branca e uma mão preta, entrelaçadas (Pel Caç Nat 53); ou ainda (v) duas armas  (G3) cruzadas, sobrepostas pela  Cruz de Cristo  (Pel Caça Nat 57).

O Pel Caç Nat 63 também ostenta a cabeça de um felino (parece ser um lobo). 

Das divisas a mais "guerreira" é a do Pel Caç Nat 52, "Os Gaviões": "Matar ou morrer"...E por baixo do gavião, o brasão ostenta uma caveira... De quem terá sido a ideia original ? 

Já no do Pel Caç Nat 64 pode ler-se: "Os Leões Sempre Prontos para Tudo"...

Panteras negras não existiam na Guiné e leões também ninguém deve ter visto nenhum no nosso tempo... Muito menos "leões negros"...  Mas, como já o dissemos,  a nossa "bicharada de estimação" dava uma boa dissertação de mestrado ou até uma tese de doutoramento (***)... em antropologia, comunicação, marketing, semiologia, artes visuais, heráldica militar, etc.

Para além do nosso apreço e reconhecimento pelo trabalho do Coutinho e dos demais camaradas que com ele trabalham neste campo, no Portal UTW - Dos Veteranos da Guerra do Ultramar, apoiamos também, mais uma vez, a ideia do nosso grão-tabanqueiro António J. Pereira da Costa (no poste P7513, de 27 de dezembro de 2010poste P7513, de 27 de dezembro de 2010):

(...) Creio que temos estado a perder uma coisa importantíssima para a memória 'futura' (será que também há memória passada? Pesada sei eu que há...) e que são os emblemas de peito (crachás) e de braço que usávamos e que hoje poderão constituir algo que se possa juntar aos números das Unidades como algo indelével e que orgulha os seus possuidores. Temos também os guiões que, nem sempre, são iguais aos emblemas. Julgo que por si só já são um bocado da História e muito faladores, como acontece aos brasões, que são 'falantes'.

"Poder-se-ia criar no blogue um 'Banco de Crachás e Guiões' onde seriam inseridos os que se encontrassem, acompanhados de uma resenha acerca da sua feitura: quem deu a ideia, quem desenhou, como foi aprovado, o quem significa, formato, etc. etc. etc. 

"Sabendo-se quais e quantas as Unidades que passaram pela Guiné, rapidamente atingiríamos o pleno e poderíamos expô-los à consideração dos curiosos e outros frequentadores. Nenhum deles foi aprovado pela Comissão de Heráldica, mas isso também não interessa. São distintivos populares (aos gosto dos 'soldados'), como os dos clubes desportivos, de que se aprende a gostar.

"Se calhar era um bom início para uma História das Unidades" (...)

Já agora, o Carlos Coutinho há muito merece honras de Tabanca Grande, memso não tendo passado pelo TO da Guiné!  Fica aqui, desde já, o convite. 

______________


 
(***) Vd. poste de  17 de outubro de 2019 >  Guiné 61/74 - P20249: Brasões, guiões ou crachás (8): A nossa bicharada de estimação ou o bestiário da nossa guerra... dava uma tese de doutoramento em antropologia!

terça-feira, 14 de maio de 2024

Guiné 61/74 - P25519: Núcleo Museológico Memória de Guiledje (26): Um símbolo, não de guerra, mas de ecumenismo, reconciliação, paz, cooperação e tolerância ? (António J. Pereira da Costa / Luís Graça / Carlos Afeitos / José Teixeira)



Guiné-Bissau > Região de Tombali > Guileje > 5 de maio de 2013 > Núcleo Museológico Memória de Guiledje > Aspeto exterior


Guiné-Bissau > Região de Tombali > Guileje > 5 de maio de 2013 > Núcleo Museológico Memória de Guileje > A capela, do tempo da CART 1613 (1967/68), restaurada.

