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quinta-feira, 14 de maio de 2009

Guiné 63/74 - P4344: Dossiê Guileje / Gadamael 1973 (12): Homenagem dos Homens Grandes de Guiledje a Coutinho e Lima (Camisa Mara / TV Klelé)



Mensagem dos Homens Grandes de Guiledje (sic) ao Cor Art Ref Alexandre Coutinho e Lima (antigo comandante do COP 5, responsável pela decisão da retirada de Guileje, em 22/5/1973), por ocasião do lançamento do seu livro A Retirada de Guileje: a verdade dos factos

Quatro depoimentos, gravados no antigo aquartelamento e tabanca de Guileje, em 2/12/2008: Aladje Mamadu Djaló, 57 anos; Amadu Coiat, 57 anos; Asana Silá, 50 anos; Camisa Mara, 51 anos (e não 30, como por lapso, se indica nas legendas).

Ficha técnica > Imagem: Alimo Djaló ; Antunis Sanca. Reportagem: Amarildo Mendes. Edição: Demba Sanhá. Colaboração: Inácio M. Mané. Produção: Televisão Comunitária de Klelé. Dezembro de 2008.

Vídeo gentilmente cedido ao nosso blogue pela TV Klelé e pela AD - Acção para o Desenvolvimento. O portador do vídeo foi o Prof Doutor Eduardo Costa Dias (ISCTE, Lisboa), a quem estamos gratos.

Vídeo (5' 38''): You Tube > Nhabijoes (2009). Direitos reservados.



Transcrição de carta, manuscrita, assinada por Camisa Mara, endereçada ao Cor Art Ref Coutinho e Lima (na foto, à esquerda, em Guileje, 1973) e que acompanhou o vídeo (*):

República da Guiné-Bissau, Região de Tombali, Sector de Bedanda, Secção de Guiledje, Guiledje, 4-12-08

Exmo. Amigo Major Coutinho e Lima:

Antes de tudo desejo-lhe uma boa saúde e felicidade, um bom fim do Ano e excelente novo Ano, longa vida no seio do povo português.

E faço-lhe saber que sou Camisa Mara, residente em Guiledje, e faço parte das 660 pessoas que salvaste da morte na última batalha de Guiledje no mês de Maio de 1973, entre os militares portugueses e os militares do P.A.I.G.C. (Bissau).

Major, queremos ser ou somos a tua família, baseando-nos no passado ou na prolongação da nossa vida a partir de 1973, por autorizares o abandono de Guiledje com destino a Gadamael Porto. Neste contexto vamos valorizar a História da Guiné – Guiledje e o Major Coutinho e Lima.

Sou Camisa Mara nº 678-92-43 (...)

[falta uma linha na fotocópia da carta a que tive acesso]

[ Transcrição / fixação de texto: L.G.]

____________

Nota de L.G.:

(*) Vd. último poste desta série > 5 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4282: Dossiê Guileje / Gadamael 1973 (11): Heróis... (Constantino Costa, Sold CCav 8350, 1972/74)

Vd. também o último poste da série A retirada de Guileje, pror Coutinho e Lima> 24 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3932: A retirada de Guileje, por Coutinho e Lima (23): Resposta do autor do livro a António Martins de Matos (Parte II)

sexta-feira, 18 de julho de 2008

Guiné 63/74 - P3070: Antropologia (6): O povoamento humano da zona do Cantanhez: apontamentos (Carlos Schwarz, Pepito)



Guiné-Bissau > Região de Tombali > Sector de Bedanda > Iemberem > Simpósio Internacional de Guileje > Visita ao sul > Dois homens grandes da Guiné, o Engº Agrónomo Carlos Schwarz (Pepito, para os amigos), fundador e director executivo da AD - Acção para o Desenvolvimento e o Aladje Salifo Camará, régulo de Cadique Nalu e Lautchandé, antigo Combatente da Liberdade da Pátria, o rei dos nalus, hoje com 87 anos (*).

Foto: © Luís Graça (2008). Todos os direitos reservados.




