sábado, 9 de fevereiro de 2013

Guiné 63/74 - P11082: Agenda cultural (254): Apresentação dos livros: "Os Resistentes de Nhala", de Manuel Mesquita e "Ultrajes na Guerra Colonial", de Leonel Olhero, dia 14 de Fevereiro de 2013, pelas 16 horas, na Messe de Oficiais, Praça da Batalha - Porto

C O N V I T E


Exmo. Senhor
O Núcleo do Porto da Liga dos Combatentes vem por este meio enviar convite em anexo para a Tertulia a decorrer na Messe de Oficiais do Porto na Batalha, a realizar no dia 14 de Fevereiro, pelas 16h00.

Nota: Venha acompanhado de um ou mais amigos, a organização agradece.  

Com os melhores cumprimentos e consideração pessoal,
José Manuel da Glória Belchior
Cor. Inf. Cmd
____________

Nota do editor:

Vd. último poste da série de 30 de Janeiro de 2013 > Guiné 63/74 - P11025: Agenda cultural (253): Mesa redonda: reflexões sobre o devir guineense. Auditório CIUL, Picoas Plaza, 17h45, Lisboa, 30 de Janeiro de 2013

Guiné 63/74 - P11081: (Ex)citações (211): Ainda o P11033 (Vasco Pires)

1. Mensagem do nosso camarada Vasco Pires (ex-Alf Mil Art.ª, CMDT do 23.º Pel Art, Gadamael, 1970/72), com data de 9 de Fevereiro de 2013:

Caro Carlos Vinhal,
Fico muito grato por tua atenção, ao criar essa secção "Fantasmas ...". Pois, tal como o velho Fernão Mendes Pinto, quarenta anos depois, alguns factos da nossa juvenil aventura Africana ficam nebulosos na nossa memória, outros ficam bem vividos.


Ainda o P11033

Do P11033:
"A outra suposta tentativa de invasão, penso "in the best of my recollection" (lá vem o recurso ao famigerado anglicismo), que o Comando já era do então Capitão de Artilharia Morais Silva, lembro ainda, que lá estavam os Comandos Africanos sob o comando do então Alferes Zacharias Sayeg. Julgo, que foi nessa data que fizemos disparo direto com o obus (10,5) para o fim da pista, num total do dia de cerca de 200 disparos, o que foi um erro meu, pois, entrei na "reserva estratégica" (que me perdoem os Artilheiros se não é este o termo exato); soube mais tarde por Oficiais lotados no comando da Artilharia, que por esse erro, o "Paizinho" pensou em me punir, o que não se concretizou."

Esses supostos disparos de obus 10,5, foram feitos, num dia (noite) de intenso ataque do PAIGC, à distância, e com aproximação ao quartel.

Fiz alguns disparos diretos para o começo (fim) da pista, o disparo direto, é um recurso extremo, e como tal só deve ser feito em situações extraordinárias.

Quanto aos cerca de 200 disparos durante o dia, foram feitos comprometendo a reserva mínima, o que foi um erro, principalmente num quartel com as dificuldades logísticas de Gadamael.

O Comandante do Aquartelamento de Gadamael, considerou a minha resposta adequada à intensidade do ataque IN, provavelmente foi o seu relatório que inibiu o "Paizinho" de me dar a sempre adiada porrada.

Quanto à quantidade de disparos dados durante o dia, nenhum Oficial do Comando da Artilharia (e lá em Bissau tinha muitos), considerou que o número de disparos (cerca de 200) feitos por 3 obus de 10,5 comprometessem o material.
Contudo, certas infrações em tempo de guerra não prescrevem, podem sempre seguir para uma instância superior. Foi o que para meu azar aconteceu, a absolvição do "Paizinho" foi revisada, e o camarada C. Martins me deu a tão adiada "porrada":


Do comentário ao P11033:
Enfiares 200 tiros de obus 10,5 em tiro directo no fundo da pista ...é obra...merecias uma "porrada".

Paciência... quem vai à guerra...

Forte abraço
Vasco Pires
____________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 31 DE JANEIRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11033: Fantasmas ...e realidades do fundo do baú (Vasco Pires) (4): Quem vem lá?

Vd. último poste da série de 9 DE FEVEREIRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11078: (Ex)citações (210): Fanado, circuncisão, excisão: diferenças interétnicas (Pepito)

Guiné 63/74 - P11080: Do Ninho D'Águia até África (51): Vinte e quatro longos... longos meses! (Tony Borié)

1. Quinquagésimo primeiro episódio da série "Do Ninho de D'Águia até África", de autoria do nosso camarada Tony Borié (ex-1.º Cabo Operador Cripto do Cmd Agru 16, Mansoa, 1964/66), iniciada no Poste P10177, chegado até nós em mensagem do dia 5 de Fevereiro de 2013:


DO NINHO D'ÁGUIA ATÉ ÁFRICA - 51


O Cifra hoje, vai falar de números.

Os amigos antigos combatentes, ainda recordam quando jovens na idade claro, pois felizmente na nossa mente continuamos jovens, verem colados nas paredes de alguns muros, ou na frente das praças de touros, uns cartazes a anunciarem uma corrida de touros, onde dizia em letras mais ou menos garrafais, “6 - TOUROS - 6”, e mais abaixo, “3 - Grupos de forcados - 3”, pois o Cifra, tal como muitos dos antigos combatentes, esteve “24 - Meses - 24”, na então província da Guiné.


O Cifra já se está a aproximar da parte final da primeira fase das recordações do tempo em que esteve no conflito que colocou frente a frente o governo de Portugal e o grupo organizado que queria a independência da então província da Guiné, mas antes de entrar nessa parte, onde vai falar dos últimos meses, pois passando esta fase, irá continuar sempre com a Guiné em primeiro plano, irá abrir algumas páginas do seu miserável diário, falar de emigração, dos companheiros de conflito que encontrou na diáspora, e muitas coisas mais, com a compreensão do Luís Graça, do Carlos Vinhal e restantes editores, e de vocês, amigos e companheiros de guerra, pois sem a vossa pachorra em ler estes escritos, muito mal escrevinhados, que o Luís Graça, deixou colocar no seu blogue, e que o Carlos Vinhal, com muita dedicação foi corrigindo, porque de outro modo, iriam ler tudo, menos português.


Como o Cifra disse anteriormente, alguns amavelmente foram lendo, mas só cá para nós, que ninguém nos ouve, o Cifra gosta mesmo é de ler “Os Melhores 40 Meses da Minha Vida”, do Veríssimo Ferreira, os poemas, fotografias e outros textos do Luís Graça, os resumos de livros e obras sobre a Guiné, do Beja Santos, o Diário da Guiné, do Graça Abreu, as investigações aprofundadas, sobre África, do José Martins, aqueles textos frontais, sem “papas na língua”, sem “ses”, nem “mas”, do José Manuel Matos Dinis, das “Cartas de Amor da Guerra”, do Manuel Joaquim, dos textos e comentários do Paulo Santiago, das histórias curtas e apimentadas do Jorge Cabral, dos comentários e textos conhecedores do António Rosinha, do César Dias, do Rogério Cardoso, cujo nome de guerra é “Roger”, e tantos outros, que se exprimem dando uma fiel opinião; das histórias, muitas com fotos, do Henrique Cerqueira, e dos piriquitos da sua amada NI, dos textos e poemas do Juvenal Amado, dos poemas com aquele toque feminino da Filomena Mealha, do “Furriel Enfermeiro, Fadista e Ribatejano”, Armando Pires, dos textos sérios e conhecedores de coisas da Guiné, do Cherno Baldé, da “Actividade Operacional” do Manuel Serôdio, das “histórias das injecções”, do Adriano Moreira, dos textos do António Melo, que escreve com profundo sentimento; da “Pedra da Odete”, do Hélder Sousa, que essa sim, se o Cifra lha pudesse roubar, pois com ela a título, daqui a um milhão de anos ainda havia textos, dos mais diversos temas, sempre actualizado, falando com pessoas, enquanto esperava na linha, para que a Odete lhe preparasse uns “salmonetes”, e mais um sem número de amigos antigos combatentes, que não lhe ocorre o nome, onde alguns colocam os seus comentários, e outros, continuam a lembrar momentos da sua passagem por aquela horrorosa guerra.


