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sexta-feira, 7 de fevereiro de 2020

Guiné 61/74 - P20627: Agenda cultural (727): lançamento, hoje, às 18h00, no Mindelo, ilha de São Vicente, da obra "Forças Expedicionárias a Cabo Verde na II Guerra Mundial”, do cor inf ref e nosso grã-tabanqueiro, Adriano Miranda Lima


Cabo Verde > Ilha de São Vicente > Mindelo >"As peças anti-aéreas do Monte Sossego; fotografia oferecida pelo  meu amigo [e conterrâneo, da Lourinhã] Boaventura [Horta] em 21/3/43."´ (*)

Foto (e legenda): © Luís Henriques (1920-2014) / Luís Graça (2017). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].




A obra “Forças Expedicionárias a Cabo Verde na II Guerra Mundial”, do nosso camarada Adriano Miranda Lima, cor inf ref,  vai ser lançada, hoje ao fim da tarde, às 18h00, no Mindelo, Ilha de São Vicente, Cabo Verde (**). A notícia foi-nos dada ontem às 16h pelo Manuel Amante da Rosa, nosso grã-tabanqueiro, que tenciona estar presente hoje, no evento.

Segundo o blogue Praia de Bote, o lançamento estava previsto para ontem,  e contaria com a com a presença do Chefe de Estado Maior das Forças Armadas de Cabo Verde, estando a apresentação a cargo da  dr.ª Ana Cordeiro, historiadora e antiga directora do Centro Cultural Português do Instituto Camões (Pólo do Mindelo), e sendo o autor, Adriano Miranda Lima,  representado pelo seu primo José Carlos Soulé.

Adriano Miranda Lima, que reside  em Tomar, nasceu no Mindelo,  S. Vicente .  Durante a guerra colonial, esteve em Angola e Moçambique. Prestou serviço durante muitos anos no RI 15 (Tomar). Esteve 40 anos sem voltar à sua terra.  Tem 15 referências no nosso blogue.

É colaborador assíduo do blogue Praia de Bote, onde  publicou,  em 2012  cerca de uma dezenas de postes sobre as forças expedicionárias a Cabo Verde na II Guerra Mundial. Colaborámos com ele autorizando a reprodução de algumas fotos dos álbuns dos "nossos pais, nossos velhos, nossos camaradas", que integararam essas forças, tendo passado  pelas ilhas de São Vicente, São Anão e/ou Sal. É também um grande defensor do património cultural de Cabo Verde.

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Sinopse:

Já quase se perde na memória do povo das ilhas que, entre 1941 e 1945, durante a II Guerra Mundial, forças militares de 5820 homens, destacadas pela então Metrópole, desembarcaram em Cabo Verde e distribuíram-se por S. Vicente (3015), Sal (2100) e S. Antão (705), onde prepararam posições defensivas contra um eventual invasor. 

Tudo aconteceu porque Portugal, embora neutro no conflito, foi pressionado pela Inglaterra e pelos EUA a reforçar a defesa das suas ilhas atlânticas (Açores, Cabo Verde e Madeira) para evitar que a Alemanha as ocupasse e tirasse proveito do seu potencial estratégico.

É de tudo um pouco que fala o livro. Da actividade militar e seus envolventes e vicissitudes de ordem operacional e logística, mas também do alvoroço que a presença das tropas representou para a rotina e a pacatez das ilhas. A narrativa debruça-se sobre a interacção dinâmica das forças militares com as circunstâncias concretas que as envolveram no quadro da sua missão, e abre espaço, e bastante, para pôr em evidência as múltiplas situações em que os militares interagiram com as populações e a sociedade civil.

Daí que haja muitas histórias para contar, e algumas de grata memória para as populações, como a acção médica e o apoio sanitário que as tropas disponibilizaram para os civis, em que se destaca sobremaneira a figura grandiosa do capitão médico José Baptista de Sousa, cuja imagem ainda perdura na memória do povo de S. Vicente. Para não falar também das sobras de rancho que mataram a fome a muitas pessoas carentes, iniciativa em que se destacou o comandante de companhia capitão Fernando Marques e Oliveira.

Relevo merece igualmente o pano de fundo social em que se desenrolou a missão das Forças Expedicionárias. As nossas ilhas foram à época assoladas por uma seca prolongada que, agravada pelo descaso ou pela inoperância do governo central, vitimou 24.463 criaturas, sobretudo aquelas que dependiam exclusivamente da agricultura para a sua sobrevivência. 

Do lado das Forças Expedicionárias reveste significado estatístico a circunstância da morte de 68 militares, trágica ironia porque as mortes não resultaram de acções violentas ligadas à actividade militar mas de doenças infecciosas que poderiam ter sido debeladas caso a penicilina estivesse já disponível em território nacional. Nesta particularidade, o quadro de carências era comum à população civil e à militar.

Portanto, nas 250 páginas do livro a historiografia cruza-se com a sociologia e conta histórias reais de homens fardados e de vidas humanas.

Fonte: Com a devida vénia ao blogue Praia de Bote, fundado e editado por Joaquim Saial, e de que o Adriano Lima  é um assíduo colaborador.

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(**) Último poste da série > 27 de janeiro de 2020 > Guiné 61/74 - P20600: Agenda cultural (726): Seminário de História do Colonialismo #2, dia 28 de Janeiro de 2020, pelas 15h30, Campus de Campolide da Nova

sábado, 14 de dezembro de 2019

Guiné 61/74 - P20450: (De)Caras (145): Maria Barba (1900-1975), a primeira embaixadora da morna, muito antes de Bana e de Cesária (Manuel Amante da Rosa / Onda Kryolu / Otília Leitão)


Nha Maria Barba, com um dos netos ao colo, em Bissau, c. anos 50, na sua casa em Bissau, na Rua Eng Sá Carneiro (hoje, Rua Eduardo Mondlane)... Nos anos 60/70, em frente da casa ficava a messe de sargentos da FAP.

Foto (e legenda): © Nelson Herbert (2019). Todos os direitos reservados. [Edição elegendagem complementar. Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Manuel Amante da Rosa,  embaixador da República de Cabo Verde, que terminou há um ano a sua missão em Itália (e Malta),  mandou-nos a seguinte mensagem em resposta a um email dirigido a Carlos Felipe Gonçalves (*), com conhecimento a vários amigos e camaradas, nomeadamente de Cabo Verde que pertencem também, doravante , à Tabanca da Diáspora Lusófona, cujo régulo, designado, assumido e empossado, é o nosso querido amigo e camarada luso-americano João Crisóstomo.


Date: quinta, 12/12/2019 à(s) 14:32
Subject: A morna imortal "Maria Barba"

Luís:

Muito feliz por vos ver juntos. O meu Amigo Kalú, meu antigo Camarada na Chefia dos Serviços de Intendência no QG [, em Bissau,], é uma figura ímpar na Rádio de Cabo Verde. 

[Em resposta ao teu pedido,] retirei este trecho sobre a Maria Barba num posto do Facebook [Onda kryolu,  12/12/2019]


2. Muito antes do Bana e da Cesária, Maria  Barba foi a primeira embaixadora da morna  

por Onda Kryolu

Foi ela que, pela primeira vez, terá cantado a morna fora das ilhas, em 1934, no Palácio de Cristal da cidade do Porto, representando Cabo Verde com um grupo de músicos e cantadeiras na Primeira Exposição Colonial Portuguesa. (**)

Seis anos mais tarde, em 1940, terá cantado e encantado na Exposição do Mundo Português em Lisboa, tendo o sucesso sido tal que foi parabenizada  pelo próprio Presidente de Portugal, Marechal Carmona.


Seu nome? Maria da Purificação Pinheiro. Ou simplesmente Maria Barba [ foto de 1934 em Portugal, (à direita)].

Maria Barba fica na história como co-autora da letra de uma das mais simples e das mais belas mornas jamais ouvidas, uma morna que leva o seu nome e até hoje cantada por muitas  das mais nobres vozes do arquipélago.

Mas quem é essa mulher que não se conhecia o rosto mas cujo nome merece figurar no Livro de Ouro da história da morna?

Neste dia em que comemoramos a elevação da morna à categoria de Património Imaterial do Mundo vale a pena recordar sua vida, prestando homenagem a essa "pioneira" da internacionalização da morna e que foi, também, uma das maiores "cantadeiras de frente de todos os tempos" e uma das maiores intérpretes do seu tempo daquela que tornaria a "musica rainha de nos terra " e hoje uma das relíquias da humanidade.

Maria Barba nasceu, provavelmente, em 1900, na Povoação Velha, Boavista, ali mesmo no berço da morna... Criancinha começou a cantar, rezando a  a história que ela tinha que ser colocada de pé sobre uma cadeira. Cresceu, e sua fama de grande cantadeira também cresceu por toda a ilha e não só, sendo   sua presença requisitada em tudo quanto era festa e  cerimónia  oficial das entidades coloniais da ilha da Boavista dos anos 30.

Foi justamente numa festa oficial de despedida, na Povoação Velha, que o Tenente Serra, na hora da partida,  a terá pedido para cantar mais uma morna a que  Maria Barba simplesmente improvisou : "Senhor Tenente um ca podê canta más ".

