Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
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quinta-feira, 2 de outubro de 2025
Guiné 61/74 - P27276: Notas de leitura (1845): "O capelão militar na guerra colonial", de Bártolo Paiva Pereira, capelão, major ref - Parte III: "A minha Pátria é o Hélder" (Luís Graça)
sexta-feira, 4 de julho de 2025
Guiné 61/74 - P26983: Seis jovens lourinhanenses mortos no CTIG (Jaime Silva / Luís Graça) (1): José António Canoa Nogueira (1942-1965), sold ap mort, Pel Mort 942 / BCAÇ 619 (Catió, 1964/1966) - Parte III: notícia do funeral no jornal da terra, "Alvorada" (de 23/5/1965)

Fonte: Alvorada. (Lourinhã). 23 de maio de 1965
I. Continuamos a reproduzir, com a devida vénia, alguns excertos livro do Jaime Bonifácio Marques da Silva, "Não esquecemos os jovens militares do concelho da Lourinhã mortos na guerra colonial" (Lourinhã: Câmara Municipal de Lourinhã, 2025, 235 pp., ISBN: 978-989-95787-9-1), pp. 165/167
(...) 4. Notas à margem do processo: notícias e testemunhos
(...) “Quanto ao teu primo José António Canoa Nogueira, natural de Lourinhã, soldado do pelotão de morteiros 942, CCAÇ 619, com sede em Catió, que tinha por alcunha o 'Bombarral' e que era muito amigo de um soldado do meu pelotão, o João Fernandes Almeida, de alcunha o 'Lourinhã', não morreu em Ganjola, mas sim, em combate, numa das operações para instalar as NT em Cufar, da qual também fiz parte (CCAÇ 617) numa altura em que, estando a municiar um morteiro, saiu do abrigo para ir buscar granadas, foi atingido, na cabeça, por estilhaços de granada do IN. Ainda foi evacuado por helicóptero, mas infelizmente, não sobreviveu aos ferimentos”. (...)
Na verdade, este testemunho do alferes Sacôto coincide com o teor da participação do comandante de companhia (a CCAÇ 619) sobre o local e causas da morte do soldado Canoa.
(...) “Depois de transportados da Guiné para a metrópole a expensas dos seus companheiros de companhia que lhe votavam particular estima e amizade, os restos mortais do soldado José António Canoa Nogueira repousam finalmente no cemitério da sua Terra Natal.
O funeral, realizado no segundo domingo do corrente, constituiu uma homenagem pública à memória daquele de cuja presença e convívio a morte irremediavelmente nos separou, e um testemunho de apreço pelo sacrifício da sua vida. Nele se incorporaram, além da multidão anónima e inumerável, o senhor Presidente do Concelho, outras autoridades civis e militares e os bombeiros voluntários.
À chegada do autofúnebre militar, com a urna, os clarins dos Soldados da Paz tocaram a silêncio. E o préstito atravessou a Vila, sob uma impressionante atmosfera de recolhimento e dor.
Antes da urna ser depositada no jazigo, os Bombeiros tocaram em continência, num último adeus e derradeiro tributo de homenagem ao soldado e Jovem Lourinhanense”. (Poste P6509, de 1 de junho de 2010).
Luís Graça, no seu blogue, a propósito da notícia da morte deste soldado, escreve o seu testemunho acerca do ambiente de dor, de luto, emoção, medo e estupefação por si experienciados:
“(…) o funeral de Nogueira, 4 meses depois (em maio de 1965), foi uma impressionante manifestação de dor. Lembro-me da urna, selada, em chumbo. Dos soldados fardados e aprumados, vindos de Mafra, da Escola Prática de Infantaria. Da salva de tiros. Do luto carregado. Da emoção no ar. De uma família destroçada. De uma comunidade comovida. Dos boatos. “Se calhar o caixão vem cheio de pedras”. Da estupefação e do medo dos mancebos que estavam na lista para a tropa, como eu. Lembro-me sobretudo do silêncio do cemitério. Do calor, abrasador, do dia.” (...)
