sábado, 26 de novembro de 2011

Guiné 63/74 - P9102: O nosso blogue em números (25): A propósito da sondagem dos 3 milhões: E de repente deixássemos de fazer... anos ? (José Colaço / Carlos Vinhal)

1. Comentário do José Colaço ao poste P9093 (*): 

Acabar com os postes de parabéns de anos ? Não, têm muito significado para quem os recebe....Embora eu pessoalmente esteja mais de a acordo com o poema de João de Deus.

Dia de anos

Com que então caiu na asneira
De fazer anos na quinta feira
Vinte e seis anos! Que tolo!
ainda se os desfizesse...
Mas fazê-los não parece
De quem tem muito miolo!

Não sei quem foi que me disse
Que fez a mesma tolice
Aqui o ano passado...
Agora, o que vem, aposto,
Como lhe tomou o gosto,
Que faz o mesmo. Coitado!

Não faça tal, porque os anos
que nos trazem? Desenganos
Que fazem a gente velho,
Faça outra coisa, que, em suma,
Não fazer coisa nenhuma
Também lhe não aconselho.

Mas anos... Não caia nessa!
Olhe que a gente começa
Às vezes por brincadeira,
Mas depois se se habitua,
Já não tem vontade sua,
E fá-los queira ou não queira!

In: João de Deus (1830-1896) > Campo de Flores (1893),


2. Comentário do nosso co-editor Carlos Vinhal, que tem  - entre muitos outros -  o "pelouro dos aniversariantes":

Caro Manuel Joaquim

Não te penalizes por não reunires o consenso. Isto dos aniversários partiu de uma brincadeira muito a sério e achou-se por bem generalizar. No meio disto há um senão, o meu stress. Já arranjei "inimigos" por ter cometido o "crime" de me ter esquecido de um ou dois aniversários. A malta felizmente é muita, mas a imaginação para tanto escrever e ilustrar, foi-se. Daí ter optado por um modelo de postal uniforme, à excepção de uma vez ou outra para um camarada a quem me dirijo pela primeira vez no seu aniversário.

Como o Luís e o Eduardo têm o seu tempo ocupado,  tomei em ombros (com muito gosto, diga-se) a "responsabilidade" de não deixar esquecer os nossos aniversários. O Luís já pôs a hipótese de se repensar para o ano a maneira de manter esta simbólica homenagem, mas até "ordens" em contrário contem comigo.

Um abraço para ti e para os demais camaradas e amigos deste Blogue, onde 75% dos que se manifestaram na última sondagem o consideram 5***** estrelas.

Um é um prazer trabalhar para vós todos.

Carlos (**)
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Notas do editor:

(*) Vd. poste de

25 DE NOVEMBRO DE 2011 > Guiné 63/74 - P9093: O Nosso Blogue em Números (24): A propósito da sondagem dos 3 milhões: Para mim o blogue está bem e recomenda-se (Manuel Joaquim) 
(...) Apetece-me dizer que o blogue se mantenha como está. Para mim “está bem e recomenda-se”. Mas, para não dizerem que não tenho ideias (!), vou ter a coragem de causar desagrado a alguns camarigos. É só isto (só?!): que se deixe de fazer edição de posts de aniversário.

Eu explico com o meu próprio comportamento, pois não encontrarão aí qualquer comentário meu, com exceção de um dedicado ao Luís Graça, o qual de certo modo era uma maneira de dar os parabéns à Tabanca, isto é, a todos os seus membros na pessoa do seu fundador.

Poupava-se espaço, aligeirava-se a consulta do blogue, ouso dizer que se acabava com comparações idiotas de quem tem mais votos de parabéns. No blogue somos todos iguais e todos os seus membros são meus amigos, mesmo que não os conheça. Digo, para oficialmente saudar no blogue um seu membro teria depois de o fazer com todos, no respetivo aniversário! Não acho razoável.

Desculpem mas acho que seria suficiente a publicação, como já se faz, da data de aniversário na margem esquerda da página e, então, cada um de nós (temos uma listagem) enviaria a mensagem a quem quisesse e nos termos que achasse melhores. (...)

(**) Até agora, manifestaram-se a favor da continuação dos postes de aniversários, além do José Colaço, os seguintes camaradas:

Rui Silva: (...) Desculpa, no entanto, Manuel, não concordar com a abolição dos parabéns 'em Post' e respectiva folha de comentários. Fazem-nos sentir vivos, lembrados. Que bom nos tempos de hoje!
A quantidade dos parabenizadores não tem relevância. Umas palavrinhas dos amigos caiem sempre como um bálsamo de conforto. (...)

Manuel Amaro: (...) Eu sou pelo continuação do sistema de comemoração dos aniversários dos tabanqueiros. É engraçado. E quando no meu último aniversário alguém contava o número de telefonemas, mensagens no 96 e no hotmail, eu fiz um figurão e apresentei mais os comentários aqui do blogue. Foi uma festa no meio de outra festa. E toda a gente achou que esta acção do blogue era muito bem pensada e muito bem executada. (...)

JERO: (...) Caro Manuel Joaquim: Gostei de te ler. Só não estamos de acordo em relação às postagens dos "parabéns". Apesar de eventualmente repetitivas ...acho que valem a pena.Porque acordar vivo, fazer anos e ter amigos a dar umas "dicas"...sabe sempre bem. Digo eu...que sou mais velho.Um grande abraço de Alcobaça (...).

Guiné 63/74 - P9101: Se bem me lembro... O baú de memórias do Zé Ferraz (7): Um acidente... no Pilão

1. Mais um pequena história, retirada das "teias de aranha" do baú de memórias... do Zé Ferraz:

Um dos meus amigos fixes desse tempo era um furriel miliciano,  destacado no Cacheu,  que sempre que conseguia desenfiava-se e aparecia em Bissau, quase sempre de madrugada.

Abreviadamente, era o A. T....Vinha bater a porta do meu quarto sempre com a burra e o mesmo grito:
- Zé,  acorda vamos pró Pilão que as meninas estão à MINHA espera...

Ora bem,  quase sempre durante a minha estadia em Bissau conseguia que o "nosso primeiro",  responsável pela distribuição de alojamentos,  se esquecesse de que no meu quarto havia duas camas. Portanto,  quando os meus amigos vinham a Bissau,  sabiam que tinham onde ficar...

Numa dessas visitas o A.T. comprou um pingalim de pau santo,  igual ao meu,  que usava quando eu ia ao Pilão. Era uma exelente arma de defesa porquanto se ouvesse necessidade partia-se com o joelho e tinhamos dois punhais improvisados...(Lamego).

Como eu ia dizendo,  numa dessa visitas depois de se recompor e depois do jantar,  era da ordem a visita ao Pilão,depois de o A.T.  ter feito,   durante o dia,  o respectivo reconhecimento. Dizia ele então:
-Ó Zé, descobri estas meninas e temos que lá ir hoje à noite,  pá. (O A.T. estava convencido que era o Adónis de toda a Guiné,  não só do Pilão).

Nessa noite parece que o estou a ver vestido a rigor,  todo de calças e camisa branca e de pingalim debaixo do braço. Arrancámos pró Pilão e fomos para uma área que eu desconhecia, o que me preocupava e perguntava-lhe:
- Ó pá,  tu sabes para onde vais ? Parece-me bem que não...

