Mostrar mensagens com a etiqueta Pel Rec Fox 42. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta Pel Rec Fox 42. Mostrar todas as mensagens

sábado, 6 de setembro de 2014

Guiné 63/74 - P13579: Blogpoesia (390): Poema de um ataque na guerra da Guiné (Armando Fonseca)

1. Mensagem do nosso camarada Armando Fonseca (ex-Soldado Condutor do Pel Rec Fox 42, Guileje e Aldeia Formosa, 1962/64), com data de 2 de Setembro de 2014:

Caros camaradas
Embora visite com frequência o blogue, há muito que não envio nenhuma mensagem mas, como encontrei agora nos meus escritos um pequeno poema escrito no principio do ano e do qual já não me recordava, resolvi enviá-lo para se assim o entenderem ser publicado.

Com os meus cumprimentos para todos os camarigos em especial para os editores que com todo o seu esforço e boa vontade nos vão dando informações.

Com um grande abraço:
Armando Fonseca (O Alenquer)


POEMA DE UM ATAQUE NA GUERRA DA GUINÉ


Esta arma que aqui vedes
Não era dos portugueses
Foi caçada numa noite
A guerrilheiros guineenses

Com esta ficaram outras
Que aqui não estão a aparecer
Estão decerto no Museu
Para o país não esquecer

Foi uma noite infernal
Que ainda não esqueceu
Eles ficaram lá todos
Mas de nós nenhum morreu

Foi numa pequena aldeia
Acabada de ocupar
Eles teceram uma teia
E vieram atacar

Como esta haviam mais duas
Faziam fogo infernal
Nós com armas como as suas
Defendíamos Portugal

Os que foram mais ousados
E do arame se aproximaram
Eram sete mas coitados
Todos eles lá ficaram

A nossa metralhadora
Manobrava o Vitorino
Mas também ele mais tarde
Sofreu o mesmo destino

Ficou-me bem na memória
A ocupação de Sangonhá
Era junto ao Senegal
E a guerra vinha de lá

Passados cinquenta anos
Estes versos estou escrevendo
Estou lembrando sem enganos
Parece que ainda estou vendo

E agora vou terminar
Mas não vou tentar esquecer
É sempre bom recordar
Pois recordar é viver

Armando Fonseca
Janeiro de 2014
(Direitos de Publicação reservados a autorização do autor)
____________

Nota do editor

Último poste da série de 1 de Setembro de 2014 > Guiné 63/74 - P13557: Blogpoesia (389): Da minha janela... (J. L. Mendes Gomes)

quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

Guiné 63/74 - P10834: Álbum fotográfico do Alberto Pires, Teco, ex-fur mil, CCAÇ 726 (Guileje, out 64/ jun 66) (Parte VI): A vida de um quartel de fronteira (Parte II)



Guiné> Região de Tombali > Guileje > CCAÇ 726 (1964/64)  > Foto nº 9 > Aspeto parcial da tabanca


Guiné> Região de Tombali > Guileje > CCAÇ 726 (1964/64)  > Foto nº 8 > Outro aspeto parcial da tabanca




Guiné> Região de Tombali > Guileje > CCAÇ 726 (1964/64)  >  Escola, a 5 km de Guileje, atacada e destruída



Guiné> Região de Tombali > Guileje > CCAÇ 726 (1964/64)  >  Dois militares tugas com um grupo de jovens da tabanca


Guiné> Região de Tombali > Guileje > CCAÇ 726 (1964/64)  > O furriel mil Faustino partilhando uma refeição com as mulheres grandes


Guiné> Região de Tombali > Guileje > CCAÇ 726 (1964/64)  >  O alferes mil Lima e outros militares com três mulheres grandes



Guiné> Região de Tombali > Guileje > CCAÇ 726 (1964/64)  >  O sold José Fidalgo (falecido em 2005), contemplando a imagem de uma santa da sua devoção,  talvez  a Virgem Maria.


Guiné> Região de Tombali > Guileje > CCAÇ 726 (1964/64)  >  O Teco ( ou o o Carlos Guedes ?)  e o José Paralta (viola)



Guiné> Região de Tombali > Guileje > CCAÇ 726 (1964/64) >  Foto nº 7 > Julgamos tratar-se da lendária viatura Fox, de matrícula MG-36-24, que resistiu a tudo e todos, acabando ingloriamente, como ferro velho, nas mãos do PAIGC em 25 de maio de 1973. Julgo que o Pel Rec Fox 42 (Aldeia Formosa e Guileje, 1962/64) foi a primeira subunidade de cavalaria a passar pro Guileje. O Armando Fonseca (também conhecido como o Alenquer) esteve aqui como soldado condutor, mas já não apanhou a CCAÇ 726. "Chegámos a Guileje  pela primeira vez em finais de 1963, vindos de Aldeia Formosa, e aí montámos o primeiro aquartelamento, seguindo-se depois Ganturé, Sangonhá, Cacoca, etc. Pertencendo ao Pelotão de Reconhecimento Fox 42, por esses locais andámos apoiando as tropas que se iam instalando ao longo desse percurso a caminho de Gadamael onde se encontrava, isolada por terra, uma Companhia de Caçadores" (...).

  Fotos: © Alberto Pires (Teco) (2007) / AD - Acção para o Desenvolvimento. [Editadas por L.G.]. Todos os direitos reservados


1. Continuação da publicação do álbum fotográfico do Alberto Pires, mais conhecido por Teco, natural de Angola, ex-fur mil da CCAÇ 726, a primeira subunidade a ocupar Guileje em 1964)... A companhia esteve em Guileje entre Outubro de 1964 e Junho de 1966.

As fotos que estamos a publicar pertencem a um lote que o Teco pôs à disposição do Núcleo Museológico Memória de Guiledje e do nosso blogue (são mais de 60 fotos). Não trazem legenda, mas estão agrupadas por temas: (i) CCAÇ 726 (Guileje); (ii) construção de abrigos (Guilje); (iii) destacamento de Mejo; (iv) operação militar; e (v) guerrilheiros mortos (neste caso, são apenas duas as fotos disponibilizadas)...

Estas fotos que publicamos hoje, têm a ver com o primeiro tema. As fotos foram editadas por nós com vista à melhoria do seu enquadramento e resolução. Sabemos que o Teco e o Carlos Guedes têm em mãos a elaboração de uma publicação com a história da CCAÇ 726. E esperamos que um dia destes eles nos ajudem a melhorar a legendagem do álbum. (LG)

____________

Nota do editor:

Último poste da série > 11 de dezembro de 2012 > Guiné 63/74 - P10788: Álbum fotográfico do Alberto Pires, Teco, ex-fur mil, CCAÇ 726 (Guileje, out 64/ jun 66) (Parte V): A vida de um quartel de fronteira (Parte I)

domingo, 28 de outubro de 2012

Guiné 63/74 - P10588: O Alenquer retoma o contacto (7): Texto sobre a vida de um soldado (Armando Fonseca)

1. Mensagem de Armando Fonseca (ex-Soldado Condutor do Pel Rec Fox 42, Guileje e Aldeia Formosa, 1962/64), com data de 17 de Outubro de 2012:

Caro camarada Vinhal e restantes participantes da tabanca grande, um bem haja a todos.
No ano letivo de 2011, frequentava a minha neta o 9.º ano, foi incumbida de fazer um trabalho em conjunto com três colegas sobre a guerra do ex-ultramar sobre regime de Portugal, e, então ela pediu-me para lhes falar sobre isso, visto eu ter estado envolvido nessa guerra.
Então elaborei um texto para depois recitar para gravação em vídeo, ao qual elas juntariam fotografias a ilustrar o texto.
Assim foi e, o trabalho embora um pouco adulterado saiu bom.