Também sobre a questão da solidariedade dos camaradas de companhia, que se cotisavam para enviar os restos mortais dos colegas para a metrópole, num tempo em que o Estado não assegurava a trasladação dos corpos, Luís Graça escreve:
(...) “Um facto desconhecido e insólito para mim, mas ao tempo revelador da grande solidariedade entre os camaradas de guerra, na época os restos mortais dos nossos soldados não eram embarcados para a Metrópole a expensas do Estado. No caso do Nogueira, foram os seus camaradas (do pelotão de morteiros e possivelmente também do batalhão) que se cotizaram para pagar, do seu bolso, o transporte via marítima da urna… (E, se calhar, a própria urna).
Creio que custava, o transporte por via marítima, qualquer coisa como 11 contos (equivalente hoje a mais de 5 mil euros…) o que era muito dinheiro para a época. " (...)
“(…) não sei se foi depois disso (da notícia do funeral e dos meus comentários) que o diretor, padre António Escudeiro, recebeu um ofício do Ministério do Interior a perguntar porque é que o jornal já não ia à censura há mais de um ano. Duas linhas, secas, burocráticas, impessoais. Em baixo, ocupando mais de metade da folha, a assinatura, em letra garrafal, mas arrogante e intimidatória que eu jamais vi em toda a minha vida. (Se o fascismo alguma vez existiu na minha Terra, na nossa Terra, então essa assinatura do censor-mor, ou de alguém dos seus esbirros era fascismo, puro e duro)”. (...)
2. Um domingo do mato | por José António Canoa Nogueira
Aqui, Ganjolá, Guiné, 10-1-1965
Mesmo no sul da Guiné, pequeno destacamento militar presta continência à Bandeira Verde-Rubra que sobre o mastro fica brilhando ao sol. E que linda que é a nossa bandeira; e é tão alegre, tão garrida, só olhá-la nos faz sentir alegria e também emoção; alegria de sermos portugueses e emoção por estarmos cá longe para a defender. Embora assim perdida no mato, a bandeira, brilhando, afirma que aqui também é Portugal.
Em volta, meia dúzia de barracas verdes, o nosso aquartelamento, a única nota de civilização nesta imensa planície.
Aqui não há escolas e as igrejas não têm paredes; o teto é o céu. Em toda a parte se reza e tudo nos incita à oração. Deus está em toda a parte e ouve-nos.
Hoje é domingo, dia de descanso, não se trabalha, mas distracções também não há. Alguns vão à pesca ou à caça; outros, deitados debaixo das enormes árvores, dormem e pensam nas suas terras e famílias distantes, mas pertinho do coração.
Dois soldados vão todos os dias à caça; por isso, fome não há. Temos carne com abundância, mas falta tanta coisa!...
Todos se servem. A refeição é pouco variada: apenas carne assada e pão. O vinho também é pouco, mas dividido irmãmente dá para todos; que bem que sabe uma pinguita com este almoço!...
Bebi-se mais mas não há, paciência… O improvisado cozinheiro faz enormes quantidades de café. Todos enchemos os copos de alumínio e bebemos alegremente. Acaba a refeição; por fim, alguns macacos, meio domesticados, que por aqui andam, aproximam-se e reclamam a sua parte.
É assim um domingo no mato. Depois de explanar esta ideia, termino. Despeço-me com o mais ardente desejo de a todos vós abraçar brevemente, fazendo preces ao Senhor para que tenhais saúde e boa sorte.
José António Canoa Nogueira.
Soldado nº 2955/63
SPM 2058.
Lourinhã > Cemitério local > 6 de maio de 2012 > Lápide funerária referente ao José António Canoa Nogueira (1942-1965), o primeiro militar lourinhanense a morrer em terras da Guiné, em 23/1/1965... Era sold ap mort Pel Mort 942 / BCAÇ 619 (Catió, 1964/66).
Os seus restos mortais estão em jazigo de família, não no talhão criado entretanto para os antigos combatentes (I Guerra Mnudial e Guerra Colonial).