Vida sofrida

Maria Barba casou cedo, com um rapaz de Santa Catarina, ilha de Santiago, que nunca foi aceite pela sua família. O casamento não deu certo e o marido voltou para a ilha de Santiago, ficando ela  com duas  filhas para criar (Clarise e Aldonsa ).

É talvez para estar junto das filhas e da mãe que era "fraca"  (o pai  era morto e não "malondre",  como Bana foi o primeiro a cantar)  talvez seja para estar junto da família que Maria Barba recusou  o convite de empresários musicais para ficar em Portugal, preferindo voltar, em 1940, para a sua Boavista natal onde  aliás só encontrou fome e desolação (era  mais uma das terríveis estiagens).  

No mesmo ano (1940)  pegou nas suas filhas e  embarcou  para  Bissau a bordo do navio Manito Bento (o mesmo que levava contratados para S.Tomé ).  Em Bissau Maria Barba "luta ku vida " durante 34 anos, sempre a cantar a morna e outras melodias da sua ilha,   sempre  divulgando a música da sua terra natal em serenatas e cerimónias oficiais, quase sempre acompanhado por Zezinho Caxote, um outro cabo-verdiano radicado em Bissau. Foi em Bissau que morreu aos 70 anos no dia 02 de Julho de 1975 ( nas vésperas da independência de Cabo Verde).


3. A filha de Maria Barba,  Clarisse Pinheiro, a viver em Portugal (, fazemos votos para que ainda seja viva!), é citada por Otília Leitão num "Postal de Lisboa", publicado no jornal "A Semana", de 20 de março de 2008, cujo URL já não está disponível na Net. Aqui vão alguns excertos que publicamos em 2014 (***)

A Semana > Opinião > Otília Leitão > Postal de Lisboa, 20 Março 2008:

(...) Clarisse [Pinheiro, a viver em Portugal] fala com emoção de sua “mãe Bárbara” ou da “Maria Barba”, a autora da morna com o seu nome, que a voz do grande Bana imortalizou. É uma das mais belas e mágicas músicas que eu, como muitas outras pessoas que conheço, interiorizei como uma grande paixão do oficial de cavalaria e engenheiro civil, Serra, obrigado a partir para Lisboa. Afinal, era uma desgarrada de despedida e saudade porque o amor era pela Victória, sua amiga, de quem o Tenente que habitava numa rocha, teve duas filhas que vivem actualmente na América. (...)

Os protagonistas que deram alma a esta morna cantada também por outras vozes da modernidade, já morreram. Ele em Lisboa. Ela, no dizer de Clarisse, uma “moça bonita” da Boa Vista que tinha a particularidade de ser “tão expressiva na alegria como na tristeza”, morreu, na Guiné-Bissau, ao fim de 34 anos, em 1974, no raiar da Independência. (...)

(...) Desde criança, Maria Bárbara cantava tão bem que era habitual vê-la em cima de uma cadeira, de vestido domingueiro, animando festas e convívios, conta Clarisse. “Eu era ainda bébé, nem tinha dentes, quando a minha mãe veio cantar ao Palácio de Cristal no Porto [, em 1934], e foi recebida e cumprimentada por Craveiro Lopes”,  diz a filha,  reportando-se a 1940 quando Maria Barba, em representação da colónia de Cabo Verde, participou na grande Exposição do Mundo Português. 

Pese embora a insistência de alguns empresários para que a sua mãe ficasse em Portugal, ela escolheu regressar à Boa Vista. Pouco depois parte para a Guiné.

Por causa da letra de “Maria Barba” - a morna mais antiga que faz uma referência a Lisboa e a primeira que foi gravada na sua versão integral e a duas vozes (Luís de Matos e Maria Alice) no CD “Lisboa nos Cantares Cabo-verdianos” - não resisti a uma provocação: “Oh Clarisse! Quantas paixões silenciosas, por diversos motivos, não existiram?!”. Mas Clarisse foi convicta: “Não! Ele [, o tenente Serra,]  era casado com a Victória! Essa era a sua paixão!” e sorriu. 

É seguramente uma Morna de despedida e saudade de alguém muito estimado, mas que tem uma postura típica do período colonial em que Lisboa, a cidade que Hans Christian Andersen já em 1866 considerava “luminosa e bela”. Era o "Eldorado", de onde se esperava que viesse a salvação de todos os males do arquipélago.

Clarisse Pinheiro desmistifica a minha ilusão doce e diz-me que Maria Barba quer satisfazer o pedido do Tenente Serra em cantar mais nessa festa de despedida. Contudo tem uma tarefa a cumprir: ”Tinha que ir fazer uma matança de gafanhotos”, uma praga que afectava as culturas e que obrigava a que cada família cedesse uma pessoa para o fazer. Como o pai já tinha falecido e a mãe era “fraca”,  ela era a representante da família.

Testemunhos de vários artistas boavistenses, como António “Sancha” Neves e Noel Fortes, referem a existência de várias versões desta Morna do final do século passado, da qual a Maria Barba aproveitou a melodia para improvisar. A versão do grupo Djalunca da Boa Vista parece ser a mais fiel à letra original (...).

Clarisse Pinheiro que ouviu muitas vezes sua mãe cantar, disse que Bana se encontrou com Maria Barba na Guiné, onde ouviu pela primeira vez na rádio a sua morna. “Não há registo, não há direitos de autor, nunca foi reposta essa verdade”, observa a filha mais nova de Maria Barba que apenas conheceu Bana em Portugal, num espectáculo na FIL, movida por esse "animus" que lhe fora transmitido pela mãe. No entanto, explicou, "foi um cumprimento fugaz e banal, esfumando-se a expectativa de qualquer eventual reconhecimento", disse.

Clarisse nasceu em Santa Catarina, Santiago, em 1932, de um parto solitário,  executado pela sua própria “mãe Barba” e testemunhado pela sua irmã Aldônça, então com dois anos. Divergências entre o casal, ligadas ao facto da sua mãe, ainda menor, ter sido raptada pelo marido, e de um casamento mal visto pela família, fizeram Maria Bárbara regressar à Boa Vista, dias depois, de barco. Ainda em 1940, e porque a crise da segunda guerra mundial se fazia sentir no aumento do custo de vida, as três, aconselhadas por um tio escrivão, rumaram à Guiné num barco de Manito Bento que, antes de chegar ao destino, se perdeu pela Gâmbia. (..)
Tinha 16 anos quando sua irmã, que vivia em Bafatá, casou com um bisneto do governador Honório Barreto, e viveu na Guiné-Bissau até 1980. Geria uma farmácia do seu companheiro que conheceu na pele as perseguições da PIDE (polícia política do regime colonial). Actualmente, Fernando Lima, com 80 anos, é apenas seu amigo. Ali conheceu Amilcar Cabral, entre outras destacadas personalidades que recorriam aos seus serviços. 

“O pai de Aristides Pereira (primeiro presidente de Cabo Verde independente) era padre e baptizou os meus filhos”, recorda. Clarisse não conhece Cabo Verde. Apenas aqui voltou em 1957, aos 25 anos para descobrir no Tarrafal, seu pai, que entretanto já tinha onze filhos... Nunca mais voltou e as suas referências reportam-se essencialmente à Guiné-Bissau. 

Não resistindo à continuada degradação da sua vida, num período pós-revolucionário, fixou-se em Portugal onde estão também dois filhos e quatro netos, sem que alguma vez se tenha desligado desta triologia feminina: a mãe e as duas irmãs. (..,)

[Excertos reproduzidos com a devida vénia]
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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 9 de novembro de 2019 > Guiné 61/74 - P20328: Meu pai, meu velho, meu camarada (59): "Maria Bárbara, canta mais uma morna... / S’nhôr Tenente, ‘m câ pôdê cantá más... Uma morna imortal, numa homenagem à Morna, em vias de ser oficialmente consagrada como "património cultural imaterial da humanidade"

Vd. também 5 de dezembro de 019 > Guiné 61/74 - P20416: O que é feito de ti, camarada (8): Carlos Filipe Gonçalves, ex-fur mil amanuense, QG/CTIG, Bissau, 1973/74, membro da Tabanca Grande, com o nº 790; jornalista aposentado, vive na Praia, ilha de Santiago, Cabo Verde... Está a escrever dois livros, um sobre a história da morna; outro sobre as suas memórias dos anos de 1973/75... E precisa de duas fotos: uma do QG em Santa Luzia, e outra da messe de sargentos no QG...

(**) Vd. último poste da série "De)Caras"  > 14 de novembro de 2019 > Guiné 61/74 - P20343: (De)Caras )115): "Nha Maria Barba" ou Maria da Purificação Pinheiro (Boavista, 1900 - Bissau, 1975): expoente máximo da morna e da morabeza da Boavista, esteve no Porto, no Palácio de Cristal, em 1934, na 1ª Exposição Colonial Portuguesa: notas de leitura de um trabalho de pesquisa biográfica, feita por Antonio Germano Lima, da Universidade de Cabo Verde

Vd. também:

12 de dezembro de 2019 > Guiné 61/74 - P20443: E as nossas palmas vão para... (20): A morna, património imaterial da humanidade

11 de novembro de 2019 > Guiné 61/74 - P20332: Historiografia da Presença Portuguesa em África (184): O modelo (Maria Barba) e o fotógrafo (José Bacelar Bebiano)... A propósito de uma morna "imortal"...Resta saber quem era o "senhor tenente Serra"...evocado na letra "Mária Bárbara, canta mais uma morna... / S’nhôr Tenente, ‘m câ pôdê cantá más...