Vou enviar esse texto, e se os digníssimos editores acharem por bem publicá-lo muito bem, caso contrário tudo bem.
Não envio o próprio trabalho porque devido aos meus fracos conhecimentos de informática não me será possível fazê-lo.


O Alenquer retoma o contacto (7)

Texto sobre a vida de um soldado

"Chamo-me Armando Fonseca, tenho 70 anos, cumpri o serviço militar desde Abril 1961 até Julho 1964. Durante esse período 26 meses foram passados na Guiné, desde Maio de 1962 até Julho de 1964.

Quando em Janeiro de 1962 fui mobilizado para ir para essa província já havia guerra em Angola e os Guineenses pela mão do PAIGC davam os primeiros passos para o mesmo fim.

Durante o período que antecedeu o embarque, houve alguma preparação para o fim em vista e eu fazendo parte de uma secção de Auto-metralhadoras, como condutor, fui enviado juntamente com os restantes companheiros da secção para a Escola Prática de Cavalaria em Santarém a fim de aí recebermos instrução de operação e manutenção do carro e do respectivo armamento que o compunha.
Terminada esta instrução regressamos para Castelo Branco para nos juntarmos aos restantes camaradas do Pelotão para aí continuarmos com a preparação, nem sempre a adequada, para os fins que nos esperavam.

Assim chegou o dia 20 de Maio de 1962 dia em que o navio "António Carlos" nos esperava no cais de Alcântara para nos transportar até à Guiné. Nesse dia, lá estavam os meus entes mais queridos para se despedirem de mim, meus pais, irmão, namorada e mais alguns familiares e amigos. Depois das despedidas embarquei no navio e quando da largada do mesmo ele emitia alguns apitos que faziam cortar o coração, esses silvos despertaram em mim tal angústia que ainda hoje me causa arrepios recordar a partida.

O navio de carga ANTÓNIO CARLOS fotografado no Norte da Europa com as cores da Sociedade Geral (Imagem da Skyfotos – colecção de L. M. Correia) In: Dicionário de Navios Portugueses, com a devida vénia.

A viagem que durou sete dias decorreu de forma normal, mas quando cheguei o ambiente era totalmente diferente ao que estava habituado, um calor abrasador, um cheiro próprio daquele ambiente local, enfim tudo coisas a que me fui habituando.

O meu pelotão ficou instalado nos arredores de Bissau, no Quartel General numa caserna onde só existiam os ferros das camas e os colchões, a roupa de cama estava ainda embarcada no navio e só nos foi distribuída uma manta para ornamentar a cama e nos cobrirmos. Com o calor intenso que se fazia sentir era impossível suportar a manta, por outro lado destapados, os mosquitos atacavam em força, era insuportável aquela situação.
Passados três dias apareceram então as roupas de cama e cada um a seu belo prazer foi na cidade mandar fazer mosquiteiros que colocados sobre as camas evitavam assim sermos comidos pelos mosquitos durante a noite.
Havia pouca higiene, visto a agua ser muito pouca e de muito má qualidade. Havia um período do dia em que havia água nos balneários para se tomar banho mas fora desse período já não era possível tomar banho, por falta de água.
A água para se beber tinha que ser filtrada em equipamentos próprios e tratada quimicamente com comprimidos a fim de evitar a propagação de doenças, tais como a malária e o paludismo.

Nesta altura a guerra ainda estava muito no começo, havia aqui e ali algumas escaramuças e nós ficamos a fazer a segurança da cidade e do aeroporto. Então, fazia serviço durante 24 horas no aeroporto de Bissalanca, passando inspecções à pista e mantendo a segurança nas aterragens e nas descolagens dos aviões tanto civis como militares. Durante essas inspecções por vezes eram avistadas cobras que atravessavam a pista e nas cercanias junto do arame farpado viam-se também hienas e onças que procuravam o seu meio de subsistência.
Nos restantes dias estávamos às ordens para qualquer imprevisto a que tivéssemos que acorrer. Às vezes, muito raras, tinha um dia de folga que aproveitava para ir até à cidade, para ir ao cinema ou fazer algumas compras de certos artigos que não me eram fornecidos.

Assim decorreram os primeiros dezasseis meses, até que o Batalhão que se encontrava em Mansoa e tinha distribuídas companhias por Mansabá e Bissorã as quais tinha que abastecer de géneros alimentícios e outros já estava com dificuldade em se movimentar devido aos ataques inimigos e então pediu a Bissau um carro de Cavalaria para apoio às colunas que tinha que fazer deslocar para o abastecimento dos seus homens e, calhou à guarnição do meu carro essa missão.
Fui então deslocado para essa região para apoio a essas colunas que diariamente se tinham que deslocar a Mansabá ou a Bissorã. Aqui os perigos aumentaram porque a guerra já estava a tomar outras proporções, havia emboscadas, com as quais se tinha que lidar especialmente nas deslocações a Mansabá e começavam a aparecer minas anti-carro aqui e ali montadas nos caminhos.

Numa das minhas deslocações com destino a Mansabá, mais ao menos a meio do percurso, rebentou uma mina centésimos de segundo antes do carro estar sobre o local onde ela estava montada, abriu uma grande cratera sobre a qual o carro passou pelo ar mas nada de mal nos aconteceu. Para os restantes carros da coluna passarem teve que ser aberta uma picada ao lado da estrada porque a cratera era maior que a largura dos rodados dos carros.

Certa madrugada foi recebida informação de que uma pequena povoação, denominada Porto Gole, situada numa das margens do rio Geba estava a ser atacada, lá fomos de imediato em socorro do chefe de posto e dos cipaios que mantinham ali vigilância, visto o rio ser um meio importante de comunicação entre Bissau e o interior Norte. Ao chegarmos encontravam-se queimadas várias moranças, dois cipaios mortos e o chefe de posto e parte da população tinha sido raptada pelo inimigo. Permaneci aí alguns dias até ser montado com segurança um destacamento militar que passava agora a garantir a segurança dos barcos que circulavam no rio.
O percurso para essa povoação era muito sinuoso tinha que se atravessar bolanhas em que dificilmente se via a estrada por onde se podia passar, visto estar cercada de água e até submersa nalguns pontos. Numa dessas deslocações, devido ao acidentado do terreno, magoei um dedo da mão direita que me deixou inapto durante algum tempo, assim foi nomeado outro condutor para me substituir durante esse período, só que, na primeira deslocação que fez a Bissorã, rebentou uma mina debaixo do carro que o deixou totalmente inutilizado, uma das rodas da frente foi ficar em cima de uma árvore e por lá permaneceu muito tempo, visto ter ficado de modo que era muito difícil retirá-la. O condutor foi o único que sofreu algumas escoriações, a restante tripulação não sofreu nada devido à boa blindagem que compunha aquelas auto-metralhadoras.