Fotos (e legenda) : © Luís Graça (2012). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]
Nota do editor LG:
(*) Postes anteriores da série > 26 de junho de 2025 > Guiné 61/74 - P26957: Seis jovens lourinhanenses mortos no CTIG (Jaime Silva / Luís Graça) (1): José António Canoa Nogueira (1942-1965), sold ap mort, Pel Mort 942 / BCAÇ 619 (Catió, 1964/1966) - Parte I
30 de junho de 2025 > Guiné 61/74 - P26968: Seis jovens lourinhanenses mortos no CTIG (Jaime Silva / Luís Graça) (1): José António Canoa Nogueira (1942- 1965) (sold ap mort, Pel Mort 942 / BCAÇ 619, Catió, 1964/ 1966) - Parte II: o Manuel Luís Lomba estava lá, em Cufar, em 23 de janeiro de 1965
quarta-feira, 1 de novembro de 2023
Guiné 61/74 - P24812: Efemérides (409): 1 de novembro, dia de lembrar e homenagear os nossos queridos mortos
Guiné-Bissau > Bissau > Cemitério > Talhão da Liga dos Combatentes > 1 de novembro de 2017 > "Conforme convite da nossa Embaixada, estive presente na homenagem aos nossos mortos. As campas estavam pintadas e arranjadas. Foram benzidas por um padre. Estavam os nossos militares da cooperação militar, adido militar e funcionários da nossa Embaixada, o representante da Liga dos Antigos Combatentes, assim como alguns empresários portugueses que cá exercem a sua actividade." (*)
- António Branquinho (1947-2023)
- António Cunha (Tony) (c.1950-c. 2022) (#)
- António Eduardo Ferreira (1950-2023)
- Armando Tavares da Silva (1939-2023)
- Carlos Alberto Cruz (1941-2023)
- Carronda Rodrigues (1948-2023)
- Cunha Ribeiro (1936-2023)
- Celestino Bandeira (1946-2021)
- Fernando Costa (1951-2018)(#)
- Fernando Magro (1936-2023)
- José António Paradela (1937-2023)
- José Carlos Suleimane Baldé (c.1951-2022)(#)
- José Marcelino Sousa (1949-2023)
- Manuel Gonçalves (Nela (1946-2019 (#)
____________
(*) Último poste da série > 2 de novembro de 2017 > Guiné 61//74 - P17925: Bom dia, desde Bissau (Patrício Ribeiro) (4): Homenagem, por iniciativa da Embaixada de Portugal, aos nossos mortos, no cemitério de Bissau, ontem, dia 1 de novembro
segunda-feira, 20 de junho de 2022
Guiné 61/74 - P23371: In Memoriam (438): Mário de Oliveira (1937-2022), ex-alf mil capelão, CCS/BCAÇ 1912 (Mansoa, 1967/68), repousa desde 26/2/2022 em campa rasa, a nº 72, do cemitério da Lixa, Felgueiras
"A urna manterse-á sempre fechada, até ser depositada numa campa rasa, em terreno comum destinado aos Sem-jazigo, do cemitério de Macieira da Lixa, a terra que, desde a década de setenta do Século XX, inopinadamente, se tornou / revelou um Lugar Teológico de Deus, o de Jesus, que gosta de Política, não de Religião e, nessa mesma qualidade, se colou para sempre ao meu nome de homem presbítero da Igreja do Porto." (...) (**)
(*) Vd. poste de 25 de fevereiro de 2022 > Guiné 61/74 - P23031: In Memoriam (430): Padre Mário de Oliveira, de 84 anos, ex-alf mil capelão, CCS / BCAÇ 1912 (Mansoa, 1967/68): o funeral realiza-se amanhã, sábado, dia 26, pelas 16h00, no Barracão da Cultura, Macieira da Lixa, sendo sepultado no cemtiério local, em campa rasa, de acordo com o seu testamento de 2009
24 de fevereiro de 2022 > Guiné 61/74 - P23024: In Memoriam (430): Padre Mário de Oliveira (1939-2022), ex-alf mil capelão, CCS/BCAÇ 1912 (Mansoa, 1967/68)
domingo, 17 de outubro de 2021
Guiné 61/74 - P22638: Memória dos lugares (427): Coimbra, cemitério da Conchada, onde repousam os restos mortais do alf mil António Maldonado, morto em combate em Porto Gole, em 4/3/1966 (João Crisóstomo)
1. Mensagem, com data de 23 de setembro último, enviada pelo João Crisóstomo, o nosso camarada luso-americano que está de visita à sua Pátria, tendo logo nos primeiros dias ido a Coimbra, a casa de uns amigos, com quem está ligado "por mor de Timor"... Aproveitou para ir ao Bussaco e ao cemitério da Conchada, em Coimbra, à procura do túmulo do nosso camarada António Maldonado, morto em combate em Porto Gole, na Guiné, em 4/3/1966, e que era natural de Coimbra.
