Queridos amigos,
Começo por um sincero pedido de desculpas. Ao desfiar as minhas recordações, senti que havia ali um atropelo de imagens, questionava-me se a ida a Ucanha não devia estar sintonizada com a visita ao Mosteiro de Santa Maria de Salzedas e às Caves da Murganheira, como não via as imagens atinentes, desatei a correr para a frente, o que o leitor hoje vai ver, tirando as imagens da Ucanha, passou-se no dia seguinte, passeio de Tabuaço ao Pinhão e viagem pelo rio Douro, parece literatura de antecipação mas não é, é uma besteira de quem não sabe mexer convenientemente no ficheiro de imagens. No próximo texto interrompo a viagem no Douro e regresso à região de Távora-Varosa. A Ucanha tem a sua magia, os azulejos da estação ferroviária do Pinhão formam um conjunto de painéis de valor inexcedível, é o que hoje aqui se mostra, para a semana voltamos ao passado, e depois percorre-se o rio Douro. São desatinos desta idade maior, mil vezes perdão.
Um abraço do
Mário
Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (138):
Férias em região duriense, uma rota de aldeias vinhateiras (7)
Mário Beja Santos
Como é que eu deixei atropelar as imagens, é que não entendo. Tínhamos ido visitar as Caves da Murganheira, na região Távora-Varosa, era inevitável visitar Ucanha, a sua torre, a sua ponte medieval única, o meio circundante. A povoação tem hoje cerca de 400 habitantes, vive-se ali num ambiente de quase fantasia com este património medieval notável, estamos perto de Salzedas, nesta excursão às aldeias vinhateiras do Douro será um ponto de referência, fica para mais adiante. Estamos na região de Tarouca, nesta viagem não visitaremos S. João de Tarouca, infelizmente. Ucanha pertenceu ao couto de Salzedas e a terra-natal de um dos nossos maiores filólogos e etnólogos, José Leite de Vasconcelos. Visita de médico, caminhava-se para o fim do dia, a assistente da excursão olhava frequentemente para o relógio, mas deu para apreciar o que se vê vezes sem conta, pois Ucanha vale.
Mudamos agora de azimute, saímos de Tabuaço para o Pinhão, há passeio fluvial no Douro, o tal Douro que Miguel Torga cantou chamando-lhe um poema geológico, de uma beleza absoluta. Como chegámos antecipadamente, a assistente deu-nos rédea solta, tempo para visitar o Pinhão, a ponte, saída dos ateliês de Eiffel, impressiona. Mas o que mais me surpreendeu foi andar a mirar e remirar os azulejos da estação ferroviária. Nunca tinha dado por isso, Pinhão pertence ao distrito de Vila Real, está no coração da região vitivinícola. Bem procurei no turismo informações suculentas, uma brochurinha e viva o velho. Fala-se na existência de uma ponte romana, a ponte metálica de Eiffel é mais largamente mencionada, tal como a linha do Douro que começou a funcionar no Pinhão em 1880, na atualidade há o comboio quotidiano e o comboio histórico, este é uma locomotiva a vapor construída em 1925. Mas bebido o cafezinho, fui prazeroso para a gare, os 24 painéis de azulejos do Pinhão exibindo as paisagens do Douro e os trabalhos vinícolas, são topo de gama, não há livro da azulejaria portuguesa que não os louve. Em tons azuis, como, aliás, é timbre das nossas estações ferroviárias e de muitos mercados dos anos 1930 e 1940, foram concebidos por J. Oliveira e encomendados à fábrica Aleluia, em 1937. Indiscutivelmente, uma das mais belas coleções de painéis azulejares em estações ferroviárias em Portugal. Basta vê-los um a um, não há que enganar, incluem a legenda do motivo escolhido. Caminham para 90 anos de vida, estão muito bem tratados, aqui me curvo respeitosamente, por tanta beleza desmedida.
Pronto, já estamos a bordo, como diria Miguel Torga, vamos ser avassalados pelo prodígio da paisagem, esta imensidade de socalcos, este excesso de natureza, o tal poema geológico, a tal beleza absoluta entre o trabalho do homem que gerou estes terraços e a graciosidade do Douro. Deste rio prodigioso se falará a seguir.
(continua)
____________
Nota do editor
Último post da série de 13 DE JANEIRO DE 2024 > Guiné 61/74 - P25067: Os nossos seres, saberes e lazeres (609): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (137): Férias em região duriense, uma rota de aldeias vinhateiras (6) (Mário Beja Santos)