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quarta-feira, 31 de dezembro de 2014

Guiné 63/74 - P14100: In Memoriam (216): Rui Romero (1934-1966), cap mil inf, 1º cmdt da CCAÇ 1565 (1966/68)... Finalmente... a Verdade (Ana Romero)

1. Mensagem da nossa amiga Ana Romero, membro da nossa Tabanca Grande, com o nº 669 [, foto atual à esquerda]:


Data: 30 de dezembro de 2014 às 19:57

Assunto: Finalmente... a VERDADE

Caros amigos,

Em primeiro lugar desejo-vos uma Boas Festas com tudo de bom.

Tal como tinha comunicado a alguns de vós, ontem desloquei-me ao Arquivo Geral de Exército, a fim de consultar o processo do meu pai. (*)

Confesso que fiquei surpresa, pois nem o meu Cartão de Cidadão
Cap mil inf Rui Romero
((Portalegre, 1934- Jumbebem,1966)
me foi pedido para verificarem quem eu era; apenas no fim da minha visita, solicitaram o meu NIF e a minha morada para envio do recibo relativo as fotocópias que solicitei.

Para surpresa das surpresas, no processo encontrava-se a seguinte documentação:

(i) processo por acidente com arma de fogo, com croqui anexo;

(ii) relatório médico;

(iii) certidão de óbito;

(iv) relatório de autópsia.

Apesar de ser omissa  a palavra suicídio, talvez por proteção da família (para atribuição de pensão!), as descrições parecem-me bastante claras e esclarecedoras.

Com todas as informações que todos vocês me foram facultando, pelas quais vos ficarei eternamente grata, e com a leitura deste processo, neste momento estou esclarecida das circunstâncias que envolveram a morte do meu pai.

Infelizmente não foi possível crescer na sua companhia, não deixando por isso, de estar sempre no meu pensamento.

Talvez um dia, em "outras vidas", nos encontremos!

Uma vez mais, um muito obrigada, do fundo do meu coração, por todo o vosso apoio.

É com muito orgulho que recebi a inscrição de membro nº 669 da Tabanca Grande, blogue que passei a seguir.(**)

Espero que nos possamos encontrar num futuro próximo. (***)

Um grande bem haja para todos e votos de umas excelentes entradas em 2015.

Beijo grande,
Ana Romero
_______________


(**) Vd. poste de 14 de outubro de 2014 > Guiné 63/74 - P13734: Tabanca Grande (448): Ana Romero, filha do cap mil inf Rui Romero (Portalegre, 1934 - Jumbembem, 1966)

sábado, 18 de outubro de 2014

Guiné 63/74 - P13757: Consultório militar, de José Martins (5): Processo do cap mil inf Rui Romero, no Arquivo Histórico Militar.... Algumas "dicas" para a Ana Romero



Fonte: CECA, vol 8



Fonte: CECA, vol 7



1. Mensagem do José Marcelino Martins (ex-fur mil trms, CCAÇ 5,  Gatos Pretos, Canjadude, 1968/70; TOC - Técnico Oficial de Contas, reformado, residente em Odivelas] [, foto atual à esquerda]

Data: 13 de Outubro de 2014 às 18:25

Assunto: Processo do cap mil inf Rui Romero

Caríssima Ana:

Sou um dos colaboradores do blogue e, por "imposição" do Administrador, com o pelouro do "Consultório Militar".

Estou de posse dos elementos essenciais, que o Luís Graça me remeteu, com o pedido de enviar elementos sobre a forma de consultar o processo militar do seu pai. (*)

Como oficial, o processo está à guarda do Arquivo Histórico Militar mas, no caso do seu avô, está à guarda do Arquivo Geral do Exército que tem os processos de sargentos e praças.

Como os processos não estão acessíveis a uma visita inopinada, deverá 
Cap mil inf Rui Romero
 (1934-1966)
contactar o AHM por mail [ahm@mail.exercito.pt] a solicitar a consulta do processo do seu pai. Posteriormente será avisada, pela mesma via, quando estiver à disposição para consulta.

Será na Sala de Leitura,  no Largo dos Caminhos-de-ferro, nº 2, em Lisboa (Museu Militar, entrada pelo lado de Santa Apolónia). Será identificada à entrada. Peça ao soldado que a encaminhe para a sala.