O Cifra, quando abre o blogue, fica com agrado e com alguma felicidade, quando repara que alguns companheiros, que pertenceram à mesma unidade militar, trocam opiniões e continuam uma conversa, que até parece que foi interrompida, com o seu regresso à Europa, trocam opiniões, tal como lá estivessem no local de acção, e nesse momento, também fica com alguma mágoa, que é durante este tempo todo em que foi falando do conflito da Guiné, ainda não teve um único combatente seu companheiro, pertencente ao Agrupamento 16, que era o comando a que pertencia, que esteve na Guiné desde Maio de 1964 até Maio de 1966, e estava estacionado em Mansoa, que viesse ao blogue dizer:
- Alô Cifra, também pertenci ao Agrupamento 16!

Tem que haver companheiros vivos, oxalá que sim, não eram muitos, não chegavam a 30 militares, sendo mais de dois terços militares graduados, portanto mais velhos na idade.
.
Bem, o Cifra já está a ir longe de mais, mas agora nesta parte final, vai publicar algumas fotos que conseguiu recuperar do tal Agrupamento 16, lembrando em números, os tais “24 - Meses - 24”, que foram mais longos que a espada de D. Afonso Henriques, que não tem culpa nenhuma em ser para aqui chamado, ou terá?
____________

Nota de CV:

Vd. últimos 10 postes da série de:

5 DE JANEIRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P10900: Do Ninho D'Águia até África (41): Outra vez, a menina Teresa (Tony Borié)

8 DE JANEIRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P10911: Do Ninho D'Águia até África (42): O Cifra encontra um inimigo (Tony Borié)

12 DE JANEIRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P10927: Do Ninho D'Águia até África (43): Lodo e tarrafo (Tony Borié)

15 DE JANEIRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P10946: Do Ninho D'Águia até África (44): O Canjura andava farto de guerra (Tony Borié)

19 DE JANEIRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P10963: Do Ninho D'Águia até África (45): Os meus galões (Tony Borié)

22 DE JANEIRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P10984: Do Ninho D'Águia até África (46): A menina Teresa não sai de cima de mim (Tony Borié)

26 DE JANEIRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11007: Do Ninho D'Águia até África (47): Iafane, o barqueiro (Tony Borié)

29 DE JANEIRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11022: Do Ninho D'Águia até África (48): Guiné... Minho e... Algarve (Tony Borié)

2 de Fevereiro de 2013 > Guiné 63/74 - P11044: Do Ninho D'Águia até África (49): Eram guerreiros (Tony Borié)

5 DE FEVEREIRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11060: Do Ninho D'Águia até África (50): A mulher e o conflito (Tony Borié)

Guiné 63/74 - P11079: Álbum fotográfico do Delgadinho Rodrigues (cap pára ref, CCP123/BCP 12, Bissalanca, 1972/74): Gadamael, junho de 1973 (Manuel Peredo, ex-fur mil, CCP 122, 1972/74, hoje a viver em França)


Guiné > Região de Tombali > Gadamael > Junho de 1973 > Foto nº 1



Guiné > Região de Tombali > Gadamael > Junho de 1973 > Foto nº 1-A


Guiné > Região de Tombali > Gadamael > Junho de 1973 > Foto nº 1-B


Guiné > Região de Tombali > Gadamael > Junho de 1973 > Foto nº 2


Guiné > Região de Tombali > Gadamael > Junho de 1973 > Foto nº 2-A


Guiné > Região de Tombali > Gadamael > Junho de 1973 > Foto nº 3


Guiné > Região de Tombali > Gadamael > Junho de 1973 > Foto nº 3-A

Guiné > Região de Tombali > Gadamael > Junho de 1973 > Fotos do álbum do  Rodrigues Delgadinho, na altura fur mil pára, da CCP 123/BCP 12, força de elite que conseguiu travar a ofensiva do PAIGC contra aquele aquartelamento de fronteira. Gadamael faz parte dos três famosos G - Guidaje, Guileje, Gadamael...

Fotos: ©  Delgadinho Rodrigues / Manuel Peredo (2013). Todos os direitos reservados [Editadas por L.G.]


1. Mensagem, com data de 4 do corrente, enviada pelo nosso camarada Manuel Peredo (ex-Fur Mil Paraquedista (CCP 122 / BCP 12, Brá, Bissalanca, 1972/74) [, foto à esquerda: é o primeiro lado direito, armado de RPG-2, seguido do sagento Carmo Vicente e do Fernandes, caboverdiano, fur mil, todos do 4º Gr Comb da CCP 122]

Caro Luis Graça, aqui vão três fotos de Gadamael que me foram oferecidas pelo Delgadinho Rodrigues, capitão pára na reforma e furriel em Junho de 73. Sei que há elementos do blogue que já não suportam ouvir falar em Gadamael, mas esses certamente não estavam lá naqueles dias difíceis. (*)

Um abraço, Manuel Peredo [, foto atual à direita]

2. Comentário de L.G.:

Meu caro Manel, sê bem aparecido. Julgo que ainda estás por França, não ? E,  se sim, tencionas voltar ? Espero bem que sim, afinal esta é a Pátria pela qual já verteste sangue, suor e lágrimas.

Obrigado, antes de mais pelas fotos, de Gadamael.  A preto e branco, e em dia de céu carregado, e com vestígios,  bem evidentes, dos ataques do PAIGC(que começaram em finais de maio de 1973), elas conseguem transmitir-nos  o dramatismo desses dias que lá vivestes, com os teus valorosos camaradas da CCP 122 e da CCP 123, até ao dia 10 de junho, em que foste ferido.

Agradece, por todos nós, ao Joaquim Manuel Delgadinho Rodrigues, o ter-te facultado estas fotos e, através de ti, tê-las feito chegar ao nosso blogue (que está aberto a todos os camaradas da Guiné, como sabes). Diz-lhe (, no caso de ele não ler esta mensagem, ) que a sua presença, na nossa Tabanca Grande, nos honraria muito, a todos, e seria também uma forma de homenagear os mortos e os feridos da batalha de Gadamael. Ele só precisa de nos mandar as duas fotos da praxe, e escrever meia dúzia de linhas sobre as férias que ele passou nesse paraíso tropical chamado Guiné... Podes (e queres) ser o padrinho dele ?

 Quanto a Gadamael, nunca será demais falar... E continuaremos a falar, de Gadamael,  "ad nauseam"... Temos já cerca de 200 referências a esse lugar, que ficará na história desta guerra e deste país pelo patriotismo, coragem, abnegação e camaradagem de homens como tu, o Carmo Vicente (CCP 122),  o Manuel Rebocho (CCP 123), o Victor Tavares (CCP 121), o J. Casimiro Carvalho (CCAV 8350) e tantos outros. Desejo-te boa saúde e longa vida. Vai aparecendo.

Parafraseando o Virgínio Briote, no seu poste sobre o livro do Carmo Vicente ("Gadamael"), "foi a Guerra que vivemos (é sempre assim em todas, em poucos minutos, horas ou dias, somos capazes do melhor e do pior")... Em 26 de junho de 1975, o nosso grã-tabanqueiro J. Casimiro  Carvalho podia escrever â mãe, com os dizeres , em caixa alta, "Now we have peace" [, Finalmente temos paz].




Foto: © José Casimiro Carvalho (2007) / BlogueLuís Graça & Camaradas da Guiné. Todos os direitos reservados.

Excerto de uma das cartas enviadas de Gadamael. Na resenha biográfica do J. Casimiro Carvalho, não há grande precisão nas datas,   no que diz respeito ao período em que esteve em Gadamael. O BCP nº 12, a duas companhias (CCP 122 e CCP 123) é enviado para Gadamael a 2 de Junho, seguindo-se a 13 a CCP 121, do Victor Tavares. Regressa a Bissau a 7 de Julho (as CCP 122 e 123) e a 17 de Julho (a CCP 121). Os páras conseguirão travar a ofensiva do PAIGC a partir do momento em que se instalam em Gadamael. 

______________


(...) Já agora vou descrever um pouco por alto aquilo que ainda está gravado na minha memória. Quando nos disseram em Bissau que íamos para Gadamael, informaram-nos que a situação era muito grave e que não valia a pena irmos carregados, só o necessário para três ou quatro dias. Quando nos aproximávamos de Gadamael, recordo-me muito bem de ver muita tropa à beira do rio, com uma expressão de terror na cara.

Alguns dizem que desembarcámos em botes, mas eu quase afirmava que foi de LDM e era capaz de jurar que só a minha companhia, a [CCP] 122, é que desembarcou nesse dia e não me lembro de estarem lá duas companhias de páras ao mesmo tempo. Penso que a 123 nos foi render para a 122 poder descansar uns dias em Cacine.