Distribuição das povoações do Cantanhez, segundo J.P.Garcia de Carvalho (Desenho de A.Teixeira da Mota)






PROJECTO ECOGUINÉ > Notas breves sobre o povoamento humano da zona de Cantanhez (versão preliminar) (**)


Texto (e infografia) : © Carlos Schwarz (2008). Todos os direitos reservados.


Bissau, Julho de 2008



Ao Aladje Salifo Camará
Régulo do Reino Nalú de Cadique,
que me adoptou como seu filho




À memória de meu pai,
Artur Augusto da Silva,
que me ensinou a compreender
e a amar a cultura dos Homens Grandes
a Guiné-Bissau



Advertência

O reduzido número de fontes escritas torna muito difícil conhecer com detalhe a história do povoamento humano de toda a zona de Cantanhez.

Recorremos a alguns documentos a que tivemos acesso, entre os quais se destacam, como sempre, os dados fidedignos coligidos por René Pélissier na sua História da Guiné (1841-1936), sendo ele próprio a reconhecer a pouca documentação existente referente ao período colonial:

“… o continente, ao sul do Rio Grande de Buba, é amplamente ignorado pelos europeus. Terras pouco amenas ao marinheiro, porque couraçadas por imensos bancos de Iodo, a sua topografia é praticamente desconhecida na época e consideram-na habitada pelos Nalús, quando o seu povoamento é muito mais complexo.”

Socorremo-nos por isso do trabalho efectuado por J.P. Garcia de Carvalho, em 1946, Nota sobre a distribuição e história dos povos da área do Posto de Bedanda, que procura sintetizar a distribuição e história de alguns dos povos do actual Cubucaré.

Os estudos realizados por Artur Augusto Silva, nomeadamente Arte Nalú em 1955 e Apontamentos sobre as populações oeste-africanas segundo os autores portugueses dos séculos XVI e XVII, permitiram compreender melhor a história da chegada dos Nalús a Cantanhez.

Igualmente o documento Tawoulia ou Tawel, Famille regnante du pays Nalou au Rio Nunez, Perfecture de Boke de 1820 a 1952, da autoria de Elhadj Sankoumba Camará ilumina muito sobre a história do povo Nalú na sua zona de concentração inicial, em Boké, actual Guiné-Conakry.

Na ausência de outras fontes, recorremos a entrevistas aos mais velhos, Homens Grandes, portadores e transmissores da História oral de geração em geração, o que permite a eventualidade de que algumas das informações não poderem ser consideradas absolutamente fidedignas, sendo bem possível que a sua transmissão possa ter sido erodida nalguns casos ou mistificada noutros, fruto de conjunturas de momento e de rivalidades étnicas.

De valor incalculável foram as informações fornecidas por Abubacar Serra, Director do Programa Integrado de Cubucaré, especialmente sobre a distribuição actual das principais etnias em todo o território de Cantanhez.

Este pequeno trabalho é o contributo de alguém que, não sendo historiador mas simples agrónomo, apenas pretende que as informações agora divulgadas permitam compreender melhor as dinâmicas de desenvolvimento económico, as revindicações territoriais em tempos em que os regulados voltam a emergir como elementos incontornáveis, ou mesmo determinantes, para a gestão do espaço e território do Parque Nacional de Cantanhez.


1. O Período Pré-colonial

Teve-se muita dificuldade em obter informações seguras referentes a este período, pelo que nos socorremos da história transmitida oralmente pelos mais velhos.

Os Nalús e os Bagas terão povoado a região do Futa Djalon na actual Guiné-Conakry por volta do século VIII, aos quais mais tarde, no século XI, se vieram juntar os Jalonkés. No século XII esta região integrou o império do Ghana e do Mali.

Nessa altura crê-se que a zona de Cantanhez era um território muito pouco habitado, tendo provavelmente a chegada dos Nalús ocorrido no século XV, vindos da Guiné-Conakry, pressionados pelos Tilibós, chefiados por Samodoi que pretendia conquistar todo o território até ao oceano.