Sem carro já nada fazia naquelas paragens e regressei a Bissau substituído por outra guarnição com outro carro. O período de permanência em Mansoa decorreu entre 28 de Agosto e 18 de Novembro de 1963. Chegado a Bissau continuei com os piquetes ao aeroporto e outras missões similares, só que, a 21 de Janeiro de 1964 é o pelotão destacado para o Sul para reforçar as tropas ali existentes, visto a situação ali já estar muito difícil e lá vamos nós a caminho de Aldeia Formosa, hoje chamada de Quebo.
Para fazermos esse percurso que em condições normais durava algumas horas, demoramos dois dias porque a estrada nalguns locais tinha que ser toda picada a fim de detectar se havia minas montadas. A certa altura do percurso fomos atacados por milhares de abelhas que deixaram toda a coluna em alvoroço, esses ataques eram tão ou mais perigosos que os provocados pelo inimigo e às vezes surgiam em simultâneo.

Ao chegarmos a Aldeia Formosa instalamo-nos aí, mas a nossa missão era fazer escolta a uma operação que ia ser desencadeada para desobstruir a estrada que se dirigia para Cacine, a qual tinha centenas de árvores derrubadas que não permitiam o movimento por terra a fim de comunicar com alguns destacamentos que assim permaneciam isolados. Então começamos a montar destacamentos ao longo dessa estrada após a sua desobstrução a fim de garantir que não voltaria a suceder o mesmo.

O primeiro destacamento a ser montado foi o de Guileje, que anos depois teve que ser abandonado devido à intensidade dos ataques inimigos. Seguiu-se Ganturé que ficava a três escassos quilómetros de Gadamael onde se encontrava uma companhia totalmente isolada por terra, a única comunicação que tinha era pelo rio e mesmo assim só quando das marés vivas, uma vez por mês os barcos lá conseguiam chegar.
Seguiram-se os destacamentos de Sangonhá e Cacoca e até aqui embora tenham havido várias emboscadas, e tenham sido descobertas várias minas anti-carro, do meu pelotão só eu tinha sido ferido na cara por duas vezes, sempre coisa de pouca gravidade, mas, no dia 2 de Julho foi montada pelo inimigo uma emboscada, onde rebentaram duas minas destruindo por completo uma auto-metralhadora e um granadeiro, matando dois camaradas e ferindo com muita gravidade mais três, os quais levaram algum tempo para reconstruir os órgãos afectados e ainda hoje sofrem dessas maleitas.

A partir desta data nós ficamos totalmente desanimados e já não fizemos mais nada, até porque já tínhamos ultrapassado o tempo previsto para a nossa comissão. Regressamos então para Bissau numa lancha da marinha a fim de aguardar o regresso que teve lugar no dia 21 no Paquete Índia, chegando a Lisboa a 30 de Julho.

Navio Índia. Foto Navios Mercantes Portugueses, com a devida vénia

À chegada esperavam-me os meus familiares que me receberam com toda a alegria e eu mais alegre estava porque em determinadas alturas pensava que já não regressava para os tornar a ver.
Nesse dia não pude seguir com eles visto que ainda tive que ir a Castelo Branco fazer o espólio dos fardamentos que trazia e receber as guias que permitiam passar à vida civil e só no dia 30 regressei.
Nesse dia tinha então todos os meus familiares e amigos à minha espera e começou aí uma nova vida".

Despeço-me com um grande abraço
Armando Fonseca (O Alenquer)
____________

Nota de CV:

Vd. último poste da série de 26 de Maio de 2011 > Guiné 63/74 - P8331: O Alenquer retoma o contacto (6): Velhas recordações (Armando Fonseca)

terça-feira, 22 de maio de 2012

Guiné 63/74 - P9936: Memórias da CCAÇ 798 (Manuel Vaz) (9): Uma perspectiva a partir de Gadamael Porto - 65/67 - VII Parte - Evolução da situação militar - Anexo IV



1. Em mensagem do dia 19 de Maio de 2012, o nosso camarada Manuel Vaz (ex-Alf Mil da CCAÇ 798, Gadamael Porto, 1965/67), enviou-nos o anexo IV referente à VII Parte das Memórias da sua Companhia.







MEMÓRIAS DA CCAÇ 798 (9)
De 63 a 73, uma década de Guerra na Fronteira Sul da Guiné
Uma Perspectiva a Partir de Gadamael Porto - 65/67 (VII Parte) > Anexo IV

Gadamael Porto fica situado na Fronteira Sul da Guiné-Bissau, num território que, na era colonial, pertenceu à França e que, através da Convenção Franco-Portuguesa de 1886 a “França cedia a Portugal a Zona de Cacine por troca com Casamança . . . “ (P3070),  dividindo o Reino Nalu sediado em Boké [, no território da Guiné-Conacri) . Assim, o território entre o Rio Cacine e a fronteira passou (na altura) a ser português, enquanto Casamança encravado entre a Gâmbia e Guiné-Bissau, continua a reclamar a independência.




Mais precisamente, Gadamael Porto, como se pode ver no recorte da carta anterior, situa-se na margem direita de um dos braços do Rio Cacine, onde desagua o Rio Queruene. Ao contrário do que se poderia pensar, Gadamael não era inicialmente um aglomerado populacional. A Carta Militar de 1954 [, de Cacoca,] dá ideia quanto à concentração da população. O maior aglomerado populacional, da etnia Biafada, situava-se na Tabanca de Ganturé, sede do Regulado, a cerca de 3 Km de Gadamael Porto. A tabanca mais próxima, digna desse nome, era a de Viana. Em toda a faixa compreendida entre os diversos braços do Rio Cacine e a fronteira, a zona mais povoada era para Sul, na estrada para Sangonhá.

Foi a sua localização, junto do braço do rio, associado à existência de um desembarcadouro que lhe deu a importância que tinha. Numa região com poucas e fracas estradas que na época das chuvas se tornam intransitáveis, a navegabilidade dos rios e a possibilidade do transporte fluvial para pessoas e mercadorias ganha uma importância vital. 

Foram estas condições naturais que determinaram o interesse das grandes Companhias que controlavam o Comércio, para instalarem ali um entreposto comercial. É disso prova a existência de duas casas de construção europeia, uma delas bem próxima do rio, exibindo a sigla ASCO que já fez correr muita tinta a propósito do seu significado, mas que, qual “ovo de colombo”, pode significar apenas, Associação Comercial [AsCo].

Foram estas casas abandonadas que a CART 494 encontrou, quando em 17DEZ63 ocupou Gadamael Porto, incorporando-as no Aquartelamento. Mas as NT já tinham estado anteriormente em Gadamael Porto. 

O Cap Blasco Gonçalves que foi o OInfOp do BCAÇ 1861, sediado em Buba (1965/67) dizia que já tinha comandado uma Companhia dispersa pelas localidades de Aldeia Formosa, Cacine e entre outras também Gadamael, onde teria estado uma Secção. Ora esta Secção deve ter estado instalada em Gadamael Porto, por volta dos anos 1961/62, tendo-se posteriormente deslocado para Buba, onde se fez o reagrupamento da Companhia.

Quando a CART 494 chegou a Gadamael, teve desde início de resistir às flagelações e emboscadas do PAIGC, ao mesmo tempo que construía as primeiras defesas do Aquartelamento e instalava um Destacamento em Ganturé (02FEV64) com apoio do Pel Rec Fox 42 que aí permaneceu até 20MAI64 (P7877). 

Seguiu-se o início das primeiras construções de apoio que se continuaram com a Companhia seguinte. Nesta fase, a margem direita do braço do Rio Queruane, a montante do desembarcadouro, com um piso plano constituído de uma pedra “esponjosa” de aparência vulcânica, serviu de pista de emergência, até ser construída a pista representada de amarelo, no recorte da Carta Militar, isto ainda no tempo da CART 494.