Fotos: © José Teixeira (2013). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Guiné-Bissau > Região de Tombali > Guileje > Núcleo Museológico Memória de Guileje > 2011 > Placa indicativa do antigo heliporto


Guiné-Bissau > Região de Tombali > Guileje > Núcleo Museológico Memória de Guileje > 2011 > Placa indicativa do local onde existiu um dos espaldões de artilharia


Guiné-Bissau > Região de Tombali > Guileje > Núcleo Museológico Memória de Guileje > 2011 > O trajeto do quartel para o heliporto, feito com garrafas de cerveja


Guiné-Bissau > Região de Tombali > Guileje > Núcleo Museológico Memória de Guileje > 2011 > Sinalização, com garrafas de cerveja, da entrada do posto de socorros

Fotos (e legendas); © Carlos Afeitos (2013). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]





Guiné-Bissau > Região de Tombali > Guileje > Núcleo Museológico Memória de Guiledje > 5 de maio de 2013 > Recordações guardadas em vitrina: objetos do quotidiano recuperados, provenientes das escavações do antigo quartel das NT, foto aérea do quartel, pista e tabanca, pratos de alumínio, emblemas, resto de vestuário...

Foto: © Pepito / AD - Acção para o Desenvolvimento (2010). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem : Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Guiné-Bissau > Região de Tombali > Iemberém > Simpósio Internacional de Guileje > Visita ao sul > 2 de Março de 2008 > Três camaradas nossos com um ar de felicidade... Ei-los aqui fotografados com um tesouro, a estatueta, em metal, da santa protectora dos Gringos de Guileje, encontrada nas escavações arqueológicas do antigo aquartelamento de Guileje... Da esquerda para a direita os valorosos representantes da penúltima subunidade quadrícula de Guileje, a CCAÇ 3477 (Nov 1971 / Dez 1972): José Carioca, Abílio Delgado e Sérgio Sousa... O Zé Carioca foi actor de teatro (amador ), vive em Cascais e é membro também da Tabanca da Linha.


Foto (e legenda): © Luís Graça (2008). Todos os direitos reservados [ Edição : Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Guiné-Bissau > Região de Tombali > Guileje ou a caminho de Guileje > 2010 > "A Nossa Senhora de Fátima de Guileje"... A última doação à Capela de Guileje, uma imagem de N. Sra. de Fátima, trazida de Portugal por António Camilo e Luís Branquinho Crespo. 

Recordamos aqui uma mensagem do nosso saudoso amigo Pepito (1947-2014), com data de 16/3/2010:

"Luís: Mais uma importante contribuição dos nossos amigos da Capela de Guiledje, o António Camilo e o Dr. Luis Branquinho Crespo (na foto), que fizeram questão de se deslocarem a Guiledje para doarem a imagem da Nossa Senhora de Fátima à Capela. Este gesto tão bonito, foi acompanhado pelos votos de que esta oferta ajude a Guiné-Bissau a encontrar rapidamente os caminhos da Paz. Abraço. Pepito."

Foto: © Pepito / AD - Acção para o Desenvolvimento (2010). Todos os direitos reservados [ Edião e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Guiné-Bissau > Região de Tombali > Guileje > Núcleo Museológico Memória de Guiledje > Cópia da factura, emitida pela Impar Lda, discriminando as despesas da reconstrução do oratório e a capela, num total de  387 mil CFA, o que corresponde a 589,98 €. (Para converter o CFA em euros, carrega aqui). 

Para se ter uma ideia dos preços de bens e serviços rtelacionados com a construção civil,  na Guiné Bissau, tomem como referência estes indicadores: 

(i) o transporte do material de Bissau a Guileje representou 26,5% do total;

 (ii) a mão de obra, 43,9%; 

(iii) os materiais custaram o resto (29,5%), com destaque para a tinta  branca (14,1%) e o cimento (4,8)...



Fotos: © Pepito / AD - Acção para o Desenvolvimento (2010). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem : Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Numa "contabilidade criativa" a reconstrução da capela de Guileje (e do oratório  construído pelos Gringos de Guileje, a açoriana CCAÇ 3477, que esteve lá entre nov 1971 e dezembro de 1972, comandada  cap mil e nosso tabanqueiro Abílio Delgado) custou 589,98 euros, totalmente cobertos pelos fundos recolhidos, em espécie (dinheiro), pelo Manuel Reis (590,00 euros) e entregues à ONG AD - Acção para o Desenvolvimento, na pessoa do Pepito, na Tabanca de  São Martinho do Porto, em 21 de agosto de 2010. (O Manuel Reis  foi alf mil, da CCAV 8350, a última unidade de quadrícula de Guileje, 1972/73.)

Outros camaradas e amigos  contribuiram (e muito),  não em espécie mas em géneros (incluindo horas de trabalho), para estas obras:


Há ainda que fazer justiça a dois homens, nossos amigos, membros da nossa Tabanca Grande, e grandes guineenses, como o Pepito e o Domingos Fonseca, da AD- Acção para o Desenvolvimento, que estiveram de alma e coração neste projecto.



"N. Sra. de Fátima de Guileje".
Foto do António
Camilo (2010)
1. A criação do Núcleo Museológico Memória de Guiledje, no antigo 
 aquartelamento de Guileje, inaugurado em 20 de janeiro de 2010 (e que o nosso blogue acompanhou  pormenorizadamente), não terá sido totalmente consensual para todos os membros da Tabanca Grande, independentemente de conhecerem ou não aquele espaço (que não se resume às instalações do museu, p.d., ou melhor, do pequeno núcleo museológico; inclui também parte do antigo aquartelamento de Guileje,  objeto de escavações arqueológicas, inventariação, limpeza, desminagem, recuperação de armas e munições, objetos do quotidiano, documentos, etc.,  restauro  e reconstrução, como o foi o caso da capelinha erigida no tempo da CART  1613 (1967/68 e do oratório dos "Gringos de Guileje"). 

Eis aqui quatro pontos de vista:

(i) António J. Pereira da Costa (*):

(...) Um das coisas que mais me irrita é o facto de os portugueses andarem sempre a celebrar derrotas militares. Há mais de 400 anos que Portugal não ganha uma guerra, mas celebrações é mato.

Era evidente que a celebração de uma derrota em Guileje era mais uma espécie de paisagem em miniatura (diaporama) reconstituindo o sucedido. Também era de esperar que a Guiné não se preocupasse muito com uma vitória de há mais de 50 anos e à qual não dá hoje muita importância. Terá motivos para celebrar? Quais? Porquê?

Eu sou estrangeiro e nada tenho a ver com o "museu" de Guileje. Mas não gosto de ver o meu país aviltado desta maneira. Mandar uma equipa de militares e ex-militares
 construir um museu em que se celebra uma derrota (nossa) e uma vitória do inimigo e depois deixá-lo cair por falta de 
manutenção é gozar e apoucar o inimigo e ele prestar-se a isso. (...)

11 de maio de 2024 às 16:57 

(ii) Luís Graça (*):

Tó Zé, permito-me discordar de ti. Esse Núcleo Museológico, tal como foi pensado e montado, não celebra a derrota de ninguém nem é uma glorificação de uma das partes do conflito. Simboliza, isso, sim, a paz, a reconciliação, o ecumenismo.

O espaço museológico vale pelo seu conjunto, e preserva elementos importantes da nossa presença naqule local ao longo de toda a guerra, como por exemplo a capela de Guileje ou o oratório dos Gringos de Guileje...

Houve uma recolha de fundos no blogue, para esse efeito. Diversos camaradas participaram com entusiasmo, mesmo nunca  tendo posto os pés em Guileje. Outros sofreram duramente quando por lá passsaram. Em suma, é uma obra de paz, não é um monumento bélico.
 
11 de maio de 2024 às 23:28

(iii) Luís Graça (*):

No tempo do cap Eurico Corvacho e do 2º srgt Zé Neto (que exercia as funções de 1º srgt), da CART 1613 (1967/68), já se rezava, em Guileje, num espírito de ecumenismo e de tolerância religiosa entre cristãos e muçulmanos.

Daí ter-se erigido uma capela que, quarenta anos depois, será reconstuída de acordo com as fotos da época, capela essa que faz parte integrante do Núcleo Museológico Memória de Guiledje. A viúva do Zé Neto, a nossa tabanqueira Júlia Neto, esteve na inauguração e benção da capela, em 20 de janeiro de 2010.

Recorde-se que foi criado um grupo "adhoc", o Grupo dos Amigos da Capela de Guileje, que angariaram fundos, em dinheiro e em géneros, para este projeto, em parceria com a ONG AD - Acção para o Desenvolvimento.

O Pepito pôs todo o seu entusiasmo neste projeto, sabia que ele era um traço de união entre portugueses e guineenses, incluindo os "inimigos de ontem" que se haviam combatido de armas na mão"...