O A.T. respondia-me:
-Sei,  sei, é por aqui...

E lá íamos cada vez mais embrenhados em território inimigo... Noite de lua nova,  escuro como breu, a única coisa que eu via era o branco do A.T.... De repente o A.T. desaparece da minha vista (ia vários passos à minha frente) e, antes que eu pudesse falar, ouvi-o vociferar:
- Ah,  f...-se!| Porra! C... Ó Ze,  ajuda-me!...
- Porra,  onde é que estás ? -  pergunto eu...
- Aqui,  pá!

Acendi o isqueiro e com a  pouca luz que dava vi que o A. T.  tinha caído numa fossa de merda,  atascando-se até ao peito e de pingalim na mão a gesticular... Parecia o maestro dos cagalhões!...
- Ó Zé,  ajuda-me!  F...-se!...

Tirei o meu cinto,  passei-lhe uma ponta e ajudei-o a vir para terra firme... Ah,  meu Deus,  e o cheiro...poça!

E aí fomos os dois andando em busca de lugares conhecidos com o A.T.,  caminhando de pernas abertas, e deixando um rasto de merda... E os dois, às gargalhadas. Lá chegámos ao pé do quartel da PSP onde entrei para chamar um táxi para o levar para o hospital militar onde recebeu um banho de antibióticos e mais não sei quantos medicamentos. 

O resto deste acidente: o taxista que chegou quando viu o estado em que estava o A. T., disse logo:
- Não senhor,  não entra no carro,  nunca mais tiro esse cheiro do assento!

Por sua vez,  os cabrões da PSP não deixaram o A. T. usar os seus chuveiros. Lá consegui uma mangeira da PSP. O  A.T.  despiu-se e eu de mangeira na mão a dar-lhe um duche como se estivesse a lavar um cavalo...

Já mais limpo e tremer de frio,  lá o meti no táxi e toca ir pró hospital... Arrancámos, e agora  imaginem a malta do hospital quando aí chegámos,  de táxi,  com um passageiro nu em pelota e a tremer de frio... Disse o médico que o viu:
- Teve muita sorte e lavar-se foi muito boa ideia...
- OK,  o que não sabe é que, sem essa lavagem,  tínhamos que vir  à pata para o hospital.

Graças a Deus o A.T.  nÃo só sobreviveu a este acidente como recuperou a sua saúde. Em 1974 quando levei a minha então esposa a Portugal para conhecer o resto da minha família e amigos,  tive o prazer de o convidar para vir jantar comnosco e estivemos noite fora à conversa:
- E lembras-te disto... e lembras-te daquilo ?...

Sinto enormes saudades desse AMIGO e camarada.

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Nota do editor

Último poste da série > 25 de Novembro de 2011 > Guiné 63/74 - P9095: Se bem me lembro... O baú de memórias do Zé Ferraz (6): Não matem a bajudinha...


Guiné 63/74 – P9100: Memórias de Gabú (José Saúde) (15): Lavadeiras: duquesas do quartel


1. O nosso Camarada José Saúde, ex-Fur Mil Op Esp/RANGER da CCS do BART 6523 (Nova Lamego, Gabú) - 1973/74, enviou-nos mais uma mensagem desta sua série.





LAVADEIRAS: DUQUESAS DO QUARTEL, AS SUAS PRESENÇAS CATIVAVAM


“Furrié pricisa de lavadera!”. Era comum ouvirmos este apelo de jovens africanas que pretendiam exercer uma função da qual recebiam, obviamente, proveitos monetários. Os “apelos” sucediam-se. Havia quem cedesse aos pedidos das bajudas, outros mantinham-se fiéis aos seus princípios, isto é, à jovem que desde a primeira hora assumiu esse compromisso.

O Quartel era fustigado com grupos de bajudas sempre prontas para arranjarem novos “patrões”. O lavar a roupa pressupunha mais alguns “pesos” no orçamento familiar. E as moças, airosas, não se faziam rogadas e toca a cativar a malta. Conheci muito boa gente que mudava de lavadeira como mudava de camisa.

Havia quem tentasse colher frutos de outra ordem da sua lavadeira. A bajuda, enraizada nos seus princípios morais mantinha-se fiel aos valores herdados da sua etnia e recusava de pronto eventuais pedidos desmedidos de jovens entregues ao marasmo físico que o rodeava. O seu estatuto de macho impunha-lhe anseios e o sexo emergia naturalmente à flor da pele. Compreendia-se que assim fosse!

Havia dias em que as presenças das lavadeiras no quartel se assemelhavam aos alcatruzes da nora. Com trouxas à cabeça, umas para abaixo outras para a cima, percorriam todas as instalações deixando roupas lavadas e levando novos pacotes de sujas.

Numa análise profícua ao cumprimento do seu dever, as lavadeiras eram mulheres afáveis e que espelhavam sorrisos dóceis para jovens militares entregues aos desprimores da guerra.

A fonte do Alecrim, junto a Gabú, era espécie de Aldeia da Roupa Branca, um filme português do antigamente onde Beatriz Costa assumia o papel principal do enredo. Em Gabú, melhor, na fonte do Alecrim, o branco dava lugar ao verde. Predominavam os camuflados, alguns com muitas histórias para contar.

Também tive uma lavadeira! Era da praxe. Da parte que me toca nunca tive nada a apontar. Pagava o serviço e a roupa vinha sempre impecável. No entanto havia outros camaradas que muito reclamavam. A mudança era impreterível, diziam.

As transversais trocas de opiniões tornavam-se importantes. Quem nada tinha a apontar elogiava os dotes da “sua lavadeira”. Motivo que levava o camarada do lado a avançar para a proposta à “Binta” que, entretanto, se tornara conhecida.

Diziam que, além dum corpo fantástico, era uma lavadeira afamada. As solicitações eram muitas mas a “Binta” ficava-se pelo “patrão” a quem muito cedo dedicou uma particular atenção. A futa-fula – com duas cicatrizes no rosto, ao lado dos olhos, que indicavam a sua verdadeira descendência racial - era uma mulher alta, de nádegas perfeitas, bem posta e todo o seu corpo parecia desenhado com traços de um pintor de renome internacional. Pablo Picasso desenvolveria certamente os seus imensos dotes numa tela em que a Binta, a nossa Binta, seria, com certeza, a rainha de um trono num legado quiçá inimaginável.

A proposta para a lavadeira era do tipo: “jogo do gato e do rato”. Havia os felizardos que desde a primeira hora assumiram compromissos com as suas lavadeiras e cumpriram religiosamente o seu dever ao longo da sua comissão na Guiné!





Um abraço a todos os camaradas,
José Saúde
Fur Mil Op Esp/RANGER da CCS do BART 6523


Fotos: © José Saúde (2011). Direitos reservados.
Mini-guião de colecção particular: © Carlos Coutinho (2011). Direitos reservados.
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Guiné 63/74 - P9099: (Ex)citações (159): O nosso mundo está a encolher (Fernando Gouveia)


1. Mensagem do nosso camarada Fernando Gouveia (ex-Alf Mil Rec e Inf, Bafatá, 1968/70), com data de 24 de Novembro de 2011:

Caro Carlos
Estou a quebrar o meu segundo período de silêncio (não quarentena como da outra vez), pois para tudo é necessário algum repouso, para refazer ideias.