Mal chegámos a Gadamael, dois pelotões foram logo para a mata, onde passaram a noite. Em Gadamael apenas se encontravam lá uns quinze ou vinte homens, o resto tinha fugido. Recordo-me que veio logo uma Berliet conduzida por um açoriano muito destemido para evacuar os mortos e feridos. Soube pelo blogue que o José Casimiro Carvalho também fazia parte dos que não fugiram. 

O meu pelotão, o quarto, fazia parte do bigrupo que passou a primeira noite no mato e, quando estávamos a regressar ao quartel, este foi fortemente bombardeado, originando a morte de alguns soldados do exército que tentaram fazer fogo com o obus 140, salvo erro. Estivemos à espera que os rebentamentos acabassem para poder entrar no quartel.

Um dia ou dois mais tarde morreram mais três soldados e um alferes miliciano, vítimas duma emboscada, muito próximo do quartel. Alguém devia ter um grande peso na consciência por ter mandado para o mato um grupo de apenas duas dezenas de militares, se tanto. Este ataque já foi contado pelo José Casimiro e pelo [Carmo] Vicente.

Aqui o Vicente deve estar enganado. Quem foi primeiro recuperar os corpos foi outro pelotão, o nosso pelotão foi enviado em reforço porque tínhamos acabado de chegar do mato. Encontrámo-nos a meio caminho e demos uma ajuda a transportar os corpos que estavam muito mal tratados : tinham o corpo queimado e ferimentos causados pelas balas. O alferes tinha um grande buraco na cara derivado a uma rajada e um soldado nem calças trazia vendo-se bem o efeito das chamas.

Quando chegámos ao quartel, os colegas dos militares mortos estavam no cais à espera e houve um pormenor que me deixou surpreendido e até chocado. Nenhum deles teve a coragem de nos ajudar a carregar os mortos para a Berliet. Os corpos eram postos no chão e o pessoal ia para as valas. Eu próprio os carreguei com a ajuda de colegas. 

Quando estávamos com este trabalho, o IN lançou novo ataque e eu só tive tempo de saltar do paredão do cais para me proteger. Foi a minha salvação pois uma granada caiu no local que tinha deixado. Escapei à uma morte certa por décimos de segundo.

Outro pormenor que me surpreendeu : quando íamos resgatar os corpos, um dos soldados que tinha fugido da emboscada dirigiu-se a mim, suplicando-me por,  tudo quanto me era sagrado, que tentasse recuperar uma medalha ou um fio que a mãe lhe tinha dado. Essa medalha ou fio devia estar no casaco que ele largou durante a fuga. Os ataques iam-se sucedendo e talvez mais espaçados e a tropa que tinha fugido ia regressando ao quartel talvez por se sentirem mais seguros com a nossa presença.

No dia dez de Junho (ninguém no mundo me convencerá que não foi neste dia ) sofremos então uma emboscada que deixou a 122 muito debilitada. Pela manhã fomos montar uma emboscada um pouco distante do quartel. Nada se passou de anormal a não ser uma tentativa do IN em abater um Fiat que voava bem lá no alto:  distinguia-se perfeitamente o fumo do míssil que tinha rebentado.

A meio da tarde, iniciámos o regresso ao quartel. Estava previsto o meu pelotão e mais um pernoitarem na mata, já muito próximo do quartel e estávamos já nesses preparativos, quando se deu a emboscada. Os dois pelotões que lá deviam pernoitar encontravam-se já na mata e os outros dois seguiam pelo caminho que dava acesso ao quartel. Os dois bigrupos encontravam-se em posição paralela,  o que podia ter custado muito caro. 

Claro que foi um erro de quem dirigiu a manobra. Os dois pelotões que iam para o quartel é que deviam ir na frente. Eu por acaso apercebi-me do erro e disse aos meus homens para não dar fogo. Aquilo nunca mais acabava. Quando os caças Fiat vieram em nosso auxílio ainda o combate não tinha acabado. Não havia árvores de grande porte para nos protegermos. O meu colega do lado esquerdo tentava proteger-se atrás dum arbusto que foi ceifado por uma granada logo por cima da cabeça. O que estava do meu lado direito foi levantado pelo sopro duma granada.  possivelmemte dum RPG 7. 

Acreditem que foi verdade,  pois vi com os meus próprios olhos. Há minutos na vida que duram uma eternidade. Resultado da brincadeira :17 feridos, todos causados por estilhaços,  fazendo eu parte desse grupo com um ferimento na cabeça.

Por absurdo que pareça eu fiquei bem disposto e até brinquei com os meus colegas. Quando estes me viram a sangrar da cabeça disseram-me : "Ó meu furriel já pode estar descansado, já acabou a comissão". Mal eles imaginavam que passados oito ou dez dias estava de novo junto deles. Claro que o ferimento não era grave e, derivado ao medo que os médicos tinham do comandante, eu próprio pedi para voltar à minha companhia. 

Quando voltei, já a 122 estava a descansar em Cacine e mal cheguei lá fui presenteado com um ataque de paludismo. Veio logo o capitão Terras Marques dizer-me que tinha que recuperar depressa pois precisava de mim para irmos fazer uma operação à fronteira da República da Guiné.

Voltando um pouco atrás. Fomos então evacuados para Cacine em dois botes que iam superlotados e de Cacine seguimos de helicóptero para Bissau. Quando eu estava no hospital a aguardar transporte para Bissalanca, chegou o homem do monóculo [, o gen Spínola,]  para ver como estavam os feridos. O médico que o acompanhava apontou para mim e disse-lhe que eu era um dos feridos. Dirigiu-se a mim e perguntou-me como se tinha passado. Quando lhe disse que foi no regresso, logo me perguntou se vínhamos pelo mesmo caminho. Pensei logo que estava ali uma armadilha e lá lhe enfiei o barrete. (...)

Guiné 63/74 - P11078: (Ex)citações (210): Fanado, circuncisão, excisão: diferenças interétnicas (Pepito)



Guiné-Bissau > Região de Tombali > Catesse > 2010 > Bajuda, a frequentar a 6ª classe da escola local. Legenda: " O ano de todas as esperanças. Djari Queita é a jovem rapariga do Grupo Teatral de Catesse, em plena floresta de Cantanhez, que se distingue pela animação e dinamização das actividades culturais de rapazes e raparigas, em especial de teatro, dança e música tradicional. Está a estudar na escola local, tendo transitado para a 6ª classe, nível muito elevado para uma jovem daquela zona rural, que tem como principal profissão a produção de óleo de palma Anda muito contente e diz que este ano, é o ano de todas as esperanças".Foto tirada em 1 de dezembro de 2010, usando uma Canon Difgital IXUS 85 IS. Foto da Galeria da AD - Acção para o Desenvolvimento. Reproduzida com a devida autorização...

Foto (e legenda): © AD - Acção para o Desenvolvimento (2013). Todos os direitos reservados.




Pepito, ao canto superior direito... Reprodução parcial de imagem constante do artigo do magazine da TAP, Up, disponível no sítio da AD - Acção para o Desenvolvimento. (Com a devida vénia...).

  1. A propósito do poste P11075, e da foto do fanado em Darsalame, da galeria da AD - Acção para o Desenvolvimento, segue-se um comentário do nosso amigo Pepito (que ontem encontrei no Colombo, com o seu filho Ivan, e um casal amigo, quando íamos, eu e o João, para a nossa sessão de ginásio... Como veem, meus amigos e camaradas, o Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande!... O Pepito está cá porque a senhora sua mãe, decana do nosso blogue, a dra. Clara Schwarz, vai fazer 98 (!) anos no dia 14 deste mês):

Caro Luís

Para as pessoas menos atentas à cultura africana, há o hábito de confundir fanado com circuncisão, o que não é correto.

Nos balantas o fanado é uma cerimónia de passagem de idade, em que o jovem se torna adulto e já pode usar o barrete vermelho (entre outras coisas). Durante a cerimónia, há de facto o fanado, isto é, o corte do prepúcio [, dobra de pele que reveste a glande do pénis,] , tal e qual o fazem os judeus. E ninguém quer eliminar estas cerimónias. O que se quer é conferir maior higiene e evitar a transmissão do HIV/SIDA através da "faca".

É nas etnias muçulmanas, sobretudo, que se dá o fanado das mulheres, isto é a excisão. Essas sim, aplicam o corte do clitóris e são atentórias da dignidade feminina. Pessoalmente acredito que, um dia, esta prática deixará de existir. Até porque cada vez se encontram mais jovens que se recusam ir ao fanado. Vai ser uma luta entre gerações e é lá que ela vai ser decidida. 