Pelo que depreendo, o Rosales esteve em Porto Gole até 1964. Porto Gole era um dos destacamentos a que pertencia ao (ou estava a cargo do) Enxalé, embora os comandantes destes destacamentos fossem de outros unidades ou em rendição individual.
Uma semana ou duas depois do Maldonado chegar, o destacamento de Porto Gole foi alvo dum ataque violento por parte do IN e o infeliz Maldonado foi atingido por uma granada de morteiro 82 que lhe causou morte quase imediata.
Foi um encontro duro e emocionante para mim. Na pessoa dele eu revia e lembrava o Mano, o Abna na Onça ,o Queba Soncó, o Açoriano e tantos outros que acabaram a sua vida nas terras da Guiné e outros que voltaram mas que também da lei da morte já se libertaram: os Zagalos, os Pires, os Rosales, os Eduardos…
Saí do cemitério em busca de umas flores; e foi pensando em todos aqueles nossos camaradas para quem a memória dos nossos falecidos é algo sagrado que deixei este pequeno ramo de flores na porta/entrada do jazigo onde se encontram os restos mortais do Maldonado (Fotos nºs 5 e 6). Naquele momento o Maldonado não era ele só, mas todos aqueles irmãos nossos , mortos em qualquer situação, incluindo os nossos camaradas nativos que foram vítimas de represálias, depois de já termos deixado terras da Guiné; e por eles todos "elevei o meu pensamento”, independentemente da sua raça, religião e posição ideológica.
Foto nº 6 > Coimbra > Cemitério da Conchada > 22 de setembro de 2021 > Ramo de flores depositado à pporta do jazigo da família do Maldonado: "Ao Maldonad com saudades. Os teus amigos e camaradas da Guiné, 22/9/2021".
Voltei , mas o resto do dia foi um contínuo reviver. (*)
João Crisóstomo
Guiné > Bissau > Praça do Império > Novembro de 1965 > O Jorge Rosales mais o Maldonado, junto ao monumento "Ao Esforço da Raça" ...
De seu nome completo, António Aníbal Maia de Carvalho Maldonado, morreu no dia 4/3/1966. Natural da Sé Nova, Coimbra, foi inumado no cemitério da Conchada. Pertenceu à 1ª CCAÇ / BCAÇ 697 (Fá Mandinga, 1964/66). (**)
Foto (e legenda): © Jorge Rosales (2010).. Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]
(*) Último poste da série > 7 de setembro de 2021 > Guiné 61/74 - P22520: Memória dos lugares (426): Paço, União das Freguesias de São Bartolomeu dos Galegos e Moledo, Lourinhã, inaugura o seu monumento aos antigos combatentes (46 no total estiveram presentes nos vários teatros de operações do séc. XX, da I Grande Guerra à Guerra do Ultramar)
(**) Vd. poste de 22 de fevereiro de 2019 > uiné 61/74 - P19517: In Memoriam (340): Até sempre, 'comandante' Jorge Rosales (1939-2019)
segunda-feira, 8 de fevereiro de 2021
Guiné 61/74 - P21868: Memórias cruzadas da Região de Tombali: Factos relativos a três baixas da CCAÇ 1427 na mata de Catesse, em 20/3/1966: o caso do corpo não recuperado do Albino Martins (Jorge Araújo)

Foto 1 > Região de Tombali > Cabedú - CCAÇ 1427 (1965-1967) – Vista aérea do Aquartelamento e pista de aviação. Foto do álbum de Manuel Janes "O Violas" - P17336, com a devida vénia.