Quanto ao tecer considerações sobre o blogue, o número de postes ou de visitas ao mesmo, repetirei o que disse na minha primeira comunicação ao Luís Graça: “já tenho que ler até ao fim da minha vida”.

Mais do que comemorar os dez mil postes ou os três milhões de visitas, quero dar o meu contributo para os onze mil postes e os quatro milhões de visitas com o “artigo” que se segue e que, desde já, gostaria que fosse comentado pelo Prof Luís Graça, pois é a ele que estes assuntos dizem respeito.

Um abraço.
Fernando Gouveia
P.S. – Brevemente apresentarei “contas” das vendas do Na Kontra Ka Kontra.


O NOSSO MUNDO ESTÁ A ENCOLHER

Quando no ano passado (daqui a dias terei que dizer “há dois anos”…) regressei da minha visita à Guiné, passados quarenta anos de lá ter estado, comentei com os meus familiares e amigos que, em Bafata, quando visitei a minha casa e o quartel do Comando de Agrupamento, ainda a funcionar como quartel, achei tudo muito mais pequeno. No quartel, os pés direitos e a platibanda do telhado pareceram-me mais baixos; os compartimentos, nomeadamente o meu antigo quarto, muito mais pequenos. A minha casa, que na altura a achava de dimensões normais, pareceu-me minúscula, tal como a varanda, onde, muitas vezes estive sentado e me sentei de novo, agora.

Sensação estranha. Pareceu-me que tudo tinha encolhido.

Não esquecendo o que se passou segui em frente. Mas eis que há dias fiquei surpreendido com um artigo que li numas “Seleções da Reader’s Digest” de Fevereiro de 1949, extraído da publicação ”The Christian Science Monitor”, que junto a seguir.


Tudo isso é então normal. Mais descansado fiquei…
Ainda na sequência de tudo isto relembrei um poema do livro “Magnetismo Terrestre” (Fevereiro de 2006) de Regina G.


BIG-BANG

Na minha infância, o Universo estendia-se
do Castelo até às Eiras, envolvendo a Praça
e o Cabecinho onde ficava a minha escola.
À volta eram ladeiras que velavam o sono do rio
lá no fundo. Era assim o meu mundo
que, para mim, era maior que o infinito
e que em cinco linhas aqui ficou descrito,
contrariando assim, à evidência,
uma das conjeturas da ciência.
Desde o seu Big-Bang
o meu Universo contrai-se, não se expande.


2010 - Edifício dos quartos dos oficiais do Comando de Agrupamento.

2010 - Um jagudi em cima da que foi a minha casa.

2010 - Na varanda da minha antiga casa.

Um abraço a todos
Fernando Gouveia
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Nota de CV:

(*) Vd. poste de 19 de Setembro de 2011 > Guiné 63/74 - P8794: Agenda Cultural (154): Exposição de fotos e lançamento do Livro Na Kontra Ka Kontra de autoria do nosso camarada Fernando Gouveia, ocorridos no dia 13 de Setembro de 2011, na Casa da Cultura Mestre José Rodrigues, em Alfândega da Fé

Vd. último poste da série de 24 de Novembro de 2011 > Guiné 63/74 - P9092: (Ex)citações (158): Homenagem aos nossos mortos não tem data! É quando um homem quiser! (António Matos)

Guiné 63/74 - P9098: Agenda Cultural (171): Ciclo de Conferências-debate Os Açores e a Guerra do Ultramar - 1961-1974: história e memória(s) (Carlos Cordeiro) (9): Rescaldo da sessão do dia 23 de Novembro de 2011 (Carlos Cordeiro)

Mensagem do nosso camarada Carlos Cordeiro (ex-Fur Mil At Inf CIC - Angola - 1969-1971), Professor na Universidade dos Açores, com data de 25 de Novembro, com o rescaldo da última conferência-debate integrada no "Os Açores e a Guerra do Ultramar – 1961-1974, história e memória(s)":

Caros amigos,
Como aqui foi noticiado (P9077), realizou-se na 4.ª feira, 23 do corrente, a quinta conferência no âmbito do ciclo de conferências “Os Açores e a Guerra do Ultramar: história e memória(s) – 1961 - 1974.

A sessão começou com a apresentação do livro do nosso camarada, há meses falecido, Fernando de Sousa Henriques, antigo Alf Mil Op Esp/RANGER na CCAÇ 3545/BCAÇ 3883 (Canquelifá, 1972/74) e presidente da Liga de Combatentes, Núcleo de S. Miguel. A apresentação esteve a cargo do General na reforma, Luciano Garcia Lopes (que foi comandante da 15.ª CCMDS na Guiné), que, em palavras sentidas, deu o seu testemunho sobre o carácter e personalidade do amigo Fernando Henriques e por fim leu um texto do Coronel CMD reformado Raul Socorro Folques, apresentado aquando do lançamento do livro no Continente. O irmão de Fernando Henriques, dirigiu palavras de agradecimento, quer ao Gen. Garcia Lopes, quer à Comissão Organizadora.

Seguiu-se a conferência de Jorge Félix Furtado Dias, que comandou, em 1973, um Esquadrão de Cavalaria a Cavalo no Leste de Angola, com sede no Munhango. Tratou- se de uma conferência muito interessante, até pelo desconhecimento que a maioria dos participantes tinha sobre a utilização da tropa a cavalo na Guerra do Ultramar.

Além disso, o camarada Furtado Dias utilizou um tipo de discurso acessível, acompanhado de um power-point com imagens significativas da actuação dos nossos cavaleiros no Leste de Angola. Os praças, furriéis e alferes eram de mobilização local, sendo só o capitão do Quadro Permanente. A partir da sua própria experiência como Comandante de Esquadrão salientou também os pontos fortes e fracos da intervenção da Cavalaria a cavalo naquelas circunstâncias.

O período reservado ao debate foi muito participado.

A Comissão Organizadora está já a preparar a próxima conferência, que se realizará em Janeiro.

Um abraço,
Carlos Cordeiro

A partir da esquerda: o Gen. Ref. Luciano Garcia Lopes lendo o seu texto de apresentação do livro; o Cor. Ref. Salgado Martins (membro da Comissão Organizadora) - que comandou na Guiné a CCaç 4544/73 e a 3.ª CCaç do BCaç 4612/72 - e o irmão de Fernando Henriques.

Panorâmicas da assistência

Jorge Félix Furtado Dias proferindo a sua conferência.
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 22 de Novembro de 2011 > Guiné 63/74 - P9077: Agenda Cultural (170): Ciclo de Conferências-debate Os Açores e a Guerra do Ultramar - 1961-1974: história e memória(s) (Carlos Cordeiro) (8): Acção a Cavalo em África, por Jorge Félix Furtado Dias, dia 23 de Novembro de 2011 no Anfiteatro C da Universidade dos Açores (Carlos Cordeiro)

Guiné 63/74 - P9097: Porto de Abrigo (Carlos Rios) (2): A nossa estada em Fulacunda

1. Segundo episódio de "Porto de Abrigo", as memórias passadas a escrito pelo nosso camarada Carlos Luís Martins Rios*, ex-Fur Mil da CCAÇ 1420/BCAÇ 1857, Mansoa e Bissorã, 1965/66.