Aquartelamento de Gadamael Porto em Meados de 1969, no tempo da CART 2410.
O croquis faz a síntese do acolhimento das Populações: do lado direito, ao longo da Paliçada, as casas da Tabanca de Gadamael; do lado esquerdo as casas de colmo construídas para albergar a população vinda de Sangonhá/Cacoca (1ª fase do reordenamento da população); as casas com cobertura de zinco construídas pela CART 2410 para albergar a população de Ganturé. (2ª fase do reordenamento)

Foi com estes meios que a CCAÇ 798 encontrou o Aquartelamento de Gadamael Porto a 08MAI65. Durante a sua permanência continuaram as construções de apoio, incluindo a oficina auto, acolheram-se as primeiras populações no interior do perímetro defensivo, o que determinou o seu alargamento e a reorganização defensiva com a construção de novos abrigos e paliçadas. (P9329). 

A pista de aviação,  que na época das chuvas fora interdita, sofreu obras de ampliação e manutenção. A Engenharia Militar procedeu à eletrificação do Aquartelamento, o que permitiu a substituição do “velho petromax” e iniciou o projeto do Cais que viria a ser construído durante a Companhia seguinte, a CART 1659

Foi durante esta Companhia que se iniciaram as primeiras construções (reordenamento da população - P3013) ainda com cobertura de colmo, ao lado do Aquartelamento, para albergar as populações vindas de Sangonhá/Cacoca, entretanto extintos (29JUL68).



Fotografia aérea de finais de 1971 (CCAÇ 2796) gentilmente cedida pelo ©  Cor Morais da Silva
Desapareceram todas as casas de colmo, bem como os últimos troços de Paliçada. O perímetro do Aquartelamento alargou-se, incluindo mais construções militares sobretudo do lado oposto à Tabanca. 


Mas o Aquartelamento de Gadamael, com o perímetro deixado pela CCAÇ 798, deve-se ter mantido, sem grandes alterações, até à instalação dos primeiros Obuses, no tempo da CART 2410 (1968/69).



Fotografia aérea de 1972/73 (CCAÇ 3518), gentilmente cedida pelo ©  ex-Alf Mil L. Monteiro
Há mais construções militares do lado esquerdo. O Reordenamento da População está concluído e pode ver-se o braço do Rio Cacine, onde desagua o Rio Queruane, com o Cais de Acostagem.
 

A partir de agora, o Aquartelamento passa a ser uma base de Apoio de Fogos e de Reabastecimentos, através de um Pel Art e de um Pel AM para o qual houve necessidade de construir instalações. Esta Companhia continuou a construção da Tabanca (36 casas com telhado de zinco,  destinadas aos nativos de Ganturé=, alterou o Aquartelamento do lado da população pela eliminação da paliçada e procedeu à revisão do sistema defensivo daquele. O croquis anterior dá uma ideia do Aquartelamento nesses tempos, onde se pode ver ainda, a Tabanca inicial e os dois tipos de casas correspondendo às duas fases do ordenamento da população. 

A CART 2410 foi rendida a 21JUN69, por troca com a CCAÇ 2316, vinda de Guileje,  que apenas permaneceu em Gadamael, cerca de 4 meses. 

Seguiu-se a CART 2478 que começou por se instalar em Ganturé a 11OUT69, onde manteve dois Pelotões até à sua extinção, a 13MAI70. Foi no tempo desta Companhia que se iniciou a construção de Valas, como sistema defensivo.



Aquartelamento de Gadamael Porto nos primeiros meses de 1973, no tempo da CCAÇ 3518.
O Aquartelamento, tal como se representa no croquis, deve ter-se mantido sem grandes alterações, até ao ataque do PAIGC de MAI/JUN/73, apenas reforçado com um Pel CAN S/R com 5 armas, chegado a Gadamael na primeira quinzena de Maio, no tempo da CCAÇ 4743.


A 29DEZ70 a Companhia anterior era rendida pela CCAÇ 2796 que, nos primeiros tempos em Gadamael, foi severamente atacada pelo PAIGC, tendo sofrido várias baixas, entre os quais, o próprio Comandante da Companhia. O esforço operacional não a impediu de se dedicar à população, construindo 80 casas no Setor Norte do Aldeamento, uma Escola e um Posto Sanitário, na zona de ligação entre os dois setores do Ordenamento, para além de um Heliporto, Casernas e uma nova Reorganização do Terreno. A 1ª foto aérea dá uma ideia do Aquartelamento e das zonas limítrofes, no tempo desta Companhia.

A 24JAN72 a CCAÇ 3518 rende a Companhia anterior. Apesar dos constantes patrulhamentos numa extensa ZA, com uma fronteira de muitos quilómetros, nunca teve qualquer contacto com o IN. O PAIGC utilizava as frequentes flagelações sobre o Aquartelamento como forma de manifestar a sua presença e pressionar as NT, normalmente à noite, retirando durante esta todo o Armamento Pesado. 

Durante a presença desta Companhia foram feitas novas construções, entre elas um novo Paiol, e recuperadas as Casas de construção europeia. Foi anda concluído definitivamente o Aldeamento. É ainda de salientar a atividade do Posto Escolar nº 23, frequentado por 40 crianças e uma dúzia de adultos nativos. Desta ação beneficiaram ainda 30 praças que obtiveram o exame de 4ª classe em Bissau. (P6283)

A 04MAR73 abandonam Gadamael os últimos efetivos da CCAÇ 3518, dando lugar à CCAÇ 4743 que estava em sobreposição desde 08FEV73. Foi efémera a presença desta Companhia, interrompida pelo ataque a Gadamael de consequências dramáticas para toda a guarnição e população, ocorrido a partir da retirada de Guileje a 22MAI73. O que se passou a seguir, não é objeto deste anexo.

E agora um simples “clique” sobre a fotografia seguinte, permite-nos uma visita, em ecrã inteiro, a Gadamael Porto, nos finais do ano de 1971. Podemos ver a Escola e o Posto Médico ligando os dois Setores do Reordenamento da População, a Pista, o Heliporto, o Aquartelamento, bem como o envolvimento da floresta e do braço do rio Cacine.

Gadamael Porto nos finais do ano de 1971.  Fotografia gentilmente cedida pelo © Cor Morais da Silva.


Finalmente, aproveito para agradecer a possibilidade de divulgação das fotografias, ao Cor Morais da Silva (foto 1 e 3) e ao ex-Alf Mil L Monteiro (foto 2), bem como a intensa colaboração na elaboração dos Croquis, ao ex-Fur Mil L Guerreiro da CART 2410 e ao ex-Alf Mil L Monteiro da CCAÇ 3518, sem a qual não seria possível a sua apresentação.






Fontes:
Principal – Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné, através das Apresentações, correções e Comentários.

Fontes Adicionais:
A necessidade de elementos concretos, obrigou ao contacto direto de vários camaradas que fazem parte da Tertúlia - Cor. Morais da Silva; ex-Alf Mil Vasco Pires; ex-Fur Mil Luís Guerreiro - e ainda do ex-Alf Mil Lopes Monteiro que não faz parte de mesma.