Os Nalús, chefiados por Manga Tauliá, decidiu partir para a região de Bafatá, actual Guiné-Bissau, onde criou a tabanca de Bigine, aguardando que todos os Nalús fugidos do Futa Djalon lá chegassem. É então discutido e decidido o rumo a tomar e o local final de destino, o qual é toda a região compreendida entre os rios Tombali e Boké.

Em função das sub-divisões dos Nalús, sobretudo de ordem linguística, embora todas submetidas ao mesmo chefe, acabam por se concentrar em cinco zonas:

- uma parte entre os Rios Tombali e Cumbidjan (actual sector de Catió), onde foram encontrar os Beafadas estabelecidos em Cubisseco, Buba e Fulacunda. Estes pretenderam submeter os Nalús o que levou estes últimos a refugiarem-se na Ilha de Como;

- outros, entre os Rios Cumbidjan e Cacine (actual sector de Cubucaré), primeiramente chefiados por Manga Iura, descendente de Manga Tauliá, e depois por Saiandi que lhe sucedera;

- outra, no actual sector de Quitafine;

- uma parte, na tabanca de Cacine;

- e outra, entre os Rios Cacine e Boké.

2. Período Colonial


No século XV, os portugueses, com as caravelas de Nuno Tristão, foram os primeiros europeus a percorrer a costa da Guiné e a entrar em contacto com as populações locais, instalando feitorias e praticando o comércio de especiarias, óleo de palma, ouro, marfim e mais tarde o tráfico de escravos. Cerca de quarenta anos depois, chegam os franceses que, ultrapassando os portugueses, estenderam a sua zona de influência desde a costa atlântica até ao Futa Djalon e à Alta Guiné-Conakry.

A primeira referência à presença dos Nalús, no final do século XV, na região sul da actual Guiné-Bissau, encontra-se no Esmeraldo de Duarte Pacheco. Mais tarde, em 1669 e 1684, os geógrafos-roteirista portugueses Álvares de Almada no seu Tratado Breve dos Rios da Guiné do Cabo Verde, e Francisco de Lemos Coelho nas suas memórias sobre a Guiné, pronunciam-se de forma mais desenvolvida sobre a vida dos Nalús.

Nas Duas Descrições Seiscentistas da Guiné, Lemos Coelho assinala: “Toda a mais terra que fica daqui da boca deste rio (Rio Grande de Buba) até à boca do rio de Nuno, que pela costa são mais de trinta léguas, tudo são Nalús”.


2.1. NALÚS, os donos do Chão

O primeiro chefe do Reino Nalu foi Boya Salifo que reinou durante 3 anos, de 1837 a 1840, ano da sua morte (Foto à direita).


Parece pois indiscutível que os Nalús eram o povo que habitava esta zona, em especial os sectores de Cubucaré e Quitafine, e em alguns pontos isolados do Cubisseco, quando aportaram os primeiros portugueses a esta costa de África.

Normalmente a habitarem as zonas ribeirinhas pelo maior acesso ao palmar e à extracção do óleo e vinho de palma, praticavam sobretudo um sistema de produção de sequeiro, baseado na fruticultura e na produção de culturas alimentares de sequeiro. Só muitos séculos depois é que, por volta dos anos 1920, com a chegada dos Balantas a esta zona é que começam a praticar um sistema de produção misto: de bolanha e de sequeiro.

Segundo Camará (2), a principal tentativa para a criação de um Reino Nalú, remonta aos anos de 1780, na tabanca de Caniop, zona de Boké, na que é hoje a Guiné-Conakry. Tudo começa com o casamento entre Tokhoye e Boya do qual nascem 4 filhos varões, por esta ordem: Salifo, Lamine, Youra e Carimo.

Nesta altura todas as tabancas Nalús funcionavam de forma autónoma, não havendo nenhuma autoridade superior que as unisse.


Com a morte do pai Tokhoye, em 1837, Boya Salifo, o primogénito, assume a liderança de um processo com vista à união de todos os Nalús à volta de uma só autoridade, representada por ele. Para isso contou com o apoio dos outros 3 irmãos que se desdobraram em visitas e contactos a todas as tabancas habitadas por Nalús, especialmente em duas zonas: na baixa do Rio Nuno e entre os rios de Cacine e Tombali. O processo é coroado de sucesso, tendo o Reino dos Nalús tido 4 chefes durante toda a sua existência:

O primeiro foi Boya Salifo que reinou durante 3 anos, de 1837 a 1840, ano da sua morte.

A ele sucedeu-lhe Boya Lamine que chefiou os nalús durante 17 anos, de 1840 a 1857, igualmente ano da sua morte (Foto à esquerda).


Segue-se-lhe, Boya Youra Tawel, o qual reina durante 28 anos, entre 1857 e 1885, tendo dividido o Reino Nalú em quatro províncias: Socoboli, Tonkima, Caniop e Cacine. Em 1860, com as etnias Landumas e Mikiforés a desentenderam-se, Youra começa a conquista de novos territórios para preservar a segurança das suas fronteiras contra as intenções expansionistas do chefe do Futa. Em 1863 dispunha de um grande território e reino. Nomeia então chefes para cada província. Para Cacine foi designado Saiondi, filho de Boya Salifo.

Com a morte deste último, em 1857, o primeiro filho de Salifo Boya, Diná Salifo, assume a chefia para um reinado de cinco anos que termina com a sua prisão pela França e respectiva deportação para Saint Louis, no Senegal, onde acaba por falecer em 1897 (Foto à esquerda).

A sua prisão prende-se com o seu completo desacordo com a França, decorrente da elaboração da Convenção Franco-Portuguesa de 1886, em que se procede a uma nova delimitação das suas respectivas possessões, na qual a França cedia a Portugal a zona de Cacine por troca com a Casamança.

O Reino Nalú ficava assim sem uma parte significativa do seu território, Cacine. Dá-se o desmoronamento do Reino Nalú e as principais tabancas tornam-se de novo autónomas. A França necessitou de 37 anos (1890 a 1927) para desarticular completamente o Reino Nalú, que levou 70 anos (1820-1890) a ser construído.

Por volta de 1860 dá-se a invasão Fula que vêm de Boké na Guiné-Conakry e do Boé no Futa Djalon que apertam os Nalús contra o mar e os obrigam a refugiarem-se nas ilhas de Melo e de Como, certos da dificuldade dos Fulas em se confrontarem com a água.

De forma inesperadamente rápida os Nalús começam voluntariamente a converter-se ao islamismo e consequentemente a abandonarem a escultura, muito semelhante à dos Bagas da Guiné-Conakry, de rara beleza e simbologia.

Trinta anos depois (1890) dá-se a chegada dos Sossos, vindos de Boffa na actual Guiné-Conakry, os quais se aliam aos Nalús para se oporem ao expansionismo Fula.

É por volta de 1896 que grande parte dos Nalús que habitavam as ilhas passam ao continente e, chefiados por Cube, antigo escravo e depois batulai do régulo Fula do Forreá, fundam inicialmente a tabanca de Cabedú e sucessivamente as de Calaque, Cafal, Cauntchinque e por último, em 1926, Cadique.

Mais recentemente, por volta dos anos 1920, verifica-se a chegada massiva dos Balantas, vindos da zona de Mansoa, os quais, numa fase inicial, não são recebidos muito cordialmente pelos Nalús.

Segundo Garcia de Carvalho, na altura Chefe de Posto Administrativo de Bedanda, em 1946, os Nalús, em número de 910 almas estavam repartidos por três territórios englobando 19 tabancas:
- Regulado de Guiledje: tabanca de Cafun’aque (8 pessoas)
- Território de Cantanhez: tabancas de Catomboi (5), Camecote (15), Camarempo (15), Sogoboli (25), Catchmaba Nalú (30) e Caiquene (25)
- Território de Cabedu: tabancas de Cafine (60), Calaque (50), Cafal (100), Fonte Iamusa (20), Cai (10), Cassintcha (40), Catombakri (40), Cabedú (200), Catesse (50), Catifine (50), Cabante (20) e Ilhéu de Melo (40).