PORTO DE ABRIGO - II

A nossa estada em Fulacunda

Durante o tempo de permanência na colónia tivemos contacto com a tremenda realidade de uma guerra no que do pior pode acontecer. Enterrámo-nos nas bolanhas, dormimos em buracos escavados à pressa, abrigámo-nos à sombra das árvores esguias e altas, bebemos a chuva escorrida entre as folhas ou chupámos as gotas de um punhado de lama amassada, bem como em muitas operações ao romper da madrugada lambíamos a humidade acumulada nas folhas do capim, tal era a sede, fome e cansaço acumulados por longas e tremendas caminhadas feitas sob o efeito da ansiedade e do medo, porque não dizê-lo; chegámos a caminhar 36 horas consecutivas alimentados a ração de combate e sendo diversas vezes flagelados por emboscadas do IN; o nosso sangue para além de ser derramado em profusão por alguns queridos camaradas, foi ainda sugado pelos mosquitos; o paludismo foi contraído por alguns de nós; o nosso suor e algumas vezes, as nossas lágrimas ajudaram a molhar a terra ressequida. Andámos dezenas e dezenas de quilómetros em picadas ou abrindo clareiras na mata espessa com o nosso próprio corpo; conhecemos as tabancas; falámos com as pessoas e entendemo-las num português incipiente, com ajuda de meia dúzia de expressões na língua local e até através da linguagem universal do gesto; pegámos ao colo tantas crianças, ajudámos a matar a fome de tantos homens e mulheres. Mas também matámos. Também morremos, e principalmente sofremos com a omnipresença da nossa vida dos nossos entes queridos; quanta nostalgia!
Sim! Porque as coisas mais lindas ou horríveis que nos marcam ou emocionam não podem ser vistas ou tocadas mas sim sentidas pelo coração.

Deslocados para o Quartel de Santa Luzia, ali recebemos directamente o armamento de outra Companhia que estava de regresso a Portugal, ali se entrecruzaram dois grupos de homens cujos estados de espírito eram perfeitamente antagónicos; enquanto entre nós reinava a ansiedade e a contrariedade, nos nossos camaradas vivia a descompressão e a expectativa do regresso.

Ainda me lembro das palavras ditas em tom de grande amizade pelo furriel que me antecedeu e me entregou a arma: - Toma lá oh periquito, aqui tens a formosa, vê se a tratas bem porque vai ser a tua melhor amiga.

Por entre a vozearia ouvia-se a espaços: vai pró mato periquito.

Começava a tomar contacto com um infindável e curioso léxico novo e utilizado pelo pessoal durante o tempo ali passado a par com imensas frases e palavras do crioulo e de dialectos gentílicos.

******

Embarcados em lanchas LDM ou LDG, não tenho já a certeza, lá partimos para o nosso local de destino. É o primeiro contacto com a realidade da misteriosa e esmagadora mata, a viagem pelos canais circundantes e por último pelo rio Corubal. Além da intranquilidade interior e ansiedade permanente, a viagem decorre tranquilamente numa linda paisagem envolvente até que chegamos ao porto de desembarque localizado a 4 quilómetros, por uma assustadora picada em péssimo estado até Fulacunda, onde se encontra instalado o Quartel, um rectângulo rodeado por arame farpado com edifícios da antiga colonização – é uma sede de circunscrição – onde foram instaladas e construídos abrigos subterrâneos e postos de sentinela em pontos estratégicos da cerca. Ainda há um Posto de Correio e um comerciante branco – o Sr. Pires – que vive sozinho. Existe no exterior bastante população, e a sensivelmente 100 metros, uma pista de aterragem, onde está instalado um posto avançado apetrechado com uma metralhadora Breda e que está permanentemente ocupado por uma Secção. As únicas ligações são o já falado porto de embarque, onde curiosamente vem carregar e descarregar uma barcaça com todo o tipo de géneros para nós e a população, da qual alguns elementos também se fazem transportar naquele meio e o aeródromo. Nas chegadas e partidas da mesma um Pelotão da Companhia monta a segurança, francamente, não creio, o barco nunca teve o mais pequeno problema, haver necessidade da mesma. O único problema havido teve a ver com um militar nosso que se meteu no rio e ia a ser levado pela maré, valeu-lhe a generosidade e valentia do recém-chegado Alf. Mil. Rui Ferreira que o resgatou às águas já a mais de 50 metros do local onde se encontrava. Começava a aparecer a valentia, voluntariedade e humanidade de um líder nato. A população dedicava-se nos limites da zona capinada envolvente ao quartel, ao cultivo de mancarra (amendoim) e proliferava a pesca; enfim um conjunto de actividades que francamente nunca entendi.

O chefe da tabanca (aldeia) era Tenente de 2.ª Linha, havia muitos pela Guiné, Não participava em nenhuma actividade em que estivéssemos envolvidos, limitando-se como todos os que vim a conhecer, a passear pela tabanca e arredores uma ridícula fardeta. Creio hoje que era um método criado pela administração de subornar e dividir as populações já tribalizadas e em conflitos. Havia na Guiné mais de trinta etnias, grupos e sub-grupos. Estes creio que eram mandingas e islamizados, praticando a poligamia. O nosso amigo Tenente tinha mais de uma dezena de mulheres.

Junto à saída para Lamane, local onde nunca nos deslocámos porquanto, segundo a Companhia de açorianos que fomos render, era local de perigoso acesso devido às fortes forças do inimigo, tanto na tabanca como em todos os acessos. Existia uma palhota pequena circular colocada no sitio mais agreste do aquartelamento onde se encontrava um elemento que também segundo os mesmos era um perigoso terrorista. Não sabia ou não queria pronunciar uma única palavra de português ou crioulo, segundo vim a saber, porque nunca me aproximei do local. Abaixo se vê imagem do local onde se manteve inamovível o elemento referido durante todo o tempo que aqui me mantive.

Durante a estadia aqui em Fulacunda dá-se o desaparecimento em combate da Alf. Nil. Vasco Cardoso e de mais cinco praças conforme explicito noutro local. Aqui perfeitamente angustiado e deprimido ouvi pela primeira vez, a canção de Zeca Afonso “Os vampiros” pela bela voz do meu camarada Ernesto Fernandes. Pela primeira vez também ouvi falar da coisa politica.


No porto um barco de cabotagem chegou. Depois da segurança montada um pequeno bote faz o transbordo de pessoas e mercadorias. A altura é aproveitada para umas banhocas.


Eis a barcaça que refiro e o local de onde o 610 foi arrastado pela corrente e o Rui Ferreira o foi pescar 50 metros mais abaixo. Na altura excedi-me e proferi uma série de imprecações dirigidas aos nossos rapazes sobre a sua imberbidade e falta de sentido de responsabilidade que punham em risco as suas vidas e dos seus camaradas. A intervenção do Rui foi de uma dificuldade e perigosidade extremas. Só quem conhece a força das águas na vazante naquele local pode aquilatar. Pouco tempo depois numa das correntes patrulhas feitas na estrada que conduzia a S. João, um dos nossos Pelotões sofreu uma tremenda emboscada que provocou o primeiro morto na nossa Companhia. Um sentimento de tremenda angústia e impotência me assaltou. Apenas me lembro que o corpo do desditoso camarada ficou toda a noite em improvisada câmara ardente. Poucos tiveram a coragem de o acompanhar. Os olhares de amargura eram visíveis não recordo mais qualquer actividade, que de facto houve.