No pedido deve constar o nome do pai, posto, número, para identificação do processo.
Em anexo segue um resumo da história da Companhia [, a CCAÇ 1565,] e o que consta sobre o falecimento do seu pai.

Sinceramente não sei o que poderá encontrar nesse processo. Já consultei mais de dez processos (correspondentes a cinco gerações da minha família) e todos se apresentavam de forma diferente. Uns mais completos que outros.

Falou na consulta da certidão de óbito do seu pai. É provável que esteja no processo, o original ou cópia (ainda não havia fotocópias), mas também pode estar apenso ao Processo de Acidente em Serviço que, provavelmente, não estará apenso.

Poderá solicitar cópia dos documentos que achar conveniente, em suporte papel ou digital, tendo, para isso, de suportar os custos em vigor nos serviços públicos.

Permito-me sugerir-lhe que não coloque s sua expectativa muito alta, apesar de considerar que "está ansiosa por pegar o processo". A causa pode ser mais que suficiente para que "tenha havido muito cuidado a tratar do assunto" e não haver documentação muito esclarecedora.

Receba as minhas saudações "paternais", colocando-me a sua disposição para o que poder ajudar nesta sua cruzada.

José Martins (**)
_________________

Notas do editor:

quarta-feira, 15 de outubro de 2014

Guiné 63/74 - P13736: (Ex)citações (239): Ainda sobre as circunstâncias da morte do cap mil inf Rui Romero (1934-1966), comandante da CCAÇ 1565, que acorreu a 2 metros de mim (Artur Conceição, ex-sold trms, CART 730, Jumbembem, Bissorã e Bissau, 1964/66)


Guiné > Zona Oeste > Setor O2 > Farim >Jumbembem > CCAÇ 1565 (1966/68) > 10 de julho de 1966 > Helievacuação do cap mil inf Rui Romero > Na foto da evacuação importa também identificar o 1º Cabo Enfermeiro Fernando Teixeira Picão colocado do lado esquerdo da foto em calção e camisa (já falecido), e ainda do mesmo lado e logo a seguir o 1º Cabo radiotelegrafista Guilherme Augusto Leal chagas, natural de Elvas; do lado direito em tronco nu e calção, junto ao Heli o Furriel, Manuel Júlio Vira, natural de Setúbal, (já falecido em 2003).

Foto (e legenda): © Artur Conceição (2007). Todos os direitos reservados [Edição de L.G.]




Cap mil inf Rui Romero, de pistola Walther P38,
à cintura
1. Resposta do Artur Conceição, técnico de informática, aposentado, da Direção Geral de Viação, residente na Damaia, Amadora, ex-sold trms, CART 730 (Bissorã, Jumbembem e Bissau, 1964/66), ás perguntas que lhe enviámos  ontem, a propósito da morte do cap mil inf Rui Romero (1934-1966) (*)

Meus caros:

Não tenho muito mais para acrescentar àquilo que já foi escrito e dito, apenas quero clarificar alguns pormenores. (**)

A primeira questão prende-se com a marca da arma de fogo. Era uma pistola Walther? É muito provável que sim, uma vez  que era a arma de defesa usada pelos oficiais e os detentores de algumas especialidades, designadamente enfermeiros e pessoal de transmissões.

A porta do espaço reservado ao comando, descaída para o lado esquerdo, dava para um corredor aberto e era tapada com um reposteiro. A cama do senhor capitão Romero estaria colocada a cerca de 3 metros dessa entrada e com a cabeceira voltada para o lado esquerdo.  No sentido oposto, (pés com pés), e com um bom espaço entre ambas, ficava a cama do comandante da CART 730.

O senhor capitão Romero estava caído no chão, e não estava nem de bruços nem de costas.

A pistola Walther, P38, de 9 mm, de origem alemã, foi
adoptada pelas nossas Forças Armadas, em 1961, como
pistola 9 mm Walther m/961, vindo substituir a Parabellum.
Foi desde logo utilizada na guerra colonial em África.
Fonte:Cortesia da Wikipedia
Em relação à parte do corpo atingida , penso não ter dúvidas de que foi a cabeça, mas convém esclarecer de que eu não entrei no espaço, Isto é,  não passei da já referida porta. Fotos no chão, correspondência em cima da cama e arma no chão deu para ver.

O local exacto da cabeça onde foi o disparo não posso garantidamente afirmar. O choque, para mim, foi  brutal... e as reacções nem sempre são "normais".