Comparando, e uma comparação tem sempre limites, é o que se passa na Europa com a violência física dos homens sobre as mulheres. É uma questão cultural e só a esse nível é que poderá ser combatida definitivamente.

Por isso mesmo deve-se notar que a foto da AD [, à direita,] se refere ao fanado dos homens balantas. 
abraço
pepito

____________

Nota do editor:

Último poste da série > 8 de fevereiro de 2013 > Guiné 63/74 - P11075: (Ex)citações (209): O fanado, visto porcolons e colonizados...(António Rosinha / Cherno Baldé)

Guiné 63/74 - P11077: A minha CCAÇ 12 (28): Dezembro de 1970: Flagelação ao pessoal e às máquinas da TECNIL, na nova estrada em construção, Bambadinca-Xime (Luís Graça)


Foto nº 114 > Coluna auto deslocando de Bambadinca para o Xime (ou vice-versa ?), nas proximidades  de Ponta Coli


Foto nº 140 >  Coluna auto saíndo do Xime, e atravessano a bolanha nas peroximidades de Taliuara (ou Ponta Coli ?)






Foto nº 138 > Regresso de coluna auto a Bambadinca, vindo do Xime... Foi daqui que o PAIGC atacou, em força, o aquartelamento de Bambadinca, em 28 de maio de 1969,,, Vê-se ao fundo, do lado esquerdo a grande antena de transmissões e os edifícios...



Foto nº 46 > A ponte do Rio Udunduma, objeto de sabotagem por parte doi PAIGC, na noite de 28 de maio de 1969, aquando do ataque ao quartel de Bambadinca... Pela escassez de água no rio, vê-se que estamos no fim da época seca...Não me lembro de ter visto  o rio Udunduma com um caudal tão fraco...Passei lá muitas noites (do 2º semestre de 1969 ao 1º trimestre de 1971), no destacamento que depois dessa data foi improvisado para defender esta posição estratégica... Com a construção da nova estrada, mais ou menos paralela a esta, foi construída uma nova ponte..


Guiné > Zona Leste > Setor L1 > Bambadinca > CCS/BCAÇ 2852 (1968/70) > Fotos do álbum do José Carlos Lopes, ex-fur mil reabastecimentos.

Foto: © José Carlos Lopes (2013). Todos os direitos reservados. (Editadas e legendadas por L.G.)







Guiné > Zona leste > Região de Gabu > Piche > Ponte Caium > CCAÇ 3546 (Piche, Ponte Caium e Camajabá, 1972 / 1974) > Foto nº 2: "As máquinas da TECNIL destruídas por ataque do PAIGC... Esta empresa estava empenhada na construção da nova estrada Piche-Buruntuma"... Entretanto, nas vésperas do natal de 1970, na construção do troço anterior, Nova Lamego-Piche a TECNIL já havia sofrido 9 mortos...

Foto: © Carlos Alexandre (2010) / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Todos os direitos reservados





Excerto da pág. 43, cap I,  da história da CCAÇ 12 (Bambadinca, 1969/71)


Guiné > Zona leste > Setor L1 (Bambadinca > Subsetor do Xime > Carta do Xime (1955) > Escala 1/50 mil > O traçado a vermelho indica a antiga estrada Xime-Bambadinca, passando por Taliuara, Ponta Coli, Amedalai, ponte do Rio Udunduma... Em dezembro de 1970, ainda estava em construção a nova estrada, a cargo da Tecnil... Na sempre temível Ponta Coli, máquinas e pessoal da Tecnil foram flagelados por um grupo IN, estimado em 20 elementos, no dia 30, às 6h30 da manhã... Valeu a pronta reação das NT que faziam segurança à Tecnil, no início de mais um dia de trabalho... Referimo-nos ao 3º Gr Comb da CCAÇ 12, comandado pelo nosso grã tabanqueiro alf mil at inf Abel Maria Rodrigues, transmontano, força essa que era reforçada por 1 secção do Pel Caç Nat 54...

Infografia: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2013).


A. Continuação da séria A Minha CCAÇ 12, por Luís Graça (*)... Estávamos com 18 meses de Guiné, e de intensa atividade operacional, desde que na segunda metade do mês de julho de 1969 fomos colocados em Bambadinca, como subunidade de intervenção ao serviço do comando do BCAÇ 2852 (até maio de 1970) e depois do BART 2917 (a partir de junho de 1970)...


(18) Dezembro / 70: tentativa IN de dificultar os trabalhos de construção da estrada Bambadinca-Xime


A 30, pelas seis e meia, um grupo IN estimado em 20 elementos abriu fogo de LRockets [, LGFog,] e armas automáticas em Ponta Coli sobre o pessoal e meios técnicos da empresa a quemf oi adjudicada a construção da estrada Bambadinca-Xime (TECNIL).

A pronta reação das NT (3º Gr Comb / CCAÇ 12, reforçada c om 1 secção do Pel Caç Nat 54) que fazia a segurança, neutralizou as intenções do IN. Na perseguição,a s NT localizaram duas posições de RPG-2. O In retirou na direção de Chacali cujio trilho foi batido pela Artilharia do Xime, tendo na fuga abandonado 1 carregador de Esp Aut Kalashnikov e granada de RGP-2.

Posteriormente foi encontrada mais 1 granada e 4 disparadores para mina A/C e A/P. E um mês depois forças da CART 2715 detectariam casualmente 1 engemnho explosivo na estrada velha, constituído por 2 granadas de canhão s/r e bocados de trotil mas sem qualquer detonador ou mina A/P.

Embora sem consequências para o pessoal da TECNIL (a não ser psicológicas que acabara de sofrer 9 mortos na estrada Nova Lamego-Piche nas vésperas de Natal), esta flagelação obrigaria as NT a reforçar o dispositivo de segurança à estrada. Assim, todos os dias, a partir dasd 5.30h, 2 Gr Com da CCAÇ 12 (ou 1 Gr Comb mais o Pel Caç Nat 54, conforme a escala) passariam a patrulhar a área compreendida entre Amedalai. Ponta Coli e Taliuara, instalando-se antes do início dos trabalhos na orla da mata, de maneira garantir uma protecçºao eficiente ao pessoal e meios técnicos, enquanto ao Pel [Rec] Daimler 2206 era dada a missão de patrulhar o troço da estrada entre a ponte do Rio Udunduma  e Ponta Coli. A partir dfas 13h, a segurança passaria  a ser feita pela CART 2715 (2 Gr Comb).

Durante o mês a CCAÇ 12 realizou ainda, a 4, uma patrulha de reconhecimento na região de Dembataco, Madina, Sinchã Mussá, Moricanhe e Sinchã Maunde (Acção Graúda) e 2 colunas ao Saltinho, na primeira das quais, a 9 [de Dezembro,] foi accionada por uma viatura da CCS/BART 2917 uma mina A/C já antiga, junto à ponte do Rio Jagarajá.
_______________

Nota do editor:

Último poste da série > 26 de novembro de 2012 > Guiné 63/74 - P10726: A minha CCAÇ 12 (27): Novembro de 1970: a 22, a Op Mar Verde (Conacri), a 26, a Op Abencerragem Cadente (Xime)...(Luís Graça)

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

Guiné 63/74 - P11076: Notas de leitura (456): "Guiné", por Mussá Turé (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 8 de Novembro de 2012:

Queridos amigos,
Descobri que o Instituto Camões ainda possui obras de autores guineenses, refere-se aqui, para começar, a poesia de Mussá Turé, muito generosa e sofrida, também varonil e afetuosa, e dá-se conta de um daqueles dossiês que diferentes grupos esquerdistas portugueses publicavam no exílio.
Aqui aparecem testemunhos de três desertores da Guiné, creio que o fuzileiro Alfaiate depois repensou a sua posição e entregou-se às autoridades portuguesas, tendo sido útil as informações que deu a Alpoim Calvão sobre a geografia de Conacri e a situação dos principais alvos que ele pretendia atingir na operação Mar Verde.