Aspecto geral da tabanca.

O interior do aquartelamento em dia de grande temporal.

Assim se ia passando o tempo num isolamento total no coração de uma mata que já se apresentava hostil e perigosamente condicionante. Neste ambiente doentio na nossa pequena e isolada Fulacunda em situação de permanente angustia e omnipresente desconforto, o mais singelo desvio da rotina é acontecimento marcante, que preenche as conversas de vários dias. Talvez por isso mesmo, a importância que ganhava tudo o resto.
Foi-nos comunicado ser possível ver cinema o que parecia ousado admitir, mas em África muitas vezes é possível o impensável.

Tinha chegado, nunca soube como, uma figura típica, o sr. Machado, um septuagenário de longas barbas brancas que se dedicava a levar o cinema às povoações mais recônditas da Guiné, e dezenas e dezenas de anos de África já o tinham feito praticamente esquecer o seu cantinho natal em Trás-os-Montes. Personalidade forte que se propunha apresentar uma sessão de cinema ao ar livre para que toda a população também pudesse assistir. Nem mesmo a eclosão da guerra impedira que o sr. Machado continuasse a levar a sétima arte aonde quer que meia dúzia de pessoas pudesse pagar um bilhete. Isso acontecia, naturalmente, nas concentrações da tropa portuguesa. O Sr. Machado fazia questão em que se soubesse que ele não percebia nada de guerra nem de política. Ao princípio da noite, reforçada a vigilância e o patrulhamento da povoação, lá íamos para o cinema, muitos de nós sem sequer sabermos o nome ou o género de filme que íamos ver. O filme apresentado era já bastante antigo, mas qualquer um era susceptível de dispor bem um punhado de homens isolados há tempo nas matas africanas. Depois das peripécias da entrada no recinto, marcada pela preocupação do bom sr. Machado de assegurar que ninguém ia ver o seu filme à borla, eis-nos instalados a esmo pelo chão o que para a população era trivial, e à soldadagem permitia uma maior aproximação às bajudas, na esperança de que a animação na tela desviasse a atenção do barulho infernal do gerador ali muito perto. Poucos minutos depois do inicio da sessão e após um pequeno intervalo, levanta-se um coro de protestos, alguma coisa acontecera uma vez que não se entendia a historia que tinha começado muito expectante e deixara de fazer sentido. Não havia dúvida de que o bom do sr. Machado trocara as bobinas do filme e o que estávamos a ver não era sequencial. Aumentaram os protestos, forçando à interrupção do filme. Mas ele, teimoso, enfrentando a plateia, garantia que a sequência estava correcta, que já tinha passado dezenas de vezes aquele filme e que nós é que não percebíamos nada de cinema. É claro que a partir daí a história do filme perdera todo o interesse e alguns começaram a sair. O sr. Machado, que então já admitia o seu engano, esforçava-se por convencer que a troca não tinha importância, porque agora é que era mais bonito. Realmente só as circunstâncias e acompanhamento podiam explicar a razão porque uma percentagem dos homens ali se manteve até final! Passados que foram alguns meses depois de termos sido confrontados com a série se acontecimentos traumáticos a que faço alusão nas cópias de alguns blogues e de sentir na pele os efeitos dum clima de tremenda humidade e calor potenciadores de possíveis doenças, sujeitos muitas vezes em plenas bolanhas ou na misteriosa selva a apocalípticos vendavais, onde a chuva caía em cascatas e os relâmpagos ininterruptos em centenas de metros iluminavam a tremenda escuridão com uma claridade inacreditável. Lá emalámos novamente as nossas embembas e fomos embarcados com destino a Bissorã.

(Continua)
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 23 de Novembro de 2011 > Guiné 63/74 - P9082: Porto de Abrigo (Carlos Rios) (1): Dedicatória, início da vida militar e viagem para a Guiné

Guiné 63/74 - P9096: Parabéns a você (345): Jorge Teixeira, ex-Fur Mil Art da CART 2412 (Bigene, Guidage e Barro, 1968/70)

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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 24 de Novembro de 2011 > Guiné 63/74 - P9086: Parabéns a você (344): António (Tony) Levezinho, ex-Fur Mil da CCAÇ 2590 e CCAÇ 12 (Bambadinca, 1969/71)

sexta-feira, 25 de novembro de 2011

Guiné 63/74 - P9095: Se bem me lembro... O baú de memórias do Zé Ferraz (6): Não matem a bajudinha...

1. Texto de José Ferraz  (ex-Fur Mil, Op Esp, CART 1746, Xime e Bissau, 1968/70;  radicado nos EUA há desde 1970):



(i) Falando de acção psicossocial, de que sempre fui partidário, lembrei-me que durante uma operação de penetração ao sul do Xime, aprisionámos 2 elementos IN (*).

Depois de interrogados, guiaram-nos a uma tabanca IN. Fizemos um assalto e durante esse combate ferimos uma miúda, bajuda, com um tiro por detrás do joelho que lhe destroçou a patela [ ou rótula].
- Mata a miúda... - disse alguém.
- Não mata nada - disse eu [, que estava a comandar o pelotão].

E ordenei ao meu pessoal para fazer uma liteira, trazendo a bajuda para o Xime de onde foi posteriormente helitransportada para o hospital em Bissau. Oxalá ainda seja viva.


Nem tudo na guerra é destruição. Talvez alguém dos meus tempos no Xime se lembre deste episódio.

(ii) Mas ainda a respeito desta bajudinha do Xime, alguém que não tenha estado nesta situação, é capaz de não perceber o que me levou a fazer o que fiz.... Por outro lado,  se alguém que tenha estado  lá comigo se lembrar [deste episódio], seguramente dirá que o tempo que levámos a preparar a liteira, deu tempo ao IN para começar a mandar morteiradas para dentro da tabanca e tiroteio de armas ligeiras como eu nunca tinha visto. De facto, poderia ter causado sérios problemas, mas graças a Deus tudo correu bem.

A minha intenção é apenas a de dizer publicamente que nós, no mato, e em situações de perigo, tínhamos coração e respeito pela vida humana, nem sempre tudo era ronco e destruição de tudo por onde pássavamos - a [alegada política da] "terra queimada".

José Ferraz (**)

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Notas do editor:



(*) Muito provavelmente) trata-se da Op Baioneta Dourada, iniciada em 2 de Abril de 1969, às 0h00, com a duração prevista de dois dias, e com o objetivo de "se completarem as destruições dos meios de vida na área, executadas quando da Op Lança Afiada [8-18 de Março de 1969], na região de Poindon".

As NT eram constituídas por dois 2 destacamentos:

(i) Dest A: CART 1746 (Xime) (a 3 Gr Comb) + CCAÇ 2314 (Fulacunda ou Tite) (1 Gr Comb);

(ii) Dest B: CCAÇ 2405 (Galomaro) (a 2 Gr Comb) + CCAÇ 2314 (Fulacunda ouTite) (1 Gr Comb).

Podemos publicar, oportunamente, um excerto do o relatório desta operação, em que foi capturado um elemento IN,  desarmado. Na exploração imediata de informações dadas pelo prisioneiro, o Dest A fez uma batida à zona, surpreendendo "9 homens sentados acompanhados de 2 mulheres" (sic).  Aberto fogo, foram capturadas as duas mulheres, feridas. Os restantes elementos fugiram, com baixas prováveis.