Em relação a ter deixado algo escrito,  não me parece. Se tal tivesse acontecido estaríamos perante um acto premeditado que também  não me parece que tenha sido o caso. Inclino-me sim para uma tentação espontânea, um gesto repentino.

Respondendo ao José Câmara (**), não me parece, dadas as circunstâncias, de haver qualquer hipótese de acidente. E de homicídio então nem pensar. A versão que ficou entre todos foi a de suicídio.

Agora vamos à parte mais fácil. Em relação ao 1º cabo cripto, ele encontra-se de frente numa foto existente no blogue  (**)  e está  identificado nessa outra foto. Recordo-o como uma jóia de moço, bastante reservado, talvez pela sua especialidade. Não sei onde vive, sei que era natural de Portalegre. E já agora mais uma "dica" que só terá interesse para melhor o localizar se essa for a intenção. Pertencia nessa época a uma religião designada  de Sabatistas.

À pergunta "quem tirou a foto",  não sei responder.

Artur Conceição
Em relação ao meu capitão, estive com ele pela última vez, em Lagos num almoço convívio do Batalhão 733. Sei que mora na Rua António Saúde,  em Benfica.  porque ele me informou, não tenho mais nenhum contacto. Era cliente da Pastelaria Califa e de uma loja de óculos que existe ao lado.

Penso que o corpo do cap Romero seguiu para Bissau porque não vejo porque razão iria para Farim.

Salvo melhor opinião, penso que nesta época os helicópteros tanto levavam os feridos como os mortos.


Finalmente queria também fazer uma pergunta ao Carlos Silva (***): que tempo medeia entre cada uma das fotos que mandaste?

Alguém estragou o espaço onde era a minha cama, e quando a foto foi tirada estava à chuva....!

Ao dispor. Um abraço

Artur António da Conceição (****)

Damaia, Amadora



Guiné > Bissau  >    23/6/1966 > Em primeiro plano, o cap mil inf Rui Romero, cmdt da CCAÇ 1565 (1966/68) > Guarda de honra ao gen Carrasco.

Foto: © Ana Romero  (2014). Todos os direitos reservados [Edição de L.G.]

______________

Notas do editor:

(*) Questões postas ao Artur Conceição, em email de ontem

Artur: Queres responder ou comentar ou acrescentar algo mais ? 

(i)  A arma utilizada foi pistola Walther ? 

(ii) Como estava caído o corpo ? No chão ou na cama ? De costas ou de bruços ? 

(iii) Que parte do corpo foi atingida ? 

(iv) O capitão deixou algum papel escrito ? 

(v) Haveria alguma hipótese de ser "acidente", como sugere o José Câmara (que está nos EUA) 

(vii) Qual a versão que correu de imediato no quartel ? 

(viii) O cabo cripto, o "Fininho",  que está na foto, de costas, com o quico na mão, ainda vive em Portalegre ? 

(ix) Quem tirou essa foto ? 

(xi)  O corpor seguiu para Bissau ou Farim ?

(x) O teu antigo capitão está contactável ? A Ana Romero pode falar com ele ? 

Ab. Luis

(**) Vd. poste de 13 de outubro de 2014 > Guiné 63/74 - P13729: O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande (88): Revivendo, 48 anos anos depois, a tragédia de Jumbembem, a morte do cap mil inf Rui Romero, da CCAÇ 1565, em 10/7/1966 (Ana Romero / Artur Conceição)

(***) Vd. poste de  14 de outubro de  2014 > Guiné 63/74 - P13735: Memória dos lugares (275): Jumbembem, ao tempo da CCAÇ 2548, 1969/71 (Carlos Silva)

(****)  Último poste da série > 13 de outubro de  2014 > Guiné 63/74 - P13728: (Ex)citações (238): Água da Bolanha... quem a não bebeu ?! (Mário Pinto, ex-fur mil at art da CART 2519 - "Os Morcegos de Mampatá", Buba, Aldeia Formosa e Mampatá, 1969/71)

terça-feira, 14 de outubro de 2014

Guiné 63/74 - P13734: Tabanca Grande (448): Ana Romero, filha do cap mil inf Rui Romero (Portalegre, 1934 - Jumbembem, 1966)



Rui António Nuno Romero (Portalegre, 1934- Jumbebem, Guiné, 1966)

Foto: © Ana Romero (2014). Todos os direitos reservados [Edição de L.G.]



