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quarta-feira, 2 de abril de 2025

Guiné 61/74 - P26640: A cidade ou vila que eu mais amei ou odiei, no meu tempo de tropa, antes de ser mobilizado para o CTIG (35): Elvas... Oh!, Elvas, oh!, Elvas, Badajoz à vista! (Mário Fitas)




Elvas > março de 2014 > Antiga Sé Catedral e praça da República

Foto (e legenda): © Luís Graça (2014). Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Do Alentejo à Guiné: putos, gandulos e guerra > VI - Por Terras de Portugal: Tavira, Elvas, Lamego, Oeiras...

Elvas (pp. 29-30)


por Mário Vicente



O Mário Fitas, março de 2016, Magnífica Tabanca da Linha,  Oitavos, Guincho, Cascais. 
Tem 165 referências no nosso blogue.



Oh Elvas! Oh Elvas! Badajoz à vista!.

Velha praça cer­cada de belas e antiquíssimas muralhas, sua segunda terra, aqui veio parar (recordar Vagabundo. Voltou a casa de seus tios, voltou a casa de seus segundos pais, vivendo)

Torna a subir ao fortim da Srª. da Conceição. Entra na capela e contemplativo, olha para a imagem da Santa e vê quão diferente se tornou, desde os tempos de estudante quando por ali passava. É gratificante por vezes ficarmos assim sós e repensar tudo o que se passou regredindo, ou sonhando tentando na futurologia adivinhar o amanhã.

Como antigamente, sobe às ameias, por sobre as muralhas da Cisterna e do Jardim das Laranjeiras, revê as eiras onde tantas vezes jogou futebol. Espraiando a vista pela cidade, fica tempos deliciando-se com os píncaros das igrejas e as pontas do forte de Santa Luzia em cujas grutas com Picolo, Orelhas de Camurça e outros, caçavam morcegos.

Alongando mais a vista pela planí­cie, extasiava-se vislumbrando lá longe o fio de prata do Guadiana. Desce pela muralha, pára na velha Cisterna que resistente, continua a dar de beber à cidade. Revê a fonte ao fundo da rua dos Cavaleiros e o recanto onde tantas vezes jogou ao berlinde com Picolo. Vê a porta velha e os degraus da casa do Tio Pinga, e tem saudades dos seus tremoços. Enquanto desce até ao jardim das Laranjeiras, vai recordando os pregões típicos:

– Queijo assente Requeijão! Oh queijo assente!....

– Água da Plata, água fresquinha!...

–  Quem qué boiinhas, há bolo fesquinho, Caramelo americano!... Arvelhana torradinha… Chora minino chora qui o Rodas si vai embora!...

Relembra outros tempos de infância, e tantas figuras típicas desta sua segunda terra. Zé da Lorca, Tio Pinga, Isidro, Alcides e a sua galinha debaixo do braço, o Ica do Monte, o tio Rodas, o Matias à frente da Banda 14 de Janeiro, lançando fo­guetes em tardes de Pendões, a Sali Pompa na garagem do Painho, levantando as saias para a estudantada dar um tostão, e outros tantos mais, pessoas simples, desta maravilhosa cidade.

Que saudades!... Pontapeando as pedrinhas que encontrava, dava a volta até entrar novamente lá em cima nas Portas da Esquina e aí, então, admirava a magnificência do Aqueduto da Amoreira feito a custas do povo, pagando o selo real de imposto durante três gerações.

Demoradamente olhava!... por detrás do horizonte, sentia a sua terra e as terras do lado do norte. Endurecido resis­tia, mas no coração tinha um "bypass" não na veia mas de gra­vação: Tânia.

No fosso das velhas muralhas, tendo como fundo o belo Forte da Graça, os recrutas são ensinados, de uma forma humana e preparados para a guerra. Não é necessário tratá-los como animais. Há sã convivência e respeito mútuo. O pelotão tem como instrutores João Bar, Vagabundo e João Uva, que formam o trio "Locos". O pessoal pode rir quando a "égua" Luz aparece na muralha e João Bar alerta o cabo Monforte. Este raspa as botas da tropa na terra transformando-as em cascos e relincha como um garanhão com cio, enquanto a "égua" Luz se desmancha toda e bamboleia o traseiro.

O Tlinta e Tlês é aplaudido, quando se baba todo como um chibo, ao perder a virgindade com vinte anos. O trio paga todas as despesas da festa, e o Tlinta e Tlês quer mais! Faça-se a sua vontade, e a malta bate palmas e dá vivas ao herói nas casas próximo do Castelo.

Nandinha! Sempre atenciosa e fogosa, foram tão simpáticas as noites e os momentos na tua casa. Nunca pensei que o João Uva ganhasse a aposta.

O trio não pára, de mota ou carro. Nos arredores da própria cidade, não há poiso certo. Os três são adorados pelos soldados básicos, na maioria do Baixo Alentejo. Não conseguem dar resposta aos convites para festins e patuscadas. Derivado dos transportes e ligações para as suas terras, toda a gente vai de fim-de-semana, com ou sem dispensa assinada, não interessa pois o código de honra é que manda. Segunda-Feira de manhã todos têm de estar presentes na chamada do pequeno-almoço. Não houve uma única falta em dezenas de homens! Felizes ficavam João Bar, Uva e Vagabundo.

Retorna a terras do norte mas clandestinamente. Fala sobre Tânia, mas mantêm-se firme. Os "Locos" mantêm-se unidos e convivem com as professoras de terras do Norte. Voltam os convívios com as miúdas da sua EICE - Escola Industrial e Comercial de Elvas. Os três entram nas brincadeiras. Há uma professora que se vê atrapalhada com as armadilhas, mas tudo na sã convivência. A professora cai no ardil montado pelo trio. As bonecas para a Mariazinha, pederasta, soldado lerdo das ideias e com a mania que era mulher, eram executadas na pró­pria aula da Formação Feminina com conhecimento da professora.