Entretanto, "ao serem prestados os primeiros socorros às mulheres feridas, um grupo IN de efectivo não estimado flagelou as NT durante cerca de 6 minutos com LGFog, mort 60 e cerca de 6 armas automáticas", sem consequências para as NT.

(Fonte: BCAÇ 2852, Bambadinca, 1968/70. História da Unidade. Cap II, pp. 78/79).


(**) Último poste da série > 24 de Novembro de 2011 > Guiné 63/74 - P9090: Se bem me lembro... O baú de memórias do Zé Ferraz (5): O desenrascanço... na justiça militar!

Guiné 63/74 - P9094: Notas de leitura (305): Dois Anos de Guiné - Diário da Companhia de Caçadores 675, por Fur Mil Oliveira (2) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem de Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 31 de Outubro de 2011:

Queridos amigos,
Neste diário de JERO aprende-se muita coisa sobre o que era o Norte da Guiné em 1964, há mesmo observações indisfarçáveis de que aquelas regiões entre Binta, Farim e Guidage eram deficientemente percorridas, a ponto de não se transitar por viatura, antes de chegar a CCAÇ 675 nem se saia de Binta. Dá para pensar. É um diário riquíssimo, o furriel enfermeiro é porta-estandarte daquele entusiasmo que se torna compreensível lendo este diário correspondente ao primeiro ano da comissão.
Não percebo como é que este documento histórico esteve aferrolhado a sete chaves. Temos aqui matéria para o JERO se justificar…

Um abraço do
Mário


Um documento histórico, o Diário da CCAÇ 675, o Diário de JERO (2)

Beja Santos

A CCAÇ 675 está altamente mobilizada, maior entusiasmo não pode haver. JERO faz o balanço de um mês na zona, num mês percorreram 22 itinerários numa extensão de cerca de 250 quilómetros a pé e 90 viaturas.

Recorde-se que o autor se apaga no colectivo: “É de assinalar que entretanto e depois do primeiro golpe de mão a Cansenhe, onde tivemos o nosso primeiro morto e encontrámos forte resistência do inimigo, voltámos à região dois dias depois, destruindo a tabanca e um grupo de 30 casas de mato. No dia seguinte, abrimos o itinerário para Farim onde desde há uns tempos não passava tropa, levantando 31 abatizes. Parecia difícil de acreditar que soldados que um mês antes só tinham ouvido tiros em carreira de tiro, num clima difícil, numa terra em tudo diferente do que até então estavam habituados, tivessem conseguido varrer autenticamente uma zona infestada de um inimigo aguerrido e numeroso que nunca tinha sido verdadeiramente incomodado por tropa.

O 5 de Agosto é dia funesto para o capitão de Binta. Desta vez pretende-se ir até Santancoto, no limite do sector. Até ao cruzamento para Guidage não se sentiram dificuldades. Encontrou-se uma ponte destruída mas o obstáculo foi vencido. JERO escreve: “Antes de Banhima a mata fechadíssima que ladeava a estrada foi interrompida por uma bolanha por onde o caminho seguia, sobrelevando-a, durante cerca de uns trezentos metros. Era surpreendentemente bonita esta língua de água, ora negra ora esverdeada, que interrompia a floresta e de onde emergiam lindíssimas flores aquáticas de cores delicadas. Apetecia parar ali e observar demoradamente, entre o verde limoso da bolanha, as elegantes pernaltas de linda plumagem que passeando, bicada aqui, bicada acolá, arqueando o pescoço longo, iam procurando alimento entre as nuvens de insectos que sobrevoavam aquela água estagnada onde se iam cozendo ramos, folhas mortas e outros tantos detritos da floresta". “A progressão é penosa, todos caminham cientes de que o contacto está próximo. Chega um pequeno grupo inimigo, há uma intensa troca de fogo, retoma-se o quadrado, com os homens bem separados uns dos outros, centenas de metros à frente voltou a avistar-se um grupo inimigo, procura-se o contacto.

Aqui está um acidente: “Apesar de recomendado ao soldado do morteiro para ter cuidado com as árvores de grande copa que ladeavam a estrada, o seu excesso de zelo e ardor combativo para cumprir rapidamente a ordem e dizimar o grupo inimigo, levou-o a disparar a morteirada com tal precipitação que a granada foi rebentar num ramo alto de uma árvore do lado esquerdo, crivando de estilhaços o lado direito onde se encontrava nosso capitão e alguns soldados”. O “capitão do quadrado” cai ferido, um jato de sangue saia do ombro esquerdo, foi prontamente socorrido, estancou-se a hemorragia e caminhou pelo seu próprio pé para a coluna-auto. O capitão continuou a dar ordens e centenas de metros à frente o inimigo emboscado atacou. A resposta é enérgica. Numa prosa contida, o cronista dos acontecimentos volta a registar: “Quando seguíamos na região de Santancoto, surgiu dos lados de Binta o helicóptero pedido para a evacuação do nosso capitão. Montada a segurança em círculo, o helicóptero desceu. O momento que se seguiu não mais será esquecido por todos aqueles que o viveram. Alguns daqueles homens de camuflado que poucos quilómetros atrás tinham zombado das balas inimigas, desprezando a morte com um sorriso altivo nos lábios, choravam agora como crianças despedindo-se do seu capitão. Não menos comovido, este, deixava correr livremente pelo seu rosto marcado pelo sofrimento, lágrimas de que um homem não se envergonha. Todos queriam pegar na maca para o transportar até ao helicóptero; um despia o casaco camuflado para lhe aconchegar melhor a cabeça na maca do helicóptero, outro dava-lhe o seu concentrado de frutos da ração de combate para comer pelo caminho; outro ainda quase que o obrigava a beber água do seu cantil. Todos lhe queriam tocar, apertar a mão, desejar-lhe as melhoras para que voltasse depressa”. O texto continua, tem toda a dignidade para um dia enfileirar, por mérito próprio, numa antologia que fale da solidariedade na guerra.

A actividade operacional não irá abrandar, aliás a malta da companhia recebeu com regozijo a notícia de que o “capitão do quadrado” conhecia melhoras, o estilhaço não tinha atingido o pulmão esquerdo. Fez-se uma nomadização em Guidage, sob o comando interino do alferes Foitinho efectuou-se um golpe de mão a Canicó, foram abatidos quatro inimigos e capturados dois canhangulos. Logo a seguir patrulharam as matas da região S. João e Sansancoto. Para o fim do mês efectuou-se uma operação de colaboração com a CCAV 487, de Farim. Mais guerrilheiros abatidos. Em 30 de Agosto, JERO rejubila: “25 dias depois do dia fatídico em que foi ferido com gravidade, voltou ao seio da 675 o nosso comandante de companhia sendo recebido por todos com a mais sincera alegria, todos o rodeavam dando-lhe mais uma vez a certeza de ter em cada subordinado um colaborador leal e um amigo que o seguem com dedicação e confiança totais. E partem todos para o Oio, numa operação em que colaboravam com mais duas companhias. O inimigo fugiu, deixando baixas. No balanço de Agosto, JERO escreve, abrindo espaço para acontecimentos de Setembro: “Logo após a operação do Oio, em 2 do corrente, dois grupos de combate chefiados pelo nosso capitão fazem um golpe de mão na região Faer, fazendo ao inimigo mais uma baixa confirmada e destruindo dez casas de mato. Dois dias depois voltou-se à região de Canicó, para acabar de destruir a tabanca e bater as matas vizinhas.

A CCAÇ 675 criou o seu jornal de parede “O Sabre”. O soldado A. Perfeito aproveita para saudar o regresso do “capitão do quadrado”: “Não quisemos deixar de usar estas colunas para lhe testemunhar toda a amizade e gratidão que lhe votamos; que estas palavras simples de um soldado não sejam vistas como adulação mas que através delas se conheça a amplitude de um sentimento que ninguém quer esquecer”.

Binta é atacada em 14 de Setembro, no ínterim a companhia andou em bolandas escoltando viaturas civis para Guidage, saídas em coluna auto até Santancoto, encontra-se uma tabanca que é destruída, etc. Foi um ataque de pouca monta, na retirada as forças do PAIGC incendiaram algumas moranças abandonadas a cerca de um quilómetro de Binta. Como já vem sendo hábito, a tropa reage e vai emboscar, ficará conhecida no diário como a emboscada na serração. E logo a seguir ocorre um episódio a que JERO vai chamar “a noite mais longa”, um patrulhamento a Simbor e Buborim, a moral da tropa está elevada, vão colaborar com a tropa de Bigene, lá vão pela noite escura, passou-se à formação do quadrado e aproximam-se da bolanha de Buborim. Um soldado precipita-se, dispara a arma e denuncia a presença da tropa. O contacto com o inimigo ocorre pouco depois: “Penetrámos numa zona de arbustos à esquerda de uma tabanca.

Registaram-se ainda alguns tiros isolados do inimigo e fez-se uma bazucada de fumos para a tabanca”. Gente de Farim apanhou algumas bicicletas que trouxe como ronco, estava vingada a visita, através de flagelação do dia 14, a Binta. Cada dia da semana tem a sua designação lá na companhia: Domingo é o dia da bandeira; segunda é a antevéspera do correio; terça é a véspera do correio; quarta é dia do correio; dia de São Comprimido; sexta tem estatuto de sexta-feira e sábado é véspera da bandeira e saída do correio. Está-se em pleno na época das chuvas, as ruas de Binta desapareceram sobre autênticos regatos. E assim se chegou ao mês de Outubro.

(Continua)
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 21 de Novembro de 2011 > Guiné 63/74 - P9071: Notas de leitura (304): Dois Anos de Guiné - Diário da Companhia de Caçadores 675, por Fur Mil Oliveira (1) (Mário Beja Santos)

Guiné 63/74 - P9093: O Nosso Blogue em Números (24): A propósito da sondagem dos 3 milhões: Para mim o blogue está bem e recomenda-se (Manuel Joaquim)



1. Resultados da nossa última sondagem, que decorreu entre 18 e 23 do corrente... Recorde-se aqui a questão que era colocada à votação dos nossos leitores, membros ou não da Tabanca Grande:

Sondagem: Tendo em conta as minhas expetativas iniciais e a minha experiência de utilização, hoje, com 3 milhões de visitas, o nosso blogue está...

 Havia 7 hipóteses de resposta, por esta ordem: 

1. Muito melhor; 2. Melhor; 3. Bom; 4. Nem bom nem mau; 5. Mau; 6. Pior; 7. Muito pior.

O total de respondentes foi de 161,  reveladora de uma boa adesão e participação dos nossos leitores, tendo em conta a experiência passada. Cada leitor só podia votar uma vez no mesmo computador (podendo embora mudar de opinião,  ao longo dos seis dias em que decorria a sondagem).

A leitura a fazer dos resultados é simples e dicotómica:

- Menos de 20% (n=31) têm uma opinião negativa sobre a forma e o conteúdo do blogue: está mau, pior ou muito pior;

- 77% (n=124) têm, em contrapartida, uma positiva do blogue: está bom, melhor ou muito melhor...

Agradecemos, muito sinceramente, a todos aqueles que quiseram associar-se ao nosso esforço para continuar a fazer mais e melhor, neste espaço que pretende ser de todos os camaradas e para todos os camaradas que estiveram no TO da Guiné, grosso modo entre 1961 e 1974... Agradecemos, muito em especial, aos que quiseram manifestar publicamente a sua opinião, dando a cara e fundamentando a sua opinião. Hoje publicamos mais um desses comentários, enviado pelo nosso camarada Manuel Joaquim.

2. Manuel Joaquim [,ex-Fur Mil de Armas Pesadas da CCAÇ 1419, Bissau, Bissorã e Mansabá, 1965/67]


“Tendo em conta as minhas expetativas iniciais (grandes e excitantes) e a minha experiência de utilização (experiência nula), hoje, com 3 milhões de visitas, o nosso blogue está BOM.”

Porquê o “Bom”? Ora, porque acho que mantém um nível bom, a raiar o muito bom, e não me sinto mais satisfeito do que quando aqui entrei. Estou muito satisfeito. Maior valorização implicaria da minha parte conhecer melhor as condições da sua realização e, principalmente, perceber o que poderia melhorar tendo em atenção o universo dos seus membros e a média da sua satisfação global.


Desejo que possa haver uma melhor organização do blogue mas sobre este assunto não me pronuncio porque ... não sei o que dizer, percebo pouco desta matéria. Estou muito limitado na área de informática para opinar sobre tal. 

Quanto ao que é publicado ou que pode ser ou não publicado, não quero entrar na expressão dos meus estados de alma. Tanto aceito que tais publicações se venham a limitar a relatos específicos de ações de combate, ou similares, como aceito (no caso, prefiro) que o critério de publicação se alargue à vivência global dos participantes, tanto passada como presente. Para mim, campo aberto! 

Somos membros de um grupo, tendo como base termos sido combatentes numa guerra. A tendência natural, num grupo, é tentar conhecer a personalidade de cada um dos seus membros, independentemente de nos sentirmos mais ou menos próximos de cada um.

Sendo assim, só uma total liberdade de expressão e de opinião permite que nos possamos conhecer melhor. É óbvio, diria obrigatório, que ofensas de caráter estão fora deste meu conceito de participação. Neste caso, sim, deverá existir impedimento. De resto, quem sou eu (quem somos nós) para julgar alguém que não tem a minha verdade, que viu (vê) as coisas de modo diferente, que não tem o mesmo sentido que eu tenho dos meus valores de comportamento pessoal, social ou político? 

Na natureza, uma das bases da sua conservação é a sua diversidade e eu penso que o mesmo se aplica ao comportamento humano. Como disse o nosso camarigo Rui Silva (P9055) isto não deve ser "amen e sim senhor». A acontecer tal, este blogue daria o “berro” dentro de algum tempo (pouco?) e deixaria de ter o grande valor memorialista que atualmente tem. 

O que é que posso mais sugerir? Podemos tentar não alargar o âmbito dos temas dos nossos posts, temas estes que devem ter como raiz a nossa vivência de combatentes. E mais uma coisa , para mim muito importante, que haja respeito mútuo. Respeito ideológico, respeito social (somos todos iguais), respeito pelas capacidades de expressão de cada um (quais erros de ortografia ou de gramática, qual quê, aqui não interessam nada!) e respeito pela “verdade de cada um”. 