1. Mensagem de 11 do corrente, da nossa leitora e, a partir de agora, nossa grã-tabanqueira,  n.º 669, Ana Romero, filha do saudoso cap mil inf Rui Romero (1934-1966):

Luís:

Desculpe,  mas acabei por ser apanhada na emoção pelas vossas palavras (*), que nem deixei mais informações sobre mim.

Moro em Telheiras, Lisboa (...). Sou engenheira electrotécnica, pelo IST - Instituto Superior Técnico, e trabalho  numa multinacional.

Tal como mencionei anteriormente, sou casada há 24 anos, tenho uma filha - Joana, de 19 anos, solteira, estudante do 2.°ano de Ciências Forenses e Criminais no ISCSEM.

Já falei à minha irmã Isabel sobre esta troca de mails que temos feito e,  se me autorizar, ceder-lhe-ei os seus contatos pois também ela tenta perceber os fatos poucos claros na época.

Mais uma vez muito obrigada pelas prontas respostas. Tal como ontem solicitou, envio umas fotos do pai e da família na altura. Envio também uma minha atual. Envio em 3 mails devido ao tamanho das fotos.

2. Comentário de L.G.:

Já transmiti, pessoalmente, à Ana Romero o nosso pesar e a nossa solidariedade pela tragédia que atingiu a família, há 48 anos. O cap mil inf Rui Romero, 1.º comandante da CCAÇ 1565, com 4 meses de Guiné, deixou duas filhas menores. A Ana tinha 1 ano. E hoje, passados 48 anos, ela quis saber a verdade sobre as circunstâncias da morte do seu pai e nosso camarada. Recorda que "o avô era militar (sargento-ajudante), nunca comentou a morte do meu pai"...

Na época, os jornais noticiaram, de acordo com o comunicado do Serviço de Informação Pública das Forças Armadas [, vd. recorte, à esquerda], que o cap Nuno Romero morrera "por desastre" no TO da Guiné. "Acidente com arma de fogo" é a causa oficial da morte. Talvez até para proteger a família, acrescenta a Ana.

Até à data, o único testemunho, escrito e oral, que temos é o do nosso camarada Artur Conceição, ex-sold trms, da CART 730 (1964/66), unidade de quadrícula em  Jumbembem, e que o pessoal da CCAÇ 1565 (1966/68) ia render.

Para que não haja quaisquer dúvidas sobre a natureza e as circunstâncias da tragédia, o Artur Conceição, técnico ide nformático reformado da Direção-Geral de Viação, de 71 anos, residente na Damaia, Amadora, e membro de longa data da nossa Tabanca Grande, confirmou-me, mais uma vez, e com novos detalhes a sua versão.  A Ana Romero mostrou interesse em falar com ele um dia destes. Da parte do Artur, ela tem toda a liberdade de lhe telefonar quando o entender.


Guiné > Região do Oio > Jumbembem > CART 730 (1964/66) e CCAÇ 1565 (1966/68) >  Domingo, 10 de julho de 1966 > Um dia trágico: pormenor da evacuação do cap mil inf Rui Romero, na foto a ser transferido para a maca do helicóptero Alouette II... A enfermeira paraquedista era a Alf Maria Rosa Exposto.

Foto: © Artur Conceição (2007). Todos os direitos reservados [Edição de L.G.]

Segundo a última conversa que tive com o Artur, em Jumbembem não havia pista de aviação. O correio era largado às quintas-feiras, de avioneta. Acabada de chegar a Jumbembem, a CCÇ 1556 só recebeu o primeiro correio, no domingo, 10 de julho de 1966. Veio diretamente de Farim, por coluna auto.

O correio dos oficiais era separado dos restantes. Daí o cap mil Romero estar a abrir e a ler o correio no seu gabinete e quarto que partilhava com o comandante da CART 730, o cap art Amaro Rodrigues Garcia, hoje cor art ref, residente em Benfica, Lisboa.  Os militares da CCAÇ 1565, os "periquitos", estavam a ler o seu correio na parada. E o Artur Conceição estava, a 2 metros,  no gabinete de transmissões, de cerca de 15 metros quadrados, que era partilhado com o centro cripto. O 1.º cabo cripto era o "Fininho", o alentejano de Portalegre (por sinal, conterrâneo do cap mil Romero), de seu nome completo Florival Fernandes Pires.