Um abraço do
Mário


Guiné! Por Mussá Turé 
Uma relíquia: Falam desertores da guerra da Guiné

Beja Santos

Guiné! (edição patrocinada pelo Montepio Geral, 2001) é uma coletânea de poesia em português e crioulo do jornalista Mussá Turé, nascido em Sonaco, em 1967. Integrou a equipa da Televisão Experimental da Guiné-Bissau, foi apresentador do principal serviço noticioso desta emissora e correspondente das rádios internacionais Voz da América, África nº 1, RDP Internacional e Rádio Renascença.
É membro da organização Repórter sem Fronteiras, desde 1997.
A sua poesia, escrita fundamentalmente no virar do século, ressoa os conflitos tremendos que viveu o país entre 1998 e 1999, é uma poética que se assume como testemunho, participação, uma quase épica de esperança, uma escrita que parece ter sido elaborada para leitura pública, é poesia de alguém que não esconde a indignação e a plenitude da dor, perdeu um filho no decurso da guerra civil.


Oiçamo-lo no seu poema Mantenhas:

Mantenhas para ti combatente
mantenhas para ti camarada
um mantenha sorridente
para ti da Câmara da
verdade da Liberdade

Mantenhas para quem lavra
mantenhas para quem aprende
mantenhas para quem vislumbra
essa caminhada
algo inocente indecente

Mando mantenhas para ti da tabanca
mantenhas para ti da praça
mantenhas para ti pescador
mantenhas para ti estivador

De volta quero receber as tuas mantenhas
mantenhas falando das águas do rio dos peixes dos tubarões
mantenhas mostrando os teus músculos duros
qual tabuleiro de pesos pesados na balança dos ossos

De volta quero ainda receber as tuas mantenhas
mantenhas anunciando colheita
mantenhas anunciando fartura
mantenhas anunciando sabura

Quero antes mandar mantenhas para ti N’Gumbé
mantenhas para ti Kussundé
mantenhas para ti Poeta
mantenhas para ti Artesão

Quero antes mandar mantenhas para Bissâssema
mantenhas para Calequisse
mantenhas para Canquelifá
mantenhas para Onhokom
mantenhas para Sintchã Mamadú
mantenhas para Tôr
mantenhas para Encheia
____________

Nota do editor:

Vd. último poste da série de 4 DE FEVEREIRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11054: Notas de leitura (455): "Raças do Império", por Mendes Corrêa (Mário Beja Santos)

Guiné 63/74 - P11075: (Ex)citações (209): O fanado, visto por colons e colonizados...(António Rosinha / Cherno Baldé)



Guiné-Bissau > Região de Quínara > Darsalame (vd. carta de Cacine) > Festa do fanado ou cerimónia de iniciação dos jovens em Darsalame.  Foto da Galeria da AD - Acção para o Desenvolvimento, em Bissau, e parceira do blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Esta foto foi tirada em 15 de abril de 2009 usando uma Canon Digital IXUS 90 IS. Foto reproduzida com a devida vénia...

"À semelhança de muitas outras etnias, os jovens balantas fazem das cerimónias de iniciação, os chamados Fanado, momentos importantes da sua vida.

É nesta ocasião que lhes são transmitidos os valores individuais e colectivos tradicionais, os segredos que devem guardar, as normas de conduta social, as leis comunitárias e onde os jovens fazem prova da sua coragem e valentia, relatando e demonstrando actos relevantes praticados antes de entrarem para o Fanado.

Durante cerca de 2 meses, os jovens recolhem-se no meio do mato, na barraca do fanado, onde ninguém os volta a ver, limitando-se as respectivas famílias a levar a alimentação de que necessitam. Antes de entrarem, os jovens brincam, fazem jogos e danças, mostrando os seus trajes de rebeldia, muito apreciados por toda a população."

Foto (e legenda): © AD - Acção para o Desenvolvimento (2013). Todos os direitos reservados.

1. Comentários do António Rosinha e do Cherno Baldé ao poste P11070:

(i) António Rosinha:

Estas práticas cerimoniais africanas que hoje se pretende eliminar, eram praticadas no tempo colonial, discretamente, um pouco às escondidas das autoridades coloniais, no caso das ex-colónias portuguesas.

No caso da Guiné, após a independência, passaram a ser praticadas publicamente e com datas próprias assinaladas pelas próprias autoridades.

Só que passou a ser testemunhado passivamente, como se fosse um inofensivo folclore, durante décadas pela UNICEF, OMS, AMI, MSF, médicos e paramédicos de Cuba, que apoiavam aquelas autoridades sanitárias incondicionalmente.

Só agora? antes tarde que nunca.

Antº Rosinha

(ii) Cherno Baldé:

Caros amigos,

Este tema já aqui foi objecto de discussão mas nunca é demais voltar a rebatê-lo pois é importante a sensibilização das pessoas a volta dos nossos problemas sociais e culturais.

Sobre esta problemática já Cabral nos dizia, mais ou menos nestes termos: "devemos manter os aspectos bons da nossa cultura, mas devemos combater e abandonar os que concorrem para manter o nosso povo no atraso e no obscurantismo".

Claro que na altura não tinham declarado guerra aberta a estas práticas, suponho que, pelas mesmas razões porque o Governo colonial não o fazia.

Do meu ponto de vista a excisão feminina resultou, históricamente, de uma simples transposição da circunscisão (fanado masculino) por iniciativa e vontade próprias da mulher, como uma instituição social de purificação, como diz o Luis Graça e também de educação ou socialização das meninas para o exercicio da função e do papel de mulher e como tal não podia ser anterior a islamização do mesmo modo que a circunscisão resulta de uma prática bem conhecida e intimamente ligada a religião que remonta até Abraao, este é o primeiro ponto.

Mas, ao mesmo tempo, a excisão feminina não resulta de nenhuma imposição ou fanatismo religioso como, erradamente, se pode pensar e o "fatwa" proferido pelos Imames no Parlamento, é demonstrativo deste facto. Da mesma forma que também ela não resulta de uma discriminação ou imposição dos homens em relação as mulheres nas nossas sociedades.

A luta contra a MGF, antes de mais, deve ser travada no seio da própria camada feminina, mas também no campo do desenvolvimento integral do Homem em geral (homens e mulheres) e, sobretudo, no dominio da educação.

Lembro que o meu pai não era letrado e vivia no campo, mas o simples contacto com comerciantes Lusos (portugueses e Caboverdianos) nos anos 60 foi o suficiente para abrir os olhos e mudar a sua filosofia de vida e o caminho escolhido para os seus filhos numa época em que as forças do obscurantismo ainda reinavam.

Assim, para as novas gerações da Guiné, a batalha contra a MGF e as práticas culturais consideradas nefastas só poderão ser ganhas se o combate contra a pobreza e o analfabetismo for encarado com firmeza e determinação, mas para isso precisamos de mais e melhor organização, de mais e melhor estado que possa conceber politicas e fixar metas que sejam económica e socialmente exequíveis.

Bem, depois de todo esse trabalho, esperamos que, a seguir, não nos venham a dizer para legalizarmos o casamento gay porque, convenhamos, isto dos direitos humanos pode ser uma verdadeira caixa de pandorra.

Um abraço amigo,

Cherno Baldé
____________

Nota do editor:

Último poste da série > 3 de fevereiro de 2013 > Guiné 63/74 - P11049: (Ex)citações (208): Monóculo de Spínola oferecido ao Museu Etnográfico de Silgueiros - Viseu (Amaral Bernardo)

Guiné 63/74 - P11074: Álbum fotográfico de Abílio Duarte (fur mil art da CART 2479, mais tarde CART 11/CCAÇ 11, Contuboel, Nova Lamego, Piche e Paúnca, 1969/70) (Parte I)

A CART 11... algures no Corubal


A CART 11... no Corubal... O descanso dos guerreiros


A CART 11,,, Fazendo exploração rádio


A CART 11... Deslocação no mato


A CART 11... Deslocação no mato, na época seca


A CART 11... Deslocação em coluna auto

Fotos (e legendas): © Abílio Duarte (2013). Todos os direitos reservados. [Edição: L.G.]



1. Duas mensagens recentes do Abílio Duarte,  ex-fur mil art da CART 2479 (mais tarde CART 11 e finalmente, já depois do regresso à Metrópole do Duarte,  CCAÇ 11, a famosa companhia de “Os Lacraus de Paúnca”) (Contuboel, Nova Lamego e Paúnca, 1969/70):

(i) Olá, Luis.

Em resposta ao teu e-mail anterior, solicitando fotos da minha companhia (*), junto mais estas, que farás o favor de juntar a outras do nosso ficheiro. Para recordação e memória futura. os meus agradecimentos. Abílio Duarte.

(ii) Sobre o [José Carlos] Lopes, almoçamos todos os meses, juntamente com outros colegas do BNU, e alguns deles, também estiveram na Guiné.

