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terça-feira, 24 de outubro de 2017

Guiné 61/74 - P17899: In Memoriam (307): Ivo da Silva Correia (Fajonquito, c. 1974 - Bissau, 21/10/2017)... Era filho de um camarada nosso, da CCAÇ 3549 (Fajonquito, 1972/74). Morreu sem conhecer o pai português... É tarde, mas ainda vamos a tempo de lançar uma petição pública para que estes pobres "filhos do vento" vejam reconhecido o seu direito a serem também portugueses, além de guineenses... O "Ibu" passa a ser, a título póstumo, o membro nº 758 da nossa Tabanca Grande!





Guiné > Região de Bafatá > Setor de Contuboel > Fajonquito > Ivo da Silva Correia (Fajonquito, c. 1974 - Bissau, 2017)

Fotos: © Cherno Baldé (2017). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Vítima de doença prolongada, faleceu  no passado dia 21 do corrente,  "o meu irmão Ibu (vulgo Ibulel)",  escreveu Aliu Baldé, na sua página do Facebook.

O Ivo da Silva Correia era natural de Fajonquito, nascido por volta de  1974 [ou já 1975],  segundo informação do nosso amigo Cherno Baldé,  que acrescenta mais o seguinte na sua página do Facebook:

(i) era filho de um soldado português da Companhia dos Deixós Poisar (CCAC 3549) que nunca o reconheceu; 

(ii) sem o devido enquadramento e a ajuda necessária, não conseguiu avançar por aí além na escola e, apesar dos apoios e solidariedade dispensada pela comunidade e colegas da sua Tabanca, sempre que era necessário, levou uma vida errática e bastante difícil, que acabou por o vitimar;

(iii) era um jovem afável e de bom trato;

(iv) foi sepultado no cemitério de Bissau. 

E termina o nosso amigo e irmãozinho, o "menino e moço" de Fajonquito que tem mais de 150 (!) referências no nosso blogue: "Fajonquito e os Deixós-Poisar perderam um dos seus filhos. Que a terra lhe seja leve e que, finalmente, encontre a paz de espírito que não teve em vida.  Amén".


2. Comentários de camaradas nossos na página do Cherno Baldé [foto à direita]:


(i) Hélder Valério de Sousa 

Lamentável que o desfecho tenha sido esse. Sabe-se que a Lei da Vida é assim mesmo,  mas, pelo relato do Aliu [Baldé] que o Cherno nos faculta, foi uma vida bem difícil e que, felizmente, contou com alguma solidariedade. Que possa descansar em paz.



Na minha aldeia [, Brunhoso, concelho de Mogadouro,] conheci alguns filhos de pai incógnito mais velhos do que eu, que embora conhecendo o seu pai, toda a aldeia sabia quem era, aceitavam esse facto como uma fatalidade natural.

Tal como nas aldeias também nas cidades ainda havia nesse tempo muitos filhos sem pai reconhecido. Por toda essa predisposição social, a acrescentar aos preconceitos raciais que existiam em todas as classes sociais e económicas, acho que não devo culpar esse soldado que abandonou o filho embora seja um acto condenável. Lamento a sorte do Ibu [Ivo]  que,  sem o apoio do pai branco, não conseguiu o equilíbrio que merecia. Que descanse em paz.


3. Comentário de LG:

O Ivo era um jovem conhecido do nosso Cherno Baldé, um "filho do vento" (, não gosto da expressão, porque é eufemística,  uma figura de estilo que usamos, de maneira cínica, que nada tem de romântcio ou poético, para escamotear ou disfarçar uma realidade cruel...), tal como a Cadija Seidi, e a Kumba Seidi, também nascidas por volta de 1973/74, em Fajonquito, filhas de soldados portugueses.

Já em 2013, o Cherno Baldé (*) tinha-nos dado notícias da existência do Ivo;

(...) "Filho de Sona Baldé, conhecida entre os soldados por Sonia, filha de Sadjo Baldé, antigo cozinheiro da tropa, nasceu em Fajonquito em 1975. O pai, de nome C..., não chegou a conhecer o filho, com o fim da comissão a Companhia de Caçadores n.º 3549, 'Deixs Poisar', comandada pelo Capitão Quadro Especial de Oficiais José Eduardo Marques Patrocínio e, posteriormente, pelo Capitão Miliciano Graduado de Infantaria Manuel Mendes São Pedro, deixou Fajonquito em junho de 1974, o pai nunca mais deu sinais de vida. 