No Luso colégio das freiras, Vagabundo arranja uma "girl friend".

– Fomos loucos, não fomos, Tuxa? Mas com a ajuda da Gény foram tempos agradáveis!

Tinha de resistir aos ventos que sopravam dos lados do Norte, que tomavam o coração tão fraco, tão fraco, que a luz da candeia de ténue chama de resistência, várias vezes tremeu e o enfarte do miocárdio esteve eminente.

– Atenção cabo miliciano Vagabundo, tem uma chamada telefónica!

– Atenção cabo miliciano João Uva, tem uma chamada telefónica!

– Atenção alferes miliciano João Bar, tem uma chamada telefónica!

Os microfones do BC 8 ecoavam pelo quartel. Os sargentos Correeiro e Serralheiro, nas suas oficinas comentavam:

– Lá estão eles outra vez! Passam mais tempo ao telefone do que a dar instrução. Juntou-se ali uma trempe e peras! Não param na “canastra”. E depois o capitão ainda lhes dá apoio!... Deram volta aos soldados, mas pelo menos aqui anda tudo cer­tinho. Vá lá a gente entender estas coisas?!...

Loucuras de Vagabundo, sã amizade:

Cély, foste simplesmente impecável, obrigado pela canção com o nome de Vagabundo. Foste recordada nos dias tristes de solidão e guerra.

Teresinha da Praia, porquê?! Deliciosos tempos de gandulo, maravilhosos já de Vagabundo, fiquei em dívida para contigo por aquele lenço perdido no Circo.

Tuxa! criança das loucuras! As contas dos bilhetes do cinema ficaram certas? Perdi-te a pista nas areias da Costa da Caparica. Fizeste bem em teres efectuado a substituição logo a seguir. A vida de Vagabundo também não valia muito.

Bons momentos, mas que iam cavando mais fundo a fossa em que o militar se afundava. A vida não pára e mais uma instrução básica, agora com o con­terrâneo e amigo Zé Luís, do Rossio de Cima como aspirante miliciano a comandar o pelotão. Belos tempos!...

Este cabo miliciano tem boa pele para se lhe tirar, por­tanto o melhor é mandá-lo para Lamego para as Operações Especiais. Vai dar um bom Ranger. Segue as pegadas de João Uva que já tinha partido.

(Contimnua)

(Seleção, revisão / fixação de texto para efeitos de publicação deste poste no blogue: LG)




Capa do livro (inédito) "Do Alentejo à Guiné: putos, gandulos e guerra", da autoria de Mário Vicente [Fitas Ralhete], o nosso querido camarada Mário Fitas, ex-fur mil inf op esp, CCAÇ 763, "Os Lassas", Cufar, 1965/67, e cofundador e "homem grande" da Magnífica Tabanca da Linha, escritor, artesão, artista, além de nosso grã-tabanqueiro da primeira hora, alentejano de Vila Fernando, concelho de Elvas, reformado da TAP, pai de duas filhas e avô.

Esta edição é uma segunda versão, reformulada, aumentada e melhorada, do livro "Putos, gandulos e guerra" (edição de autor, Estoril, Cascais, 2000, com apop da Junta de Freguesia de Vila Fernando, 174 pp.,).

A nova versão  (2010, 99 pp.) já foi reproduzida no nosso blogue. Tem prefácio do nosso camarada António Graça de Abreu.


Elvas > Março de 2024 > O Forte de Santa Luzia


Elvas > Março de 2024 > O Forte da Graça

Fotos (e legendas): © Luís Graça (2014). Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


2. Comentário do editor LG:

Em 2014 lançámos esta série, "A cidade ou vila que eu mais amei ou odiei, no meu tempo de tropa, antes de ser mobilizado para o CTIG"... Ao fim de uma dezena de anos, já temos os depoimentos de mais de três dezenas de camaradas, alguns infelizmente já falecidos (como o Veríssimo Ferreira,  o Vasco Pires, o António Eduardo Ferreira, o  José Manuel Dinis)...

 Aqui ficam os seus nomes, por ordem cronológica de publicação do poste (entre parênte4ses o número do poste):

José Martins (1, 19) | Carlos Vinhal (2) | António Manuel C. Santos [Tomanel] (3) | António Graça de Abreu (4) | Luís Nascimento (5) | Manuel Amaro (6) | Veríssimo Ferreira (7) | José Colaço (8) | Fernando Gouveia (9) | Juvenal Amado (10) | Vasco Pires (11, 15) | António Eduardo Ferreira (12) | Francisco Bapatista (13) | Veríssimo Ferreira (14) |! Manuel Luís Lomba (16) | Mário Miguéis (17,22) | Henrique Cerqueira (18, 21, 27) | Hélder Sousa (23, 32) | José Manuel Dinis (24) | Jorge Picado (24A) | César Dias (25) | Luís Graça (25A) | Augusto Silva Santos (26) | António J. Pereira da Costa (28) | Paulo Rapos0 (29) | António Tavares (30) | Manuel Traquina (31) | | José Saúde (33) | Mário Fitas (34, 35) |

Observ - Houve algunds erros na numeração dos postes... 