(***) Vd. poste de 9 de outubro de 2014 > Guiné 63/74 - P13713: Caderno de Poesias "Poilão" (Grupo Desportivo e Cultural dos Empregados do Banco Nacional Ultramarino, Bissau, Dezembro de 1973) (Albano de Matos) (6): Homenagem a Mário Lima e Aguinaldo de Almeida, já falecidos, meus colegas do BNU, em Bissau (António Medina, ex-fur mil inf, CART 527, Teixeira Pinto, Bachile, Calequisse, Cacheu, Pelundo, Jolmete e Caió, 1963/65; natural de Santo Antão, Cabo Verde, vive hoje nos EUA)

quinta-feira, 23 de maio de 2019

Guiné 61/74 - P19818: (Ex)citações (354): A navegação fluvial no Geba e os "barcos turras" (Manuel Amante da Rosa / Arsénio Puim)


Guiné > Zona Leste > Região de Bafaá >  Sector L1 > 1969 > O sortilégio e a beleza do Rio Geba, entre o Xime e e Bambadinca, o chamado Geba Estreito, numa das fotos aéreas magníficas do Humberto Reis, ex- Fur Mil Op Esp, CCA 12 (Contuboel e Bambadinca, 1969/71). nosso querido amigo e camarada Humberto que é também aniversariante este mês. (LG)


Foto (e legenda): © Humberto Reis (2005). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Guiné > Região de Bafatá > Setor L1 > Bambadinca > c. 1973/74 > Rio Geba Estreito e porto fluvial, em Bambadinca, na margem esquerda.


Foto (e legenda): © Luís Mourato Oliveira (2016). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].


Guiné > Bissau > Cais do Pidjiguiti > 1967 >  "Barcos turras", tripulantes, passageiros e esivadores


Foto (e legenda(: © João José Alves Martins (2012). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar:  Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].


Guiné > Região de Bafatá > Setor L1 > Bambadinca > CCS/BCAÇ 2852 (1968/70) > O alferes mil cav, cmdt Pel Rec Daimler 2046 (1968/70), Jaime Machado, num "barco turra" (que fazia ligação Bambadinca-Bissau-Bambadinca)

Foto (e legenda): ©Jaime Machado  (2015). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



1. Recorde-se aqui três  excelentes nacos de prosa sobre a navegação fluvila na Guine e os "heróicos barcos turras", do nosso tempo (*).

 Dois são  comentários de Manuel Amante da Rosa, e o outro um excerto das memórias do Arsénio Puim.

"Barco turra", e não no "barco dos turras"... Chamavam-se assim as embarcações civis que faziam a carreira Bissau-Xime-Bissau ou Bisssau-Bambadinca-Bissau... O pai do Manuel Amante da Rosa tinha uma carreira diária para o Xime, com o "Bubaque"... É possível que elementos do PAIGC, militantes ou simpatizantes, também utilizassem este meio de transporte... Não havia outros, a não a ser aéreos. A avioneta (civil ou militar) era um luxo... Muitos de nós, quando íamos a Bissau, utilizávamos o "barco turra"... Fardados, mas desarmados... Sem escolta, confiando na segurança que se fazia no Mato Cão e na Pona Varela...

O nosso ex-alf mil capelão Arsénio Puim (CCS/BART 2917, Bambadinca, 1970/72) escreveu num das suas crónicas, sobre  "cruzeiro turístico" pelo Rio Geba abaixo... Vale a pena relembrar. Não sei se também se aplicava ao "Bubaque" o epíteto de "barco turra"... O Manuel Amante da Rosa já veio dizer aqui que o pai não tinha nenhum acordo com o PAIGC. Ele prestava um serviço público, de que todos beneficiavam de um lado e do outro (população, militantes e simpatizantes do PAIGC, militares portugueses...). Em 10 anos de navegação pelo Geba acima Geba abaixo, o "Bubaque" terá sido atacado uma vez, "por engano", em 1/6/1973, à uma e tal da manhã, em São Belchior, antes de chegar a Bambadinaca



O embaixador Manuel Amante da Rota, 2013.  Cortesia  da RTC - Radiotelevisão Caboverdiana].


Manuel Amante da Rosa (**)


[ex-fur mil, QG/CTIG, Bissau,1973/74 (embaixador plenipotenciário da República de Cabo Verde em Itália entre 2013 e 2018; membro da nossa Tabanca Grande; o pai, antes de se tormar empresário de trasnsportes fluvianets, tinha sido, até ao início da guerra, comerciante em Belim, Fulacunda.]


(...) a navegação fluvual e costeira na Guiné era complexa e sempre dependente do ciclo das marés. Fazia-se muito pelos canais, à vista, com pontos de referência, e de forma impírica. 

Muito raros eram os arrais, motoristas e marinheiros que sabiam ler ou escrever. Mesmo assim tornavam-se pela prática experientes navegadores e exímios maquinistas. Muitos deles eram ainda do tempo das lanchas à vela. Muitos bebiam é certo o que em certas épocas se tornava um perigo. Metê-los no porão era a melhor opção. Pude cconstatar isso por diversas vezes. Dessa vez com o meu Pai ausente e com uma tripulação quase toda bêbada de cerveja, porque os excursionistas apesar de avisados deram-lhes à vontade de beber, sem restrições, tive de ir para o leme à partida de Bubaque. 

Era um bom navio. De ferro. Dois pisos. Um antigo e batido cacilheiro, "O Amanhã" . Dotado de um potente e excelente Caterpillar que lhe fazia bater entre 10 a 12 nós em viagem. 

O meu Velho comprara-o anos antes ao Sr. Fausto, português de Setúbal, opositor do regime de Salazar, desterrado para a Guiné, nos anos 40, e que ali se tornará um reconhecido madeireiro. Era ligado ou pelo menos tinha ligações a alguns dirigentes do PAIGC. Teria sido ele a transportar Luis Cabral, durante uma noite, até à fronteira com o Senegal para que não fosse preso pela PIDE que lhe estava no encalço. Era pessoa conhecida e ter levado para Bissau uma boa embarcação e colocado o nome de "O Amanhã" diz muito. (****)

Na realidade existe muita semelhança com a navegação fluvial do Brasil. Lembro-me que a primeira coisa que fiz ao chegar um dia a Manaus foi ir para o Hotel e apanhar um táxi para o porto/mercado. revivi o Pidjiguiti tal às semelhanças. Pontão, navios no lodo, grande amplitude das marés, mesmos cheiros, gentes, embarcações parecidas e até mercadorias. Umas boas horas somente a observar, a conversar e a passar de um navio para o outro. 

Anos mais tarde em Amapá, norte do Brasil, foi a mesma constatação e subir o Amazonas de lancha ronceira até Afuá. Pormenores inesperados que refluem na memória que julgavámos há muito desgarrados. (...)



Arsénio Puim (***)




Arsénio Puim, ilha de São Miguel, Açores, 2019.
Foto: Arsénio Puim

[ açoriano, da Ilha de São Jorge, ex-alf mil capelão; foi expulso do seu Batalhão, o BART 2917, e do CTIG em maio de 1971, apenas com um ano de comissão; no final da década de 1970 deixou o sacerdócio, formou-se em enfermagem, casou-se, teve 2 filhos; vive na Ilha de São Miguel; está reformado; é membro da nossa Tabanca Grande; tem cerca de 40 referências no nosso blogue; é autor da série "Memórias de um alferes capelão", de que se publicaram doze postes]



(...) Mas as embarcações que circulavam no Geba Estreito são também barcos a motor, para transporte de pessoas e de carga, que faziam viagens regulares e prestavam um importante serviço entre a capital do território e Bafatá.

Vim, uma vez, num destes barcos da carreira civil desde Bambadinca até Bissau, numa longa e pitoresca viagem que hoje ainda recordo.

Alguns militares usavam, uma vez ou outra, este meio de transporte para se deslocarem à capital. Penso que o grande Machadinho e meu grande amigo [, alf mil Abílio Machado, nosso grã-tabanqueiro, e que pertencia igualmente à CCS/BART 2917], também ia nesta viagem, mas não tenho a certeza.

No «Bubaque», apinhado de pessoas – muitos africanos e africanas e alguns soldados portugueses –, galinhas, porcos, cabras, (tudo em muita paz), navegámos ao longo do Geba Estreito, ladeado de mato denso e misterioso e cheio de curvas muito apertadas que obrigavam o barco a manobrar bastante próximo das margens. Depois entrámos no Geba largo, cada vez mais espaçoso e aberto aos nossos olhos curiosos, de margens arborizadas e baixas, ponteado com os seus quarteis militares estrategicamente disseminados dum lado e outro do território.

Sete horas depois, agradavelmente vividas em conversação amena e, sobretudo, a olhar, profundamente, a terra da Guiné e desfrutar da sua natureza, o «Bubaque» havia passado a grande ria do Geba e entrava no porto de Bissau, quando eram cinco horas da tarde do dia 8 de Março de 1971.