"[ O Ivo] não está desesperado da vida, simplesmente gostaria de conhecer a cara do pai, pois dizem que são muito parecidos. A única referência que tinha do pai era uma fotografia que entretanto se deteriorou com o tempo." (...)


Todos estes homens e mulheres carregam histórias de amargura, discriminação racial, exclusão social, pobreza... São, brutalmente falando,  "restos"... do nosso império! (**).

Camaradas e amigos, este é assunto de que temos falado aqui no blogue, com alguma frequência...  Aliás, temos falado muito e feito pouco... Há um mês atrás, em 14 de setembro último, chegou-nos um pedido de publicação. Ou melhor: uma sugestão de texto para uma eventual petição à Assembleia da República...

Precisamos de alguém, com formação jurídica, de preferência, que agarre esta causa e que trabalhe melhor o texto... que podia ter o seguinte teor:

(...) "Durante o período em que durou a guerra colonial ou guerra do Ultramar, para uns, guerras da libertação nacional (1961-1975), para outros, estiveram ao serviço do Estado português, em Angola, Moçambique e Guiné, quase um milhão de homens portugueses (, sem esquecer os oriundos dos territórios ultramarinos, Cabo Verde, Guiné, São Tomé e Príncipe, Angola, Moçambique, Macau e até Timor). Muitos destes militares mantiveram, durante o conflito, relações com mulheres locais, que resultaram em filhos.

Os filhos que os militares portugueses deixaram para trás,  vêm por este meio solicitar que o Estado Português lhes reconheça o seu legítimo direito à nacionalidade portuguesa, uma vez que são filhos de pais portugueses que, na maior parte dos casos, nunca irão ter a oportunidade de vir a conhecer.

Souberam das suas origens através das suas mães e familiares. E têm em comum toda uma vida de ostracismo e estigmatização nos seus países de origem, sobretudo a seguir à independência, onde foram cruelmente chamados de “restos de tuga” ou “sobras do colono”, e sofrem até hoje com o desconhecimento de metade da sua história. 

Conceder-lhes a nacionalidade que é dos seus pais desconhecidos,  seria uma forma de fechar um ciclo da História de Portugal." (...)

O texto pode ser melhorado, este é apenas um rascunho.

O sítio Petição Pública é o mais usado para estes fins e torna o processo de criação e divulgação da "causa" muito mais fácil. Depois de angariada alguma massa crítica é que se poderia formalizar o processo no sítio  da Assembleia República. Ver aqui o endereço na Net: Petição Pública - Serviço gratuito de petições online.

Para já, temos o dever (moral) de homenagear o Ivo e, na sua pessoa, todos os  demais filhos e filhas de militares  portugueses, que continuam a lutar, através da sua Associação, pelo direito à nacionalidade portuguesa.

O Ivo da Silva Correia (c. 1974-2017) (***)  passa a  ser, a título póstumo e simbólico,  membro da nossa Tabanca Grande. O seu lugar será o nº 758. Fica connosco, à sombra do nosso sagrado poilão, que nos une a todos, amigos e camaradas Guiné, vivos e mortos.  (****).

Obrigado, Cherno Baldé, por nos teres dado a esta notícia, embora triste. Sem ti, nunca ficaríam a saber que, afinal, estamos todos mais pobres, Fajonquito e a família da CCAÇ 3549.
_____________

Notas do editor:


(**) Vd. poste de 14 de julho de 2013 > Guiné 63/74 - P11838: Os filhos do vento (13): Em busca do pai tuga: um reportagem, 3 vídeos, 19 histórias, 19 rostos, 19 nomes à procura do apelido paterno... Hoje no "Público", domingo, dia 14. A não perder.

(***) Último poste da série >  19 de outubro de 2017 > Guiné 61/74 - P17883: In Memoriam (306): Cadi Candé (c.1927-2017), arquétipo da mãe africana, exemplo de humildade, abnegação e coragem... Homenagem à mãe do nosso amigo e irmãozinho Cherno Baldé (Bissau)

(****) Vd. poste de 20 de outubro de 2017 > Guiné 61/74 - P17888: Tabanca Grande (450): António Ramalho, ex-fur mil at cav, CCAV 2639 (Binar, Bula e Capunga, 1969/71), natural da Vila de Fernando, Elvas, e novo membro da Tabanca Grande, com o nº 757... Faz parte da Associação de Alunos da Universidade Sénior de Vila Franca de Xira.