Na altura em que se ouviu o disparo, o "Fininho"  não estava no centro cripto.  A 6/7 metros de distância ficava o bar/messe de oficiais.  O Artur foi  primeiro a correr e a ver o cadáver do capitão, ensanguentado, estendido no chão, de lado, com a cabeça virada para os pés da cama, fardado com as calças por dentro das botas. Essa imagem ficou-lhe para o resto da vida, bem como as cartas e as fotografias das filhas pequenas, espalhadas pelo chão.

Segundo o Artur, o capitão terá sacado da pistola Walther, que estava em cima da cabeceira, e disparou um único tiro na testa.  Imediatamente a seguir, apareceu o cap art Garcia. Foi mandada uma mensagem para Bissau, encriptada, a pedir uma  evacuação Ypsilon.  Na foto acima, o malogrado capitão Romero é  transferido da maca do quartel para a maca do helicóptero, um Alouette II. A enfermeira era a alf Maria Rosa Exposto. O corpo foi levado para Bissau. O funeral realizou-se em Lisboa, no dia 13 de agosto, do Hospital Militar Principal para o Alto de São João.

A Ana Romero, aceitando de pronto e de bom grado o meu convite, passa a integrar a nossa Tabanca Grande (**). É uma forma, nobre, e um grande exemplo de amor filial, de homenagear o seu pai e nosso camarada. Seja bem vinda, Ana, apesar das tristes circunstâncias que a levaram a chegar até nós.

Como já tive ocasião de lhe dizer, pessoalmente, ao telefone, em casos como este,  o nosso único móbil ou motivação é  a busca e a partilha da verdade a que têm direito as famílas dos nossos camaradas que morreram na Guiné, no cumprimento do seu dever... As famílias, e  nós próprios, seus camaradas... partilhamos memórias e afetos. E temos, de resto,  contribuído para levar algum conforto e paz de espírito a diversas familias que não souberam, na realidade, como morreram os seus entes queridos: esposo, pai, avô... E alguns não voltaram à pátria, nem mesmo num caixão de chumbo.


Fotos do álbum de família: o cap mil inf Rui Romero, na IAO (presume-se) antes de embarcar para o CTIG


Fotos do álbum de família: o cap mil inf Rui Romero,   a caminho do TO da Guiné. T/T Uíge, 24 de abril de 1966.


Fotos do álbum de família: Em casa, 1/3/1965, a esposa do cap mil inf Rui Romero com as duas filhas, a Isabel e a Ana (com 1 mês de idade)



Fotos do álbum de família: o cap mil inf Rui Romero, com a esposa e a filha mais nova, na praia, o verão de 1965 (presume-se)


Fotos do álbum de família: A Ana com a mana Isabel (seis anos mais velha),. A família vivia (e vive) em Lisboa.

Fotos: © Ana Romero (2014). Todos os direitos reservados [Edição de L.G.]
____________

Notas do editor:

(...) Olá, Luís! Foi com enorme alegria que recebi o seu mail, bem como aquele que encaminhou para o Artur [Conceição]. Já enviei o pedido de amizade para a Tabanca Grande Luís Graça [, página do Facebook,] e também aderi ao blog Luís Graça & Camaradas da Guiné.

É claro que autorizo a publicação da minha mensagem. Esta noite vou arranjar a foto do pai e enviá-la-ei, juntamente com uma minha. (...)



(**)  Último poste da série > 24 de setembro de 2014 > Guiné 63/74 - P13644: Tabanca Grande (447): Egídio Avelino Lopes, ex-Tenente Pilav da BA 12 (Bissalanca, 1966/67)... É o nosso grã-tabanqueiro n.º 668

segunda-feira, 13 de outubro de 2014

Guiné 63/74 - P13729: O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande (89): Revivendo, 48 anos anos depois, a tragédia de Jumbembem, a morte do cap mil inf Rui Romero, da CCAÇ 1565, em 10/7/1966 (Ana Romero / Artur Conceição)


Guiné > Região do Oio >  Jumbembem > CART 730 e CCAÇ 1565 (1966/68) >  Em primeiro plano, de costas, e quico na mão, o 1.º cabo operador cripto Florival Fernandes Pires, natural de Portalegre, que foi, com o Artur Conceição, sold trms, uma das primeiras testemunhas das circunstâncias trágicas em que morreu o cap mil inf Rui Anónio Nuno Romero, comandante da CCAÇ 1565, de 32 anos, casado, pai de 2 filhas (a Isabel, com 7; a Ana, com 1), natural de Portalegre, residente em Lisboa, filho de pai militar,  desenhador de construção civil a frequentar o curso de arquitetura quando foi chamado para o curso de capitães.