Fácil se tornou para nós pensar que, não obstante serem alvo de um ou outro ataque esporádico, não seria possível estes pequenos barcos civis, indefesos e para mais trasportando elementos do exército português, circularem regularmente numa tão extensa e recôndita área fluvial se não existisse um acordo secreto entre a empresa e a guerrilha, como aliás era voz corrente.

Mas além deste possível e mais ou menos controlado obstáculo humano, todo o movimento de barcos no Geba é condicionado por um interessante fenómeno natural que dá pelo nome de macaréu.
É, em linguagem simples, uma onda, provocada pelo choque da maré com a corrente fluvial, que avança rio acima, impetuosa e com grande ruído, operando à sua passagem a transição brusca e imediata da baixamar para a preiamar, numa amplitude que pode atingir dois metros ou mais.
Neste interior da Guiné, a mais de 100 quilómetros de Bissau, várias vezes me detive junto do grande Geba para ver passar o macaréu, poderoso e cheio de mistério, admirável e sempre benvindo. (...)


 Manuel Amante da Rosa (***)


(...) Caro Arsénio Puim, alegrou-me muito saber que fez uma viagem no "Bubaque" de Bambadinca para Bissau. Muito provavelmente, se a sua jornada foi num fim-de-semana eu deveria estar a bordo. Se assim foi, deveremos ter saído do sempre atulhado e improvisado cais de Bambadinca às 11 da manhã. Uma a duas horas antes da vazante. Factor regular (horário das marés) que muito nos preocupava para não ficarmos em seco no meio do Mato Cão. 

O Bubaque era do meu Pai que o adquirira à Marinha Portuguesa e o transformara em barco de passageiro com capacidade para 140 ou 180 passageiros, após ter sido abatido à carga. Teria sido antes uma trainera algarvia que foi transformada ainda em Portugal em Lancha Patrulha (o LP4) com uma pesada casamata blindada, em ferro, a meia nau e enviada para a Guiné em principios de 1960. 

Muito patrulhou os rios da Guiné tendo inclusivamente participado na batalha do Como. Com a chegada regular das LDM e LDP as 4 LP  tornaram absoletas e foram abatidas por Decreto do Ministro da Marinha. Eram robustas, aguentavam bem o mar e todas possuiam bons motores. 

O Bubaque era muito conhecido na região do Leste. Era a carreira mais regular entre Bissau e Bambadinca e exclusivamente destinada ao transporte de passageiros e suas cargas. Era também conhecido por “Djanta Kú cia” pela sua rapidez na jornada. Significava que se podia almoçar em casa e chegar ao seu destino ainda a tempo de jantar. 

Fiz muitas e muitas viagens nesse navio, mais de dia que de noite, algumas com acidentes e avarias graves no percurso mas, estando a bordo, nunca fomos vítimas de ataque. Meu Pai sim, numa madrugada em pleno Mato Cão, por erro de identificação. Não me parece que tivesse havido alguma vez um acordo ou pagamento de passagem. Era sabido que só transportavámos passageiros e muitos deles seriam familiares próximos de quem estava na luta quando não fossem mesmo guerrilheiros ou mensageiros a caminho de Bissau e vice-versa. Transportei muitas vezes militares que demandavam e/ou outro porto Sentiam-se seguros no "Bubaque". A viagem directa Bambadinca-Bissau demorava em média de 5 a 6 horas, duas das quais na “auto-estrada” do Mato Cão a parte que mais encanto me dava. A subir era sempre menos.

No Geba largo, no tempo das chuvas e tornados, a preocupação era evidente devido às vagas curtas, sempre de través e instabilidade da massa humana a fugir da chuva ou a agachar-se do vento a sotavento dele. Nessas ocasiões aproximavamo-nos da margem oposta passando por Jabadá e Enxudé até cortar directo para oeste de Cumeré, passar entre a ponte cais e o ilhéu do Rei e atracar no Pidjiguiti. No outro dia, a favor da mare, lá se iniciava uma outra jornada. Tenho ainda vivas as mesmas imagens que tão bem descreveu das margens do Geba apertado. (...) (*****)

 ____________

Notas do editor

(*) Vd. poste de 22 de maio de 2019 > Guiné 61/74 - P19815: Álbum fotográfico de Virgílio Teixeira, ex-alf mil, SAM, CCS / BCAÇ 1933 (São Domingos e Nova Lamego, 1967/69) - Parte LXX: Viagem, de regresso, do Gabu a Bissau, em 26/2/1968: no 'barco turra', a partir de Bambadinca (II)



(**) Vd.comentário ao poste  17 de março de  2015 > Guiné 63/74 - P14377: O nosso blogue como fonte de informação e conhecimento (29): A Ilha das Galinhas que eu conheci e a nostalgia da "prisão" com que o Zé Carlos Schwarz ou Zé Cabalo (, no meu tempo de liceu), nos surpreende, na letra e música de "Djiu di Galinha" (Manuel Amante da Rosa)

(***) Vd. psote de 12 de dezembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5453: Memórias de um alferes capelão (Arsénio Puim, BART 2917. Dez 69/Mai 71) (5): O grande Rio Geba


(****) Vd. poste de 20 de junho de 2017 > Guiné 61/74 - P17489: (De) Caras (85): o testemunho de Manuel Amante da Rosa, embaixador plenipotenciário de Cabo Verde em Itália, sobre o Fausto Teixeira: "era uma figura distinta, opositor ao regime de Salazar, vigiado pela PIDE/DGS, amigo do meu pai que lhe comprou, no início dos anos 70, o último navio que ele levou para a Guiné, um antigo cacilheiro que fazia carreiras regulares para o Xime e para os Bijagós ...Morreu depois do 25 de Abril em Portugal".

Vd. também postes de:

18 de novembro de 2014 > Guiné 63/74 - P13912: (Ex)citações (247): A embarcação "Bubaque", da carreira Bissau-Bambadinca-Bissau (Manuel Amante / Jorge Araújo / J. F. Santos Ribeiro)

sexta-feira, 28 de dezembro de 2018

Guiné 61/74 - P19342: Memória dos lugares (384): Tradições do Natal crioulo em Bissau: o "fanal" e o "mbim pidi festa" da meninada do meu tempo (Nelson Herbert)


Desenho de um "capelinha"  feitas pelas crianças de Bissau  no Natal... Segundo Nelson Herbert, era o "fanal2 (que tinha sempre no interior um pequeno presépio montado e uma vela acesa)...

Foto (e legenda): © Virgílio Teixeira (2018). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Mensagem do nosso amigo Nelson Herbert [jornalista, de origem guineense e cabo-verdiana, filho da antiga glória do futebol guineense,  Armando Duarte Lopes, o "Búfalo Bill (1920-2018); vive nos EUA, onde trabalha ou trabalhou na VOA - Voice of America]:

Data - quarta, 26/12, 16:00

Assunto - Tradições do Natal crioulo da Guiné (*)

O “esqueleto” da capela [, vd. imagem acima]  era feito do “miolo-esponjado” da cana de bambu [escapa-me agora o nome em crioulo do material também usado na confecção de peças de mobiliário tradicional- (cadeiras e banquinhos - particularmente no Leste da Guiné )] e as “paredes”  eram forradas de papel de seda, meio transparente, e de várias cores.

Ao artefacto que tinha sempre um pequeno presépio montado no interior e uma vela acesa, nós,  a meninada,  dávamos o nome de “Fanal”...

"Kandi foi, kandi foi para Belem..." (quando foi, quando foi para Belem...)  era um dos versos da lírica da “ladainha” que metia ainda referências ao “Menino de Jesus” e demais figuras do “Presépio”... É tudo o que ainda me recordo.

De resto havia um “Ritual” (De Pidi Festa)  que, de porta à porta, pelo Natal, se impunha como o tal arauto de “Boas Festas” pelo “nascimento do Menino” às famílias visitadas... e sempre a troco de alguns “trocados”...

Mbim Pidi Festa !

Nelson  Herbert
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Notas do editor:

(*) Vd,. postes de:

27 de dezembro de  2018 > Guiné 61/74 - P19338: Memória dos lugares (383): Essa tradição do Natal crioulo, descrita pelo Mário Dias, e vivida por ele em 1952, em Bissau, vou ainda encontrá-la em Nova Lamego, 15 anos depois, em 1967!... (Virgílio Teixeira, ex-alf mil SAM, CCS/BCAÇ 1933,1967/69)

25 de dezembro de 2018 >  Guiné 61/74 - P19334: Memórias dos lugares (382): Bissau, 1952, quando lá passei o meu primeiro Natal, aos 15 anos: uma tradição crioula que se perdeu, as crianças de Bissau, vindas do Chão Papel, Alto do Crim, Cupilon, Gã Beafada, Santa Luzia e outros bairros, que inundavam as ruas com as suas casinhas luminosas ou com os “kinkons” articulados e garrafas para marcar o ritmo, "tintim, tintim, kinkon, kinkon"... (Mário Fernando Roseira Dias, compositor musical, ex-srgt 'comando' reformado, Brá, 1963/65)

11 de janeiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5628: Antropologia (16): Canções antigas do Natal de Bissau (Manuel Amante da Rosa)

quinta-feira, 27 de dezembro de 2018

Guiné 61/74 - P19338: Memória dos lugares (383): Essa tradição do Natal crioulo, descrita pelo Mário Dias, e vivida por ele em 1952, em Bissau, vou ainda encontrá-la em Nova Lamego, 15 anos depois, em 1967!... (Virgílio Teixeira, ex-alf mil SAM, CCS/BCAÇ 1933,1967/69)


Guiné > Região de Gabu> Nova Lamego > CCS / BCAÇ 1933 (Nova Lamego e São Domingos, 1967/69) > Natal de 1967 > O capelão Moita, à civil, à esquerda,  junto de um dos miúdos que transportavam uma "capelinha", uma réplica  em miniatura, com um presépio lá dentro, iluminado por uma vela;   à direita, o Virgílio Teixeira.

Foto  (e legenda): © Virgílio Teixeira (2018). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Comentário,   ao poste P19334 (*), de Virgílio Teixeira (ex-al mil SAM, CCS/BCAÇ 1933, 1967/69):

Depois de ler esta bela história do Mário Dias, sobre o Natal em Bissau, talvez me passasse pela cabeça ter visto por alturas do Natal, antes ou depois, porque os Natais eram passados junto do comando e CCS do Batalhão (BCAÇ 1933) estas manifestações, embora não tenha nenhum facto exacto em mente.

Contudo, e a propósito, isto passava-se cá, na minha infância também se cantavam as Janeiras e os Natais, junto das portas dos senhores, com cantigas alusivas que ainda me lembro delas perfeitamente, eram os peditórios para o 'menino Jesus',  quer dizer para nós que fazíamos parte dos grupos, e era até rentável para as guloseimas que não tínhamos. Mas isto é outra história.

Ao ler este texto: "Grupos de 3 ou 4 crianças, transportavam pequenas casas feitas com armações de finas tiras de cana ou material semelhante revestidas com papel de seda de várias cores. Com um coto de vela aceso no seu interior, resplandeciam como se de vitrais se tratasse. E como havia algumas tão bem construídas e belas!... A catedral de Bissau, a casa do governador, o edifício da Administração Civil, ou simples casas saídas da fértil fantasia do seu construtor. Também havia quem desse asas à criatividade e aparecesse com navios, aviões e de quanto a imaginação fosse capaz.

"Iam parando em cada casa, ora à porta quando situada ao rés do passeio, ora penetrando nos pequenos jardins das mais recuadas, e um deles, portador de uma garrafa vazia e de um pequeno ponteiro de ferro batia o ritmo: tintim, tintim. tintim… Então, ao compasso que o “tocador de garrafa” ordenava, todos rompiam nesta cantilena: ( por sinal bem afinados)"

... Lembrei-me do meu Poste,  sobre o Tema 055, em Nova Lamego, na época do Natal, de ver estes grupos de miúdos com umas coisas que na altura disse não saber o que eram.  Pelo ao nosso editor para ver então esse  Poste - que não encontro o número nem a sua publicação, mas era sobre o Nosso Capelão Moita, e cujo texto retirei e coloquei aqui:

(...) Guiné - Portugal 67/69 - Álbum de Temas:  T055 – O Nosso Capelão, Aferes Graduado Moita, o Capelão Padre Moita que se juntou mais tarde ao BCAÇ 1933.

(...) F8 – O capelão Moita junto de um grupo de Djubis com objectos religiosos de Natal, não sei o que é aquilo. NL, Dezembro 67.


Pedia então para o Mário Dias, ou outro camarada que saiba disto, se aquela peça que os miúdos apresentam iluminada, não seria uma dessas referidas.por ele.

Parabéns ao editor por esta publicação, e agora peço que tente desvendar este dilema, podemos estar na presença das tais ´casinhas ou outras coisas´, feitas de qualquer coisa...

E assim acabaram estas festas natalícias....

2. Comentário do nosso editor LG:

Heureca, Virgíliio, é isso mesmo!... Tens olho clínico!... Essa tradição do Natal crioulo, descrita pelo Mário Dias, e vivida por ele em 1952, em Bissau, vais tu ainda encontrá-la em Nova Lamego, 15 anos depois, em 1967!...

Aqui está, como  prometido, o  teu comentário elevado à categoria de poste !... Aqui tens a foto em questão (a nº 8), depois de reeditada para dar mais destaque aos miúdos que seguram nas mãos a "igreja" em minitura, em papel... e um presépio lá dentro!... Não é a a igreja de Nova Lamego, que só tinha uma torre, mas pode ser a de Bissau ou de Bafatá... 

Que coisa linda!...Deviam ser miúdos de famílias cristãs, também as havia em Bambadinca e Bafatá, mas eu na noite de Natal, pelo menos a de 1969, passei-a... destacado na "Missão do Sono" a aguardar as costas dos senhores do comando e da CCS do BCAÇ 2852 (Bambadinca, 1968/70)...

Vê aqui o poste que tu não conseguiste localizar (**)

Lembrei-me, entretanto, que o nosso amigo (e camarada) Manuel Amante da Rosa tem um poste antigo sobre esta tradição, a que eu chamo o Natal crioulo da Guiné (***). Escreveu ele:

Uma "capelinha"...
(...) Muito provavelmente muitos dos membros da nossa Tabanca Grande que tenham passado um Natal na Guiné, terão visto e escutado grupos de crianças que, festeiramente, andavam de porta em porta com pequenos presépios ou casas de papel, iluminadas com vela por dentro, mais uns bonecos articulados, alguns com caricas de garrafas de cervejas pregadas em tábuas de ocasião a chocalhar, acompanhando um coro, por vezes desafinado. São gratas recordações dessa tradição que ainda hoje persistem em Bissau.(...)

O seu relato sobre o Natal de outrora na Guiné bate certo com o que  que já escrevera, quatro anos antes, o Mário Dias (Poste P367, de 18 de dezembro de 2005).

Um "quincom"...
(...) Outrora e até o início dos anos 70 do século passado, era frequente, nas noites de 24 e 31 de Dezembro, as ruas da cidade de Bissau serem percorridas por grupos de jovens guineenses, oriundos dos Bairros periféricos, que consigo transportavam interessantes réplicas de igrejas e capelas. Eram as “Capelinhas”.

Feitas numa estrutura de madeira muito leve, vulgarmente denominada “tara” (Raphia sp. Exsicc. Esp. Santo 766), eram forradas a papel de seda, contendo, no seu interior, várias pagelas de santos e, ao centro, iluminadas por um coto de vela, o que, no breu da noite, conferia ao conjunto um aspecto de particular carinho.

Os grupos de miúdos percorriam as ruas de Bissau, cantando, de casa em casa, saudando, a troco de 5 tostões, com a seguinte cantilena os moradores (...):

A cantinela era a mesma que já o Mário Dias ouvia em 1952...

E era   "acompanhada, sequencialmente pelos famosos bonecos, tipo espantalhos feitos de papelão, presos numa cana ou pequena haste de madeira, com os braços e pernas articulados, graças a um sistema de cordéis interligados, nas costas, dos referidos bonecos. Estes bonecos eram conhecidos pela designação vulgar de Quincões” (...).
__________________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 25 de dezembro de 2018 > Guiné 61/74 - P19334: Memórias dos lugares (382): Bissau, 1952, quando lá passei o meu primeiro Natal, aos 15 anos: uma tradição crioula que se perdeu, as crianças de Bissau, vindas do Chão Papel, Alto do Crim, Cupilon, Gã Beafada, Santa Luzia e outros bairros, que inundavam as ruas com as suas casinhas luminosas ou com os “kinkons” articulados e garrafas para marcar o ritmo, "tintim, tintim, kinkon, kinkon"... (Mário Fernando Roseira Dias, compositor musical, ex-srgt 'comando' reformado, Brá, 1963/65)

(**) Vd. poste de 15 de setembro de 2018 > Guiné 61/74 - P19017: Álbum fotográfico de Virgílio Teixeira, ex-alf mil, SAM, CCS / BCAÇ 1933 (Nova Lamego e São Domingos, 1967/69) - Parte XLIII: O alf mil capelão Carlos Augusto Leal Moita

(***) Vd. poste de 11 de janeiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5628: Antropologia (16): Canções antigas do Natal de Bissau (Manuel Amante da Rosa)

terça-feira, 20 de junho de 2017

Guiné 61/74 - P17489: (De) Caras (78): o testemunho de Manuel Amante da Rosa, embaixador plenipotenciário de Cabo Verde em Itália, sobre o Fausto Teixeira: "era uma figura distinta, opositor ao regime de Salazar, vigiado pela PIDE/DGS, amigo do meu pai que lhe comprou, no início dos anos 70, o último navio que ele levou para a Guiné, um antigo cacilheiro que fazia carreiras regulares para o Xime e para os Bijagós ...Morreu depois do 25 de Abril em Portugal".

1. Duas mensagens, a primeira do nosso editor Luís Graça, com data de 13 do corrente; e outra, a resposta, enviada a 16 do corrente pelo  nosso amigo, camarada e grã-tabanqueiro,  ex-fur mil, QG/CTIG, Bissau,1973/74, Manuel Amante da Rosa, embaixador plenipotenciário da República de Cabo Verde em Itália desde 16/1/2013, e agora também em Malta [foto, acima, de 2013; cortesia da RTC - Radiotelevisão Caboverdiana].

(i) Mensagem do nosso editor LG, com data de 13 do corrente, enviada a Manuel Amante da Rosa:

Assunto - Madeireiro "amgo" do PAIGC? Fausto Teixeira, deportado para a Guiné em 1925... Um barco dele é atacado no Rio Geba c. 1970.

Manuel: Como vais tu na "Roma eterna"? Com muitas saudades da "nossa terra, Cabo Verde", imagino!,,,

Preciso de um favor teu, mais um esforço de memória... Este homem, Fausto Teixeira,  foi contemporâneo do teu pai, era madeireiro, tinha barco(s) que fazia(m) o Geba... Ajudou o Luís Cabral a fugir para o Senegal...

Se achares conveniente, não te cito... Em todo o caso, não me parece que haja qualquer inconveniente... Era um "tuga", e possivelmente teria duas famílias, uma em Palmela e outra em Bafatá... No final dos anos 60, hospedava-se no Hotel Portugal e tinha uma companheira cabo-verdiana, muito mais nova do que ele, de nome Agostinha...

Esta história diz-te alguma coisa? Um xicoração... Luís

PS - Andamos a ajudar na exposição sobre o escritor Manuel Ferreira (1917-1998), autor de "Hora di Bai", contemporâneo do meu pai, Luís Henriques (1920-2012), em São Vicente, na II Guerra Mundial... Casou com a Orlanda Amarílis (1924-2014). Eram colegas do Liceu Gil Eanes, no Mindelo, em 1944. O Amílcar Cabral foi da turma da Orlanda...

(ii) Resposta do Manuel Amante da Rosa:

Data: 19 de junho de 2017 às 09:48

Assunto: Re: Madeireiro "amigo" do PAIGC? Fausto Teixeira, deportado para a Guiné em 1925... Um barco dele é atacado no Rio Geba c. 1970...

Meu caro Luís, estou numa reunião sobre as secas e desertificação. Novas abordagens!

Aproveito um "break" para te dizer o que ainda a minha memória não apagou.

Este Senhor, Fausto Teixeira, era uma figura distinta na Guiné. Um empedernido opositor ao regime de Salazar, por vezes incómodo, e permanentemente seguido pela PIDE/DGS.

Conheci-o através do meu Pai, de quem era amigo. De baixa estatura, conversador, rijo apesar da idade e pertinaz em todas as opiniões que proferia.

Era originário de Setúbal e teria sido deportado para Bissau em finais de 40 ou inícios de 50 do século passado.


Fonte: Anúncio comercial. In: "Revista de Turismo", jan-fev 1956, número especial dedicado à então província portuguesa da Guiné






O meu Pai [, António Amante Rosa, que em 1956 era comerciante, em Belim, Fulacunda, e mais tarde armador] comprou-lhe o último navio que ele levou para a Guiné nos inícios dos anos 70.

Registou o navio, um antigo "cacilheiro", com o nome de "O Amanhã". Nessa altura, [o Fausto Teixeira] estaria já nos seus 70 anos e denotava esperanças em tudo o que fazia ou dizia.

O meu Pai conservou o nome e ele fazia carreiras regulares para o Xime diariamente. Eu fiz muitas viagens nele, não só para o Xime como para os Bijagós.

Julgo que o Sr. Fausto terá vivido o seu amanhã com o 25 de Abril ainda na Guiné e terá morrido anos depois na sua terra natal. Aqui não estou bem precisado.

O meu abraço de sempre.
Manuel Amante da Rosa


2. Comentário de LG:

Caro dr. Manuel Amante da Rosa, meu caro Manuel: estou-te muito grato pela rápida resposta e pela tua partilha de memórias sobre a terra que te vou nascer e crescer... Afinal, o Fausto Teixeira era teu conhecido e era amigo do teu pai, com quem teve negócios....

Só um detalhe biográfico, se me permites: o Fausto Teixeira já estava na Guiné desde o final da I República, mais concretamente desde julho de 1925. Foi deportado, não pela Ditadura Militar / Estado Novo (1926-1974), mas pela República (1910-1926), sem julgamento, por suspeita de pertencer à temível "Legião Vermelha".

Esta organização revolucionária (para outros meramente terrorista...) era, ao que parece, de inspiração bolchevique (e não anarcossindicalista, que era então a corrente dominante no movimento operário português,  e na Confederação Geral do Trabalho, de vida curta: 1919-1927)... 

O fantasma da "rede bombista" da Legião Vermelha seria usado como arma de arremesso da propaganda salazarista, anos mais tarde...  [Vd. documentário da RTP disponível no You Tube].




"Parte da retórica estado-novista foi construída e mantida capitalizando o fantasma da Legião Vermelha, concentrando em si toda a ideia de desordem política e social da I República, como se vê n[este] cartaz, presumivelmente, saído do Secretariado de Propaganda Nacional nos anos 40".

Fonte: Pinto, Ana Catarina Simões Mendonça - A luta de classes em Portugal (1919:1926) : a esquerda republicana e o bloco radical. Lisboa:  RUN [Repositório da Universidade NOVA de Lisboá. Faculdade de Ciências Sociais e Humanas (FCSH). Departamento de HistóriaTeses de Doutoramento, 2015, p. 339 (Com a devida vénia...).
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Nota do editor:

Últmo poste da série > 18 de junho de  2017 > Guiné 61/74 - P17482: (De) Caras (84): Fausto Teixeira, deportado político em 1925, empresário em Bafatá, de quem o 2º tenente Teixeira da Mota, ajudante de campo do governador Sarmento Rodrigues dizia, em 1947, ser um "incansável pioneiro da exploração de madeiras da Guiné"... Mais três contributos para o conhecimento desta figura singular (José Manuel Cancela / Jorge Cabral / Armando Tavares da Silva)

quinta-feira, 20 de abril de 2017

Guiné 61/74 - P17261: (In)citações (106): Macau e Guiné-Bissau, dois pesos e duas medidas... Deu-se a nacionalidade portuguesa a cerca de 100 mil macaenses, a grande maioria incapaz de trocar meia dúzia de frases na língua de Camões... Em contrapartida, milhares e milhares de guineenses que lutaram (e muitos morreram ou ficaram feridos), nas fileiras do exército português durante a guerra colonial, foram votados a um destino cruel... (Manuel Amante da Rosa, cabo-verdiano, diplomata, ex-fur mil, QG/CTIG, Bissau, 1973/74)

1. Do nosso amigo, camarada e grã-tabanqueiro, 
ex-fur mil, QG/CTIG, Bissau,1973/74, Manuel Amante da Rosa, embaixador plenipotenciário da República de Cabo Verde em Itália desde 16/1/2013, e agora também em Malta [, foto, acima, de 2013; cortesia da RTC - Radiotelevisão Caboverdiana]



Data: 13 de abril de 2017 às 12:23
Assunto: Público-2017/04/13 (*)


Meus Caros,

Um desabafo estritamente pessoal, que não seja somente a de partilhar convosco esta reflexão, bem fora do âmbito de qualquer polémica ou publicação.

Há muito que venho seguindo este sistema de "dois pesos, duas medidas" usados pelas autoridades lusas ao tempo da descolonização. O diário português "Público", de hoje, trás nas suas páginas 12 e 13, no quadro do 30º Aniversário da transferência de Macau à China, o tratamento diferenciado dado aos africanos e, mais tarde, os dados aos residentes chineses daquele diminuto território asiático.

Curtos onze anos após as negociações para a Independência das Colónias africanas, foram concedidos nacionalidade portuguesa a cerca de uma centena de milhar de pessoas residentes em Macau. Por iniciativa negocial e visão acertada dos negociadores lusos em confronto directo com o estatuído na lei chinesa.

80% ou mais deste contingente que era visado nem a primeira estrofe do Hino Nacional de Portugal conheciam para não dizer cumprimentar e/ou trocar algumas frases na língua de Camões.

E ainda hoje, para aqueles que permaneceram na RAEM [ Região Autónoma Especial de Macau], este desconhecimento é total.

A língua portuguesa, apesar dos onerosos montantes alocados pelo Executivo macaense, continua como francamente residual e raramente usado fora das repartições e do núcleo da comunidade lusa.

Este assunto, da atribuição pertinente e massiva da nacionalidade portuguesa, foi seguido por mim com especial interesse e interrogações por ter sido militar do exército português, no seu último ano e meio e ter convivido com a violenta guerra, desde criança, porque tudo se relacionava a ela, ao fim e ao cabo. Não havia como se estar à margem do ambiente bélico.

De uma maneira geral, em todas as colónias havia forte contingente de nativos/indígenas, integrados em pelotões independentes e companhias, enquadrados por graduados e oficiais oriundos da metrópole. Mas para além das forças militares regulares, de recrutamento obrigatório, haviam ainda, numa base de voluntariado, os contingentes das forças especiais, das milícias locais, organizadas em unidades auxiliares nas unidades militares, outras constituídas em auto-defesa, contigentes de cipaios e forças para-militares (unidades de polícias).


Na Guiné, pela sua pequena dimensão territorial e humana, a contribuição dada ao exército português foi relevante em todas as frentes de combate, nas patrulhas e operações de grandes envergaduras, nas defesas dos quartéis, construções de estradas e outras infra-estruturas e até nas forças especiais.

Lógico que milhares sofressem ferimentos em combate e acidentes, outros encontrassem a morte ou e ainda outros milhares ficassem com sequelas de guerra, uns estropiados e outros com stress pós-traumático.

Mas que outros milhares fossem distinguidos com cruzes de guerra, louvados, condecorados, citados em ordens do dia, premiados e levados
para a ex-metrópole em gozo de férias.

É consabido (e conheço casos) que soldados africanos se tenham  sacrificado, tenham salvo a vida ou ajudado os seus camaradas brancos  nos confrontos da contra-guerrilha.E vice-versa, está claro!

Raros, muito raros, foram aqueles que não acabassem o período de 3 anos de serviço militar sem saberem entender ou se exprimir em português. Era de cariz obrigatório a alfabetização no exército, até  pelo menos a quarta classe. Pelo menos na Guiné. Assim como conhecer  rudimentos da história de Portugal e cantar o Hino Nacional.

Quando tenho a oportunidade de retornar à Guiné e encontro, em todo o lado, esses idosos e valorosos militares das forças armadas  portuguesas, abandonados à pressa e à sua sorte e me vem ainda ao  pensamento os milhares que acabaram fuzilados, após a guerra, sempre  me pergunto porque raio de circunstâncias o destino lhes traçou esse
nefasto rumo.


E, se por força do esforço pessoal e determinação, conseguem chegar a  Lisboa, para se radicarem ou tratarem da saúde e das sequelas da  guerra, vale-lhes mais a solidariedade, camaradagem e memórias dos
antigos oficiais ou camaradas para calcorrearem a via crucis… do que  qualquer outra instituição a que com garbo e sacrifício pertenceram. (**)

Abraços

Manuel Amante

____________

Notas do editor

(*) Vd. Bárbara Reis > Há 30 anos, Portugal surpreendeu a China nas negociações de Macau > Públicio, 13 de abril de 2017

(...) As negociações sobre a transferência de Macau duraram nove meses e, para Augusto Santos Silva, são “um marco na história diplomática de Portugal”. E ajudaram, 30 anos depois, a eleger António Guterres secretário-geral das Nações Unidas.(...)


quinta-feira, 6 de abril de 2017

Guiné 61/74 - P17212: Homenagem a Clara Schwarz (1915-2016): gravações precisam-se para passarem na Rádio Voz de Klelé e eventuamente na Rádio Sol Mansi, em programas que deverão ir para o ar depois da Páscoa (Catarina Schwarz)


Uma das últimas fotos de Clara Schwarz (1915- 2016): uma (e)terna imagem de despedida para os seus filhos, netos, bisnetos e demais família e amigos... A foto é da Catarina Schwarz, a neta que nos últimos anos esteve mais próxima da avó paterna, afetiva e efetivamente, tendo-lhe dado inclusive a alegria de mais uma bisneta,

A Clara era carinhosamente conhecida no seio da família e dos amigos mais íntimos pelo "nickname" Calinhas. Para além dos amigos e admiradores, mais recentes, da Tabanca Grande, deixa muitos amigos também entre os antigos alunos e professores do Liceu Honório Barreto, em Bissau, de que foi cofundadora, com o marido, o jurista e escritor Artur Augusto Silva (1912-1983), e onde foi também professora de francês... 

Deixou uma marca indelével nos seus antigos alunos, alguns dos quais são membros da nossa Tabanca Grande (como, por exemplo, os camaradas António Estácio e o embaixador Manuel Amante da Rosa) ou ainda prestigiadas figuras da nossa vida intelectual e cultural como a escritora e investigador Maria Estela Guedes, que foi sua aluna de francês, "do 2º ao 7º ano" (*). Ou ainda de outras figuras como  João Ramiro Caldeira Firmino, o João Câmara, a engª agrónoma Xanda Monteiro, esposa do engº agr. Manuel Monteiro, amigos da Maria Alice Carneiro.  O nosso António Júlio Estácio tem esses contactos dos antigos alunos da professora de francês dra. Clara Schwarz.

Por sua vontade expressa, as suas cinzas vão ser depositadas junto do marido e do filho Pepito (1949-2014), em Bissau. A Catarina está a organizar um programa de homenagem nas rádios locais e pede a nossa colaboração.

Foto: Cortesia da Catarina Schwarz, Página no Facebook, disponível aqui,


I. Mensagem da nossa amiga Catarina Schwarz, filha do nosso saudoso amigo Pepito (1949-2014) e neta da mulher grande Clara Schwarz (1915-2016), que foi durante anos a "decana" da Tabanca Grande

Data: 31 de março de 2017 às 11:14

Assunto: Clara Schwarz

Olá.  Luís e Maria Alice,

Como estão? Espero que esteja tudo a correr bem convosco!

Nós andamos por Bissau... Um Bissau já bem diferente de há uns anos atrás. Novas caras, outras dinâmicas e outras crises políticas!

Escrevo-vos pelo seguinte: há 3 anos atrás, a minha avó Calinhas, Clara Schwarz, expressou a sua
vontade em ser enterrada na Guiné-Bissau, junto do marido [, Artur Augusto Silva,] e do meu pai.

Assim fizemos e neste momento, estamos a preparar um pequeno programa de rádio em sua homenagem, na Rádio Voz de Klelé e, em princípio,  na Rádio Sol Mansi.

Este programa irá decorrer durante 5 dias e incluirá:


1 - Um apresentação da biografia  da Calinhas;

2 - Pequenas passagens de uns apontamentos  que a Calinhas escreveu em "cadernos dos avós"

3 - Entrevistas presenciais com pessoas  que foram alunas de francês  [, no Liceu Honório Barreto, em Bissau,]  ou conheciam a Calinhas;

4 - Emissão de contributos gravados de amigos  e ex-alunos da Calinhas e que vivem fora da Guiné;

5 - Uma linha aberta para quem esteja interessado em participar com questões ou contributos,


Gostávamos muito que este programa fosse enriquecido com o vosso testemunho, amigos do meu pai, amigos da minha avó, que de uma forma ou de outra, sempre a acompanharam e de quem ela falava com regularidade e muita estima.

A ideia é gravar (via WhatsApp ou Skype) breves palavras sobre a Calinhas, ou uma história que viveram com ela (o vosso contributo seria enquadrado no ponto 4 do programa de rádio).

Caso tudo isto seja possível, teríamos de trocar contactos (WhatsApp ou Skype), para que depois eu possa descarregar as gravações e passá-las na rádio.

Por outro lado, se acharem mais conveniente (do que as gravações) podemos ler o poema que escreveste à minha avó, por ocasião dos seus 100 anos,  e passar a(s) música(s) que o João tocou para a Calinhas, em São Martinho do Porto.

Beijinhos e um bom fim-de-semana.
Catarina

II. Resposta do nosso editor Luís Graça:


Catarina: Que bom receber notícias tuas!... Acabamos, eu e a Alice, de chegar do sul de Marrocos onde fomos passar 12 dias de "férias"... Estive estes dias completamente desligado do blogue e da Net...

Fico feliz pela tua iniciativa de cumprir o desejo da tua avó... A "Tabanca Grande" quer desde já associar-se a homenagem que estás a preparar... Afinal, para além de amiga, ela foi durante anos a "decana" da Tabanca Grande... Pelo que, se mo permites, deixa-me dar a notícia no blogue e da nossa página do Facebook, de modo a que outros contributos de amigos e admiradores da tua avó possam aparecer...

Para já dispõe de todos os materiais (textos, fotos, vídeos...) que publicámos ao longo destes anos de convívio estreito com o teu pai, com a tua avó, contigo, a tua mãe e demais família...

O João está no sul de Itália, deve voltar no próximo fim de semana. Vou-lhe  pedir que grave de novo uma das músicas klezmer de que a tua avó tanto gostava (a começar pelo Bulgar de Odessa, cidade onde os teus avós, Samuel e Agatha, se casaram).

Diz-me qual é o teu "timing"... Posso também gravar um texto poético... E haverá, por certo, outros amigos, como o Zé Teixeira, que vão querer participar...

Vai dando notícias... Beijinhos para ti, para a tua menina e para a tua mãe.

Luís.
Xicoração da Alice.

PS - A Clara Schwarz entrou para a Tabanca Grande em 14/2/2010, no dia em que fez 95 anos (*). Foi a nossa "decana" até à data da sua morte, em 11 de dezembro de 2016. (**)

Na altura, escrevemos-lhe o seguinte: "A nossa singela prenda de aniversário, é pô-la aqui, debaixo do poilão da nossa Tabanca Grande, a falar com todos os amigos e camaradas da Guiné, a partilhar connosco as histórias de uma vida... A Clara, que atravessou o Séc. XX e continua a sorrir-nos e a surpreender-nos no Séc. XXI, passa ser a Mulher Grande da nossa Tabanca Grande, o novo membro, o 397º, da nossa tertúlia. (O seu nome figura, desde hoje, na nossa lista alfabética, na letra C)... E daqui a cinco anos, em 2015, vamos apagar-lhe a vela do centenário!... Combinado ?"...

E a verdade é que ela e nós cumprimos o prometido. Ela chegou, não aos 100, mas aos 101. Não quis festejar os 100 anos por estar ainda a fazer o luto da morte recente do seu filho Carlos Schwarz da Silva, o nosso Pepito. Mas não demos-lhe, como sempre, os parabéns (***). Tem 44 referências no nosso blogue. O seu nome continuará  a figurar, na Tabanca Grande, na coluna do lado esquerdo do nosso blogue, na lista dos 53  amigos e camaradas da Guiné que "da lei da morte já se foram libertando".

III. Nova mensagem da Catarina Schwarz, com data de anteontem: 

Olá, Luís, Maria Alice e João

Obrigada desde já pela vossa atenção!

Marrocos e Itália, parece-me muito bem! Será que as catástrofes naturais de Itália já acabaram? A nossa catástrofe chama-se José Mário Vaz, o presidente da república da Guiné... que diz que quer ser o melhor PR do país e só faz disparates!

Entretanto, estamos a apontar para depois da Páscoa, o início do programa de rádio.

Vou aproveitar então o poema e a música tocada pelo João que também está no blogue. A história da Joana também é engraçada! A minha avó ficou maravilhada e lembrava-se sempre desse episódio.

Os contributos da Tabanca Grande serão mais do que bem-vindos!

Temos de encontrar uma forma eficaz de fazer as gravações (o WhatsApp parece ser a forma mais simples).

Beijinhos a todos!
Catarina

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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 14 de fevereiro de 2010 >  Guiné 63/74 - P5813: Parabéns a você (79): Clara Schwarz da Silva, 95 anos, uma grande senhora, viúva de Artur Augusto da Silva, mãe do nosso amigo Pepito, leitora do nosso blogue, novo membro da Tabanca Grande (Luís Graça)

(**) Vd. poste de:

11 de dezembro de 2016 > Guiné 63/74 - P16825: In Memoriam (272): dra. Clara Schwarz da Silva (1915-2016), mãe dos nossos amigos Henrique, João e Pepito (1949-2014), cofundadora e professora do Liceu Honório Barreto, em Bissau, decana da Tabanca Grande. Dia 14, 4ª feira, haverá uma pequena cerimónia de despedida, no crematório de Barcarena, Oeiras 20 de dezembro de 2016 



(***) Vd. postes de:


14 de fevereiro de 2016 > Guiné 63/74 - P15744: Parabéns a você (1033): Senhora D. Clara Schwarz, Centenária Amiga Grã-Tabanqueira, Mãe do nosso falecido amigo Carlos Schwarz (Pepito), e decana da Tabanca Grande... Faz hoje 101 anos!

14 de fevereiro de 2015 > Guiné 63/74 - P14256: Homenagem da Tabanca Grande à nossa decana: a "mindjer grande" faz hoje 100 anos... Clara Schwarz da Silva, mãe do Pepito (8): Mensagens da Tertúlia

14 de fevereiro de 2014 > Guiné 63/74 - P12715: Parabéns a você (691): Senhora Dona Clara Schwarz, Grã-Tabanqueira, mãe do nosso amigo Pepito, que a partir de hoje fica a um pequeno passo do seu centenário

14 de fevereiro de 2013 > Guiné 63/74 - P11094: Memória dos lugares (212): Ilha da Brava, Sotavento, Cabo Verde... Em homenagem a Clara Schwarz (n. 1915, Lisboa) e ao seu saudoso cretcheu Artur Augusto Silva (1912, Brava -1983, Bissau) (João Graça / Luís Graça)

14 de fevereiro de 2013 > Guiné 63/74 - P11093: Parabéns a você (535): Senhora Dona Clara Schwarz faz 98 anos!

14 de Fevereiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9484: Parabéns a você (216): 97° Aniversário de Clara Schwarz da Silva, mãe do nosso amigo Pepito, a nossa matriarca, a decana da nossa Tabanca Grande, a anfitriã da Tabanca de São Martinho do Porto

14 de fevereiro de 2011 > Guiné 63/74 - P7780: Parabéns a você (216): 96° Aniversário de Clara Schwarz da Silva, nascida a 14/2/1915, uma cidadã do mundo, co-fundadora e professora do Liceu Honório Barreto, em Bissau, cuja presença na Tabanca Grande muito nos honra... (Luís Graça, co-editores, amigos e antigos alunos)


terça-feira, 17 de março de 2015

Guiné 63/74 - P14377: O nosso blogue como fonte de informação e conhecimento (29): A Ilha das Galinhas que eu conheci e a nostalgia da "prisão" com que o Zé Carlos Schwarz ou Zé Cabalo (, no meu tempo de liceu), nos surpreende, na letra e música de "Djiu di Galinha" (Manuel Amante da Rosa)

1. Mensagem de Manuel Amante da Rosa [Manuel Amante da Rosa [, ex-fur mil, QG/CTIG, Bissau, 1973/74; atual embaixador de Cabo Verde em Roma]

Data: 16 de março de 2015 às 22:37

Assunto: Prisão na Ilha das Galinhas: localização, etc. (*)

Meus caros editores e leitores:,

Vamos ver se consigo dar uma ideia do que seria ilha das Galinhas.

Ficava bem próxima de Bolama de Baixo. Separada desta parte da ilha de Bolama por um canal navegável com relativa profundidade. O campo prisional (colónia agrícola/colónia penal) da ilha era supervisionado pelo Administrador Civil do Concelho de Bolama.

Havia reclusos de crime comum com penas de longa duração e até presos políticos. Tive por lá, que me lembre, quatro a cinco amigos. Os detentos movimentavam-se com relativa facilidade pela ilha, gozavam alguns de certos privilégios e muitos dedicavam-se à agricultura ou pesca. A população da ilha era amistosa e aceitava sem problemas os presos com quem se relacionavam. Julgo que, a memória não me é certa neste ponto, de haver um chefe da colónia penal e alguns polícias que faziam um controlo da população dos presos.

Passei algumas vezes pela ilhas das Galinhas, quando jovem mas nunca cheguei de ter a perceção de que haveria prisão por lá. Na ida para Bubaque ou Sogá, paravámos em Nbangana, que era uma pequena casa comercial mesmo à beira mar em que na maré cheia as ondas batiam na varanda. Era do velho Manuel Simões, pai do Manelito Simões. Por detrás da casa subia-se por um carreiro até a uma altura de 20 a 30 metros onde se ía para o interior da ilha e  algo próximo se localizava a Tabanka. 

Não raras vezes havia festa nesse aglomerado nas noites que por ali permaneci. O rufar de tambores, característico da etnia bijagó escutava-se de longe. O ritmo, as danças dos cabarôs e campunes era
contagiante. 


Guiné > s/d > s/ l > A embarcação "Bubaque", ostentando a bandeira portuguesa... Era uma antiga LP 4 (Lancha de Patrulha 4, da nossa Marinha, no ativo entre 1963 e 1964)-

Foto: © Manuel Amante da Rosa (2014). Todos os direitos reservados.

Nesta casa, à beira-mar, viveu durante uns dois anos um amigo do Manelito e meu que tinha sido condenado a uma pena por algo acontecido em Portugal. Teve um regime especial. Os navios Corubal e o Formosa nas idas de fim de semana para Bubaque pairavam nesse pequeno porto, ao largo, para deixar ou receber correspondências ou deixar alguém. 

Nbangana era um porto difícil de se entrar porque corria paralelamente à costa uns baixios de pedra, perigosos e sem sinalização. Um pequeno navio do meu pai, o Salomé, feito de teca, trazido da Indonésia (?) ou Timor, antigo patrulha japonês, partiu ali a quilha para nunca mais ser recuperada. Eu próprio, ao leme, com uma tripulação quase toda bêbada, num regresso da ilha de Bubaque com uma excursão da Cícer, fábrica de cerveja da Guiné, encalhei nesses baixios procurando o canal já de noite. Valeu-me a enchente e não ter batido mais à frente. O susto foi enorme lembrando-me do sucedido com o Salomé.

Julgo que.  após ser transferido para a prisão policial de Bissau, ficado preso, incomunicável e tratado de forma desumana pelos carcereiros pela sua ousadia de colocar, pelo menos uma bomba debaixo do reluzente Mercedez Benz de um Chefe de Esquadra, estacionado à frente da UDIB  e,  conhecendo o Zé Carlos, que também chamávamos de Zé Cabalo, por aparecer pelo Liceu Honório Barreto algumas vezes a cavalo, ele terá sentido nostalgia da ilha onde circulava à vontade, escrevia, lidava com a população e convivia livremente com os outros reclusos.

Essa será a diferença fundamental e a razão porque terá escrito uma melodia tão profunda, nostálgica e agradável a todos que escutam o "Djiu di Galinha".

A viúva do Zé Carlos poderá, no entanto, explicar muito melhor e com conhecimento sólidos de uma vida comum de partilhas várias as razões dessa composição.

Escrevi de um fôlego só e sem rever o texto pelo que se vierem a publicar alguns trechos façam as inevitáveis correções. (**)

Um forte e amigo abraço.

Manuel

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Notas do editor:

(*) Vd,. poste de 16 de março de 2015 > Guiné 63/74 - P14374: O nosso blogue como fonte de informação e conhecimento (27): Ainda sobre o cantor José Carlos Schwarz (Bissau, 1949 - Havana, 1977) e a letra da canção "Djiu di Galinha" [, Ilha das Galinhas] (Helena Pinto Janeiro, historiadora)

(**) Último poste da série > 17 de março de 2015 > Guiné 63/74 - P14376: O nosso blogue com fonte de informação e conhecimento (28): motorizadas: eu, com os meus 17 anos e a minha Zundapp Mavic (José Colaço)