Por outro lado, A.A.Silva , recorrendo ao Censo de 1960 que apresenta números credores de confiança, assinala a existência em toda a zona, e não exclusivamente na antiga Bedanda, 3.009 Nalús.

Com o início da luta de libertação nacional desencadeada em 1963, os Nalús acabam por aderir na sua quase totalidade ao movimento pela independência da Guiné-Bissau, vivendo e sendo protagonistas exemplares na construção das primeiras zonas libertadas, em Cantanhez.


2.2. FULAS, os islamizadores

A tradição oral narra que alguns caçadores Fulas terão chegado acidentalmente ao país dos Nalús. Mais tarde um grupo de Fulas cativos, oriundos da parte francesa do Boé e chefiados por Turá-Iá, imigraram para esta zona atraídos pelos seus bons solos e fundado primeiramente a tabanca a que puseram o nome de Guiledje, para logo de seguida criarem a tabanca de Salancaur de Fulas. Rapidamente dominaram toda a região mantendo os Nalús confinados às Ilhas de Melo e de Como, sabendo estes que se fossem apanhados seriam imediatamente feitos escravos e enviados para o Forreá.

A segunda avalanche de imigração Fula para o Chão dos Nalús, dá-se com os Fulas-Pretos. Em 1891 verifica-se uma forte desavença entre os Fulas do Foreá e os Fulas-Pretos, o que leva a que um novo grande contingente de Futa-Fulas, chefiados por Suleimane Djaló, Bacar Dambuia, Bela Coulibali e Mutaro Galissa, se deslocassem para Cantanhez e fundassem a tabanca de Iemberém, logo seguida da de Madina.

Com a morte de Turá-Iá em 1918, foi nomeado régulo de Guiledje, Alfa Mamadú Seilú, a quem as autoridades coloniais doaram o território deste regulado, como paga pela sua colaboração com Abdul Indjai, na chamada guerra de pacificação da colónia. De referir que esta compensação se deveu ao facto de ele ter recusado receber o dinheiro que o Governo lhe oferecia.

Em poucos anos este regulado desenvolveu-se, tendo sido criadas as tabancas de Medjo, Bomane, Um-Siré, tandá, Banco-Bunge, Banhege, fazendo ele valer o seu poder ao chefe de Cantanhez, Suleimane Djaló, que a ele se submeteu voluntariamente. Estendeu a sua autoridade a Quebo e ao território de Cabedú. Acaba por morrer em Mansoa quando organizava em 1921 uma revolta contra os portugueses.

Sucedeu-lhe o seu filho Amadú Uri, deposto três anos depois, tendo herdado a chefia do regulado o seu irmão Mamadú Seilú que morre cinco anos depois. Como quem o devia substituir, Mamadú Saliu, ainda era uma criança, ninguém foi nomeado régulo, tendo cada tabanca designado o seu chefe.

Em 1937, Adjibo, padrasto do herdeiro legítimo, é nomeado régulo, depois de uma forte divergência entre os dois, acabando por ser deposto menos de um ano depois por ser considerado pela população como um usurpador. Só 4 anos depois, em 1941, é que Mamadú Saliu acaba por ser nomeado régulo, transferindo a sede para Salancaur.

Em 1946 havia 1.295 Futa-Fulas em todo o sector de Cubucaré, o que representava 0 segundo grupo com maior número de habitantes.


2.3. BALANTAS, os últimos a chegar

Nos anos 1920, os Balantas, fruto dos massacres perpetrados em Nhacra e Mansoa por Teixeira Pinto, na chamada guerra de pacificação, e pelos trabalhos forçados a que eram sujeitos na construção de estradas, decidem imigrar para o sul, primeiramente para o Cubisseco e depois para Tombali.