O Artur Conceição estava a 2 metros do local da tragédia. Embora já cadáver, o corpo do malogrado oficial foi levado de helicóptero para o Hospital Militar de Bissau (presume-se), e o funeral realizou-se um mês e tal depois em Lisboa, no cemitério do Alto de São João. A enfermeira na foto parece ser a Rosa Exposto, do curso de 1964, segundo apurámos junto do nosso camarada Miguel Pessoa e das nossas camaradas enfermeiras paraquedistas Giselda Pessoa e Maria Arminda.

A CCAÇ 1565 foi mobilizada pelo RI 1, partiu para o TO da Guiné em 20/4/1966, e regressou a 22/1/1968. Esteve em Bissau, Jumbembem, Canjambari e Bissau. Comandantes, além do cap mil inf Rui António Nuno Romero:  cap inf  José Lopes e cap mil inf José Alberto de Sá Barros e Silva, que vive atualmente em Lisboa.

Por sua vez, a CART 730 / BART 733, foi mobilizada pelo RAL 1, partiu para o TO da Guiné em 8/10/1964, e regressou a 14/8/1966.  Pasou por Bironque, Biossorã, Jumbembem e Farim, Foi seu comandante o cap art  Amaro Rodrigues Garcia. O BART 733 esteve em Bissau e Farim.

Foto: © Artur Conceição (2007). Todos os direitos reservados [Edição de L.G.]


1. Mensagem da nossa leitora Ana Paula T. Romero, com data de 8 do corrente:

Olá! Peço desculpa por estar a incomodar, mas talvez me possa fornecer algumas respostas que ainda não encontrei.

O meu nome é Ana Paula Teixeira Romero Serranito, tenho 49 anos e sou a filha mais nova do Capitão Rui António Nuno Romero, falecido na Guiné (Farim), a 10/07/1966.

Na altura eu tinha 1 ano, 5 meses e 9 dias, a minha irmã mais velha, Isabel, tinha acabado de fazer 7 anos (a 04/07) e a nossa mãe,Rosária, tinha 31 anos.

Acabei de ler a informação sobre a morte do meu pai (*)  e a curiosidade voltou.

A minha mãe felizmente ainda se encontra viva, mantem-se viúva, a minha irmã também se encontra viva, divorciada, com uma filha (35 anos) e com um neto (9 anos), e eu, casada e com uma filha de 19 anos. Os avós paternos já faleceram (avó em 1989 e avô em 2005), mas o avô, que também era militar (Sargento Ajudante), nunca comentou a morte do meu pai.

A minha mãe, pela tristeza ou pela minha tenra idade na altura do acontecido, também nunca comentou e eu confesso que cresci sempre a pensar o que tinha sucedido ao meu pai, mas também evitei perguntar pormenores à minha mãe, pois não queria colocar “o dedo na ferida”.

Se me puder dar alguns detalhes, contatos de colegas que tenham sido próximos do meu pai, agradeço.

Deixo os meus contatos [...]

Até breve e obrigada por ter criado o blog. (**)


2. Novo mail enviado no dia seguinte, 9 do corrente:

Caros Camaradas Luís Graça, Carlos Vinhal e Eduardo Ribeiro,

Peço desculpa por vos incomodar com este assunto, por tomar a liberdade de vos tratar, com todo o respeito, por Camaradas, mas gostaria de pedir a vossa ajuda.

Tal como informei ontem no mail que enviei ao Camarada Luis Graçam o meu nome é Ana Paula, e sou a filha mais nova do capitão miliciano Rui Romero, falecido na Guiné, a 10/07/1966.