Foto 2 > Guiné > Região de Tombali > Cabedú - CCAÇ 1427 (1965-1967) – Vista aérea do Aquartelamento. Foto do álbum de Manuel Janes "O Violas", com a devida vénia.
Foto 3 > Guiné > Região de Tombali > Cabedú > O contingente da CCAÇ 1427 (1965-1967) - Foto do álbum de Manuel Janes "O Violas", com a devida vénia.

Sei que já transcorreu muito tempo sobre os milhares de ocorrências que, independentemente da época, do lugar e do contexto, influenciaram as crenças, as expectativas, os comportamentos e os desempenhos de todos os actores, de ambos os lados, daquela a que chamaram «Guerra do Ultramar» ou «Guerra Colonial», de que a do «CTIGuiné» não é excepção. Sei que sobre todas elas nada podemos fazer para as alterar, pois são factos da História, de um passado cada vez mais longínquo.
Sei que alguns dos registos que constam nas narrativas históricas, quer de fonte Oficial ou de outras, deverão continuar a merecer a nossa atenção no sentido de as melhorar ou, se for caso disso, de lhes adicionarmos o que está menos explícito ou, simplesmente, omisso.
Sei que a investigação historiográfica é, intrinsecamente, um processo em aberto, e em movimento, à qual é sempre possível juntar-lhe mais uma "peça do puzzle", uma linha ou um detalhe.
Dito isto, este meu presente contributo emerge do quadro teórico supra, onde o objecto de investigação (em título) nasceu do interesse pessoal em encontrar respostas (razões) ao facto de, durante os «Doze anos da Guerra», a literatura nos dar a conhecer casos de "camaradas mortos em campanha", onde os seus "corpos não foram recuperados" (ou "resgatados"), omitindo os fundamentos para que tal acontecesse, ou seja: o porquê (ou porquês)?
O exemplo do camarada Albino Teixeira Martins, da CCAÇ 1427, que hoje decidi partilhar convosco no fórum, será o primeiro "caso" de um conjunto de outros já identificados, na certeza de que aquilo que não foi possível saber/encontrar poderá muito bem ser de maior relevância.
2. – SUBSÍDIO HISTÓRICO DA COMPANHIA DE CAÇADORES 1427
= BISSAU E CABEDÚ (1965-1967)
Mobilizada pelo Regimento de Infantaria 16 [RI16], de Évora, a Companhia de Caçadores 1427 [CCAÇ 1427], embarcou no Cais da Rocha do Conde de Óbidos, em Lisboa, a 16 de Agosto de 1965, 2.ª feira, a bordo do N/M «Niassa», sob o comando do Capitão de Infantaria Fernando António Pereira dos Santos, tendo chegado a Bissau a 24 do mesmo mês.
2.1 - SÍNTESE DA ACTIVIDADE OPERACIONAL DA CCAÇ 1427
Após a sua chegada à capital da província da Guiné, a Companhia Independente «CCAÇ 1427» ficou instalada na dependência do BCAÇ 1857 [06Ago65-03Mai67; do TCor Inf José Manuel Ferreira de Lemos] a fim de colaborar na segurança e protecção das instalações e das populações e efectuar, simultaneamente, a instrução de aperfeiçoamento operacional (IAO).
De 25Set65 a 11Out65, rendeu por troca a CCAÇ 555 [03Nov63-28Out65; do Cap Inf António José Brites Leitão Rito], assumindo então a responsabilidade do Subsector de Cabedú, ficando integrada no dispositivo e manobra do BCAÇ 619 [15Jan64-09Fev66; do TCor Inf Narsélio Fernandes Matias] e depois do BCAÇ 1858 [24Ago65-03Mai67, do TCor Inf Manuel Ferreira Nobre Silva], tendo tomado parte em diversas operações realizadas naquela área.
