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quarta-feira, 16 de maio de 2018

Guiné 61/74 - P18640: (Ex)citações (337): A propósito das deserções nas fileiras do PAIGC, há um provérbio africano que diz "Todos os cães podem ser bravos, mas são mais bravos dentro das suas moranças", o mesmo quer dizer, dentro dos seus "chãos" (Cherno Baldé, Bissau)

1. Comentário do nosso colaborador permanente, Cherno Baldé, especialista em questões etnolinguísticas da Guiné-Bissau (*)

Caro amigo Jorge Araújo,

Sobre as restantes localidades, cujas regiões não puderam ser identificadas, aqui deixo a minha contribuição para o efeito, baseada no cruzamento do nome dos combatentes e dos locais de nascimento com a sua identidade e chão de provável pertença étnica:

Nome / Localidade / Sector / Região

Bala Bodjam - Bessadjari -Morés/Mansaba - Óio
Bala Turé - Caur-ba -Quebo - Tombali
Mamadu Mané - Cauale/Can-Wal -Cacine - Tombali
N’tuntum N’codé - N’ghansonhe -Binar/Bissorã - Óio
Malam Cissé - N’gharu -Morés/Mansaba -Óio
Queba N’beghan - N’ghneghan -Bissora - Óio
N’dindin Turé - Nhanbra -Morés/Mansaba - Óio
N’yado Turé - Sansanghoté -Morés/Mansaba - Óio

Assim, feitas as devidas correcções, para o Óio,  teríamos (17+6) 74%; para Tombali (1+2) 10%; e o Cacheu mantem-se inalterável. Constatamos que,  mesmo com essas correcções, o balanço entre
as três regiões não se altera, mas Tombali aumenta um pouco e ultrapassa Cacheu.

E, em face dos dados assim obtidos,  e tendo em conta que a maior parte dos desertores, de acordo com as informações, eram originários de (ou dirigiram-se a) o sul, neste caso  a região de Tombali, a conclusão que talvez se pode tirar, na minha opiniao, é a de que havia maior probabilidade de que estas deserçoes tenham acontecido no Bigrupo de Cambano Mané onde a percentagem de combatentes originários desta região é superior a 26%, enquanto o Bigrupo de Ansu Bodjam era formado maioritariamente por naturais de Óio (74% com a correcçãoo que fiz do primeiro quadro de análise).

Em leituras que fiz em tempos das obras de Amílcar  Cabral e relacionadas com o flagelo das deserções (do norte para o sul), parece que existia no seio dos combatentes o sentimento de maior segurança quando lutavam nas suas regiões  de origem ("chãos") e, inversamente, alguma insegurança e fragilidade quando eram obrigados a combater noutras regiões e o caso mais paradigmático aconteceu com os Balantas do Sul (Tombali) que, tudo leva a pensar, não se sentiam muito à vontade nas outras frentes da luta. o que o partido tentava contrariar com medidas duras como era seu apanágio.

Não sei se chegou a haver fuzilamentos mas, pelo menos, falava-se em tomar medidas duras e, sabe-se hoje o que é que, na linguagem da guerrilha e do PAIGC em particular, isso podia dar.

Por outro lado e reportando-nos ao acontecimento aqui relatado com os elementos da companhia dos Manjacos no Óio (Mansabá?), parece que a situação não era muito diferente do lado dos elementos nativos do Exército português. 

Há um provérbio africano que diz que "todos os cães podem ser bravos, mas são mais bravos dentro das suas moranças", o mesmo que dizer, dentro dos seus "chãos"...

Com um abraço amigo,

Cherno Baldé

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Nota do editor: