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sexta-feira, 19 de setembro de 2025

Guiné 61/74 - P27230: Timor-Leste: passado e presente (32): a rendição dos japoneses foi há oitenta anos, foram-se embora, sem castigo, lá deixando mais de 40 mil cadáveres de timorenses, portugueses, australianos, holandeses...




Bandeira do Império do Sol Nascente: símbolo de terror no Pacífico, durante a II Guerra Mundial , e mais exatamente entre 7 de dezembro de 1941 e 2 de setembro de 1945 (data da rendição oficial e incondicional do Japão).  

Em Timor-Leste, invadido e ocupado desde 19 de fevereiro de 1942,  completamente isolados do mundo desde julho de 1943, sem telecomunicações, os habitantes  só souberam da notícia do fim da II Grande Guerra e do armistício em 1 de setembro de 1945 (!)... As tropas ocupantes só começaram a retirar da ilha a 6 de setembro (*).

Portugal recuperou a soberania da Timor, ao fim de três anos e meio de ocupação do território pelas tropas japonesas. Morreram perto de uma centena de portugueses, europeus e "liurais" (régulos timorenses, fiéis a Portugal), em combate, assassinados, vítimas de doença, ou desaparecidos no mato, sem falar das muitas dezenas e dezenas de milhares de timorenses anónimos (no mínimo, 40 mil).

O Governador, cap inf Ferreira Carvalho, rapidamente decidiu a reocupação da ilha, e o restabelecimento da autoridade portuguesa, o que foi feito em tempo tempo-recorde de 14 dias.


1. A ocupação japonesa de Timor-Leste, então colónia portuguesa, durante a II Guerra Mundial,  decorreu entre fevereiro de 1942 e setembro de 1945. Foi marcada por violência extrema, genocídio,  guerrilha, colaboração e imenso sofrimento para a população local (incluindo a pequena comunidade portuguesa, constituida por desterrados, missionários católicos, funcionários civis e escassos militares).

Apesar da neutralidade de Portugal durante a II Guerra Mundial, Timor-Leste tornou-se um campo de batalha estratégico no teatro do Pacífico, principalmente devido à sua proximidade com a Austrália (Dili ficava a c. 700 km de Darwin).

Passam, este mês, 80 anos desde o fim da guerra do Pacifico (7 de dezembro de 1941 - 2 de setembro de 1945). Os japoneses tiveram a infelicidade de ter um governo militarista e  totalitário e os timorenses o azar de ficarem na rota das suas loucas ambições imperiais de subjugar toda a Ásia e a Oceania...


 Ocupação de Timor-Leste na II Guerra Mundial (1942-1945)> Principais factos e datas


A invasão japonesa ocorreu na noite de 19 para 20 de fevereiro de 1942, com desembarque de cerca de 1500 soldados; ao mesmo tempo, a marinha e a força aérea nipónicas atacavam a parte ocidental da ilha, sob administração holandesa (a capital Kupang e outros pontos).

Logo a seguir, em 24 de fevereiro de 1942, foi introduzida a moeda militar japonesa como única com circulação legal em Timor. A administração civil portuguesa não foi formalmente deposta: era preciso salvar as aparências.  

O governador português e o seu escasso corpo de funcionários ficarm circunscritos à residência oficial em Díli após maio de 1942. Mas era uma administração fantoche. 

A resistência aliada, composta por australianos (Sparrow Force), holandeses, meia dúzia de ingleses, e civis, portugueses e timorenses,  continuou sob a forma de guerrilha nas montanhas. O apoio da população local está bem documentado, apesar dos focos de rebelião contra os portugueses (as  famigeradas "colunas negras", armadas ou toleradas pelo ocupante).

O interesse estratégico aliado pelo território irá, entretanto, diminuir e, a partir de fevereiro de 1943, a maioria dos comandos australianos foi evacuada.

 A ocupação terminou apenas após a rendição do Japão, em 2 de  setembro de 1945, e o regresso da administração portuguesa efetiva

A ocupação resultou em intenso sofrimento: houve peloo menos 40 mil mortos  entre timorenses e portugueses (cerca de 10% da população da época), devido a massacres, fome, doenças e trabalhos forçados.

Houve repressão violenta contra qualquer suspeita de apoio aos aliados, envolvendo represálias, torturas, fuzilamentos públicos e deportação em massa da população de Díli para o interior.


NBa resistência ao oocupante, destacou-se, de entre muitos outros,  a figura do régulo Aleixo Corte-Real (Dom Aleixo), fuzilado pelos japoneses em 1943 por ter colaborado com as forças aliadas e apoiado a população local. 

Envolveu-se também a comunidade portuguesa local, ora na resistência armada, ora tentando proteger a população timorense, apesar das ordens de estrita neutralidade vindas da metrópole. 

De entre os portugueses, resistentes, destaque-se  o tenente (e antigo administrador de Baucau) Manuel de Jesus Pires (durante anos e anos totalmente esquecido) (Foto à esquerda, com dedicatória manuscrita à "amiga Maria", e data de 6/3/1943, um ano antes de morrer, às mãos dos japoneses, no cativeiro; fonte: blogue Uma Lulik  > 10 de fevereiro de 2008 > Tenente Pires). (Julgamos que a Maria da dedicatória fosse a jovem esposa de Carlos Cal Brandão, o advogado, seu conterrâneo, do Porto, ali desterrado desde 1931.)

A maior parte das infraestruturas urbanas e povoados de Timor Leste foi destruída pelos combates e bombardeamentos aéreos: Díli sofreu mais de 90 ataques aéreos ao longo da ocupação, a maior parte da aviação aliada.

(i) Contexto e invasão aliada (1941)

17 de dezembro de 1941:

  • antecipando uma mais que provável invasão japonesa, e  para prevenir a instalação de bases japonesas, uma força de 400 comandos australianos e holandeses (e alguns ingleses) desembarca em Díli, contra a vontade e os protestos do governador português, Manuel de Abreu Ferreira de Carvalho;
  • o objetivo era criar uma linha de defesa avançada e impedir que o Japão usasse a ilha como base para atacar a Austrália;
  • Lisboa protestou em vão, mas veementemente, contra esta violação da sua neutralidade (com mais veemência do que dois meses depois).

(ii) A invasão japonesa e o início da resistência  (1942)


19-20 de Fevereiro de 1942:

  • o Império do Sol Nascente, usando a presença aliada como pretexto para a invasão, lança um ataque massivo, de cerca de 1500 soldados em Díli, ocupando rapidamente a cidade;
  • o pequeno contingente aliado e as forças portuguesas (não mais do que  600 homens, no total, incluindo uma companhia de timorenses, mal armados, e enquadrados por meia dúzia de graduados metropolitanos) são rapidamente subjugados na capital.
  •  a marinha e aviação japonesas  bombardeiam  Kupang (Timor holandês) e noutros pontos estratégicos da ilha;


finais de fevereiro de 1942:

  • os soldados aliados sobreviventes, principalmente australianos da "Sparrow Force", recuam para as montanhas do interior da ilha;
  • com o apoio crucial da população timorense, que lhes fornecia comida, abrigo e informações,  iniciam uma mais que improvável campanha de guerrilha contra as forças nipónicas.

(iii) A guerra de guerrilha e o apoio timorense (1942)



março - dezembro de 1942:

  • os comandos australianos, conhecidos como os "fantasmas de Timor", infligem pesadas baixas às tropas japonesas, sabotando as suas operações e linhas de comunicação;
  •  estima-se que mais de 1500 soldados japoneses foram mortos nesta fase, ao custo de apenas cerca de 40 baixas australianas;
  • a resistência não teria sido possível sem o apoio ativo dos timorenses: muitos serviram como guias, informantes, e carregadores (chamados "criados" pelos australianos); esta colaboração, no entanto, teve um custo terrível, pois os japoneses retaliaram brutalmente contra as aldeias que ajudavam os aliados.

agosto de 1942: 

  • os nipónicos lançam uma grande contraofensiva para esmagar a guerrilha, intensificando a violência contra os civis (e fazendo recurso às famigeradas "colunas negras", timorenses de um lado e do outro, arregimentados para espalhar o terror),

(iv) a  retirada aliada e o isolamento total (1942-1943)

dezembro de 1942 - fevereiro de 1943: 

  • face à insustentabilidade da situação, a marinha australiana realiza uma série de operações secretas para evacuar os seus soldados; a grande maioria dos comandos é resgatada, deixando a população timorense à mercê da brutalidade das forças de ocupação japonesas e dos seus colaboracionistas; 
  • as autoridades e cidadãos portugueses que não tinham sido evacuados foram, na sua maioria, internados em campos de concentração;

(v) O auge da ocupação japonesa e a fome (1943-1945)

  •  com a saída dos aliados, os japoneses consolidaram o seu controlo, impondo um regime de terror; civis timorenses foram executados, torturados e forçados a trabalhos pesados;
  • as forças japonesas confiscaram colheitas e gado para sustentar o seu esforço de guerra; o colapso da agricultura e da pecuária, combinada com os bombardeamentos aéreos aliados que visavam as posições japonesas nos anos seguintes, levou a uma fome generalizada que devastou a população.

(vi) O fim da guerra  (1945)

  • 6 e 9 de agosto de 1945:  bombas atómicas sobre Hiroshima e Nagasaãqui;
  • 15 de agosto:  o  Imperador Hirohito anuncia a rendição incondicional do Japão, terminando a II Guerra Mundial.
  • 5 de setembro: o comandante das forças japonesas em Timor-Leste,  coronel Kaida Tatsuichi, encontra-se com o governador português interino para comunicar a rendição;
  • 6 de setembro;: os japoneses começam a retirar do território;
  • 11 de setembro: as forças japonesas em Timor rendem-se formalmente aos australianos em Kupang (capital da parte holandesa).
  •  a 27, chegam a Díli os avisos "Bartolomeu Dias" e "Gonçalves Zarco", e, dois dias depois, a 29, o aviso "Afonso de Albuquerque" e o T/T "Angola", vindos de Lourenço Marques, e ainda, a 9 de outubro, o vapor "Sofala", com tropas expedicionárias, novos funcionários e mantimentos.

Em resumo: 

  • a invasão de Timor demonstrou os limites da neutralidade  portuguesa e as ambiguidades ou fragilidades da diplomacia do Estado Novo durante o conflito;
  • a experiência da ocupação e resistência marcou profundamente a identidade timorense, sendo memória central da história do país e das relações com Portugal e a Austrália;
  • estes factos e datas  são unanimemente reconhecidos nas fontes académicas, relatos de sobreviventes e historiografia portuguesa, australiana e timorense, confirmando que ocupação japonesa foi uma das maiores catástrofes da história de Timor-Leste (infelizmente seguida, 30 anos depois, pela ocupação dos indonésios); 
  • embora os números exatos sejam difíceis de apurar, as estimativas indicam que entre 40 mil  e 70 mil timorenses (Ramos Horta fala em 40 mil)  terão morrido,  em resultado direto da ocupação e da violência, ou seja indireto, através da fome e das doenças (uma perda que representava entre 10% a 15% da população da época, um a proporção mais ou menos equiparável ao do genocídio praticado pelos indonésios, entre 1975 e 1999).

Vd. RTP Ensina > A ocupação  de Timor pelos japoneses (vídeo, 6' 01'')


(Pesquisa: LG / Blogue  + Assistente de IA (Gemini, ChatGPT, Perplexity)

(Condensação, revisão / fixação de texto: LG)
 

______________________

Notas do editor LG:

(*) Último poste da série > 

(**) Vd. poste de:


14 de setembro de 2024 > Guiné 61/74 - P25941: Timor: passado e presente (21): Notas de leitura do livro do médico José dos Santos Carvalho, "Vida e Morte em Timor durante a Segunda Guerra Mundial" (1972, 208 pp.) - Parte XII: O regresso à Pátria e o fim do anátema de 'deportado' (pp. 102-107)

domingo, 14 de setembro de 2025

Guiné 61/74 - P27218 Efemérides (467): Homenagem do povo de Vila do Conde, no passado dia 9, ao Padre Bártolo Paiva Gonçalves Pereira, capelão-chefe no CTIG (1966/67) e autor do recente livro de memórias "O Capelão Militar na Guerra Colonial" (Virgílio Teixeira, ex-Alf Mil SAM, CCS/BCAÇ 1933, 1967/69)





Padre Bártolo  Paiva Pereira (n. 3 set 1935, Santo Tirso).
Foi capelão-chefe no CTIG (1966/67); 
é autor de diversas publicações, a última das quais o livro de memórias,
 "O Capelão Militar na Guerra Colonial" (2025).
 Vive em Vila do Conde.


1. Mensagem do Virgílio Teixeira, natural do Porto, a viver em Vila do Conde (foi alf mil SAM, CCS/BCAÇ 1933, Nova Lamego e São Domingos, 1967/69).

 
Data - terça, 9/09/2025 13:39  
Asunto - Homenagem ao nosso capelão-chefe no CTIG, Padre Bártolo (*)

Caros amigos,

Alguns aspectos da cerimónia de homenagem merecida ao nosso Padre Bartolo, nosso amigo, embora eu não corresponda com idas à missa, a minha mulher faz isso pelos dois.

A ordem (das fotos)  é aleatória, não tem critérios nenhuns.

Na minha apresentação do nosso Padre, esqueci um pormenor importantes, ele após o 25 de Abril, foi para Capelão nos Comandos da Amadora, tornando-se grande amigo do comandante Jaime Neves - já falecido - e no seu livro diz expressamente que foi o melhor militar, e que é "o seu herói" preferido.

Estive a ler a historia dos Capelães militares e a lista de todos e o Curriculum do Padre Bartolo.

Já sabia alguma coisa, mas agora sei muito mais.

Hoje não vou trabalhar mais nisto, porque o meu filho Bruno está a ser operado ao Joelho, e vamos estar ocupados.

Tinha já estas fotos, que envio, mas há mais.

Vila do Conde, 9 de setembro de 2025

Vt



Foto nº 1 > Vila do Conde > ) 9 de setembro de 2025 >  Aspecto geral do interior da igreja matriz. Ao fundo, o padre Bártolo a celebrar a missa


Igreja Paroquial de Vila do Conde / Igreja de São João Baptista IPA.00005249
Portugal, Porto, Vila do Conde, Vila do Conde

Arquitectura religiosa, gótica, manuelina, renascentista. Igreja tardo-gótica de planta em cruz latina com 3 naves de diferente altura e cabeceira tripla, com portal axial manuelino, muito semelhante ao da Igreja de Azuaga na Estremadura espanhola. Torre sineira renascentista. As paredes que formam a nave central e a capela-mor, em toda a sua extensão, estão coroadas por duas ordens de merlões. Grande torre sineira quadrangular, impondo-se à frontaria e a toda a igreja pelo volume e quase ausência de ornamentação, com excepção para o balcão de balaústres assente em mísulas. Pia manuelina. Capela lateral inteiramente forrada a azulejo do séc. 17. O janelão voltado a O. mostra uma cena de Cristo de fortes efeitos cromáticos. Vitrais do princípio deste século executados em Paris, representando a vida de S. João Baptista. (Fonte: SIPA - Sistema de Informação para o Patrim+onio Arquitetctónicvo



Foto nº 2 >  Fachada da Igreja Paroquial de Vila do Conde / Igreja de São João Baptista, monumento nacional desde 1910.

 



Foto n º 3 > Panorama do histórico convento de Santa Clara, visto apartir do hotel Santana do outro lado do Rio Ave, no monte Santana, É o ex-libris da cidade, temn 700 anos de história, é um hotek de 5 estrelas, do grupo Lince.


Fotos (e legendas): © Virgílio Teixeira (2025). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]
___________________

Nota do editor LG:

(*) Vd. poste de 7 de setembro de 2025 > Guiné 61/74 - P27194: Efemérides (466): Homenagem do povo de Vila do Conde ao Padre Bártolo Paiva Gonçalves Pereira, Capelão Militar em Angola, Guiné e Moçambique, a levar a efeito hoje, dia 7 de setembro (Virgílio Teixeira, ex-Alf Mil SAM)

domingo, 7 de setembro de 2025

Guiné 61/74 - P27194: Efemérides (466): Homenagem do povo de Vila do Conde ao Padre Bártolo Paiva Gonçalves Pereira, Capelão Militar em Angola, Guiné e Moçambique, a levar a efeito hoje, dia 7 de setembro (Virgílio Teixeira, ex-Alf Mil SAM)

Virgílio Teixeira 
1. Mensagem do nosso camarada Virgílio Teixeira, ex-alf mil, SAM , CCS / BCAÇ 1933 (Nova Lamego e São Domingos, 1967/69), com data de hoje, 7 de setembro de 2025:

Boa noite, Luís:
Lembrei-me agora desta homenagem que o povo de Vila do Conde vai fazer, hoje domingo, dia 7 de setembro, a uma figura ligada ao sacerdócio e nesta época em Vila do Conde.

O povo juntou-se e angariou 150 convivas para a sua homenagem, como homem bom, de fé, culto e amigo.

Fez 90 anos no dia 3 de setembro e hoje, dia 7, vai celebrar o seu aniversário e em especial uma homenagem ao padre em si.

É do concelho de Santo Tirso, foi incorporado no serviço militar como capelão. Passou 30 anos na tropa e 13 dos quais nos cenários de guerra. Está reformado como major graduado. É do meu tempo na Guiné embora nunca o tenha conhecido lá .Era capelão-mor no QG. Passou por Angola, Guiné e Moçambique, onde deixou obra feita.

Depois de 30 anos de tropa, reformou-se e esteve na Suíça outros 30 anos como sacerdote onde aprendeu muita coisa das vidas. É homem sem pergaminhos, aberto, conversado e de uma enorme cultura geral.

É nosso amigo, dá missa ainda aqui na Igreja do Desterro e é ele que preside a todas as cerimónias militares. Não se lhe conhecem convicções.

Vive sozinho aqui perto em zona de primeira, vive bem com boas reformas. Uma irmã vem fazer a sua sopa e ajudar na casa.

Tornámo-nos amigos de café onde passamos as tardes de domingo. Agora juntou-se outro casal amigo, o ex-alferes Alberto Leite,  da CHERET, de que já aqui foram publicados alguns excertos da sua vida.

Podemos falar à vontade de tudo,  ele sabe mais que nós todos.

Não há tempo para dizer muito mais, dos livros que escreve oferece sempre um exemplar com dedicatória, como este que junto umas fotos. O próximo a sair é sobre a mulher.

Os festejos começam com missa às 11h na Igreja Matriz, depois almoço no hotel Santana.
Seguidamente as celebrações na Matriz.

Não há nada de política, são causas espontâneas do povo. Nem apoio religioso. Embora esteja também inscrito, o padre da paróquia, por sinal não se dão bem. São gerações com 45 anos de diferença. O padre mestre é um pretensioso que ninguém vai à sua bola, as pessoas fogem dele, de origem burguesa que só usa tudo de marca e luxo.

Caso interesse, esta referência no blogue fica ao teu cuidado.
Boas vindimas.

Um abraço
Virgílio

2. Comentário do editor LG:

O padre Bártolo Paiva Pereira é o n.º 28 da lista dos 102 capelães que serviram o exército, no CTIG, entre 1961 e 1974. (Houve mais 7 na Força Aérea e 4 na Marinha; no total, 113.) E foi um dos quatro que exerceu funções de capelão-chefe. 

Esteve no CTIG em 1966/67. Aproveitamos para lhe mandar um "balaio" de parabéns e votos de saúde e alegria, por ocasião do seu 90º aniversário, em nome dos editores e dos demais amigos e camaradas da Guiné.  

Fica convidado a integrar a nossa Tabanca Grande, tendo como padrinho o seu amigo, vizinho e camarada Virgílio Teixeira. Gostaríamos de poder reproduzir alguns excertos do seu livro. E, se possível, ter acesso a um exemplar. Que Deus, Alá e os bons irãs o protejam!
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Nota do editor

Último post da série de 19 de agosto de 2025 > Guiné 61/74 - P27133: Efemérides (465): 21 de Julho, Dia da Arma de Cavalaria, comemorado em 1970, em Nova Sintra, com rabanadas (Aníbal José da Silva, ex-Fur Mil Vagomestre)

segunda-feira, 1 de setembro de 2025

Guiné 61/74 - P27174: Felizmente que ainda há verão em 2025 (29): Olha que não, Rosinha, olha que não... Sempre houve incêndios florestais no Portugal Mediterrânico... Mas há quem proponha que se corte as mãos aos incendiários...


edição de 9 de setembro de 1966. Reportagem de Joaquim Letria e Pedro Rafael Santos


1. Trágica efeméride: d
aqui a dias cumprem-se 59 anos sobre o incêndio que devastou 5 mil hectares (cerca de um terço da área plantada)  na Serra de Sintra e causou a morte a 25 militares do Regimento de Artilharia Antiaérea Fixa de Queluz.

Cinco mil hectares. Esta foi a área aproximada que ardeu no trágico incêndio que deflagrou na Serra de Sintra em setembro de 1966, um dos maiores e mais devastadores incêndios florestais da história da região.

O fogo, que teve início a 6 de setembro de 1966, lavrou durante vários dias, consumindo uma vasta mancha florestal, estimada em cerca de um terço da área arborizada da serra na altura. As chamas, impulsionadas por ventos fortes, alastraram rapidamente, ameaçando a vila de Sintra e marcos históricos e naturais.

Para além da imensa perda a nível de património natural, o incêndio de 1966 na Serra de Sintra ficou marcado, para sempre,  pela morte de 25 militares do Regimento de Artilharia Antiaérea Fixa de Queluz, que perderam a vida enquanto combatiam as chamas.

A tragédia teve um profundo impacto no país e levou a uma maior consciencialização sobre a necessidade de prevenção e combate a incêndios florestais em Portugal.

2. Disse o Fernando Ribeiro, em comentário ao poste P27166(*):

Antº Rosinha, em Portugal sempre existiram incêndios e sempre existirão, porque são uma forma de a Natureza se renovar. Não há volta a dar-lhe. 

O que não existia, era tantos eucaliptos e tantos pinheiros bravos, que ardem como palha, nem tanto despovoamento do interior. 

Em 1966, concretamente, morreram 25 militares no combate a um incêndio ocorrido na serra de Sintra. 

Durante as muitas caminhadas que fiz na serra de Sintra, aos fins de semana, estive mais do que uma vez no local onde eles morreram, que se situa perto do convento dos Capuchos. O local está assinalado por uma cruz e uma placa de mármore com os nomes das vítimas, e o terreno em volta estava totalmente desmatado. 

Para lá se chegar, sai-se de uma encruzihada próxima dos Capuchos, onde confluem as estradas para o palácio da Pena, para o convento dos Capuchos, para o Pé da Serra e para a Peninha. Sobe-se por uma "picada" que sai dessa encruzilhada no sentido do Monge (um túmulo pré-histórico) e que acaba por desembocar perto da Peninha. 

Os pormenores do trágico incêndio podem ser lidos aqui: 


3. De facto, sempre houve fogos florestais em Portugal ao longo dos séculos, não é só um fenómeno exclusivo da atualidade... 

Só por populismo, demagogia ou ignorância histórica se pode afirmar o contrário, nomeadamente nas redes sociais,  procurando-se tirar partido, emocional e politico-partidariamente, da tragédia que são sempre, todos os anos, os incêndios em Portugal e demais países de clima mediterrânico (Espanha, Sul de França, Itália, Grécia, etc.).

Mas em breve voltaremos à barbárie: cortem-se as mãos aos incendiários, já se ouve por aí... Ou, então, acabem-se com os isqueiros e as caixas de fósforos em Portugal. E até mais: encerrem-se as gasolineiras...

A afirmação
 de que sempre houve incêndios florestais em Portugal ao longo do séc. XX acaba por ser uma realidade histórica inegável. 

O que mudou, e muito,  foi perceção pública e a escala dos incêndios  nas últimas décadas. Estamos de acordo o Fernando Ribeiro.

E depois, é bom não esquecer (!),  havia quem, até aos 25 de Abril de 1974,  decidisse por nós, cidadãos de 2ª classe,  o que podíamos ler ou não nos jornais, ouvir ou não na rádio, ver ou não na televisão...

Os registos históricos confirmam que o fogo foi um elemento recorrente e transformador das paisagens rurais e florestais portuguesas durante todo o século passado e séculos anteriores.

Uma conjugação de fatores, desde políticas de florestação a profundas alterações socioeconómicas, moldou a história dos incêndios no país.

Os incêndios florestais em Portugal têm raízes históricas profundas e são resultado tanto de processos naturais quanto de atividades humanas de gestão do território ao longo dos séculos. 

Se olharmos para registos históricos, relatos de cronistas, arquivos municipais e até estudos de paleobotânica, vemos que os incêndios rurais e florestais existiram sempre, de Norte a Sul do país, associados a vários fatores.

(i) Registos históricos de incêndios florestais

Existem indicações de uso e ocorrência de fogos florestais que remontam a milhares de anos, detetados por depósitos de carvão com mais de 11 mil  na Serra da Estrela, associados a grandes incêndios ligados à ocupação humana e gestão agropastoril.

Desde a Idade do Bronze e do Ferro, o fogo foi utilizado para desflorestação e construção de novas áreas agrícolas, o que provocava incêndios regulares.

Registos escritos de municípios portugueses já no século XIV documentam preocupações e legislação para evitar incêndios em matas, particularmente zonas de sobreiros e azinheiras.

(ii) Incêndios notáveis nos séculos XIX e XX

No Pinhal de Leiria, registaram-se grandes incêndios, como os de 1806, 1814, 1818, 1824 (cerca de 4.000 ha), 1825 (cerca de 5.000 ha) e 1875 (cerca de 300 ha).

No séc. XIX, já se encontravam em vigor portarias e legislação para proteção florestal e combate às queimadas.

Desde a década de 1960, os incêndios passaram a ser mais frequentes, intensos e recorrentes.  

Tornam-se mais comuns a partir dos anos 1970 devido a profundas transformações sociais, demográficas e económicas (guerra do ultramar, emigração, expansão de áreas florestais, sobretudo de eucalipto, abandono rural, industrialização e urbanização do país, etc.).

Repare-se nestes dados:

1930 > Censo da população > 6 825 883 habitantes (Continente e Ilhas). Só 1 em cada cinco portugueses (19%) residia em cidades (594 mil em Lisboa, 232 mil no Porto e 485 mil nas restantes);

1950 > População activa: 3.2 milhões (50% no sector primário, 24% no sector secundário e 26% no sector terciário); por outro lado, mais de quarenta anos depois da instalação, por Alfredo da Silva, das primeiras fábricas de produtos químicos nos terrenos de aluvião da Margem Sul do Tejo, o complexo químico-industrial do Barreiro ocupava então uma área de 21 hectares; o maior grupo económico português era constituído por centena e meia de empresas e 10 mil trabalhadores.

1951 > Inauguração da barragem de Castelo de Bode, uma obra emblemática do Estado Novo e elemento-chave do plano de electrificação de 1944, e da industrialização do país; inaugurada, também nesse ano,  a ponte de Vila Franca de Xira, permitindo uma mais rápida ligação Norte-Sul.

(iii) O fogo como fenómeno mediterrânico natural

O fogo é considerado um fenómeno natural nos países do Mediterrâneo, tendo papel importante na dinâmica ecológica e na sucessão de algumas espécies vegetais. Factos a destacar:
  • o uso tradicional do fogo para renovação de pastagens e controle de vegetação sempre esteve presente na paisagem portuguesa e mediterrânica;
  • os pastores eram recorrentemente acusados de "incendiários";
  • clima mediterrânico. verões longos, quentes e secos,  favorecem a propagação do fogo;
  • práticas agrícolas tradicionais, como as queimadas para renovação de pastagens ou limpeza de terrenos, que muitas vezes saía fora de controlo;
  • trovoadas secas (factor a não negligenciar como causador de incêndios, tal como na Guiné);
  • descuidos e acidentes: desde tempos medievais há relatos de incêndios ligados a fogueiras,  produção de carvão, cal, forjas, etc. ou até relâmpagos;
  • estrutura da vegetação: matos, pinhais, sobreirais, giestais e eucaliptais (mais recentes) sempre foram combustíveis disponíveis; todavia, o coberto mediterrânico, com sobreiros, azinheiras e castanheiros é mais resistente ao fiogo.
Refira-se que o eucalipto foi introduzido em Portugal em meados do séc. XIX:  os  primeiros exemplares plantados em jardins e hortos botânicos destinavam-se a  fins... terapêuticos e científicos.

 Planta exótica, acabou por se tornar uma praga:  as plantações comerciais iniciaram na década de 1880, invadindo propriedades privadas e Matas Nacionais. 

 O Eucalyptus globulus tornou-se a espécie dominante (devido à sua boa adaptação ao nosso clima e ao seu rápido crescimento). (Passemos por cima do seu peso na economia portuguesa, na estrutura do emprego, etc.)

A diferença em relação ao passado, e no que diz respeito aos incêndios florestais,  é a escala, a frequência e o impacto socioeconómico:

  • antes, os fogos eram mais localizados, porque a floresta estava mais fragmentada entre campos agrícolas, baldios e áreas de pastoreio;
  • nos nossos dias, com o abandono rural, a continuidade de matos e florestas densas e a expansão do eucalipto e do pinheiro, o fogo alastra de forma muito mais rápida e devastadora.

Portanto, dizer que "só há incêndios hoje" é, de facto, uma mistificação histórica. O que mudou foi o contexto social, económico e ambiental, que faz com que os fogos atuais sejam mais extensos e difíceis de combater.
 
Aqui vão alguns exemplos documentados que ajudam a perceber que os incêndios florestais fazem parte da história de Portugal muito antes do século XX:

 
(iv) Portugal a ferro e fogo... Da Idade Média à Época Moderna

Séc. XIV

Nas Ordenações Afonsinas já aparecem normas para punir quem fizesse queimadas descuidadas que levassem a incêndios em montes e matos.

Séc. XV-XVI 

Há registos em cronistas e câmaras municipais de incêndios em pinhais e matos, sobretudo ligados à preparação de terras para agricultura ou pastoreio.

Pinhais de Leiria (plantados desde o reinado de D. Afonso III e expandidos por D. Dinis) sofreram incêndios várias vezes nos séculos XVI e XVII; há referências a fogo “que ardeu muitos pinheiros” e necessidade de reflorestação.

Séc. XVIII

O Terramoto de 1755 originou também incêndios urbanos e rurais que se estenderam a zonas florestais próximas de Lisboa e outras zonas atingidas.

Em 1792, um alvará régio regulava o uso do fogo em baldios e pastagens, por causa dos “grandes danos dos fogos desmandados que frequentemente incendeiam os matos e arvoredos”.

Séc. XIX

Há várias notícias em jornais da época sobre incêndios em pinhais, matas e serras. Por exemplo:

1824: referência a incêndios no Pinhal de Leiria; criação da AGMR (Administração Geral das Matas do Reino).

1843: notícia no Diário do Governo sobre fogos em matas nacionais.

1853: grandes incêndios em Trás-os-Montes e Beiras são relatados como “desgraças repetidas”;

1876: grandes incêndios no Alentejo;
 
1882/83:  grandes incêndios na Mata do Buçaco.

Desde o início do século XIX, existiam preocupações institucionais e técnicas sobre a gestão florestal e a prevenção de incêndios, especialmente com a criação em 1824 da AGMR e os trabalhos de campo e científicos de silvicultores como:

  • José Bonifácio de Andrada e Silva (fim do século XVIII / início do XIX); 
  • Bernardino António de Barros Gomes (1839–1910);
  • Adolfo Möller (formado na Alemanha, responsável pela arborização de margens do rio Mondego, na década de 1860).

Em resumo: podemos afirmar com segurança que os incêndios florestais sempre existiram em Portugal. 

O que acontece nos séc. XX e XXI é que, com o êxodo rural, a continuidade do coberto vegetal e a monocultura florestal (eucalipto), os fogos passaram a ser mais extensos e mais frequentes. E as preocupações com a sua prevenção já são não de agora.

 
(v) Incêndios florestais: uma constante na paisagem portuguesa do Séc. XX 

Embora a sistematização de dados sobre áreas ardidas só se tenha tornado mais rigorosa a partir da década de 1980, é possível delinear uma cronologia de eventos significativos que marcaram o século XX.

No início do século, os incêndios eram frequentes, mas muitas vezes de menor dimensão e mais ligados a práticas agrícolas e pastoris. 

A gestão do fogo fazia parte do quotidiano rural, sendo utilizado para a renovação de pastagens e limpeza de terrenos. No entanto, a falta de controlo resultava frequentemente em incêndios de maior escala.

A partir da década de 1960, a frequência e a dimensão dos grandes incêndios florestais começaram a aumentar de forma notória.

 Eventos como os incêndios em Vale do Rio/Figueiró dos Vinhos e Viana do Castelo (1961), na Serra de Sintra (1966) (que resultou na morte trágica de 25 militares) e na Serra de Monchique (1966), evidenciaram uma nova e mais perigosa realidade.

As décadas seguintes foram marcadas por uma escalada no número de ocorrências e na área ardida. 

O ano de 1986 assinala um marco sombrio, com o primeiro incêndio a ultrapassar os 10 mil  hectares. 

A partir daí, os "mega-incêndios" tornaram-se uma preocupação crescente, culminando em anos de extrema severidade já no final do séc. XX e no início do séc. XXI.


(vi) As Raízes do problema: causas e consequências

A omnipresença dos incêndios florestais em Portugal no séc. XX pode ser atribuída a um complexo de causas interligadas:
  • Políticas de Florestação: 
No Estado Novo nacionalizou baldios e implementou uma vasta campanha de florestação, com o objetivo de combater a erosão dos solos e aumentar a riqueza florestal do país. 

No entanto, a aposta em monoculturas de espécies de rápido crescimento e elevada inflamabilidade, como o pinheiro-bravo e, mais tarde, o eucalipto, criou vastas áreas contínuas de combustível, propícias à propagação de grandes incêndios.

  • O Êxodo rural e o abandono de terras: 
A partir de meados do século, a intensificação do êxodo rural para os centros urbanos e para o estrangeiro provocou uma profunda alteração na paisagem e na estrutura social do interior do país. 

O abandono de terras agrícolas e de práticas tradicionais de gestão do território levou à acumulação de matos e outro material combustível, tornando as florestas mais densas e perigosas.

  • Declínio da agricultura e pastorícia tradicionais: 
A diminuição da pastorícia extensiva (incluindo a transumância)  e da agricultura de subsistência, que anteriormente garantiam a limpeza de vastas áreas de mato, contribuiu significativamente para o aumento da carga de combustível nas florestas.

  • Fatores humanos: 
A esmagadora maioria das ignições teve origem humana, seja por negligência (queimadas mal controladas, fogueiras, foguetes lançados em festas e romarias, etc.) ou por ação intencional (fogo posto, piromaníacos, incendiários). 

A falta de sensibilização e de fiscalização foram fatores que potenciaram este problema ao longo de décadas.


(vii) A evolução (lenta) da prevenção e do combate

A resposta do Estado, das empresas e da sociedade aos incêndios florestais evoluiu de forma lenta e reativa ao longo do século XX.

Nas primeiras décadas, o combate aos incêndios era rudimentar, dependendo largamente da mobilização de populares, com meios escassos e pouco eficazes. 

A estrutura de bombeiros voluntários, embora fundamental, debatia-se com a falta de formação e de equipamentos adequados para fazer face a grandes incêndios florestais.

A tragédia da Serra de Sintra em 1966 foi um ponto de viragem que expôs as fragilidades do sistema de combate e alertou para  a necessidade de uma estrutura mais bem organizada. 

No entanto, só nas últimas décadas do século se assistiu a uma aposta mais significativa na:

  • profissionalização dos bombeiros;
  • criação de corpos especializados;
  • aquisição de meios terrestres e aéreos mais sofisticados.

As políticas de prevenção também tardaram em ser implementadas de forma eficaz. A aposta centrou-se durante muito tempo no combate, em detrimento de uma gestão florestal integrada que promovesse a descontinuidade dos combustíveis e a criação de mosaicos agrícolas e florestais mais resilientes ao fogo.

Em suma, a história dos incêndios florestais em Portugal no século XX é a crónica de uma paisagem em transformação, marcada por decisões políticas, mudanças sociais profundas e uma crescente vulnerabilidade ao fogo, agravadas pelas alterações climáticas. 

A afirmação de que "sempre houve incêndios" é, portanto, um ponto de partida para a compreensão de um problema complexo e multifacetado que continua a desafiar o país no presente e no futuro imediato. (**)


(Pesquisa: LG | Assistente de IA / ChatGPT, Gemini, Perplexity)

(Revisão / fixação de texto, negritos e itálicos: LG)
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Notas do editor LG:

(*) Vd. poste de 30 de agosto de 2025 Guiné 61/74 - P27166: Os 50 anos da independência de Cabo Verde (9): Secas e fomes levaram ao longo do séc. XX à morte de mais de 100 mil pessoas

quarta-feira, 27 de agosto de 2025

Guiné 61/74 - P25156: Capas da Ilustração Portugueza - Parte XI: as "campanhas de pacificação e ocupação" do sul de Angola; o desastre do Vau do Pembe (em 25 de setembro de 1904)

 


Tropas portuguesas da guarnição de Angola, a caminho do interior,  preparando um bivaque (segundo um croquis)


Capa da Illustracão Portuguesa, I Ano, nº 49, 10 de outubro de 1904 (Edição semanal, Empresa do Jornal O Século, Lisboa; editor, José Jourbert Chaves) (Cortesia de CM Lisboa / Hemeroteca Digital) (*)


1. O semanário dedica a capa e as duas páginas centrais às "Guerras de África: alguns oficiais portugueses na guerra dos cuanhamas" (pp. 0776/0777), que se traduziu por um "terrível desastre":


"A notícia deste terrível desastre impressionou vivamente o país e veio lançar o luto sobre as armas portuguesas. Habituados a constantes vitórias em África, vitórias que têm colocado os nossos soldados entre os melhores do mundo, a derrota agora sofrida cai sobre nós como uma calamidade e vem demonstrar a razão que tinha a imprensa, quando, com o Século à frente, achava insuficiente o número de expedicionãrios. Para demais s já desde 1896 se sabia as forças de que dispunham esses inimigos, pois tendo ido em comissão o capitão Luna de Carvalho teve ocasião de dizer algumas coisas sobre




a situação dos cuanhamas. O régulo Jula vivia em Oujiva e em sua residência havia mobiliário europeu, e ele vestia à europeia, como os seus grandes. Os cuanhamas tinham cerca de 10.000 guerreiros, armados à moderna, dispunham entre eles de bons cavaleiros e esse número deve ter aumentado consideravelmente até agora, calculando-se em 50.000 homens as forças atuais.

Foi por isso uma temeridade atacar esses vizinhos dos herreros, famosos guerreiros que noutros encontros têm batido as tropas alemães; porém decerto os nossos teriam vencido se fosse



mobilizado maior número, como tantas vezes se aconselhou. O destacamento que ia ao encontro dos cuanhamas, era composto de dois pelotões de infantaria europeia, quatro pelotões de infantaria indígena, duas bocas de fogo e uma secção de artilharia, na totalidade de 409 homens, dos quais foram mortos 254, contando entre eles 16 oficiais e 13 sargentos.

O corpo principal da coluna não entrara em fogo e concentrou-se no dia seguinte no Humbe, tendo-se dado a chacina pela noite na margem do Cuneme, sendo os atacantes os cuamatas, povo aliado


dos cuanhamas e como eles dispondo de forças importantes. O comandante das tropas era o capitão de engenharia João Maria d' Aguiar, governador da Huila, que se encontrava com a coluna, pois do contrário teria sido vítima com os seus camaradas.

Oficial valente e distinto, sem dúvida tirará uma brilhante desforra deste desastre que tanto vem enlutar a pátria portuguesa.

Fonte: Excertos de Illustracão Portuguesa, I Ano, nº 49, 10 de outubro de 1904, pp. 0776/0777)

(Revisão / fixação de texto: LG)


1. Uma efeméride trágica: foi em 25 de setembro de 1904, vai fazer agora 121 anos, que o exército português sofreu uma sério revés nas campanhas de pacificação e ocupação do sul de Angola.


A cerca de 500 quilómetros da costa, uma coluna comandada pelo governador da Huíla, o capitão de engenharia João Maria de Aguiar (de que fazia parte Gomes da Costa, mais tarde líder do golpe de estado militar do 28 de maio de 1926), internou-se para lá do rio Cunene, através do vau do Pembe.  

Portugal estava decidido a bater o pé aos alemães que que estavam a expandir, para norte, a sua colónia do Sudoeste Africano Alemão (1884-1915) (hoje Namíbia, independente da África do Sul, desde 1990). (**)

(..) "Só em 1904 é que os portugueses lançaram a primeira grande campanha além-Cunene, para ocupar o Reino do Cuamato Pequeno, do Cuamato Grande e o Reino Cuanhama mas esta redundou numa derrota na Batalha do Vau do Pembe

"O 'Desastre do Pembe' galvanizou os ovambos, em particular os cuamatos, que começaram a atacar tribos sob a protecção de Portugal e até a ameaçar fazendas na margem norte do Cunene mas galvanizou também a opinião pública portuguesa, que forçou o governo português a intervir na região." (...) (Vd. Wikipedia > Campanhas de Pacifiocação e Ocupação).


Os Portugueses, apanhados numa emboscada, caíram às mãos de outra tribo do grupo dos Ambós, os Cuamatos, e deixaram no local duas centenas e meia de mortos (mais de cem,. de origem metropolitana), o que representou, à escala africana, uma trágica surpresa para a Europa colonizadora (Portugal, Alemanha, Grã-Bretanha).

A ermboscada do Vau do Pembe (um ponto de travessia do rio Cunene) foi descrito pela "Ilustraçáo Portuguesa",  duas semanas depois (na edição de 10 de outubro de 1904) como um desastre  para as tropas portuguesas lideradas pelo capitão Luís Pinto de Almeida, que trouxe imensa dor e luto para a pátria portuguesa.

 João Roby (1875-1904), oficial da armada, é uma das figuras centrais da memória da Batalha do Vau do Pembe (também conhecida como Combate de Umpungo).
 
(Imagem à esquerda:  foto de João Roby,  "IIustração Portuguesa",I Ano, nº 49, 10 de outubro de 1904, pág. 0776).
 
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Notas do editor LG:


(**) Com a ajuda do ChatGPT, apurei o seguinte sobre este "protetorado alemão" (1884-1915):

(i) em 1884, a  Alemanha (com o chanceler Otto von Bismarck, o pai-fundador da Alemanha Moderna),no contexto da “Partilha de África” (Conferência de Berlim, 1884-1885), declarou protetorado sobre a região costeira do atual Namibe/Namíbia, a pedido de comerciantes e colonos alemães, nomeadamente Adolf Lüderitz (1834-1886), que já tinha adquirido, de maneira fraudulenta,  terras aos chefes locais;

(ii) a colónia foi chamada Deutsch-Südwestafrika (Sudoeste Africano Alemão) e foi a primeira e a mais importante colónia de povoamento alemã em África;

(iii) tinha, desde 1891, a capital em  Windhoek;  o número de colonos alemães andava à volta dos  15 a 20 mil (antes da Primeira Guerra Mundial);

(iv) a economia colonial assentava sobretudo na criação de gado, na agricultura e, a partir de 1908, nas importantes minas de diamantes descobertas em Lüderitz;

(v) o "protetorado" encontrou forte resistência por parte das populações locais:  Herero, Nama (também chamados Hotentotes, povo nómada), Damara e San;

(vi) 1904-1908: genocído dos Herero e Nama: rebeliões contra a ocupação alemã, foram reprimidas de forma extremamente violenta; o general Lothar von Trotha aplicou  uma política de extermínio; como resultado: dezenas de milhares de pessoas (entre 65% e 80% dos Herero e cerca de 50% dos Nama) morreram em massacres, perseguições no deserto, inanição, envenenamento de poços  e campos de concentração (no que foi considerado mais tarde, pela ONU,  o primeiro ou um dos primeiros genocídios do séc. XX).

(vii) extinção do protetorado: em 1915, no decurso  da Primeira Guerra Mundial, forças da União da África do Sul (do Império Britânico) invadiram e ocuparam o território;

(viii) em 1919, pelo Tratado de Versalhes, a Alemanha perdeu todas as suas colónias; o Sudoeste Africano passou a estar sob  mandato da Sociedade das Nações (antecessora da ONU), administrado pela África do Sul, situação que se prolongaria até à independência da Namíbia em 1990. 

(Condensação, revisão/fixação de texto: LG)

terça-feira, 19 de agosto de 2025

Guiné 61/74 - P27133: Efemérides (465): 21 de Julho, Dia da Arma de Cavalaria, comemorado em 1970, em Nova Sintra, com rabanadas (Aníbal José da Silva, ex-Fur Mil Vagomestre)


1. Em mensagem de 24 de Julho de 2025, o nosso camarada Aníbal José Soares da Silva, ex-Fur Mil Vagomestre da CCAV 2483 / BCAV 2867 (Nova Sintra e Tite, 1969/70), enviou-nos uma efeméride do dia 21 de Julho de 1970, Dia da Arma de Cavalaria, passado em Nova Sintra.


O 21 de JULHO – DIA DA ARMA DE CAVALARIA e as RABANADAS, têm algo em comum?

Aparentemente não, mas será conveniente ler o texto que se segue.

Prestei serviço militar na Guiné de 01 de Março de 1969 a 22 de Dezembro de 1970, integrado numa Companhia de Cavalaria, a 2483, denominada por Cavaleiros de Nova Sintra, que pertencia ao BCAV 2867, sediado em Tite.

O dia 21 de Julho de 1970 foi passado no mato, em Nova Sintra, dia esse que esteve efetivamente ligado às rabanadas. Isto porque no reabastecimento mensal de géneros frescos, os tais que só davam para três dias, sobraram algumas dúzias de ovos, poucas, que não davam sequer para meio ovo por militar numa refeição. Para que os ovos fossem repartidos igualmente por todos (uma companhia tem mais ou menos 160 homens), resolvi mandar fazer rabanadas e desta forma comemorar a data festiva do Dia da Cavalaria, tanto mais que eu fazia nesse dia 24 anos.

O padeiro, o José Manuel Bicho teve um trabalho extra ao fazer o pão, tipo cacete e os homens da cozinha o Gonçalves e o Gonzaga, auxiliados pelos seus ajudantes deram início à “Operação Rabanada”. As fatias de pão estiveram de molho em vinho tinto, como convém e depois for embebidas em ovo batido. Na cozinha ao ar livre, iniciou-se a fritura das ditas.

Deviam ser umas três da tarde e o pessoal juntou-se à volta das fritadeiras e não arredou pé, lambendo os lábios com o cheiro da iguaria.

Mas de repente tudo mudou. Os rapazes do PAIGC vieram participar na festa, dando inicío a uma flagelação ao quartel, a uma hora não muito habitual, porque era no final do dia que costumavam visitar-nos. Ouvidos os primeiros tiros da célebre arma automática, por todos conhecida por “costureirinha”, pois tinha um matraquear parecido com uma máquina de costura, bem como o som caractrístico da saída das granades de morteito e do canhão sem recuo, disparadas longe do arame farpado, os esfomeados bateram em retirada procurando refúgio nos abrigos e nas valas onde, por vezes, resultava equimoses na cabeça e uns arranhões nos braços.

Na ânsia da fuga, o pessoal bateu com as pernas nas compridas pegas das fritadeiras, tombando-as, originando que o petisco caísse no pó do chão de terra da cozinha. Durante a flagelação ouviam-se as granadas das armas pesadas do PAIGC a silvar o céu, cruzando o aquartelamento, indo cair e rebentar com estrondo lá para os lados da bolanha. Contrariamente a outras flagelações desta vez não acertaram no alvo. Foi um susto que durou perto de dez minutos, não tendo havido feridos ou danos materiais.

Passda a tempestade veio a bonança com a malta a regressar ao local do crime (junto das fritadeiras). Só que rabanadas limpas e comestívéis havia poucas, porque a grande maioria ficou polvilhada de pó de terra, parecendo canela e até esmagadas devido à debandada. Mas ainda assim os mais gulosos e corajosos pegaram as rabanadas do chão e com todo o cuidado tiraram a terra envolvente e com meio dúzia de sopradelas, passaram a ter um petisco delicioso, sempre acompanhado por uma ou mais garrafas de cerveja de 0,66.

Terminada a festa foi tempo de tomar banho e aguardar as cinco da tarde para o jantar. Findo este, o pessoal ficou na conversa, próximos dos abrigos, prontos para o que desse e viesse, por vezes sob o magnífico luar africano, contando anedotas e discutindo os jogos de futebol, ou escrevendo à família, aos amigos, à namorada ou madrinha de guerra. Também, por vezes, ansiosos aguardavam o regresso dos camaradas que haviam saído para um patrulhamento.

Como curiosidade refiro que o Dia da Cavalaria, a nível de Batalhão foi celebrado em Jabadá, onde se encontravam os camaradas da CCAV 2484, os Dragões de Jabadá.

Aníbal Silva

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Nota do editor

Último post da série de 4 de agosto de 2025 > Guiné 61/74 - P27087: Efemérides (464): 4 de agosto de 1969, o "adeus às armas", ou o dia em que o T/T Uíge apitou.... seis vezes, antes de zarpar (Virgílio Teixeia, ex-alf mil, SAM, CCS / BCAQÇ 1933, Nova Lamego e São Domingos, 1967/69)

segunda-feira, 4 de agosto de 2025

Guiné 61/74 - P27087: Efemérides (464): 4 de agosto de 1969, o "adeus às armas", ou o dia em que o T/T Uíge apitou.... seis vezes, antes de zarpar (Virgílio Teixeia, ex-alf mil, SAM, CCS / BCAQÇ 1933, Nova Lamego e São Domingos, 1967/69)


 
Foto nº 1


Foto nº 2

T/T Uíge, no regresso a casa >  Agosto de 1969 >   O Virgílo Teixeira, de óculos escuros,  é o do meio na foto nº 1...  Era o adeus às armas, o regresso a casa... Uma efeméride sempre nostálgica e festiva, ao mesmo tempo.


Fotos (e legenda): © Virgílio Teixeira (2024). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guine]



1. Mais uma "efeméride"... Temos 464 referências com este descritor. É próprio do ser humano comemorar "efemérides"... A palavra vem do grego antigo "ephemerís" (ἐφημερίς), que queria dizer "diário" ou "registro diário". O termo é composta por 2 elementos: (i) "epí" (ἐπί), sobre, a respeito de; (ii) "hēméra" (ἡμέρα), dia...

Antes de chegar à nossa língua, passou para o latim dos nossos "colonizadores" e "esclavagistas" romanos, "ephemeris", que continuou a significar registro diário de acontecimentos.  

Quando usamos hoje  o termo "efeméride", estamos a referirmo-nos a um acontecimento importante, histórico, social ou pessoal, ocorrido numa determinada data.  Pode ou não estar registada em documento escrito, nem muito ser celebrado como feriado (o 25 de Abril, o Dia de Portugal, o Natal...). Pode simplesmente estar guardado na nossa memória: o dia em que fomos às sortes, o dia em que nascemos (que até pode ser diferente do assento na Conservatória do Registo Civil)... 

Ou simplesmente o dia em que regressámos da Guiné... É o caso de hoje: há 56 anos, o nosso camarada Virgílio Teixeira  dizia... "adeus às armas"... Com uma particularidade, algo anedótica:  foi  o dia em que o T/T Uíge apitou... seis vezes, as três primeiras vezes não valeram,  foi falsa partida, o navio só zarparia  uma hora depois... Algo de insólito aconteceu... (Virgílio, também podia ser publicado na série "Humor de caserna" esta tua "efeméride"...).


2.  Mensagem de Virgilio Teixeira, ex-alf mil SAM, CCS/BCAÇ 1933, Nova Lamego e São Domingos, 1967/69:


Data - 4 agosto 2025 , 01:40 

Assunto - 4 Agosto 69:  o Adeus às Armas... O dia em que o navio de T/T Uíge teve de esperar uma hora para zarpar


Efeméride Nunca Esquecida !

Dia 4 de agosto de 1969,  eram 12 horas,  o T/T  Uíge,  cheio,  ao largo de Bissau, pronto para arrancar rumo à nossa casa.

O heli de Spinola já dava as voltas ao navio para, como normalmente, agradecer e despedir-se das tropas que acabavam a comissão de serviço na guerra da Guiné.

Tudo a postos... e agora vem, não o humor de caserna, mas sim "o humor negro": arrancada interrompida,  ninguém sabe o que se passa!

Vemos uma LDP, uma lancha da Marinha,  a chegar em alta velocidade.  Vêm buscar um oficial miliciano para ir ao QG a Bissau!  Preso ?...

Esperamos longo tempo, uma infinidade, quando queremos deixar para trás o território da Guiné.

Uma hora depois já vemos a mesma LDP a chegar com o oficial impedido de partir!

Ele sobe as escadas mete-se no seu camarote, e nunca falou do assunto.

O navio apita,  ou volta a apitar três vezes, as hélices já rodam e o rasto das águas a ficarem para trás, e uma hora depois lentamente já não se vê nem Bissau nem a ponte-cais, só o oceano Atlântico!...

Não há calor sufocante, nem mais humidade pegajosa!...

Em 10 de agosto chegámos a Lisboa, seguimos para Tomar, fizemos o espólio, recebemos os nossos vencimentos, despimos as fardas, recebemos a guia de marcha e fomos  para o comboio com viagem paga.

Chegámos à estação de São Bento, no Porto,  já noite.

Acabara uma fase das nossas vidas.

Faz hoje 56 anos.(**)

Virgílio Teixeira