Respeito não é concordância. Discutam-se as divergências, as opiniões, mas haja elevação e alguma humildade nessa discussão. Respeitemo-nos, a começar por nós próprios.

Eu, por mim, respeito todas as opiniões, concorde ou não com elas, com as que me emocionam ou com as que me irritam. E respeito quem as emite. Seja “patriota” ou não, tenha sido combatente heróico ou simplesmente cumpridor dum mínimo eticamente exigido ou seja do tipo de “anda lá tu, que a minha mãe não me criou para isto”. Seja (tenha sido) defensor do regime político de então ou seu adversário, veja a “guerra ganha” ou a “guerra perdida” ou ache que ninguém ganhou nada, todos perderam (ou ganharam?).

Voltando ao inquérito. O que é que está bem ou não?

Apetece-me dizer que o blogue se mantenha como está. Para mim “está bem e recomenda-se”. Mas, para não dizerem que não tenho ideias (!), vou ter a coragem de causar desagrado a alguns camarigos. É só isto (só?!): que se deixe de fazer edição de posts de aniversário. 

Eu explico com o meu próprio comportamento, pois não encontrarão aí qualquer comentário meu, com exceção de um dedicado ao Luís Graça, o qual de certo modo era uma maneira de dar os parabéns à Tabanca, isto é, a todos os seus membros na pessoa do seu fundador. 

Poupava-se espaço, aligeirava-se a consulta do blogue, ouso dizer que se acabava com comparações idiotas de quem tem mais votos de parabéns. No blogue somos todos iguais e todos os seus membros são meus amigos, mesmo que não os conheça. Digo, para oficialmente saudar no blogue um seu membro teria depois de o fazer com todos, no respetivo aniversário! Não acho razoável. 

Desculpem mas acho que seria suficiente a publicação, como já se faz, da data de aniversário na margem esquerda da página e, então, cada um de nós (temos uma listagem) enviaria a mensagem a quem quisesse e nos termos que achasse melhores.

Desculpem este parlapié sem qualquer valor para fazer subir a cotação deste grande centro de convívio memorialista, de que tanto gosto. Acabo repetindo o que já aqui disse, há tempos: preciso de todos vós, velhos combatentes membros deste blogue, nele escrevendo ou, simplesmente, o lendo. Gosto das opiniões duns, gosto assim assim ou não gosto das de outros, algumas emocionam-me, outras passam-me ao lado e outras até me revoltam as “tripas”. 

Pessoalmente conheço poucos mas são-me todos queridos, uns mais que outros como é natural. E não desejo mais do que saber que estão vivos e ter o prazer de vos sentir “vivos” participando neste blogue.

Um abraço e um “muito obrigado” a todos

Manuel Joaquim
23/11/2011
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Nota do editor:

Último poste da série > 22 de Novembro de 2011 > Guiné 63/74 - P9078: O nosso blogue em números (23): Mensagens dos nossos camaradas Carlos Filipe, Fernando Barata e José Barros

quinta-feira, 24 de novembro de 2011

Guiné 63/74 - P9092: (Ex)citações (158): Homenagem aos nossos mortos não tem data! É quando um homem quiser! (António Matos)


1. O nosso camarada António Matos, ex-Alf Mil Minas e Armadilhas da CCAÇ 2790, Bula, 1970/72, enviou-nos a seguinte mensagem:

Homenagem aos nossos mortos não tem data! É quando um homem quiser!

Camaradas,

Para lá duma forte comoção que me invadiu o coração em dia de greve geral a qual me permitiu dedicar o tempo "à limpeza" de muito lixo acumulado no computador, descubro inadvertidamente este texto nos meus arquivos que me sobressaltou pela saudade, pela dor e pela juventude passada...

Fiquei confuso sobre a oportunidade de uma re-publicação mas isso deixo ao critério dos editores e o que decidirem está bem decidido.

Dizia eu em 2008 :

Cá volto eu outra vez nestes primeiros contactos de Tabanca, recordando outras tabancas lá por terras de poucas saudades, onde deixei muita da pureza da minha meninice, alguns dos amigos que fiz desde os Arrifes em Ponta Delgada e que tinha jurado trazê-los de volta ao colo das suas Mães, aos abraços enternecedores dos Pais, aos beijos das namoradas...

Tal não se concretizou e hoje, ao ver os rostos daqueles que eram meninos, confrange-me o sofrimento incalculável de quem tenha recebido um telegrama a anunciar uma morte por actos de bravura em defesa da Pátria !!!!

Caramba, muitos dos nossos camaradas morreram tão simplesmente por serem os homens errados, no sítio errado à hora errada!

Muitos de nós não tinham tido sequer tempo de interiorizarem o quanto essa Pátria ( que hoje os esquece em favor de outros que seguem para missões de meia dúzia de meses e a troco de belas fortunas ), lhes pediu, de borla, para que fossem heróis na medida das suas forças!

Caramba, eu vi miúdos a chorar na caserna com saudades dos seus familiares !

Caramba, eu vi miúdos a baterem-se com uma heroicidade contagiante pela defesa do camarada em apuros que lhe estava ao lado!

Caramba, eu vi miúdos a fazerem frente a um contingente de guerrilheiros liderados pelo Nino Vieira!

Caramba, eu vi miúdos a caírem nas minas e a ficarem decepados!

Caramba, meus caros, eu vejo, todos vemos, o abandono a que esta Pátria nos relegou!

Não, não faço parte de qualquer associação de apoio aos ex-combatentes; nunca me disponibilizei a engordar as filas de manifestantes que se propõem zelar pelos interesses de todos nós; nunca expus publicamente o meu desencanto com os sucessivos (des)governantes que têm passado pelos corredores dos Passos Perdidos numa atitude de vil desrespeito por esta geração que é a minha; mas agora, do alto da palhota da minha Tabanca, tento compreender o meu tempo e as novas gerações onde já pontuam os meus filhos, os meus netos, e os filhos e os netos dos meus camaradas de armas.

Os tempos deram uma grande cambalhota e os valores alteraram a sua ordem hierárquica.

Hoje pertencemos a uma geração que sendo sobrevivente a uma guerra, assiste à transformação do paradigma da vida.

Hoje há filhos a morrer antes dos pais pelas mais diversas razões: droga, uso indevido de armas, acidentes viários, gangsterismo, AVC's, stress, incertezas profissionais, etc., etc., etc.

Duvido que esta juventude tenha alguma simpatia pelo conhecimento desta aventura africana na qual os seus pais se envolveram.

Têm tanto com que se preocupar...

Enfim, em dia de todos os mortos, rendo-me à memória de todos aqueles que partiram dirigindo às respectivas famílias o meu sentido silêncio já que as palavras teimam em não sair pelo nó que se forma na garganta.

Voltarei mais tarde para me dedicar também às ocasiões que nos faziam rir.

E foram muitas...

Abraços,
António Matos
Alf Mil Minas e Armadilhas da CCAÇ 2790
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Notas de M.R.:

Vd. último poste desta série em:

15 de Novembro de 2011 > Guiné 63/74 - P9046: (Ex)citações (156): A recensão a Pami Na Dondo foi feita não ao livro mas à pessoa do autor (Mário Fitas)