Em 31Mar67, foi rendida no Subsector de Cabedú pela CART 1614 [18Nov66-18Ago68; do Cap Mil Art Luís João Ferreira Marques Jorge] e recolheu a Bissau, a fim de aguardar o embarque de regresso ao continente, o qual teve lugar a 16Abr67, a bordo do N/M «Uge».
Não tem História da Unidade (CECA; 7.º Vol; p. 347).
Ao sétimo mês da sua Comissão Ultramarina, a CCAÇ 1427 perde em combate, na mesma missão, três dos seus efectivos, ocorrência registada em 20Mar66, domingo.
Porque nada consta no 6.º Volume da CECA (Aspectos da Actividade Operacional), nem tampouco na História da Unidade, que não existe, partimos do óbito do Soldado Albino Teixeira Martins, natural de Cachopo, Tavira, localizado no 8.º Volume (mortos em campanha, p. 182), e que abaixo se reproduz, cujo "corpo não foi recuperado", para procedermos à competente investigação sobre esta ocorrência.

Segundo Tony Grilo, em comentário enviado do Canadá em Abril de 2009 – P4220, é referido que ele, quando chegou a Cabedú, no início de Julho de 1966, "estava lá a CCAÇ 1427, uma companhia velha [ia fazer onze meses], com bastante experiência, e com algumas operações no Cantanhez, onde numa delas tiveram 2 mortos [?] e vários feridos, um deles com uma bazucada na cabeça. Por sinal tiveram que deixar o corpo na mata e fugir, pois os turras caíram-lhes em cima".
Será que era desta ocorrência que se estava a referir, uma vez que ainda lá não tinha chegado?
Será que, porventura, quis associar as duas baixas acima ao facto de ter encontrado igual número de sepulturas no cemitério de Catió que, segundo ele, se reportam a dois militares da CCAÇ 1427, conforme se demonstra na imagem abaixo?
Região de Tombali > Catió > Cemitério de Catió > Duas sepulturas de militares pertencentes à CCAÇ 1427 (1965/67), segundo informação e foto do Tony Grilo – P4220, com a devida vénia.
Na Resenha da CECA, 8.º Volume, "mortos em campanha", pp 182/183, constam três mortos (óbitos) em combate da Companhia de Caçadores 1427, todos eles registados com data de 20 de Março de 1966, como consequência de uma operação realizada na "floresta de Catesse", conforme infografia abaixo, e que são:
- Albino Teixeira Martins (Soldado) – natural de Cachopo / Tavira: Corpo não recuperado
- Adolfo do Nascimento Piçarra (Soldado) – natural de Ferradosa / Alfândega da Fé: Corpo sepultado no cemitério de Catió;
- António Joaquim Carvalho (Soldado) – natural de Viana do Alentejo: Corpo sepultado no cemitério de Viana do Alentejo
Imagem de satélite da região de Tombali, com infografia da localização do Aquartelamento da CCAÇ 1427 (Cabedú) e da mata de Catesse, onde terá falecido o Albino Teixeira Martins, cujo corpo não foi recuperado.
3.1.3 - D(O) OUTRO LADO DO COMBATE > COMUNICADO ASSINADO PELO CMDT INÁCIO SOARES DA GAMA COM DATA DE 20-3-1966
Com a expectativa de podermos encerrar esta investigação de modo satisfatório, procedemos à consulta nos Arquivos de Amílcar Cabral (1924-1973), existentes na CasaComum, Fundação Mário Soares, de algo relacionado com a questão de partida.
Depois de algumas leituras documentais, aí encontrámos um comunicado manuscrito, assinado por Inácio Soares da Gama, datado de 20 de Março de 1966, domingo, e que, tudo leva a crer, deverá estar relacionado com o episódio supra.