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Nota do editor:

Último poste da série > 1 de abril de 2025 > Guiné 61/74 - P26637: A cidade ou vila que eu mais amei ou odiei, no meu tempo de tropa, antes de ser mobilizado para o CTIG (34): Tavira... Nem bom cavalo, nem bom soldado! (Mário Fitas)

segunda-feira, 1 de julho de 2019

Guiné 61/74 - P19935: (De)Caras (131): Um ninho de "lacraus", em Espinho, Silvalde, fevereiro de 1969, na véspera de partida para o CTIG (Valdemar Queiroz / Abílio Duarte, CART 2479 / CART 11, 1969/70)


Espinho > Silvalde > Fevereiro de 1969 >  CART 2479 / CART 11 >   IAO, Instrução de Aperfeiçoamento Operacional >  Uma "foto histórica" um "ninho" de lacraus, designação do pessoal da futura  CART 11 (Contuboel, Nova Lamego, Piche)

CART 2479 constituiu-se no RAL 5 em Penafiel, no ano de 1968, como subunidade do BART 2866, desmembrando-se desta unidade em fevereiro de 1969, e embarcando com destino à Guiné no dia 18, aonde chegou a 25 do mesmo mês. O  percurso operacional da CART 2479 na zona leste, foi longo, fixando a sua sede em Nova Lamego, no Quartel de Baixo em setembro de 1969; passou por Bissau, Contuboel, Nova Lamego,  Piche; o comandante era o cap mil art Analido Aniceto Pinto (1934- 2014) (trabalhou na Galp Energia); foi extinta em 18 de janeiro de 1970, passando a companhia a designar-se CART 11; em maio de 1972 a CART 11 passou a designar-se CCAÇ 11. No CIM de Contuboel, no 1º e 2º trimestre de 1969l formaram-se, entre outras, as futuras CART 11 / CCAÇ 11 e CCAÇ 12-

Na foto, e graças aos contributos do Valdemar Queiroz  e do Abílio Duarte (*), podemos identificar os seguintes 1ºs cabos milicianos (futuros furriéis milicianos. "Lacraus" da CART 2479 / CART 11), da esquerda para a direita:

(i) na primeira fila, Manuel Macias (8), Pechincha (que era de operações especiais) (7), Abílio Duarte (5) e Aurélio Duarte (, de Coimbra, falecido em 2015);

(ii) na segunda fila, Canatário (que era apontador de armas pesadas) (9); o Ferreira (vaguemestre) (10);  o Cândido Cunha (3)") (**) ; e o Abílio Pinto (11);

(iii) na terceira fila,  o Vera Cruz ("este rapaz era um tratado a jogar á lerpa, bons momentos, muito stressado, mas com saída com as miúdas na Guiné"(13); e o Renato Monteiro (2):

(iv) na última fila,  o Bento (14), o Sousa (, já faelcido (4), (14) e o "indomável Valdemar Queiroz da Silva, grande contador de histórias" (1). (***)

 "Todos duma excecional colheita de bioxene", garante o Valdemar.  "Na foto faltam os restantes da colheita, os ex-fur.mil. Pais de Sousa (Mecânico), Silva (Transmissões) e Edmond (Enfermeiro).!

Foto (e legenda): © Valdemar Queiroz (2014). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar. Blogue Luís Graça & Camaradas da Guine.]
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Notas do editor:

(*) Vd. postes de:

 16 de abril de 2014 > Guiné 63/74 - P12992: Memórias de um Lacrau (Valdemar Queiroz, ex-fur mil, CART 2479 / CART 11, Contuboel, Nova Lamego, Canquelifá, Paunca, Guiro Iero Bocari, 1969/70) (Parte XII): O Cunha, único até hoje, o fur mil Cândido Cunha... Ou Cor mil Lukas Títio, o antitropa...

2 de junho de 2015 > Guiné 63/74 - P14690: Cartas de amor e guerra (Renato Monteiro, ex-fur mil, CART 2479 / CART 11, Contuboel, Nova Lamego e Piche, 1969/70; e CART 2520, Xime, 1970) (Parte II): anti-herói

(**) Vd. poste de 28 de outubro de 2011 > Guiné 63/74 - P8956: O Nosso Livro de Visitas (118): Cândido Filipe da Cunha, ex-Fur Mil da CART 11 (CART 2479) (Canquelifá)

(...) Comentário, ao poste P 12992,  de Jaime Cunha, filho de Cândido Cunha, em 9/12/2015: quando era, presumimos, soldado do Regimento de Comendos:

(...) "Poderia ler este texto sem fazerem referência a quem seria, que iria sempre reconhecer que era do meu pai de que falam.... porque até eu próprio identifico me no que vejo. É uma enorme honra saber que assim recordam o meu pai, e de que,  apesar dos anos que passaram, manteve se como o grande homem que assim é retratado.... Muitas vezes o meu pai recorda os bons momentos que passaram por lá, guardando para si os maus momentos....

"Um grande abraço também deste vosso camarada, aos verdadeiros Heróis de Portugal Jaime Cunha sold rc " (...)

(***) Último poste da série >  22 de maio de 2019 > Guiné 61/74 - P19814: (De)Caras (106): João Crisóstomo, o luso-americano que vem de propósito de Nova Iorque para estar com os seus antigos camaradas de armas, em Monte Real, no dia 25, sábado... Entretanto, tarda o reconhecimento, público, do seu país de origem, pela seu ativismo cívico e social na diáspora lusitana...

segunda-feira, 23 de maio de 2016

Guiné 63/74 - P16123: O segredo de... (28): Domingos Ramos e Mário Dias, dois camaradas e amigos da recruta e do 1º CSM (Bissau, 1959), que irão combater em lados opostos... No último trimestre de 1960, Domingos Ramos terá sido vítima do militarismo e racismo de um oficial português quando foi colocado no CIM de Bolama, como 1º cabo miliciano

1. Já aqui publicámos um dos textos mais notáveis do blogue, daqueles que terão, obrigatoriamente, de figurar na antologia dos 100 melhores postes da Tabanca Grande  que um dia, se houver tempo, pachorra e saúde,  ainda haveremos de organizar... Referimo-nos ao poste P3543, de 30/11/2008, do nosso camarada e grã-tabanqueiro da primeira hora  Mário Dias (1).

Mário [Roseira] Dias  [, foto de 2005, à direita, ] foi para a Guiné no início dos anos 50, ainda adolescente, tendo assistido à modernização e crescimento de Bissau, capital da Província desde 1943... Conheceu Domingos Ramos, de que se vai tornar amigo, na recruta e depois no 1º Curso de Sargentos Milicianos [CSM], que se realizou na Guiné, em 1959,


[foto à esquerda, efígie de Domingos Ramos em nota de 100 pesos, emetida em 1990, pelo Banco Centreal da Guiné-Bissau]



Como é sabido, o Domingos [Gomes Ramos tornar-se-ia um dos nomes míticos da fase inicial da guerrilha do PAIGC, sendo comnhecido pelo seu nome de guerra, "João Cá".  Este CSM  acabaria, de resto, por ser um alfobre de quadros... para o PAIGC.

Segundo o próprio Mário Dias nos conta (2), o Domingos Ramos era filho de um quadro local da administração colonial portuguesa, com o estatuto de assimilado,  ou seja, já não era um indígena.

Mário Dias sugere que ele ter-se-á alistado nas fileiras do PAIGC, em novembro de 1960, depois de ter sido vítima de uma grave injustiça enquanto 1º cabo miliciano, colocado no Centro de Instrução Militar (entretanto transferido de Bissau para Bolama).

Os dois amigos seguirão  caminhos diferentes: Mário Dias será um dos fundadores da CCmds da Guiné e é combatente no CTIG (até 1966),  seguindo depois para Angola, como sargento do quadro permanente,  não sem antes ter estado frente a frente com o seu antigo camarada e amigo, em meados de 1965, nas matas do Xitole, na zona entre Amedalai e os rápidos de Cussilinta, perto da estrada Xitole-Aldeia Formosa-Mampatá...

Vale a pena reler o segredo que o Mário guardou durante anos e revelou, em primeira mão, aqui no nosso blogue, aos seus amigos e camaradas da  Guiné (1). Um ano e poico depois o Domingos Ramos morreria, em combate, em Madina do Boé, em 10 de novembro de 1966 (3). A sua perda foi particularmente por Amílcar Cabral.

O Mário, grande português e um homem de invulgar nobreza,  tem palavras de grande apreço e admiração pelo Domingos Ramos. Diz ele:

"Se um dia tiver a oportunidade de regressar à Guiné, é meu firme propósito ir visitar a sua campa e prestar-lhe merecida homenagem. Não é pelo facto de termos combatido em campos opostos que deixei de ser seu amigo e de o admirar".

Por tudo isto, estes dois homens merecem ser aqui lembrados: um já morreu sem ter podido partilhar  o seu segredo com o seu antigo camarada e amigo (e sobretudo confirmar a sua versão dos factos, passados em Bolama).

O que se passou, realmente, em Bolama, por volta de outubro de 1960 ? Domingos Ramos, segundo se depreende do testemunho (insuspeito) de Mário Dias,  terá sido  vítima do militarismo e do racismo de um oficial português, ao punir o 1º cabo miliciano Ramos com vários dias de prisão.


2. O segredo de... Domingos Ramos

por Mário Dias


Foto nº 1 > Guiné > Bissau > Centro de Instrução Civilizados (CIC) > Maio de 1959 > Recruta >  "Eu, Domingos Ramos e outros"...

 Texto e fotos: © Mário Dias (2006). Todos os direitos reservados


Manhã de 8 de Maio de 1959. Na parada do quartel da Bateria de Artilharia de Campanha [BAC] em Bissau, Santa Luzia, defronte ao que viria a ser o QG [Quartel General], mancebos agrupavam-se segundo indicações de alguns oficiais e sargentos e preparavam-se para iniciar a sua vida militar. Eu era um deles. Com receio, mas também com alguma expectativa pelo que iria acontecer.

Foi nas instalações desse quartel que funcionou pela primeira vez uma escola de recrutas seguida de um CSM [ Curso de Sargentos Milicianos ] para europeus e guineenses considerados civilizados ou assimilados, já com formação escolar de, pelo menos, o 2º ano do liceu, na época chamado 1º ciclo liceal.

Até essa data, a recruta era separada e, sendo os europeus um pequeno número que não justificava uma incorporação anual, iam ficando esperados alguns anos e, quando havia suficientes mancebos para formar um ou mais pelotões, realizava-se a recruta que tinha lugar em Bolama. Portanto, esta incorporação de 1959, foi a primeira na Guiné que juntou europeus e africanos.

Curiosamente, a unidade chamava-se Centro de Instrução de Civilizados (CIC) por se destinar a africanos considerados civilizados [ou assimilados]. O comandante era o capitão Teixeira, pai do conhecido historiador Nuno  Severiano Teixeira (4). Nos anos seguintes, talvez devido ao caricato da designação, passou a chamar-se Centro de Instrução Militar (CIM) e foi transferido para Bolama.


Foto nº 1 A

Foto nº 1 B
Aqui está o 1º pelotão do CIC da incorporação de 1959 em Bissau [Foto nº1]. Eu estou à esquerda, na 3ª fila (de óculos) [Foto nº 1 A]. Uma pequena chamada de atenção para o facto de os homens situados à esquerda do pelotão serem europeus. Tal não se deve a qualquer espécie de discriminação ou elitismo. Aconteceu que, formando-se, como sabem, por alturas, nós, os tugas, éramos os mais pequenos. Dos elementos africanos, alguns foram para o PAIGC após a passagem à disponibilidade. De entre eles, quero aqui destacar o Domingos Ramos (segundo à direita na fila de pé) [Foto nº 1 B].

O Domingos Ramos era um indivíduo bem constituído fisicamente e, sobretudo, moralmente. Aquilo que se pode chamar, um bom gigante. Desde o início da nossa vivência comum que por ele tive uma especial estima. Tornámo-nos bons amigos em todas as situações e na caserna, nas horas de descanso, trocávamos opiniões sobre os mais variados assuntos, com especial interesse da minha parte por tudo relacionado com os usos e costumes dos guineenses. Muito aprendi com ele. Recordo ainda com saudade e emoção as paródias, próprias da irreverência da nossa juventude. E da célebre água pú que ele me ensinou e a que aderi com entusiasmo.

Eu explico: Água pú era uma bebida/comida energética, fácil de fazer, fruto do desenrascanço e instinto de sobrevivência dos africanos e que eu desconhecia. Trata-se de um tigela ou caneca com água onde se dissolve açúcar, quanto mais melhor, e nessa calda se vão molhando pedaços de pão quase como se de açorda se tratasse.

Que bem que sabia! Fiquei cliente viciado desde a primeira vez que, pela mão do Domingos Ramos provei. No final da 3ª refeição, metíamos no bolso (à socapa) o casqueiro sobrante que guardávamos no armário da caserna onde, para o efeito, não faltava o respectivo açúcar. Saída para Bissau - as garotas ou bajudas estavam à espera - e, após o recolher, lá íamos repor energias com a água pú. Mal o sargento de dia dava a ordem de destroçar, era uma correria, direitos aos armários gritando com todo o entusiasmo: Água púuuuu…

Nesse ambiente de sã camaradagem se passou o tempo até ao juramento de bandeira que teve lugar em 10 de agosto de 1959, alguns dias após os célebres acontecimentos do Pidjiguiti (5). Terminada a recruta, teve início a 14 de agosto de 1959 o 1º Curso de Sargentos Milicianos (CSM) que houve na Guiné. Nesta fase, já que os instruendos do CSM eram menos que durante a recruta (alguns foram para a Escola de Cabos e outros ficaram como soldados),  os nossos laços de amizade estreitaram-se ainda mais.


Foto nº 2

Guiné > Bissau > 1959 > 1º Curso de Sargentos Milicianos (CSM) > Instruendos do  CSM / 59  . Em baixo, a partir da esquerda, : eu [, Mário Dias, de óculos]; Domingos Ramos apontando a velha Mauser; Pinhel; Orlando; e Laurentino Pedro Gomes [que, tal como eu, após passagem à disponibilidade, regressou ao serviço como furriel do quadro, seguindo a carreira milita; segundo me disseram, faleceu num acidente de viação nas proximidades de Cacheu já depois da independência].

De pé, também a partir da esquerda, está um (não me lembro o nome) que veio a ser professor de trabalhos manuais no liceu de Bissau; a seguir o Telmo que acabou por se formar em economia e já faleceu; o Armindo Birges; depois é o alferes Vigário, um dos nossos instrutores que viria a falecer em combate em Angola; segue-se o Coelho, exímio acordeonista, sobrinho de um conhecido comerciante de Cacine e que acabou emigrando para o Brasil; finalmente o 1º cabo Cerqueira, que já pertencia ao Quadro Permanente [QP] e que fez o CSM para obter condições de promoção a furriel.


Foto nº 3

Guiné > Bissau > 1959 > 1º Curso de Sargentos Milicianos (CSM)> O Domingos Ramos montando a tenda... Aqui está o Domingos Ramos nos exercícios finais do CSM (semana de campo), atarefado na montagem da barraca que era feita com 3 panos de tenda ligados entre si por botões metálicos.n Certamente que alguns tertulianos se recordam deste primitivo sistema. A fotografia não tem grande qualidade mas não deixo de mostrá-la, por se tratar de uma pessoa que muito estimei.


Foto nº 4

Guiné > Bissau > 1959 > 1º Curso de Sargentos Milicianos (CSM)> O Domingos Ramos na Semana de Campo... Aqui, como se pode ver pelos apetrechos que levam nas mãos (cantil e marmita) iam a caminho do carro que nos trazia o almoço durante a semana de campo. O Domingos Ramos é o segundo da direita.

O CSM terminou 28 de novembro [de 1959] e a 29 fomos promovidos a 1ºs cabos milicianos que era uma forma de o regime de então poupar umas massas. Fazíamos sargentos de dia, frequentávamos a messe e tínhamos as responsabilidades inerentes mas… ganhavamos como cabos.

A seguir ao CSM, tivemos que dar uma recruta como monitores. Alguns, entre os quais o Domingos Ramos, foram colocados para o efeito em Bolama, ficando outros, como eu, em Bissau. Creio que algo se passou em Bolama que o tornou permeável aos apelos do PAIGC e o levou a aderir à luta. Na verdade, enquanto com ele convivi em Bissau, nem o mais leve indício de descontentamento, nem o mais pequeno sinal de revolta ou discordância com o status quo existente demonstrou. Se algo havia na sua mente, disfarçava muito bem, o que não creio, dada a sua rectidão de carácter.

O mesmo já não se passava com outros como, por exemplo, o Rui Demba Jassi, que tinha atitudes incorrectas para com os europeus sem que houvesse razões para tal e não conseguia disfarçar animosidade contra nós. Este Rui Jassi era filho do capitão de 2ª linha Jassi que morava no lado direito da estrada de Santa Luzia, perto da capela aí existente. Era uma figura incontornável nas cerimónias e festividades às quais comparecia orgulhosamente com a sua farda branca. Quando soube que o filho tinha passado para o PAIGC, segundo constava, dizia que oferecia tudo quanto tinha a quem lhe trouxesse o seu cadáver. Talvez isto não passe de mais uma das muitas lendas que se foram gerando.

Mas, regressando ao Domingos Ramos, tema principal desta minha intervenção, creio que foi um acontecimento em Bolama que o fez mudar de ideias. Um dia, já próximo da nossa passagem à situação de licença registada, que ocorreu em outubro de 1960, seguindo-se a disponibilidade em fevereiro de 1961, o Laurentino [Pedro Gomes] mostrou-me uma espécie de memorando que o Domingos Ramos havia escrito em Bolama,  respeitante a uma tremenda injustiça por parte de um superior hierárquico que o levou à prisão durante uns dias.

Foi uma daquelas situações tão frequentes, infelizmente, na vida militar que levam a que muitos inocentes sejam punidos apenas porque a corda parte sempre pelo lado mais fraco e a máxima de que "palavra de oficial faz fé" é uma realidade. Nesse memorando, era bem patente o desgosto que ele sentia por ter sido vítima de tal injustiça e, mais do que um desgosto, notava-se o destruir das convicções que até ali o tinham norteado.

E foi isso, creio, que o levou a juntar-se ao PAIGC. Nos primeiros dias de novembro [de 1960], juntamente com o Rui Jassi, Constantino Teixeira e outros cujos nomes já não me ocorrem, partiu para Pequim, Praga, Moscovo e demais escolas de guerrilha tornando-se um dos primeiros e mais importantes chefes de guerrilha daquele movimento.

Morreu em combate num dos ataques ao quartel de Madina do Boé onde está sepultado. Se um dia tiver a oportunidade de regressar à Guiné, é meu firme propósito ir visitar a sua campa e prestar-lhe merecida homenagem. Não é pelo facto de termos combatido em campos opostos que deixei de ser seu amigo e de o admirar.



Foto nº 5

Guiné > Bissau > 1959 > 1ºs Cabos Milicianos Mário Dias, Domingos Ramos e outros...
 De cócoras, a partir da esquerda: Domingos Ramos; um outro cujo nome não me lembro mas que também foi para a guerrilha; e depois o Laurentino Pedro Gomes. De pé: não me recordo o nome mas também foi para a guerrilha; Garcia, filho do administrador Garcia, muito conhecido e estimado em Bissau; mais um de cujo nome não me recordo; eu [, Mário Dias]; e mais outro futuro guerrilheiro.

Foto nº 6

Guiné > Bissau > 1959 > O 1º Curso de Sargentos Milicianos foi uma alfobre de quadros para o PAIGC... Alguns dos outros que foram meus camaradas na recruta. De poucos nomes me recordo mas muitos também foram guerrilheiros. Dos dois que estão mais altos, o da direita é o Constantino Teixeira, mais conhecido por Chucho ou Axon, que foi igualmente figura importante do PAIGC. Chegou a ser ministro da segurança interna, salvo erro, no tempo imediatamente a seguir à independência. Apareceu, algum tempo depois, morto dentro do carro numa rua de Bissau. Daquele gordinho de óculos escuros que está com a mão no bolso da camisa, só me recordo da sua alcunha que era Diblondi. O porquê de tal alcunha, não sei. Peço desculpa por omitir tantos nomes, embora me lembre das pessoas. Nunca tive o cuidado de ir anotando os acontecimentos nem de escrever no verso das fotos os nomes das pessoas. Péssimo hábito de que agora me arrependo.

Foto nº 7

Guiné > Bissau > 1959  > O meu pelotão de recrutas africanos, de pé descalço...

Termino com esta foto [nº 7] dos meus primeiros recrutas porque ela constitui o testemunho de um facto que, possivelmente, muitos desconhecem e outros certamente acham impossível se apenas contado. Reparem bem nestes soldados indígenas na Guiné em 1959. É isso mesmo que estão a ver: descalços.

Era assim que faziam toda a recruta e só depois de prontos lhes eram distribuídas as botas. Dizia-se que eles preferiam andar descalços. Mesmo sendo verdade, e muitos de nós se devem lembrar que, de facto, o andar descalço era um hábito muito arreigado, não se justifica e é humilhante que soldados assim andassem. (6)

Mário Dias
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Notas do editor:

(1) vd. poste de 30 de novembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3543: O segredo de ... (1): Mário Dias: Xitole, 1965, o encontro de dois amigos inimigos que não constou do relatório de operações

(...) De repente, ouvimos pessoas a conversar e o ruído característico de movimentação. Querendo observar melhor o que se estava a passar, ergui-me acima do arbusto que me ocultava. Foi então que aconteceu. Do outro lado, a cerca de vinte ou trinta metros, um vulto se ergueu também e olhou na minha direcção. Espanto dele! Espanto meu! Era o Domingos Ramos.

Ficámos ambos como petrificados. Não falámos, apenas nos limitámos a sorrir e houve como que uma espécie de telepatia. Mas, mesmo sem falar, as expressões de contentamento de ambos (espero que ele tivesse entendido que também eu estava contente com o inesperado mas feliz encontro) tornaram mágicos aqueles breves momentos que jamais esquecerei.

Mas era preciso regressar à terra. De imediato ouvi as suas ordens:
- Nó bai, nó bai -. E internou-se ainda mais, desaparecendo na densa mata. Voltei para trás, para junto do resto do grupo:
- Não há problema. Era um pequeno grupo mas já fugiram.

E continuámos a patrulha sem mais percalços. Claro que este episódio não constou do relatório. (...)


(2) Vd. 1 de fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - P474: Domingos Ramos, meu camarada e amigo (Mário Dias)

(3) Domingos Ramos,  morto em Madina do Boé em 10 de novembro de 1966, é um herói nacional da Guiné-Bissau, figurando em notas de banco (por exemplo, de 100 pesos, emissões de 1975 e 1990), nomes de ruas e instituições de ensino... Foi um dos pioneiros da luta de libertação, sob a liderança de Amílcar Cabral. Tinha também um irmão na guerrilha, Paulo Ramos.