(iv) Carlos Afeitos (**):

 [professor de matemática, cooperante na Guiné-Bissau, durante 4 anos (2008-2012), e nosso grã-tabanqueiro, com nº.  606, que nos mandou mais de uma meia centenas de fotos recentes de Guileje. ]


 (...)  Durante o tempo que estive na Guiné passei por Guilege duas vezes. A primeira vez foi a caminho de Cantanhez, região lindíssima e que vale a pena visitar. A segunda vez foi quando convidei a minha irmã para ir conhecer a Guiné em 2 semanas. Fiz questão de levá-la um bocado ao sul e ficar a conhecer um bocado mais da história que une os dois países.

Pelas conversas que tive com um homem a viver e a recuperar o antigo aquartelamento, está previsto edificar um complexo que irá servir de escola profissional no sítio da pista de aterragem de helicópteros, relembro que isto segundo as informações.

O senhor serviu de guia e explicou-nos como estava ordenado o quartel e como viviam os militares que estavam destacados para lá. O museu relembra muito bem da vida e da luta de ambas as partes envolvidas no conflito. À entrada podemos ver uma antiaérea e um Unimog, lado a lado. Fizemos uma visita à pista de aterragem exactamente pelo caminho feito de garrafas e depois mais umas voltas pelos pontos assinalados. 

Na minha segunda visita também tive uma conversa muito amigável com uma pessoa que estava a viver na tabanca no interior do quartel aquando da retirada. Ele contou-me alguns dos momentos complicados que passou e recordou com alguma angústia e nostalgia. As memórias ainda fazem chorar...

Uma das coisas curiosas que eu reparei é do carinho que a população tinha por alguns militares portugueses, pois é uma das coisas que todos falam é nos nomes deles. Depois de tantos anos ainda os recordam e sabem exactamente quem são, a graduação que tinham e de onde eram. (**)

(v) José Teixeira (***):

[O José Teixeira é membro sénior da Tabanca Grande e ativista solidário da Tabanca Pequena, ONGD, de Matosinhos; partiu de Casablanca, de avião, e chegou a Bissau, já na madrugada do dia 30 de abril de 2013; companheiros de viagem: a esposa Armanda; o Francisco Silva, e esposa, Elisabete; no dia seguinte, 1 de maio, o grupo seguiu bem cedo para o sul, com pernoita no Saltinho e tendo Iemberém como destino final, aonde chegaram no dia 2, 5ª feira; na 1ª parte da viagem passaram por Jugudul, Xitole, Saltinho, Contabane Buba e Quebo; no dia 3 de maio, 6ª feira, visitam Iemberém, a mata di Cantanhez e Farim do Cantanhez; no dia 4, sábado, estão em Cabedú, Cauntchinqué e Catesse; 5, domingo, foram de Iemberém, onde estavama hospedados, visitar o Núcleo Museológico de Guileje, e partinso  depois para o Xitole, convidados para um casamento ] 


(...) O dia nasceu suavemente, com um mango a acordar-me ao cair encima do telhado de capim e rolar até ao chão. Talvez um dos macaquitos que estava a tomar o seu matabicho se tenha descuidado. Estes macacos, de pelo cinzento, não armam aquela gritaria a que nos habituamos em tempos idos com o macaco cão. Habituaram-se a viver com o homem e passeiam-se nas árvores por cima de nós, pacifica e calmamente. Certo é que neste dia 5 de Maio, o sol já ia alto quando me sentei para tomar o pequeno-almoço, que começou por um mango madurinho e saboroso.

(...) Partimos (de Iemberém) com destino a Bissau. Duas horas depois estávamos a admirar o Museu Memórias de Guiledje (****), inaugurado em 2010 e que pretende documentar todo um passado de luta pela independência da Guiné-Bissau. À nossa espera estava o diretor, Domingos Gomes, como tinha prometido, para uma visita guiada. Foi um regresso ao passado para mim e para o Francisco Silva no reencontro com as armas e canhões, com as viaturas, com as imagens da guerra que ambos vivemos em locais e tempos diferentes.

Em cada visita que faço, noto com alegria que o museu vai crescendo. Há outras partes do antigo quartel levantadas. No pavilhão principal estão os instrumentos de guerra portugueses, bem como as armas que o PAIGC usava, as fotografias da guerra e outros memoriais. Livros, poucos, sobre a guerra, são o princípio de uma biblioteca que se pretende seja enriquecida com todos os livros e documentos possíveis para enriquecer a história do conflito que existiu para separar e afastar os portugueses da Guiné e de facto separou-nos com muito sangue derramado, dor e pranto, mas creio que estranhamente nunca os guineenses estimaram tanto os portugueses como agora que estão livres da sua tutela política.