Manuel Vaz
Ex-Alf Mil
CCAÇ 798
____________

Nota de CV:  

Vd. último poste da série de 13 de Abril de 2012 > Guiné 63/74 - P9740: Memórias da CCAÇ 798 (Manuel Vaz) (8): Uma perspectiva a partir de Gadamael Porto - 65/67 - VII Parte - Evolução da situação militar - Anexos I, II e III

sexta-feira, 15 de abril de 2011

Guiné 63/74 - P8109: O Alenquer retoma o contacto (5): O ataque de 23 de Março de 1964 a Sangonhá (Armando Fonseca)

1. Mensagem de Armando Fonseca (ex-Soldado Condutor do Pel Rec Fox 42, Guileje e Aldeia Formosa, 1962/64), com data de 9 de Abril de 2011:

Caro camarigo Vinhal,
Aqui estou mais uma vez a contar mais um capitulo da minha vivida história, para ser publicada para conhecimento de toda a tabanca, se acaso a julgar digna disso. deixo à vossa consideração.


O Alenquer retoma o contacto (5)

O ataque de 23 de Março de 1964 a Sangonhá

Depois de, em Ganturé, existirem as condições mínimas de sobrevivência para a instalação das tropas que aí permaneciam, o Pel Fox 42 juntamente com tropas recém chegadas à Guiné e com um Pelotão de Milícias rumou até Sangonhá a 21 de Março de 1964, a fim de aí ser instalado um novo aquartelamento.

Como de costume segue-se a capinagem, a vedação de arame farpado em volta da tabanca, que seria agora um quartel, a colocação de cavaletes para instalação dos candeeiros a petróleo (petromaxes), a que alguns “valentes” iam dar pressão de ar durante a noite, sempre que necessário.

Também era norma que quando chegávamos a um novo local não se consumia água da que ali existia sem ser certificado de que ela estava em boas condições de utilização, assim, recorria-se sempre ao aquartelamento mais próximo para nos abastecermos desse precioso líquido.

Então no dia 23 pela tarde lá vamos nós a Guilege encher os reservatórios de água regressando já ao lusco-fusco, aquela hora em que já não se vê muito bem mas também ainda não é preciso acender faróis.

Assim o IN que decerto nos vigiava não deu pela chegada dos carros da Cavalaria e entenderam ser muito fácil um ataque às tropas recem instaladas para mais que a maior parte tinha as pernas muito brancas o que indiciava pouca experiência naquelas andanças e que se tornaria uma tomada do local com a maior das simplicidades.

E, então pelo meio da noite de 23 para 24, qual não é o espanto do sentinela que se encontrava do lado da estrada que liga a Guiné-Bissau à Guiné-Conacri quando vê aparecer um grupo de guerrilheiros pela estrada acima, descontraidamente a aproximar-se da entrada trazendo uma metralhadora e outros armamentos parecendo que passeavam. Essa sentinela chegou a estar confundido sem saber se devia atacar ou esperar julgando que eles se vinham entregar às nossas forças.

Entretanto quando eles se encontravam a cerca de vinte metros do arame, a sentinela que se encontrava dentro do granadeiro reagiu e fez uma rajada que despoletou um ataque feroz, à volta da aquartelamento. Havia mais duas metralhadoras iguais à que aquele grupo transportava, cuja foto envio, e várias outras armas mais ligeiras, aquelas "costureirinhas" que quase todos conhecemos.

As nossas tropas reagiram e o tal grupo procurou uma elevação no terreno e instalaram-se para fazer fogo sobre nós, mas como os nossos carros tinham um grande poder de fogo, depressa o anulamos, isto com a ajuda do comandante da milícia, visto que a certa altura devido à proximidade do IN não se sabia muito bem de quem eram os tiros se das nossas tropas se do IN. Depois de anulado esse grupo cuja maioria ficou lá assim como o respectivo armamento, que se encontra no museu militar, todo o ataque foi sendo anulado e o IN retirou em debandada.

Ao raiar da aurora fomos então fazer o reconhecimento, e do grupo que fora avistado estavam seis mortos, a metralhadora, pistolas-metralhadoras e pistolas e um rolo de corda. Depois de examinados os outros locais de onde vieram os piores ataques restavam montes de invólucros e os vestígios das metralhadoras terem sido arrastadas no final do ataque, pelo que se deduziu que o cordão encontrado seria exactamente para atar ao suporte da metralhadora para que um dos intervenientes recuasse para local seguro e puxasse a metralhadora no final do ataque, caso este corresse mal como foi o caso, só que neste caso não houve tempo para a execução dessa operação.

Passada esta primeira confusão, permanecemos em Sangonhá até 23 de Junho, continuando a manter as devidas precauções e a segurança das tropas aí instaladas, até que eles atingissem a maturidade para se defenderem a si próprios.

Depois de Sangonhá seguiu-se Cacoca que ficará para o próximo episódio.
____________

Nota de CV:

Vd. último poste da série de 28 de Fevereiro de 2011 > Guiné 63/74 - P7877: O Alenquer retoma o contacto (4): Depois de Guileje, seguiu-se Ganturé (Armando Fonseca)

segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Guiné 63/74 - P7877: O Alenquer retoma o contacto (4): Depois de Guileje, seguiu-se Ganturé (Armando Fonseca)

1. Em mensagem de 24 de Fevereiro de 2011, Armando Fonseca (ex-Soldado Condutor do Pel Rec Fox 42, Guileje e Aldeia Formosa, 1962/64), volta com mais uma das suas memórias.


O Alenquer retoma o contacto (4)

Depois de Guileje seguiu-se Ganturé

Durante a permanência do meu pelotão em Guileje, enquanto ia avançando a construção do aquartelamento, nós deslocávamo-nos com frequência a Aldeia Formosa, Buba, Bedanda, etc.

Nessas deslocações sofríamos algumas emboscadas e como reagíamos de imediato, porque tínhamos um forte poder de fogo, depressa eram aniquiladas.

Lembro-me de uma das vezes em que fomos a Bedanda, termos sofrido uma emboscada e na sequência desse ataque, em certa altura ver um arame a ir pelo ar, saindo debaixo da minha auto-metralhadora. Esse arame não era nada mais nada menos do que o comando de uma mina que depois de levantada tinha o bonito peso de sete quilos.

Pelo que se deduziu, o arame foi puxado no exacto momento em que uma das rodas o pisava e por isso se partiu e a mina não explodiu. Depois de bem examinado o local, ainda havia mais outra mina idêntica uns metros mais à frente, mas que devido à nossa rápida reacção, o IN partiu em debandada e não houve tempo de a fazer explodir.

Depois do aquartelamento de Guileje ter condições de alguma segurança para defesa do pelotão que aí se instalou, nós rumamos para outras paragens.

Em Gadamael Porto encontrava-se uma Companhia que se encontrava totalmente isolada por estrada, devido às dezenas de árvores que ocupavam as estradas que comunicavam com essa localidade vindas de Norte. Ali só se chegava de barco ou de helicóptero.

Essa Companhia era constantemente flagelada pelos ataques do IN e toda aquela gente vivia em frequente sobressalto, até que foi posta em marcha a Operação “Furão” que tinha por fim pôr transitável a estrada entre Guileje e Gadamael.

Então, a 2 de Fevereiro de 1964, lá vamos nós a escoltar os Caçadores e a Engenharia a fim de desobstruir a estrada. Assim: depois de quase um dia, e de várias dezenas de árvores cortadas e retiradas para as bermas da estrada, chegámos a Gantoré que se situa a cerca de três quilómetros de Gadamael Porto.