Vd. referênciaa ao Domingos Ramos no postes:

22 de Julho de 2005 > Guiné 63/74 - P119: Antologia (10): Dossiê Guiné (Vida Mundial, 1971) (conclusão) (A. Marques Lopes)

12 de dezembro de 2007 >  Guiné 63/74 - P2343: PAIGC - Quem foi quem (5): Domingos Ramos (Mário Dias / Luís Graça)

(4) Henrique Nuno Pires Severiano Teixeira: é um académico e político português. Professor catedrático (Departamento de Estudos Políticos da Faculdade de Ciências Sociais da Universdiade NOVA de Lisboa) , é também vice-reitor da mesma instituição. Dirige o Instituto Português de Relações Internacionais. Nasceu em Bissau em 5 de novembro de 1957. Ministro da Administração Interna no XIV Governo Constitucional, dirigido por António Guterres, de 14 de setembro de 2000 a 8 de abril de 2002; e ministro da Defesa Nacional no XVII Governo Constitucional, com José Sócrates como primeiro ministro (de 12 de março de 2005 a 26 de outubro de 2009).  É autor, entre diversas obras, da Nova História Militar de Portugal, 5 Volumes (Lisboa: Círculo de Leitores, 2003-2004).

(5) Local do porto de Bissau onde, a 3 de Agosto de 1959, na sequência da repressão de um conflito laboral (uma greve de marinheiros, estivadores e outros trabalhadores portuários, reivindicando aumentos salariais e melhores condiçõs de trabalho), terá morrido um número nunca rigorosamente determinado de mortos e feridos. Estes acontecimentos foram habilmente explorados por Amílcar Cabral, passando a efeméride a ser considerada pelo PAIGC como o início (oficial ou oficioso) da luta de libertação da Guiné.

Vd. poste de 2 de junho de 2009 > Guiné 63/74 - P4452: Controvérsias (19): O 'massacre do Pidjiguiti', em 3 de Agosto de 1959: o testemunho de Mário Dias

(6) Último poste da série > 3 de outubro de 2015 > Guiné 63/74 - P15192: O segredo de ... (27): A minha prenda de Natal de 1963: a destruição de Sinchã Jobel, com o meu engenhoso fornilho montado numa mala de cartão... (Alcídio Marinho, ex-fur mil at inf MA, CCAÇ 412, Bafatá, 1963/65)

quarta-feira, 16 de março de 2016

Guiné 63/74 - P15862: Fotos do álbum da minha mãe, "Honra e Glória" (Abílio Duarte, ex-fur mil, CART 2479 / CART 11, Nova Lamego e Paunca, 1969/70) - Parte I



Foto nº 1  > Capa do álbum da minha saudosa mãe, "Honra e Glória"



Foto nº  2  > O meu saudoso pai, militar do Regimento de Infantaria de Lisboa, 1943-45


Foto nº 3 >  A foto da ordem, com a farda emprestada... [A farda nº 1...]



Foto nº 4 > Recruta nas Caldas da Rainha [, em farda nº 3, no RI 5, que faz hoje 42 anos que se revoltou,...]



Foto nº 5 > Juramento de bandeira [, no RI 5, Caldas da Rainha]



Foto nº 6 > Em Vendas Novas, EPA [Escola Prática de Artilharia]



Foto   nº 7 >  Diploma do Curso de Minas e Armadilhas [, Escola Prática de Engenharia; nota, 79,8, "regular"]





Foto nº 8 >  Eu e o famoso e afamado Pechincha  [, do meu pelotão, fur mil op esp, desenhador na vida civil,,,]



Foto nº 9 > Eu [, à esquerda,]  com o fur mil Pais, numa jogatana, na nossa messe no Gabu [Nova Lamego], e o devido bioxene.







Foto nº 10 > Eu e o Pais, uns trinta anos depois






Foto nº 11 > Eu, o Pais e o Valdemar [Queiroz]


Fotos (e legendas): © Abílio Duarte (2016). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar. L.G.]


1. Mensagem, de 12 do corrente, do Abílio Duarte [, ex-fur mil, CART 2479 / CART 11, Nova Lamego, Paunca, 1969/1970]

Olá,  Luís,

Conforme teu pedido semanas atrás, aqui vão algumas fotos, que farás o favor de lhes dar o destino que entenderes, fui buscá-las a um Álbum, que a minha saudosa mãe criou com fotos que eu lhe enviava.

O interesse delas é relativo, tudo depende de quem as vê.

Nas mesmas vou pôr legendas, para melhor interpretação do seu significado.

Agradecendo desde já a tua paciência, daqui um grande abraço.

Abílio Duarte

2. Comentário do editor:

Obrigado, Abílio... Vamos publicar, numa série com o teu nome... Se quiseres, podes ir mandando pequenos textos, a partir das legendas (que são sucintas, mas nem sempre suficientes)... Quem disse que uma imagem vale por mil palavras, esqueceu-se dos cegos... São frases de senso comum, que vale pouco, como aquela, que costumávamos dizer e repetir em Bambadinca: Quem não sabe ler, que veja os bonecos... (Lembras-te, Tony Levezinho ?).

Todas estas fotos (mesmo as mais pessoais...) são preciosas, ajudando, em muito, a reconstrução do "puzzle" esburacado da nossa memória, da memória de toda uma geração que passou pela Guiné, entre 1961 e 1974... 

Mas é preciso "contextualizá-las"... Um ET, da geração dos nossos filhos, netos ou bisnetos, vai olhar para as tuas/nossas fotos como um boi para um palácio... Quem são esses gajos, em que época é que viveram, o que estavam para ali a fazer ?... Não havia telemóveis, ipads, tablets, PC, o Skype, nem sequer telefones!... Um homem podia estar (estava!) dois anos sem falar, "ao vivo", com a família e os amigos!... Tal como no tempo, 500 anos atrás, em que se ia à Índia e voltava (quando voltava!) dois anos depois... Havia, entretanto, uma coisa que se chamava "aerograma", inventada pelas senhoras do Movimento Nacional Feminino, e uma máquina montada pela tropa chamada "Serviço Postal Militar" (SPM)... Ajudaram a "encurtar" as distâncias, que o império, de dois mil quilómetros quadrados, era longe e largo...