Inicialmente o seu relacionamento não foi bom com os Nalús que não os receberam bem. Mais tarde a situação modificou-se tendo estes aprendido as técnicas de orizicultura de bolanha salgada e passado a praticá-las. Instalaram-se nas zonas ribeirinhas, ao longo do rio Cumbidjan, praticando um sistema de produção de bolanha, em que o arroz de bolanha salgada era o elemento quase exclusivo do sistema. Rapidamente passaram a ser a etnia mais numerosa, tendo sido registados 7.165 habitantes em 1946, em 29 tabancas do sector de Cubucaré.

2.4. SOSSOS, os donos da língua

Chefiados por Lourenço Davy, um número muito reduzido de Sossos terão chegado a Cantanhez vindos de Boké, por volta de 1891, criando a tabanca de Camecote, muito perto da de Iemberém.

Especialmente ligados ao comércio, impõem a sua língua como o crioulo de Cantanhez. Embora em 1946 apenas com 490 habitantes concentrados em 4 tabancas, acabam por determinar que a língua sossa seja falada por todas as outras etnias como instrumento financeiro de comercialização dos produtos.


2.5. TANDAS, de Iemberém

Relatos orais dão os Tandas como originários de Kindou, na região de Tambacunda, Senegal oriental, de onde se terão deslocado inicialmente para Badjar, região de Koundura, actual Guiné-Conakry, à procura de bons solos para a prática da agricultura. Mais tarde foram para Kakalidi, zona de Boké, onde começaram a negociar com os Nalús a concessão de terras, tendo-lhes sido atribuído uma área onde fundaram a sua primeira tabanca na Guiné-Conakry: Madina.

Na actual Guiné-Bissau, Gassimo Camará criou a primeira tabanca que foi designada de Lamoi, na área de Quitafine. Seguiu-se Cambraz, fundada por Danim Marena, igualmente em Quitafine. Já em Cubucaré, Adulai Cumpon criou Bomani, a que se seguiu Madina, na área de Guiledje, por Umarú Nangacum. Caboxanque Tanda, em Quitafine é fundada por Umarú Galissa.

Acabam finalmente por chegar a Iemberém, em 1930, através de um grupo de seis pessoas, constituído por Umarú Camará, Pedjedibi Camará (pai de Umarú), Issufo Galissa, Mutaro Galissa, Mamadú Nhabali e Alfa Galissa. Por último, Umarú Galissa funda a tabanca de Cambeque, na linda mata com o mesmo nome.

De todas estas tabancas apenas existem actualmente quatro: três em Cubucaré (Iemberém, Cambeque e Cambraz) e uma em Quitafine (Caboxanque Tanda).

No seu seio os Tandas têm seis sub-grupos: Aiendja, Aban, Abangar, Assóssó, Aiés, Abucul e Adjar.


3. Período Pós-Independência

Se nos primeiros 15 anos do pós-independência (1973) a situação das migrações para a região de Cantanhez não sofreu mudanças significativas, já nos últimos 15 anos se vem registando uma tendência para um acentuado crescimento demográfico.

O aumento do número de população tem sido feito à custa da vinda dos povos do leste, especialmente de Fulas do Gabú, à procura de novas áreas de cultivo e fugindo à clara diminuição a queda pluviométrica e dos solos de baixa fertilidade, consequência do uso prolongado de sistemas de produção baseados na cultura da mancarra e do algodão, fortemente penalizadoras da riqueza nutritiva destes solos.

Os eixos rodoviários Mampata-Guiledje e Guiledje-Faro Sadjuma são os que mais têm registado o aumento do número de novas tabancas e o uso de sistemas de cultura baseados na desmatação extensiva.

Paralelamente, nos últimos 5 anos têm-se intensificado igualmente o estabelecimento, por vezes temporário, por vezes permanente, de “nanias” vindos do outro lado da fronteira da Guiné-Conakry.