Já anteriormente te tinha comunicado que conhecia muito bem o Lopes, que era meu colega no BNU, e que tinha estado com ele várias vezes em Bambadinca.

Quando vocês pediram, ditados e frases que nós utilizavamos no nosso dia a dia, enviei-te uma, que precisamente que aprendi em Bambadinca, quando o Lopes me dava asilo lá na vossa messe, que era o "BIOXENE".

Ainda hoje, quando peço Whiskey, me lembro desse nome.

Tenho bastantes fotos, mas não estão digitalizadas, pelo que me é dificil enviá-las.

O Lopes já me tinha, falado do vosso próximo encontro [, na casa dele, em Linda a Velha]. Quando quiseres, estou à tua disposição.

Até sempre. Um Abraço.
____________________

(*) Explicação do Abílio Duarte:

(...) Esta Companhia foi formada por quadros de Portugal e naturais da Guiné, quando o meu Camarada, e Comandante Chefe, Marechal Spínola, era o Governador da Guiné.

Foi constituída por soldados de 2ª linha, provenientes da evacuação de Madina do Boé, Cheche e Beli, ao sul do Rio Corubal.

Foi dada instrução militar, em Contuboel, donde se formaram duas Companhias de Fulas [, CART 11 e CCAÇ 12,] e um Pelotão de Mandingas, que foi depois enviado para a Zona de Bambadica e Xime. 

A nossa Companhia era Comandada, pelo Cap Mil Analido Aniceto Pinto, que muito considero, pois alinhou sempre.

Depois da Formação e Juramento de Bandeira em Bissau, fomos colocados no Leste da Guiné como força de Intervenção subordinada ao Com-Chefe, e depois ao COP 5 de Bafatá.

Durante 14 meses de Operações Militares de toda a espécie, Nomadizações, Colunas , Emboscadas, Segurança na Fronteira com o Senegal, Apoio Logístico no conflito de Buruntuma (Fronteira com a Guiné-Conakri) e Apoio no Deslocamento de Rebeldes de Nova Lamego até à Fronteira com a Guiné, para o Golpe de Estado contra Sekou Touré [, Op Mar Verde], tudo foi feito com dignidade e HONRA. (...)

Guiné 63/74 - P11073: Parabéns a você (533): Constantino Neves, ex-1.º Cabo Escriturário da CCS/BCAÇ 2893 (Guiné, 1969/71)

____________

Nota do editor:

Vd. último poste da série de 6 de Fevereiro de 2013 > Guiné 63/74 - P11063: Parabéns a você (532): Amiga Ana Duarte; Fernando Franco, ex-1.º Cabo do PINT 9288 (Guiné, 1973/74); Hugo Moura Ferreira, ex-Alf Mil da CCAÇ 1621 e CCAÇ 6 (Guiné, 1966/68) e José Teixeira, ex-1.º Cabo Aux Enf da CCAÇ 2381 (Guiné, 1968/70)

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2013

Guiné 63/74 - P11072: Memória dos lugares (211): Bafatá, Natal de 1970, a minha primeira bebedeira (Campelo de Sousa)

Bafatá, Natal de 1970


1. Mensagem do nosso camarada Campelo de Sousa*, ex-1.º Cabo Radiotelegrafista (STM), Bafatá e Nova Lamego, 1970/72, com data de 5 de Fevereiro de 2013:

Como prometido cá vai a minha primeira foto que,  como podeis verificar,  vai autenticada com o meu selo pessoal que desde já autoriza a sua publicação, cópia e reprodução.

Como podeis ver, esta foto foi tirada na noite de Natal de 1970 no Posto de Rádio em Bafatá. Este pessoal não era todo radiotelegrafista, estavam aqui também operadores de mensagens e operadores cripto que estavam de folga a beber uns valentes copos,  como se pode ver!

E vou contar já um segredo que fica aqui só para nós!!!!

Foi nesta noite de Natal que eu apanhei a minha primeira bebedeira! Ainda hoje falo nisso ao meu filho e à minha mulher. Andei três dias doente.

Só os operadores que estavam de serviço nessa noite se livraram de apanhar tão grande bebedeira.

Outras fotos seguirão.

Cumprimentos,
Campelo de Sousa
____________

Nota do editor:

(*) Vd. poste de 3 DE FEVEREIRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11051: Tabanca Grande (384): Manuel Isidro Campelo de Sousa, ex-1.º Cabo Radiotelegrafista dos STM (Bafatá e Nova Lamego, 1970/72)

Vd. último poste da série de 6 DE FEVEREIRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11065: Memória dos lugares (210): Também estive na ponte Caium, dois meses, antes de acabar a minha comissão em Camajabá (Abel Santos, ex-sold at, CART 1742, Nova Lamego e Buruntuma, 1967/69)

Guiné 63/74 - P11071: Em busca de... (214): Carlos Botto, ex-Condutor Auto da CCAV 3404/BCAV 3854, Cabuca, 1971/73 (José António Sousa)

1. Mensagem do nosso camarada José António Sousa (ex-Soldado Condutor Auto da CCAV 3404/ BCAV 3854, Cabuca, 1971/73), com data de 2 de Fevereiro de 2013:

Caros camaradas da Guiné:
Hoje gostaria de falar do Carlos Botto.

Este camarada era condutor e foi integrado na CCav 3404 nos finais de 1972 (desconheço a data certa), era filho de um oficial do exército e talvez por ter estado sujeito a alguma disciplina militarista (digo eu) na sua adolescência e juventude tornou-se um jovem um tanto ou quanto irreverente, não é que fosse mau rapaz, mas era um pouco rebelde o que lhe terá custado algumas sanções disciplinares na tropa, e apareceu em Cabuca por isso mesmo.

O Botto era um indivíduo muito criativo, organizava todo o tipo de actividades para combater o isolamento a que estávamos sujeitos dentro daquelas duas fiadas de arame farpado.

Desde o futebol ao basquetebol passando pelo voleibol, lá estava a assinatura do Carlos Manuel Marques Botto, chegou até a organizar um gincana com bicicletas que convenceu alguns nativos emprestar-lhas embora algo desconfiados, até que um dia resolveu criar uma emissora de rádio, um radialista por excelência, tinha que passar por tudo para conseguir os seus intentos.

Foi escolhida uma pequena casa que havia sido construída com a finalidade de substituir a velha enfermaria mas que nunca foi utilizada, com a colaboração do pessoal das Transmissões,

Lá conseguiu arranjar o equipamento necessário para o sua emissora de rádio, pôde também contar com a minha colaboração, pois para alimentar os equipamentos era necessária corrente eléctrica e esta era fornecida através de uns cabos ligados à bateria do “meu" Unimog estacionado nas traseiras da “emissora”, também lhe dava assistência no som. O genérico de apresentação era o POP CORN, na época muito em voga. Para além da música emitida por um gravador de cassetes, organizavam-se os mais diversos concursos que sempre divertiam o pessoal.


Fiquei surpreendido quando há cerca de dois ou três anos atrás soube que o meu amigo Carlos Botto havia regressado a Cabuca, já no tempo da 2ª Cart do Bart, 6523, provavelmente pelos mesmos motivos da primeira vez, e como não podia deixar de ser, mais uma vez uma emissora de rádio a “Rádio Nos Tera”.

Passei muitos bons momentos com este camarada que nunca mais vi, soube que apareceu num dos convívios da CCav 3404 mas eu não estive presente. Gostava muito de o rever.

Quero enviar um forte abraço a todos os camaradas da Tabanca Grande.

Em anexo vou enviar duas fotos do Botto que compilei do Blog dos Abutres de Cabuca que espero eles não fiquem zangados, vou enviar também uma foto da casa onde funcionava  a emissora mas esta foi obtida em 2010 quando visitei Cabuca.

Carlos Botto, à esquerda

Carlos Botto em plena actividade, entrevistando, se não estou em erro, o nosso camarada António Barbosa

Rádio Cabuca em 2010
____________

Nota do editor:

(*) Vd. poste de 24 DE JANEIRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P10995: Tabanca Grande : José António Gomes de Sousa, ex-Soldado Condutor Auto da CCAV 3404/BCAV 3854 (Cabuca, 1971/73)(383)

Vd. último poste da série de 1 DE FEVEREIRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11038: Em busca de... (213): Camaradas de Buba, 1972/74 (Aníbal Silva, através da sua filha Nilza Gonçalves)

Guiné 63/74 - P11070: Recortes de imprensa (64): Ontem, Dia Internacional da Tolerância Zero à Mutilação Genital Feminina, cerca de 200 imãs guineenses decretaram, em Bissau, uma fatwa contra o fanado (Lusa / Público)


Guiné > Zona Leste > Setor L1 > Bambadinca > CCS/BCAÇ 2852 (1968/70) > Foto nº 80:  Mulheres, de rosto tapado, na festa do fanado (?)... Ignora-se o que faziam junto ao edifício do comando do batalhão... Fotos do álbum do José Carlos Lopes, ex-fur mil reabastecimentos.