Ao chegarmos, foram detectados vários vestígios da presença do IN que aí se tinha instalado, porque as tropas que estavam em Gadamael não conseguiam vir até aí sem que sofressem grandes emboscadas que as obrigavam a voltar para trás.

Depois de instalado em Ganturé um perímetro de segurança, o Pelotão de Cavalaria deslocou-se a Gadamael onde foi recebido com pompa e circunstância; havia um grande lanche à nossa espera com comida e bebida à descrição.

Nesse dia eu que nem sou de muitas bebidas, apanhei o maior pifo da minha vida, que nem sei como regressei a Gantoré, nem por onde o carro passou, só sei que acordei no outro dia de manhã debaixo do carro, deitado em cima de um pouco de capim seco que alguma alma caridosa se encarregou de lá colocar.

Durante os próximos dias seguiram-se a montagem do arame farpado à volta do aquartelamento, a escavação de abrigos, a melhoria de habitabilidade das palhotas ali existentes, que eram agora as nossas habitações, e escoltas aos arredores a fim de serem minados os possíveis acessos do IN.

O meu Pelotão deslocava-se a Gadamael várias vezes por dia visto que era lá que funcionava a cozinha e as messes de Sargentos e de Oficiais. Por vezes também nos deslocávamos a Guileje.

Nessas deslocações, nos locais que se julgavam perigosos, fazia-se fogo de reconhecimento e numa dessas vezes aconteceu um caso pouco vulgar:

Ao serem feitas algumas rajadas para reconhecimento, no cruzamento entre Gantoré, Gadamael Porto e Gadamael Fronteira, senti uma leve comichão no pescoço e um liquido viscoso a correr-me pelo peito. Qual não foi o meu espanto ao verificar que já existia uma quantidade de sangue dentro da camisa.

Coloquei um penso e ao chegar a Gadamael o médico verificou que havia um corte provocado por um objecto metálico. Como não tínhamos ouvido nenhum tiro por parte do IN isso criou-nos alguma admiração. No regresso fomos averiguar no local se havia alguns vestígios de algum atirador isolado, mas o que se encontrou foi uma lasca de ferro tirada de um poste dos fios telefónicos que era de ferro, o que nos levou a supor que foi o nosso próprio fogo que me provocou esse ferimento.

Quem havia de dizer que aquela lasca arrancada pelo fogo das nossas metralhadoras vinha entrar pela janela de visão do condutor, que é muito limitada em tamanho, cerca de 40X15cm.

Cerca de um mês depois, quando nos deslocávamos ao encontro de uma coluna que se destinava ao abastecimento do aquartelamento de Guileje vinda de Aldeia Formosa, pois como anteriormente citei, nunca os dois Pelotões de Cavalaria se encontravam do mesmo lado do rio Balana, por causa da possível destruição da ponte, sofremos uma emboscada em que de novo voltei a ser ferido por uma rajada, que batendo na frente da auto metralhadora junto da janela, cujos estilhaços das balas juntamente com tinta se vieram espetar na minha cara. Fiquei com quatro ou cinco ferimentos ligeiros, e o resto eram pedaços de tinta espetados por toda a cara. O Alferes ao ver a minha cara ficou estupefacto, ainda ficou mais preocupado do que eu.

Até esta altura, Março de 1964, já com 22 messes de comissão, nunca tínhamos tido ninguém ferido, mas aqui o nosso bom anjo parecia ter-nos abandonado.

Permanecemos em Ganturé até 20 de Maio. No dia seguinte fomos para Sangonhá, mas ficará para uma próxima edição, que por agora não me vou alongar mais.

Um grande abraço para toda a tabanca, em especial para os seus editores
Armando Fonseca
____________

Nota de CV:

Vd. último poste da série de 7 de Fevereiro de 2011 > Guiné 63/74 - P7736: O Alenquer retoma o contacto (3): Actividades do Pel Rec Fox 42 em Janeiro e Fevereiro de 1963 (Armando Fonseca)

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

Guiné 63/74 - P7736: O Alenquer retoma o contacto (3): Actividades do Pel Rec Fox 42 em Janeiro e Fevereiro de 1963 (Armando Fonseca)



1. Mensagem de Armando Fonseca (ex-Soldado Condutor do Pel Rec Fox 42, Guileje e Aldeia Formosa, 1962/64), com data de 5 de Fevereiro de 2011:

Caro camarigo Carlos Vinhal
Aqui estou para descrever mais um capítulo dos meus arquivos; se acharem por bem publiquem para conhecimento de todos os camarigos da Tabanca.

Armando Fonseca


O Alenquer retoma o contacto (3)

Actividades do Pel Rec Fox 42 em Janeiro e Fevereiro de 1964

Autometralhadora


No dia 21 de Janeiro pelas 07h30 o Pelotão FOX 42 saiu de Bissau, com destino indefinido, passando por Mansoa, Mansabá foi chegar a Bafatá por volta das 17h30.

A marcha foi vagarosa e cheia de precauções devido às possibilidades de sofrer emboscadas ou de encontrar minas, mas chegamos sem anormalidades, pernoitando aí para prosseguir no dia seguinte.


No dia seguinte às 07h30 lá seguimos rumo a Sul agora acompanhados por pessoal da CCav 154 que estava sediada em Bafatá, chegando ao Saltinho pela hora do almoço. O percurso foi muito vagaroso visto seguirem à frente dos carros camaradas a pé com detectores de minas e até picando a estrada com sabres para ser certificada a ausência de minas, entretanto a meio do percurso houve um pequeno ataque seguido por largada de abelhas que deixou todos desnorteados uns para cada lado e ainda houve camaradas mordidos pelas abelhas, mas, depois de tudo reorganizado seguimos a viagem.

Depois do almoço saímos do Saltinho com destino a Aldeia Formosa e, entretanto veio ao nosso encontro o Pelotão de Reconhecimento Fox 888 que estava sediado naquela localidade junto com uma companhia de caçadores da qual não me lembro o número.

À nossa chegada não havia pão e muito menos vinho, mas lá comemos qualquer coisa e fomos procurar acomodarmo-nos para aí permanecer algum tempo.

Mas no dia 23 logo pelas 07h45 lá íamos outra vez, agora a caminho de Buba para aí pernoitar. Durante a tarde foram feitas duas saídas aos arredores em reconhecimento e no dia seguinte foi então o regresso a Aldeia Formosa com mantimentos para aquele destacamento, visto que o transporte era feito de barco até Buba e depois por terra para abastecer os destacamentos daí dependentes.

Durante as saídas para de reconhecimentos nos arredores de Buba, o alferes de minas e armadilhas aproveitou para efectuar algumas operações nos caminhos que se julgava serem percorridos pelo IN.

A dormida em Buba foi no chão com uma manta por colchão, visto aquele destacamento não estar preparado para receber mais um pelotão e os condutores das viaturas que se destinavam a trazer as cargas.

Durante os dois dias que se seguiram não houve nenhuma saída mas no dia 27 lá fomos até Guileje fazer um reconhecimento, onde nada existia além de laranjeiras carregadas de frutos e algumas bananeiras com bananas que mesmo muito verdes, depois de uns dias embrulhadas em papel dentro da mala do carro, já marchavam.

Havia também alguns ananases mas muito poucos. Nesta altura Guileje não passava de um matagal com algumas árvores de fruto pelo meio.

Foram passando os dias com algumas saídas a Buba escoltar as viaturas que iam buscar mantimentos até que; no dia 4 de Fevereiro pelas 02h30 da manhã lá vamos a caminho de Guileje agora para montar um aquartelamento onde ia ficar instalado um pelotão de caçadores e alguns milícias fulas com as suas famílias.

Nos dias que se seguiram foi a preparação do aquartelamento a capinagem a montagem de tendas e depois o inicio das construções e a preparação dos terrenos onde mais tarde foi feita a pista para as avionetas aterrarem e levantarem voo.

Durante esta permanência no dia 13 foi o meu Pelotão deslocado a Bedanda para deitar fogo através das balas incendiarias, das metralhadoras instaladas no meu carro, a umas casas de mato que se encontravam muito perto do rio que separava a zona onde estavam as nossas tropas e o reduto do IN. O rio era a baliza, nem os militares passavam para lá nem o IN se aventurava a passar para cá, no entanto, haviam constantes ataques a morteiro de ambas as partes.

Os dias foram passando com algumas idas a Aldeia Formosa e a Buba e a partir de certa altura chegou informação de que o IN iria dinamitar a ponte sobre o rio Balana e então nunca mais se juntaram os dois pelotões Fox do mesmo lado do rio; quando nós passávamos para um lado o pelotão 888 passava para o outro.

Já veio descrito em postes anteriores o trágico final do destacamento de Guilege e aparece agora descrito o início da formação deste mesmo destacamento.





Segue-se depois Gantoré e Gadamael mas fica para um próximo episódio.

Com um abraço para todos
Armando Fonseca
____________

Nota de CV:

Vd. último poste da série de 25 de Janeiro de 2011 > Guiné 63/74 - P7668: O Alenquer retoma o contacto (2): Os primeiros grandes sustos (Armando Fonseca)

terça-feira, 25 de janeiro de 2011

Guiné 63/74 - P7668: O Alenquer retoma o contacto (2): Os primeiros grandes sustos (Armando Fonseca)

1. Mensagem de Armando Fonseca (ex-Soldado Condutor do Pel Rec Fox 42, Guileje e Aldeia Formosa, 1962/64), com data de 22 de Janeiro de 2011:

Caros camarigos,
Aqui vão mais umas narrativas para que, se bem entenderem, publiquem algumas fases da guerra passadas em 1964.

Armando Fonseca


O Alenquer retoma o contacto (2)

Os primeiros grandes sustos

Regressados a Mansoa, recomeçaram as escoltas diárias a caminho de Mansabá, Bissorã e Porto Gole, até que no dia 17 de Outubro de 1963 ao dirigir-me para Mansabá, próximo de uma tabanca denominada Mamboncó foram encontrados na estrada dois buracos provocados pelo rebentamento de fornilhos dois dias antes.

Foi o primeiro grande sinal de perigo, porque até aí ainda não tinham aparecido minas por aqueles lados.

No dia dezanove ao fazer outra escolta a Mansabá e depois de ter percorrido mais ao menos metade do percurso, rebentou uma mina mesmo na minha cara, mas por sorte minha e dos camaradas que seguiam no carro, foi comandada uns décimos de segundo antes do carro estar em cima dela, não provocando estragos.

Foram feitas umas rajadas para reconhecimento em todas as direcções pelas borzings, e entretanto um dos soldados da CCAÇ 413, que seguia na coluna e que se tinha apeado, viu um fio que vinha do mato para dentro da estrada e alertou o Furriel de minas e armadilhas que seguia na coluna, tendo este verificado que havia outra mina montada e sobre a qual eu já tinha passado.

Essa mina, que pesava quatro quilos cento e cinquenta, foi levantada com as devidas precauções e a viagem foi recomeçada e seguiu até ao destino.

Como a reacção do apontador das metralhadoras foi imediata não houve tempo para o IN despoletar a outra mina, caso contrário tinha sido uma chacina, haveria decerto mortes e muitos feridos. Esta foi a primeira de muitas das intervenções do meu bom anjo da guarda.

Em vinte, pelas cinco da manhã, lá ia a caminho de Enxalé e uns quilómetros depois de Porto Gole, perto da tabanca de Flora, estava a estrada cortada não permitindo a passagem dos carros. Depois da intervenção dos sapadores lá fomos passando mas passadas umas dezenas de metros começaram a rebentar sobre nós várias granadas e de seguida várias rajadas a baterem no carro. Agimos de imediato e a situação pareceu acalmar-se. Entretanto foram avistados vários elementos IN a fugir. Alguns camaradas foram em sua perseguição, mas como havia outra auto-metralhadora do outro lado do morro, era uma ação arriscada porque podiam ser confundidos com o IN e haver acidentes, como veio a acontecer.

Convencido de que o perigo tinha passado, avancei, e quando cheguei ao cimo do morro para me juntar ao restante grupo que se encontrava do outro lado, senti o rebentamento de outra granada mesmo em cima do carro e novas rajadas se notavam a bater no mesmo. Voltamos a reagir e entretanto quando tudo ficou calmo. Fomos até aos camaradas que estavam do outro lado e verificamos que eles tinham feito fogo sobre o grupo que tinha ido em perseguição do IN. Sem acidentes ao que se julgava, visto se terem apercebido que eram camaradas e não elementos do IN.

Esta nossa missão consistia em fazer passar uma auto-metralhadora e um granadeiro para Enxalé e, como a zona de perigo já estava passada, eles seguiram tendo a restante coluna regressado a Mansoa convencidos de que tudo não tinha passado de susto.

Ao chegar verifiquei que tinha uma roda furada e no outro dia ao desmanchá-la encontrei uma bala de nove milímetros introduzida entre a jante e o pneu, mas não ficou por aqui, porque pela noite comecei a ouvir uns rumores de que faltava um camarada da CCAÇ 413, que decerto teria ficado na operação do dia anterior. Assim, no dia vinte e dois de manhã lá me vejo de novo a caminho da tabanca de Flora, só que, cerca de um quilómetro antes do local de destino, rebentou uma mina na frente do meu carro, mas de novo sem consequências para nós. Entretanto o rebentamento foi precedido de novo ataque com a mesma intensidade do anterior. Respondemos ao ataque, tendo então um pelotão ido mato fora em busca do camarada perdido, sem resultado algum. Quando a escaramuça acabou, tanto eu como a restante guarnição do meu carro, estávamos intoxicados pelo fumo e pelos gases da pólvora que se acumularam dentro dele. Eu tive que ser assistido pelo médico, porque ao sair do carro se não me tivessem amparado tinha caído para dentro da bolanha.

O tempo continuou a passar com escoltas quase todos os dias, por vezes mais do que uma.

Entrou o mês de Outubro e nem no dia dos meus anos (10) tive descanso escoltas atrás de escoltas umas de dia outras de noite para colocar Pelotões ou a Companhia a fazer tentativas de emboscada ao IN. Numa destas operações, no dia 15, eu sofri uma entorse no dedo polegar da mão direita que me deixou um pouco debilitado. Ainda continuei a fazer os serviços que me eram destinados, mas com algum esforço. Um certo dia, devido a algumas dores e a um pouco de ronha, fui queixar-me ao capitão dizendo que não podia continuar a trabalhar e teria que ir a Bissau fazer uma radiografia à mão. Ele ficou um pouco atrapalhado, mas compreendeu o meu esforço e pediu-me para ir ter com o Furriel Mecânico para ver se ele arranjava quem fosse capaz de me substituir. Assim fiz e, em conjunto com o Furriel, preparamos um condutor que depois de umas breves noções já se desenrascava, era um camarada de Freixo de Espada à Cinta que pertencia à CCAÇ 413.