Depois de ter enviado ontem o email, estive a ler com mais atenção o texto escrito pelo Artur Conceição (Era domingo, dia 10 de Julho de 1966, um dia como tantos outros por Artur Conceição)(*)  em que o Artur menciona; “…A distribuição do correio ocorria na parada quando, subitamente, se ouviu um disparo. Eu estava de serviço no posto de rádio e, a dois metros do local do disparo, que havia acontecido no gabinete mesmo ao lado” e pelo seu [, de Luís Graça,]comentário, que transcrevo abaixo, e confesso que fiquei confusa…chocada, pois nunca tive consciência que o meu pai pudesse ter cometido suicídio.

(...) “Foste corajoso ao trazer, até nós, este trágico episódio da morte do capitão Romero... Mas sejamos francos, vamos chamar as coisas pelos seus nomes: o Cap Mil Romero cometeu suicídio, em plena parada, na hora da distribuição do correio... É isso que eu leio nas entrelinhas... Por pudor, por razões culturais, para poupar a família e os amigos, nunca falamos de sucídio... A p+alavra é tabu. Por outro lado, como se o suicídio fosse desonroso, hipocriticamente o exército atribuiu a morte do Cap Mil Romero a um acidente com arma de fogo... O exército (colonial) nunca quis assumir que alguns de nós, militares, milicianos, do quadro ou do contingente geral, puseram (ou tentaram pôr) termo à vida, ou se automutilaram, por que a guerra, aquela guerra, os perturbou intensamente... Sabemos que em muitos casos houve erros de 'casting': os oficiais milicianos ou do QP eram mal seleccionados, mail treinados e formados, não estavam preparados para comandar homens no TO da Guiné... Para muitos foi uma aprendizagem dolorosa. Por outro lado, o exército não tinha especialistas para dar apoio a militares em sofrimento psíquico" (...) (*)

Afinal ocorreu na parada ou no gabinete ao lado? Foi mesmo suicídio?

Gostava tanto de saber um pouco mais daquilo que nada sei…

Um grande bem haja a todos,
Ana Romero

3.  No dia 10, o Artur Conceição, contactado por mim,  mandou-me a seguinte mensagem e texto anexo:

[, foto á esquerda, o Artur Conceição, ex-Sold Trms Inf e Cond Auto, CART 730, Bissorã, Farim e Jumbembém, 1964/66; por lapso, o nome deste camarada aparece sistematicamente no nosso blogue como sendo de 1965/67,,,]

 Meu caro  caro Luís Graça

(...) Escrevi mais um pequeno texto que junto em anexo, que penso possa clarificar alguns pontos, e que se achares por bem poderás enviar à Ana Paula. Podes também corrigir algo que esteja menos explicito se assim o entenderes, bem como eliminar aspectos que aches que não são relevantes .

O Capitão Rui Romero não estava na parada mas sim nos aposentos que lhe estavam reservados, e estava sozinho. Quem estava na parada eram apenas os Cabos e os Soldados. A correspondência de Oficiais e Sargentos era retirada e entregue antes da distribuição geral.

Estou ao inteiro dispor para mais esclarecimentos.

Um grande abraço
Artur António da Conceição
Damaia / Amadora



Guiné > Região do Oio > Farim > Jumbembem > 2ª CCAÇ do BCAÇ 4512 (Jumbembem, 1973/74) > 1974 >  Parada do quartel e chegada de um helicóptero com o correio.

Foto: © Fernando Araújo  (2010). Todos os direitos reservados [Edição de L.G.]


MEMÓRIA, por Artur Conceição

Para quem conhece o local dos acontecimentos [, Jembembem,] entende mais facilmente o que em tempos [escrevi] (*). Para quem não conhece torna-se um pouco mais difícil, pelo que assim sendo importa fazer mais alguns esclarecimentos.

Quando se sai da estrada que vai para Cuntima para se entrar no destacamento de Jumbembem,   depara-se um espaço a que vulgarmente se chamava de parada.

Ao fundo desse espaço existia uma casa com apenas rés do chão, que tinha uma pequena escada de madeira que dava acesso a uma varanda que dava entrada do lado direito para a secretaria e para o lado esquerdo ao posto de enfermagem.

Do lado oposto e por detrás do posto de enfermagem ficava o espaço reservado aos aposentos do Comandante da Companhia, servia de escritório, gabinete e quarto de dormir. Mesmo ao lado e por detrás da secretaria ficava o posto de rádio.

As praças da CCAC 1565 [, a que o cap mil inf Rui Romero pertencia,] estavam a receber o seu correio, que estava a ser distribuído de um dos degraus da escada que já foi referida.