Foto: © José Carlos Lopes (2013). Todos os direitos reservados. (Editadas e legendadas por L.G.)

1. Ontem foi o Dia Internacional da Tolerância Zero à Mutilação Genital Feminina... A MGF é também conhecida por corte dos genitais femininos, circuncisão feminina, excisão, fanado, sunna, circuncisão faraónica...E ainda se pratica em cerca de três países de África, Próximo Oriente e Sudeste asiático... Portugal, França  e outros países europeus que acolhem imigrantes, nomeadamente da África Ocidental, são também países de risco. Este ano a Organização das Nações Unidas está otimista quanto à possibilidade de, num futuro próximo, ainda se poder pôr fim a esta prática não só atentatória dos direitos humanos como altamente nociva à saúde sexual e reprodutiva das raparigas e mulheres excisadas.

Dados fornecidos pelo International Day of Zero Tolerance of Female Genital Mutilation/Cutting, das Nações Unidas, parecem indicar um decréscimo da prevalência desta prática, em geral, estando a geração mais jovem menos vulnerável  hoje do que no passado.

Nos 29 países da África e do Médio Oriente onde a prática da MGF está concentrada, uma média de 36% de raparigas,  na casa dos 15-19 anos, foram excisadas, percentagem essa bastante inferior à estimada (53%) para as mulheres da faixa etária dos 45-49 anos.  Esse declínio é mais evidente em países como o  Quénia em que a percentagem de mulheres excisadas é três vezes superior à das raparigas entre os 15 e os 19 anos.

Para o director executivo da UNICEF,  Anthony Lake, "este progresso mostra que é possível acabar com a MGF". Estas estimativas recentes produzidas pela UNICEF mostram que pelo menos 120 milhões de meninas e mulheres sofreram MGF / Circuncisão, nestes 29 países. Dadas as tendências atuais, pelo menos 30 milhões de meninas com menos de 15 anos de idade ainda poderão  estar em risco.  

Em  dezembro passado, foi adotada por unanimidade uma resolução da Assembleia Geral da ONU , c condenando a MGF / Circuncisão e convidando os Estados membros a intensificar os esforços para a sua eliminação completa. (A MGF/Circuncisão engloba 4 tipos de práticas: vd. Quadro 1, a seguir).


Fonte: Yasmina Gonçalves - Mutilação Genital Feminina. Lisboa: Associação paar o Planeamento da Família. 2004.


2, Também na Guiné-Bissau surgem algumas boas notícias neste campo. Reproduzem-se aqui excertos de uma notícia da Lusa, publicada no Público, de ontem;


(...) "Líderes islâmicos guineenses pronunciaram esta quarta-feira, no parlamento do país, uma fatwa (um decreto religioso) proibindo a prática de excisão, que afecta cerca de 50% de raparigas e mulheres.

"Cerca de 200 imãs vindos de todas as partes do país assistiram, no parlamento, à leitura da fatwa e declararam solenemente que, a partir de hoje, vão reforçar o apelo para o abandono da prática da excisão, por não ser uma recomendação do Islão".

O influente imã Mamadu Aliu Djaló, da mesquita central de Bissau, que é também o segundo vice-presidente do Conselho Superior dos Assuntos Islâmicos,  declarou que "a excisão não está no Islão, e nos ensinamentos do profeta Maomé também não vimos nada disso, até porque as filhas do profeta, as filhas dos seus discípulos, não foram submetidas à excisão. Isto é um uso e costume de certas comunidades islâmicas”.

Segundo a fonte que estamos a citar (Lusa / Público),  "o presidente do parlamento guineense, Ibraima Sory Djaló, que presidiu ao acto, declarou que se alcançou “um grande marco” no país com a adopção da fatwa, o que, disse, vai ao encontro da lei aprovada pelos deputados em 2011 criminalizando a prática. “Esperamos agora que a lei seja respeitada, para que não seja necessário que se prendam pessoas por causa da excisão” na Guiné-Bissau, declarou Sori Djaló, apelando, contudo, para o reforço da divulgação da lei.

Ainda segundo a Lusa / Público:

(...) Para Fatumata Djau Baldé, presidente do Comité Nacional para o Abandono de Práticas Tradicionais Nefastas à Saúde da Mulher e da Criança, um consórcio de 18 ONG guineenses e estrangeiras, “hoje é um grande dia” na luta contra “a tragédia silenciosa que afecta cerca da metade das raparigas e mulheres” da Guiné-Bissau. “Hoje é um dia histórico. Não ganhámos a guerra contra a excisão, mas alcançámos uma grande conquista contra essa prática degradante para a saúde da mulher guineense”, disse Djau Baldé, emocionada. [Ela própria foi vítima, em criança, da MGF].

O ministro da Saúde Pública guineense, Agostinho Cá, considerou o dia de hoje como sendo aquele em que se prestou um dos melhores serviços ao povo com a adopção da fatwa “pelos chefes religiosos” islâmicos, “proibindo uma prática secular” que se caracteriza pela submissão da mulher a situações “atentatórias da sua dignidade”.

Assistiram à leitura e adopção da fatwa, a primeira a ser pronunciada na Guiné-Bissau, elementos do corpo diplomático e o representante adjunto do secretário-geral das Nações Unidas, Gana Fofang, que é também o coordenador do PNUD (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento) no país.

____________

Nota do editor:

Último poste da série > 12 de janeiro de 2013 > Guiné 63/74 - P10931: Recortes de imprensa (63): Homenagem, em maio de 2008, ao tenente capelão Joaquim Ferreira da Silva, jesuíta, natural de Santo Tirso, que pela sua coragem e lucidez terá evitado um banho de sangue no campo de prisioneiros de Pondá, Goa, em 19 de março de 1962 (JN- Jornal de Notícias, 12/5/2008)

Guiné 63/74 - P11069: Histórias e memórias de Belmiro Tavares (36): Juramento de Honra

1. Em mensagem do dia 28 de Janeiro de 2013, o nosso camarada Belmiro Tavares (ex-Alf Mil, CCAÇ 675, QuinhamelBinta e Farim, 1964/66), enviou-nos mais uma memória do seu tempo de estudante.


HISTÓRIAS E MEMÓRIAS DE BELMIRO TAVARES

36 - Juramento de Honra

No Coa, por incrível que pareça, também havia destas coisas – não se brincava em serviço. Faziam-se juramentos… e não eram só de amor eterno; havia outros … afinal!

Três bons rapazes – teriam de ser bons cachopos, pois eu era um deles – frequentavam o 5º ano; depois, certamente de alguns considerandos, mais ou menos alargados, de livre e espontânea vontade e de comum acordo, os três bons malandros decidiram que “nenhum deles cortaria a barba antes do início das férias da Páscoa”. Esta ousada decisão terá sido alinhavada na sequência das férias do Carnaval; o ambiente carnavalesco era forte e convidativo a tais deliberações.

A direção do COA, porém, também não brincava em serviço; a disciplina era levada muito a sério – não era palavra vã. Mas, se os alunos -  mesmo apenas três – decidiram... está decidido! Cumpra-se!
Aqueles três galfarros entenderam também que só conversa não era suficiente! Palavras leva-as o vento! Vai daí... escreveram para que constasse!

O assunto ia mesmo passar ao papel! Pegaram numa vulgaríssima folha de sebenta (comezinho bloco de apontamentos com folhas  pardacentas, não pautadas) e nela escreveram um texto bem (ou mal ) alinhavado pelos três artistas, mais ou menos, como se segue: “Nós, F, F1, F2, abaixo assinados deliberámos e juramos pela honra, uns dos outros, que não cortaremos a barba antes do início das férias da Páscoa”.

Teremos certamente acrescentado: “aconteça o que acontecer”, ou ainda “nem que a burra tussa”! Apusemos local e data e as três assinaturas. Só faltou reconhecer as assinaturas no tabelião, que, à época, já era notário. Utilizando como base um reles papel;… nós éramos pessoas (adolescentes) confiáveis e prescindimos do reconhecimentos… até porque esta atuação implicava o pagamento de determinada verba… e o dinheiro não abundava nos nossos bolsos. A decisão acima citada pode parecer caricata aos olhos dos jovens de hoje porque estão habituados ao regabofe que prolifera nas escolas da atualidade; naqueles tempos, tudo era diferente! Havia DISCIPLINA e como ela era ali geralmente dura. Mas isso são contas de outro rosário!