A sua primeira e única saída, no dia dezassete, foi para Bissorã, e passado algum tempo da coluna ter partido de Mansoa chegou uma comunicação via rádio de que tinha rebentado uma mina debaixo da auto-metralhadora e que o condutor tinha ficado ferido. Resultado, o carro ficou com a frente parcialmente destruída, tendo uma das rodas ido pelo ar e ficado em cima de uma árvore. Apenas o condutor tinha sofrido algumas escoriações no rosto e numa das pernas.

Mais uma vez o meu bom anjo intercedeu por mim e creiam que não ficou por aqui este meu fado.

Como o carro ficou inutilizado, no dia 18 de Outubro regressei a Bissau, substituído por outro carro e outra guarnição.
____________

Nota de CV:

Vd. primeiro poste da série de 21 de Janeiro de 2011 > Guiné 63/74 - P7649: O Alenquer retoma o contacto (1): De Bissau para Mansoa com intervenções em Mansabá, Cutia, Bissorã e Porto Gole (Armando Fonseca)

sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

Guiné 63/74 - P7649: O Alenquer retoma o contacto (1): De Bissau para Mansoa com intervenções em Mansabá, Cutia, Bissorã e Porto Gole (Armando Fonseca)




O Alenquer retoma o contacto (1)

1. Mensagem de Armando Fonseca*, ex-Soldado Condutor do Pel Rec Fox 42, Guileje e Aldeia Formosa, 1962/64, com data de 19 de Janeiro de 2011:

Conforme o solicitado anteriormente, vou tentar não ser enfadonho, mas deixar alguns dados do que foram os meus tempos de Guiné passados entra 1962 e 1964.

Sem ter propriamente veia de escritor, vou narrar alguns factos tal como os tenho no meu caderno de apontamentos daquela altura.

Chegado a Bissau a 28 de Maio de 1962 no Navio António Carlos, não cito aqui os arrepios da partida visto que todos nós vivemos esse suplício, o navio fundeou ao largo e fui transportado para terra numa lancha, onde esperavam GMCs para transporte até ao quartel General onde fiquei instalado.

As camas e as respectivas roupas ainda não tinham sido desembarcadas e dormi as primeiras noites numa cama de campanha apenas com uma manta para me defender dos mosquitos mas com o calor intenso que se fazia sentir, ou se morria de calor ou se era comido pelos mosquitos.

No terceiro dia lá apareceu a cama e a roupa, e a promessa de mosquiteiro que nunca chegou a aparecer, se quis evitar de ser comido pelos bichos tive que ir comprar tecido e mandar fazer um mosquiteiro num alfaiate da cidade.

O pelotão levava como missão reforçar a defesa da cidade, incluindo o aeroporto, e então o meu primeiro serviço foi exactamente piquete ao aeroporto. Fazia 24 horas de serviço dia sim dia não, garantindo a segurança das partidas e chegadas dos aviões, quer fossem civis ou militares.

Antes das aterragens ou dos levantamentos lá ia passar revista a toda a pista observando se havia algo de anormal e só depois os aviões entravam na pista.

Às vezes no dia aparecia outro biscate para fazer inclusive atender a algumas escaramuças que apareciam na cidade, visto que, aquela data o comando do PAIGC era nos arredores da cidade, no Pilão, que se situa entre esta e o Quartel General.

Permaneci assim até aos finais de Agosto de 1963, altura em que fui sorteado para ser deslocado com a guarnição do meu carro para Mansoa, porque o Bcaç 512 que aí se encontrava e tinha distribuídas Companhias em Mansabá e em Bissorã, as quais tinha que abastecer, já estava com graves problemas nas deslocações das suas colunas e então pediu o reforço de um carro de cavalaria para acompanhar essas colunas.

Cheguei então a Mansoa em 28 de Agosto e comecei de imediato a fazer escoltas, quase todos os dias saía para Mansabá ou Bissorã, e quando assim não era, havia que escoltar pessoal que se deslocava para a capinagem das bermas das estradas desses percursos.

Na madrugada do dia 3 de Setembro chegou ao quartel a notícia de que Porto Gole tinha sido atacado e lá fomos pelas seis da manhã escoltar um pelotão da Ccaç 413 para ver o que se tinha passado. Ao chegarmos encontramos um cenário desolador, haviam cinco moranças totalmente queimadas, dois cipaios mortos, tendo os guerrilheiros levado preso o chefe de posto e um colono branco.

Já não regressamos a Mansoa e no dia seguinte começou a ser erigido ali um aquartelamento visto que tinha deixado de haver a segurança, até aí feita pelo chefe de posto e pelos cipaios, e aquele era um ponto crucial para apoio aos barcos que pelo Geba se deslocavam de Bissau para o interior.

Permaneci ali até haver condições para as tropas de caçadores terem um mínimo de segurança. Durante esse período a alimentação baseou-se quase sempre em bolachas e conservas, até haver condições para começar a matar uns carneiros e umas galinhas que por lá havia.

No dia 9 regressei a Mansoa, sendo retomada a rotina de escoltas e agora também a Porto Gole porque ninguém dava um passo sem que a auto metralhadora não fosse à frente da coluna.

No dia 13 um pouco antes do almoço ouviu-se ao longe um rebentamento e passado algum tempo apareceram dois homens a informar que o rebentamento tinha sido na tabanca de Cutia e que havia lá feridos.

Seguimos para lá e deparamos com dois feridos graves, um tinha um buraco na cabeça e o outro tinha uma perna e as duas mãos cortadas, o primeiro foi levado para o hospital, e o segundo, a família não deixou que o levassem, porque quiseram que ele morresse junto deles.

Em 22 fomos chamados para socorrer uma viatura civil e uma ambulância de transporte colectivo que estava a ser atacada entre Mansoa e Mansabá. Fomos lá e quando chegamos já o IN tinha abandonado o local levando todo o dinheiro e os géneros que seguiam nas viaturas.

A partir desta data, além das deslocações militares que chegavam a ser duas por dia, apareceram também as colunas civis que já não se deslocavam sem escolta militar.


No dia 24 saímos de Mansoa pelas cinco da manhã para ir tirar umas árvores que o IN tinha colocado na estrada que ligava Porto Gole a Enxalé e a deixara intransitável, e às oito horas com 44 árvores cortadas e retiradas, encontramos uma companhia que vinha de Enxalé ao nosso encontro e que a cerca de um quilometro tinha sofrido uma emboscada, onde se encontra um pelotão com vários feridos ligeiros e um Furriel com uma perna cortada, o qual ao fim de cinco horas, sem o socorro que a situação exigia, veio a falecer.

Além dos feridos havia ainda um granadeiro atascado na bolanha que nos deu muito trabalho a retirar.

Quando regressamos a Porto Gole era já noite e apenas com o pequeno almoço das quatro da manhã no estômago; depois de comermos alguma coisa regressamos a Mansoa que distava cerca de 27 quilómetros.

Este é o primeiro episódio, outro se seguirão se acharem por bem.

Um grande abraço do camarigo
Armando Fonseca,
Soldado 452 do
Pelotão de Rec Fox 42
__________

(*) Vd. poste de 22 de Setembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7023: Tabanca Grande (245): Armando Fonseca, ex-Soldado Condutor do Pel Rec Fox 42 (Guiné, 1962/64)