No documento, manuscrito num português macarrónico, ainda assim foi possível retirar as seguintes ideias:
Comunicado
Tombali, 20-3-966
No dia 13-3-66 [lapso de memória] os grupos do local Cabaceira [base de Cabaceira; Tombali] dirigido pelo camarada Sússa [?] atacaram uma companhia de soldados inimigos [CCAÇ 1427/?] das 11 horas da manhã até às 3 da tarde, donde conseguiram fazer o inimigo regressar sem tocar [entrar] no entroncamento [acampamento ou base].
Durante o ataque utilizaram as Bazookas que contribuíram para a fuga do inimigo, deixando ficar 7 cadáveres [?]. 6 Foram queimados [?] pelas balas incendiárias que queimaram os corpos [?]. O seu enfermeiro [?] foi apanhado à mão [ferido/?]. Tirámos-lhe o relógio, que é o que se encontra no envelope. Poucas horas depois o "enfermeiro" não resistiu, e faleceu. Peço-lhe que o manda arranjar porque ficou danificado.
Peço-lhe desculpa porque estou muito preocupado por não poder escrever bem a carta.
Do teu Inácio S. [Soares] da Gama [Comissário Político].
Citação: (1966), "Comunicado - Tombali", Fundação Mário Soares / DAC - Documentos Amílcar Cabral, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_40687
4. – CONSIDERAÇÕES FINAIS
Para finalizar a presente narrativa podemos concluir:
■ 1. - Confirma-se que a CCAÇ 1427 realizou uma actividade operacional, com contacto, na zona da Mata de Catesse, região de Tombali, no dia 20 de Março de 1966, domingo, durante a qual registaram três baixas, uma delas o "corpo não foi recuperado".
■ 2. - Desconhece-se o número de efectivos que estiveram envolvidos nesta missão.
■ 3. - A ser verdade que o "corpo não recuperado" é o mesmo que é citado no comunicado assinado por Inácio Soares da Gama, então estamos perante o "caso" do Albino Teixeira Martins, identificado como sendo "enfermeiro", uma vez que no texto não consta a captura de qualquer arma, sendo o relógio o único objecto apreendido.
■ 4. - Aceitando-se, como verdadeiras, as informações obtidas por Tony Grilo e narradas no ponto 3.1.1, então o Albino Teixeira Martins estaria a ser assistido, por se encontrar ferido, onde junto dele, provavelmente, existiria uma sacola de primeiros socorros, daí o terem classificado de "enfermeiro". É que, face às dificuldades sentidas no decurso dos combates, "tiveram que deixar o corpo na mata e fugir"…
■ 5. - Quanto às duas sepulturas existentes no cemitério de Catió, que o Tony Grilo afirma serem de militares da CCAÇ 1427, não foi possível confirmar, por dificuldade de identificar os nomes gravados nas respectivas lápides.
► Fontes consultadas:
Estado-Maior do Exército; Comissão para o Estudo das Campanhas de África (1961-1974). Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África; 7.º Volume; Fichas das Unidades; Tomo II; Guiné; 1.ª edição, Lisboa (2002).
Estado-Maior do Exército; Comissão para o Estudo das Campanhas de África (1961-1974). Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África; 8.º Volume; Mortos em Campanha; Tomo II; Guiné; Livro 1; 1.ª edição, Lisboa (2001).
Instituição: Fundação Mário Soares Pasta: 07200.170.093. Título: Comunicado – Tombali. Assunto: Comunicado assinado por Inácio [Soares da Gama] sobre o ataque dos "grupos do local Cabaceira" a uma companhia de soldados portugueses, no Sector de Cufar. Data: Domingo, 20 de Março de 1966. Observações: Doc incluído no dossier intitulado Diversos. Guias de Marcha. Relatórios. Cartas dactilografadas e manuscritas, 1960-1971. Fundo: DAC - Documentos Amílcar Cabral. Tipo Documental: Documentos.
Outras: as referidas em cada caso.
Termino, agradecendo a atenção dispensada.
Com um forte abraço de amizade e votos de muita saúde.
Jorge Araújo.
05Fev2021



