Passadas (não mais de) duas semanas – creio -  surgiram as primeiras dificuldades que iriam fazer ruir o nosso juramento,  um a um, apesar de a nossa barba não crescer tanto assim que se notasse a olho nu, ao fim duma semana,

O primeiro visado foi, parece-me, o Armando Figueiredo, natural de S. Vicente de Pereira, lá para as bandas de Ovar; a Sr.ª Dª Mª Adília não permitiu que ele entrasse na sala de aula (seria, certamente, Geografia de Portugal) “sem lavar a cara”.

Para não começar a somar faltas, sempre perigosas, o Armando houve por bem cortar a barba. Foi a 1ª baixa! Uns dias mais tarde (não recordo  qual o motivo) o Arlindo desligou-se também, unilateralmente, do citado juramento, barbeando-se.

Eu era então o último (único) resistente. Acontecia que eu tinha, como soe dizer-se, “as costas quentes”
A primeira vez que fui a casa, depois de tal promessa rigorosamente escrita, tive o especial cuidado de perguntar ao meu pai se podia deixar crescer a barba; ele respondeu afirmativamente; entendi, não corretamente, que isso seria suficiente para salvaguardar a minha imunidade. Acontecia que a vontade de meu pai não imperava entre as severas paredes do COA! Ali, graças a Deus, imperava a vontade da Direção... e o resto era conversa!

Todos os sábados, durante o estudo da manhã, o Sr. Correia elaborava cuidadosamente uma lista com os nomes dos alunos internos que pretendiam ir passar o fim-de-semana a casa. Pretender ir não era sinónimo de... ser autorizado a ir. Entre uma coisa e outra havia um longo e árduo caminho a percorrer e,  de vez em quando, surgia uma cilada.

O Sr. Almeida, com a citada lista na mão, entrou no refeitório e a cada um ia dizendo se podia ou não sair do COA, nessa tarde; tinha por base as informações sobre o comportamento e/ou aproveitamento escolar. Chegada a minha vez, ele informou em tom (mais) autoritário:
- “vais a casa, mas cortas a barba durante o fim-de-semana”!
- Se não se importa, Sr. Almeida, eu corto-a no início da próxima semana, quando voltar ao Colégio; – comentei eu – era mais um pedido que outra coisa.
- Está bem! Mas não te esqueças! Proferiu o chefe, encerrando o assunto com a sua reconhecida autoridade.

Foi deste modo que o tal juramento – a nossa nobre decisão – redigida e ratificada numa mísera folha de sebenta, foi ao ar. E tudo o vento levou!

Respeito é bonito! Não havia juramento que resistisse à superior e decisória vontade do Sr. António Almeida, o Homem forte daquela casa!

Saudações colegiais,
Janeiro 2013
BT
____________

Nota do editor:

Vd. último poste da série de 1 DE FEVEREIRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11039: Histórias e memórias de Belmiro Tavares (35): O perfeito, senhor Correia

Guiné 63/74 - P11068: O Spínola que eu conheci (29): Depoimento de Jaime Antunes, ex-fur mil, CART 11 / CCAÇ 11 (Paunca, 1970/72)

1. Comentário,  de Jaime Antunes, nosso leitor (e camarada), ao poste P11028:

O nosso General Spínola  fez uma escala em Lisboa e aproveitou para selecionar os comandos para a CART 11, os quais  chegaram em Novembro de 70 a Bissau (os que embarcaram no Ana Mafalda foram os primeiros a chegar; o  Capitão que seguia a bordo conseguiu ficar por Bissau e depois surgiu, e muito bem, o Capitão Almeida). 

Não gostei de Spínola, não só por ter recorrido a Oficiais, Furriéis e Cabos Milicianos que já não estavam em lista de mobilizáveis (2 meses antes eu e o Teixeira tínhamos recusados  150.000$00 para tomar o lugar de um Furriel que era filho de um Coronel). 

E não gostava também porque era prepotente...O  facto de falar primeiro  com os soldados e depois com o Comandante... era uma treta. Por trás... 

Um aditamento, em 1970/72  a CCAÇ 11 / CART 11 esteve por toda a zona Leste. Estivemos ainda em Bafatá,  Bolama, Galomaro, Pirada (antes também éramos viajados). 

 Spínola também era de Cascais (já era meu conhecido). Na recepção à chegada a Bissau disse-me:
- Lamento mas... prometo que quando fizeres 21 meses estás a caminho da Metrópole... 

Foram 21 meses e 5 dias. 

Podia e tinha condições para ser um grande Comandante. Faltou-lhe um pouco de humildade no relacionamento com os seus Homens. Uma nota final, dou-lhe nota positiva e agradeço o Louvor recebido. 

Jaime Antunes
(Ex-Fur Mil Antunes,  CART 11 / CCAÇ 11)



Guiné > Zona leste A> Paunca > Alguns furriéis da CCAÇ 11. O único que era da Guiné, cabo-verdiano,  era o Reis Pires (em primeiro plano, ao centro).  Foto do álbum de Adriano Lopes dos Santos Neto, ex-Fur Mil da CART 3521 (Piche) e CCAÇ 11 (Paunca), 1971/74.

Foto: © Adriano Neto(2011). Todos os direitos reservados.


2. Outros comentários, anteriores, do Jaime Antunes (a quem reitero, mais uma vez, o convite para ingressar na nossa Tabanca Grande, juntando-se assim a outros camaradas da CART 2479, depois CART 11  e depois CCAÇ 11, que já aceitaram um lugar à sombra do nosso mágico e fraterno poilão, como o Renato Monteiro, o Abílio Duarte, o Adriano Neto...):

(i) 14 de dezembro de 2011 > Guiné 63/74 - P9198: Tabanca Grande (311): Adriano Lopes dos Santos Neto, ex-Fur Mil da CART 3521 (Piche) e CCAÇ 11 (Paunca), 1971/74

 (...) Comentário: Olá, uns anitos passados. Li com atenção a passagem por Paunca. O meu Camarada foi um dos que contribuiu para o meu regresso a Lisboa. Fui rendido em Agosto de 72 e o regresso a Lisboa via TAP em 5 de Setembro de 1972. O jovem que me rendeu veio de uma outra Companhia e... foi literalmente "sacado" para ir para a CART 11 (CCAÇ 11 foi alteração que se verificou a meio da minha comissão),  por mim e um comerciante,  de nome João Evangelista,   radicado em Paunca na sua carrinha Toyota. Confesso que não me recordo do seu nome mas foi para me substituir no 4º Pelotão.  (...)


(ii) 23 de dezembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2377: Em busca de ... (13): Malta da CCAÇ 11, Paunca, 1970/72 (Jaime Antunes)

(...) 1. Mensagem de Jaime Antunes, a quem saudamos e convidamos a integrar a nossa Tabanca Grande:

(...) Nestas coisas da vida há recordações que sempre perduram. Como muitos dos Portugueses, na minha juventude, também estive em África. Por uma escolha do Senhor General Spínola, 25 Milicianos, no dia 20 de Novembro de 1970, embarcaram no navio Ana Mafalda com destino ao CTIG. Todos classificados nos primeiros lugares dos cursos. Esta situação levantou-nos muitas dúvidas que foram esclarecidas à nossa chegada ao QG. Tínhamos sido selecionados para integrar uma Companhia de Africanos... a CCART 11. Posteriormente e porque uma Companhia de Artilharia... não era ... uma Companhia de Infantaria... o Senhor General ... passou-nos a CCAÇ 11 para que já não houvesse reclamações quanto às constantes saídas de Paunca  para ir reforçar outras zonas.

Fui colocado no 4º Pelotão e ... cheguei em Novembro de 1970 e fui rendido em Setembro de 1972. 
Mantenho contacto com alguns dos elementos que estiveram nessa altura na CCAÇ 11 mas faltam outros a que perdemos o rasto. Manifesto a minha disponibilidade para conseguir reunir mais alguns camaradas (...).

___________

Nota do editor:

Último poste da série > 5 de fevereiro de 2013 > Guiné 63/74 - P11058: O Spínola que eu conheci (28): Figura incontornável da nossa História, que respeito mas não idolatro (Hélder Sousa, ex-fur mil trms TSF, 1970/72)