Um Unimog bem conservado transportou-nos ao tempo das colunas por aquelas picadas inóspitas atapetadas de perigosas minas. Transportou-nos até ao grupo de picadores que, à sua frente e com todo o cuidado, picavam a terra, centímetro a centímetro, na esperança de as detetar e assim salvar possivelmente algumas vidas. Transportou-nos a um tempo que já passou, mas as suas marcas continuam bem presas na nossa mente e só desaparecerão com o pó da terra que nos há-de tragar.

A capela com a imagem de Nª Senhora de Fátima no seu altar, tal como no tempo da guerra, e o oratório do Santo Cristo dos Milagres construída pelos devotos Gringos açorianos. Locais, onde os mais devotos se ajoelhavam a pedir por seu intermédio a bênção de Deus para os momentos difíceis que a guerra e agradecer os perigos passados dos quais se livraram com vida.

O Museu foi enriquecido com um novo auditório onde está patente, onde foi instalado o Museu de Cultura e Ambiente onde se pretende espelhar o ecossistema da mata do Cantanhez e as culturas dos diferentes grupos étnicos que habitam a região.

O tempo não tem paciência para esperar e os ponteiros do relógio vão marcando as horas. Tínhamos encontro marcado na tabanca do Xitole para participarmos na festa do casamento da filha do nosso amigo Mamadu Aliu que há três dias atrás atuou de cicerone na visita/peregrinação que o Francisco Silva ali fez em busca do seu passado.

Com pesar para o Domingos Gomes, que bem insistiu para ficarmos mais um pouco e havia muito para ver e refletir, mas não queríamos ficar mal com a família da noiva que tão amavelmente nos tinha convidado. (...)

Excertos de: Crónicas de uma viagem à Guiné-Bissau (30 de Abril - 12 de maio de 2013) - Parte VI (***)

(Excertos, revisão e fixação de texto: LG)



(***) Vd.  poste de 22 de junho de 2013 > Guiné 63/74 - P11745: Crónicas de uma viagem à Guiné-Bissau: de 30 de abril a 12 de maio de 2013: reencontros com o passado (José Teixeira) (6):De Iemberém a Guileje, a caminho de um casamento no Xitole

(****) Um "visita virtual" ao Núcleo Museológico Memória de Guiledje pode ser feita através dos  postes a seguir.  (Este descritor tem 40 referências no blogue.)


Vd. também poste de 4 de fevereiro de 2010 > Guiné  63/74 - P5761: Núcleo Museológico Memória de Guiledje (13): Iintervenção da Presidente da AD , Osabel ;Miranda, no dia 20 de janeiro de 2010  

(...) "O  'Museu 'Memória de Guiledje' é, antes de tudo, uma homenagem à geração de Cabral, a todos os que com o seu exemplo escreveram uma das mais belas páginas da nossa História. Mas é também um lugar de confluência de rios anteriormente desencontrados que hoje procuram um caminho comum.

"Encontro com os militares portugueses, aqueles que, embora em campo oposto, aprendemos a respeitar pela sua coragem e capacidade militar numa luta de longa duração e que, afinal, partilham os mesmos sentimentos de amor pela Guiné-Bissau e pelo seu povo, pela sua humildade, dignidade, valentia e determinação, os quais sempre souberam distinguir o povo português do regime colonial que a ambos oprimia .

"Hoje, em liberdade, reencontramo-nos com emoção, com vontade de juntar memórias, recordações, encontros e desencontros, voltar a caminhar juntos num caminho de respeito e progresso.

"Saudamos a presença da Srª Julia Neto, esposa do capitão José Neto que tanto amou este canto e que tanto contribuiu para que o Museu 'Memória de Guiledje' fosse um êxito. Poucos dias antes de falecer, deixou-nos o seu desejo mais profundo: 'hei-de voltar a Guiledje', disse. A sua esposa, Srª Julia Neto, está hoje entre nós para realizar esta sua última vontade. Através dela saudamos todos os militares portugueses das 12 companhias que passaram por Guiledje e que quiseram deixar um pouco das suas recordações (aerogramas, fotografias, filmes, contos e narrativas). (...).