Ao pores à nossa disposição algumas fotos que mandavas à tua mãezinha e que ela foi guardando e colando carinhosamente no seu álbum, prestas, a todos nós, um serviço altruista: ao vê-las, estamos a "avivar" as nossas próprias memórias individuais (e grupais): a tua história de vida é também a nossa. a de cada um de nós... Bem hajas!... Luís.

PS - Tens sabido do nosso comum amigo (, meu, de Bambadinca, teu, do BNU),  o José Carlos Lopes ? Ele tem um excelente album fotográfico... Fazia muitos "slides" e de boa qualidade... É meu vizinho (, eu moro em Alfragide). Mas não arranjo tempo para o ir visitar a Linda a Velha... Estive com ele cerca de 1 ano em Bambadinca... Ele, da CCS/BCAÇ 2852 (1968/70), eu, da CCAÇ 12 (1969/71)... Em tempos combinámos juntarmo-nos, eu, tu e ele... Vamos ver quando poderei ou quando poderemos juntarmo-nos, os três...

terça-feira, 8 de março de 2016

Guiné 63/74 - P15832: Controvérsias (130): O "nosso Cabo Miliciano", que em 1965 ganhava 90 escudos de pré (34,24 euros, hoje), fazendo o serviço de sargento... (Mário Gaspar)


Artigo do nosso camarada Mário Gaspar, publicado na revista da ADFA, "Elo", de 15 de janeiro de 2016. Foi-nos na mesma altura também enviado para publicação no blogue. Ficou em lista de espera... 

Achámos por bem publicá-lo agora, na nossa série Controvérsias (*)... Por curiosidade, o 1.º Cabo Miliciano em meados dos anos 60, no tempo do Mário Gaspar, ganhava 90 escudos de pré... Ficam os nossos leitores a saber quanto equivalia essa importância hoje, em euros, conforme o ano: em 1960, 38,72 €; em 1965, 34,24€; em 1970, 25,64 €; e 1974, 14,58 €... Já em tempos recuados o nosso camarada Libério Lopes escreveu um poste semelhante (**), nesta série (que tem tido pouco uso, ultimamente) ...

1. Mensagem,  com data de 20 de janeiro de 2016,  do Mário Gaspar,

[Foto à esquerda: Mário Gaspar, ex-Fur Mil At Art e Minas e Armadilhas da CART 1659, Gadamael e Ganturé, 1967/68; lapidor de diamantes, reformado; cofundador e antigo dirigente da APOIAR - Associação de Apoio aos Ex-Combatentes Vítimas do Stress de Guerra]

Camaradas,

Enviei este texto para o Jornal ELO, e foi publicado. Se considerar ser de publicar no Blogue podem fazê-lo

Mário Vitorino Gaspar
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Notas do editor:

(*) Último poste da série > 6 de dezembro de 2013 > Guiné 63/74 - P12402: Controvérsias (129): Pequena reflexão (António Matos)

(**) 26 de junho de 2009 > Guiné 63/74 - P4584: Controvérsias (26): Cabo Miliciano: Cabo, Sargento ou Soldado? (Libério Lopes)
(...) Dizia o Manuel Maia, há alguns dias, que o único país do Mundo onde existiu o posto de Cabo Miliciano foi em Portugal. E tem razão. Só em Portugal isso podia acontecer e foi devido à lucidez brilhante de um Ministro do Exército do Governo de Salazar que isto podia acontecer. Se não me engano foi o Santos Costa. Se não for, e se alguém souber ao certo quem foi, é bom transmitir a todos os camaradas para lhe prestarmos as nossas homenagens…

Foi um indivíduo inteligente ao tomar esta atitude, poupou milhões ao Estado, só que criou inúmeros problemas.

Com o vencimento de um soldado, tinha um Cabo a fazer um serviço de Sargento. É claro que alguns comandantes usavam e abusavam do seu poder discriminatório para rebaixar os Cabos Milicianos.

Fui Cabo Miliciano no Batalhão de Caçadores 6, em Castelo Branco, desde Janeiro de 62 a Abril de 63. Dei salvo erro três recrutas e, por falta de aspirantes muitas vezes comandámos pelotões de 100 recrutas.

Neste quartel aconteceram, com o comandante de então, coisas interessantes. Ao Cabo Miliciano era proibido frequentar o bar dos soldados, porque faziam serviço de Sargento. Só que os sargentos do QP não nos deixavam entrar no seu Bar.

Houve, inclusivamente, um Cabo Miliciano de Sargento de Dia ao Batalhão que, ao querer tomar café no Bar de Sargentos, durante a noite, foi posto na rua por um 1.º Sargento. Isto serviu para que os Cabos Milicianos se juntassem e conseguissem uma pequena sala onde se reuniam e tinham uma máquina de café.

Como defesa da classe, deliberamos só responder quando nos tratassem por Cabo Miliciano e não por cabo. Ainda estou a ver o Comandante a chamar o Silva… gritando: ó nosso cabo… ó nosso cabo - e o Silva… não lhe respondia. O comandante aproxima-se dele e pergunta-lhe se não o tinha ouvido chamar. O Silva retorquiu-lhe: O meu comandante desculpe mas chamou nosso cabo e eu sou Cabo Miliciano. O Comandante engoliu e calou. Serviu de exemplo para todo o quartel.

Esse mesmo senhor quis aplicar-me como castigo, de me ver à civil na rua, uma carecada (”écada” no meu tempo).

Em Março de 1963 fomos promovidos a Furriéis Milicianos. Nunca nenhum de nós entrou alguma vez no Bar de Sargentos. (...)