O espaço reservado para dormitório do Comandante da CART 730 estava a ser partilhado com o Senhor Capitão Rui Romero que dormia com a cabeceira para o lado do posto de rádio, enquanto o Comandante da CART 730 dormia com a cabeceira para o lado contrário.

O senhor Capitão Rui Romero estaria sentado na sua cama a ler a sua correspondência, quando ocorreu a triste tentação.

Ao ouvir um disparo ali tão perto, acorri de imediato à porta, (ou melhor dizendo, ao espaço para entrada naquela área, porque porta propriamente dita não existia), deparei com o senhor Capitão Rui Romero caído no chão,   com algumas fotos de duas meninas bastante jovens, espalhadas em seu redor e algumas cartas em cima da cama. A arma também estava no chão.

Naquele espaço não havia mais ninguém, atendendo a que se estava próximo da hora de almoço.

Nesta foto [, vd. acima,] pode ver-se em primeiro plano com o quico na mão direita o 1º Cabo Operador Cripto Florival Fernandes Pires, natural de Portalegre,  e que como pode ver-se também assistiu a uma parte do acontecimento.

[Artur Conceição, Damaia, Amadora, 10/10/2014]

4.  No mesmo dia deu conhecimento À Ana Romero deste último texto do Artur Conceição:

 Ana: Aqui ten os contactos do Artur Conceição e um pequeno texto com uma versão mais recente sobre as circunstãncias da morte do seu pai... No meu comentário [ao poste P2335, de 8/12/2007] (*), por lapso meu, fiz referência despropositada à "parada"... Não, tudo se passou à hora da distribuição do correio, e no seu quarto e gabinete... A Ana pode tentar juntar as pontas e perguntar: porquê ?... Quando se tem acesso (fácil) a armas, há mais risco de ocorrerem tragédias destas... Oficialmente, foi um acidente com arma de fogo...

Disponha sempre. Mandei-lhe esta manhã um outro mail, do meu endereço profissional.
Bom fim de semana.
Luís Graça

5. Mail enviado por L.G., na manhã de 10 do corrente, à Ana Romero [, foto à esquerda, da sua página do Facebook]:

Querida: Lamento muito que só agora saiba das circunstâncias trágicas em que morreu o pai. Mas o nosso blogue tem esse dever (doloroso) também de falar dos nossos queridos camaradas mortos, em combate, por doença, acidente ou outros motivos. Nalguns casos, temos ajudado as famílias a fazer o lutto (até agora patológico). O exército (e o Estado) tratou mal estes bravos que deram tudo pela Pátria.

Posso pô-la em conctacto com o Artur Conceição, soldado de transmissões que estava a 2 metros do gabinete onde tudo ocorreu... Ele vive aqui perto na Amadora. Mas a Ana pode primeiro falar comigo. Tem aqui o meu telemóvel (...). Ou se preferir,  eu ligo-lhe, se me mandar o seu nº de telemóvel.

Eu não conheci o seu pai. Sou mais novo na Guiné (1969/71). Mas sou o fundador deste blogue coletivo (que vai a caminho dos 700 membros e dos 7 milhões de visualizações). Como costumamos dizer, os filhos dos nossos camaradas nossos filhos são. Convido-a inclusive a integrar a nossa Tabanca Grande (comunidade virtual, à volta do blogue, que tem mais de 10 anos), honrando desse modo a memória do seu pai.

Se quiser. mande-nos uma foto dele e outra sua. E escreva-nos duas linhas. Ou autorize-nos a publicar a sua mensagem anterior, ou parte dela. Sente-se à sombra retemperadora e fraterna do nosso mágico poillão, a árvore sagrada da Guiné. Somos uma espécie em vias de extinção, mas partilhamos memórias e afetos.

Um beijo com ternura.
Luís Graça

6. Feedback imediato da Ana Romero:

Olá, Luís!

Foi com enorme alegria que recebi o seu mail, bem como aquele que encaminhou para o Artur.

Já enviei o pedido de amizade para a Tabanca Grande Luís Graça [, página do Facebook,] e também aderi ao blog Luís Graça & Camaradas da Guiné.

É claro que autorizo a publicação da minha mensagem.

Esta noite vou arranjar a foto do pai e enviá-la-ei, juntamente com uma minha.

Muito obrigada pelo seu feedback.

Bjo. Ana [telemóvel...]