Aproveitando os brandos costumes guineenses na aplicação da Lei Florestal em vigor, deslocam-se para as áreas junto à linha da fronteira Balana-Bendugo onde praticam uma cultura itinerante de migração, desmatando enormes áreas florestais para, na maior parte dos casos, a abandonar nos anos seguintes, ocupando outras, novas e mais férteis. A cultura nómada destes povos faz com que a floresta não tenha nenhum significado especial, preferindo viver em zonas abertas e desmatadas.

Qualquer destes sistemas, dos fulas do Gabú ou dos Nanias da Guiné-Conakry, está a causar perdas consideráveis no património genético vegetal e animal, em particular nos dois grandes corredores de animais selvagens de Balana e Bendugo.


4. Os Regulados de Cubucaré


Existem actualmente quatro regulados em todo o sector.

- Regulado de Cabedú, tendo sido empossado em 2008 o novo régulo Bubu Camará, por morte em Fevereiro deste ano do anterior Aliu Turé.

- Regulado de Cadique, sendo régulo Aladje Salifo Camará

- Regulado de Medjo, sendo régulo Umarú Djaló

- Regulado de Iemberém, sendo régulo Adriano Sulai Djaló


Carlos Schwarz [, Pepito,]
Julho de 2008


Bibliografia

(1) Anginot Ethiène, 1988. Approche de la diversité des systèmes agraires du secteur de Bedanda, Région de Tombali, Guinée-Bissau: Zonage utilitaire pour la recherche et le développement. Bissau, Ministério do Desenvolvimento Rural e Pescas, DEPA.

(2) Elhadj Sankoumba Camará, 1999. Tawoulia ou Tawel, Famille regnante du pays Nalou au Rio Nunez, Perfecture de Boke de 1820 a 1952. Conakry.

(3) Garcia de Carvalho, J.P. 1946. Nota sobre a distribuição e história dos povos da área do Posto de Bedanda. Bissau, Boletim Cultural da Guiné-Portuguesa, nº 14.1949

(4) Pélissier René, História da Guiné: Portugueses e Africanos na Senegâmbia (1841-1936). Lisboa: Editorial Estampa. 1997

(5) Silva, Artur Augusto, 1959. Apontamentos sobre as populações oeste-africanas segundo os autores portugueses dos séculos XVI e XVII. Bissau, Separata do nº 55 do Ano XIV do Boletim Cultural da Guiné Portuguesa

(6) Silva, Artur Augusto, 1956. Arte Nalú. Bissau,
__________

Anexo 1

Tabancas Nalús em 1945


A. Regulado de Guiledje

• Cafunaque 8 pessoas

B. Território de Cantanhez

• Catomboi 5
• Camecote 15
• Camarempo 15
• Sogoboli 25
• Catchmaba Nalú 30
• Caiquene 25

C. Território de Cabedu

• Cafine 60
• Calaque 50
• Cafal 100
• Fonte Iamusa 20
• Cai 10
• Cassintcha 40
• Catombakri 40
• Cabedu 200
• Catesse 50
• Catifine 50
• Cabante 20
• Ilhéu de Melo 40

Total Nalús 910


Anexo 2

Nomes dos filhos de nalús islamizados por nascimento


FILHOS FILHAS

Primeiro > Salifo
Segundo > Lamine
Terceiro > Youra
Quarto > Carimo


Nomes dos filhos de nalús não-islamizados por nascimento


FILHOS / FILHAS

Primeiro > Titcho / Boya
Segundo> Toho / Tcha
Terceiro > Samani / Kenan
Quarto > Bakeni / Finia
Quinto > Tia (filha)
Sexto > Botia (filha)

__________


Notas de L.G.:

(*) Vd. postes de:

2 de Abril de 2008 > Guiné 63/74 - P2714: Antropologia (5): A Canção do Cherno Rachide, em tradução de Manuel Belchior (Torcato Mendonça)

(**) 24 de Abril de 2008 > sGuiné 63/4 - P2793: Uma semana inolvidável na pátria de Cabral (29/2 a 7/3/2008) (Luís Graça) (15): Salvemos o Cantanhez (I)