Guiné > Bissau > Nhacra > Janeiro de 1972 >Posto retransmissor da Emissora Oficial da Guiné, com anti-aéreas
Foto (e legenda): © Eduardo Campos (2010). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné
É autor da série "Histórias do Eduardo Campos". Vamos lembrar algumas das suas memórias de Nhacra, que ficava as escassas duas dezenas e meia de quilómetros, a norte de Bissau.
1. Em 08/09/73, saímos do Depósito de Adidos, com destino a Nhacra, onde iríamos substituir a CCaç 3477, “Os Gringos de Guileje”
A partir de 19/09/73, a Companhia passou a ter á sua responsabilidade o subsector de Nhacra, sob as ordens do COP 8, instalado no local.
- a Norte o Rio Mansoa,
- a sul o Rio Geba,
- a Oeste o Canal do Impernal
- e, a leste, confinava com o Dugal.
Era atravessada, nos seus limites, por uma estrada asfaltada (com grande movimento de pessoas e viaturas), que ligava Bissau a Mansoa. Havia também a ligação entre Nhacra e Cumeré, em estrada asfaltada.
O terreno apresentava uma uniformidade e configuração incaraterísticas, em que os relevos praticamente não existiam. Er apenas entrecortado pelas bolanhas que abundavam nessa região, visto formarem-se a cotas inferiores às do terreno.
Hidrograficamente a região era rica, com os importantes rios Mansoa e Geba, bastante caudalosos na praia-mar, que chegavam a atingir cerca de três metros de amplitude e invadiam uma série de canais, do qual se destacava o Canal do Impernal, que estabelecia a ligação entre eles, dando origem à ilha de Bissau…
A mata era muita reduzida nessa região, exceptuando-se pequenas manchas existentes no extremo norte do Rio Geba e nas proximidades do Canal do Impernal.
Nas zonas marginais dos rios e dos canais, zonas extremamente pantanosos, abundavam as plantas hidrófilas que se ramificavam em múltiplas raízes, formando o que se designava por “tarrafo”.
Nas aves destacavam-se os pelicanos, as garças os periquitos, além das perdizes, rolas, codornizes, galinha-do-mato, patos, sem esquecer os jagudis. (...)
2. Em Nhacra, fomos encontrar os camaradas do Pelotão de Morteiros 4581/72 e os do 3º Pelotão AA da Btr AA 7040, além de dois pelotões de Milícias: o 329, aquartelado em Oco Grande, e o 230 aquartelado em Bupe, ambos pertencendo à Companhia de Milícias de Nhacra e que ficaram adidos à CCAÇ 4540.
O IN não possuía dentro da nossa ZA, pessoal suficiente em quadros e grupos que lhe permitisse desenvolver uma atividade dinâmica e poderosa, quer para flagelar e atacar o aquartelamento e o Centro Emissor de Nhacra, quer para emboscar as NT fora do aquartelamento.
No entanto, fomos informados que Nhacra e o Centro Emissor foram flagelados pelo IN duas vezes: a primeira ao tempo da CCAÇ 3326, em maio de 1972, por um grupo equipado com armas automáticas e RPG-2 e 7; e a segunda em agosto de 1972, utilizando também um canhão s/r. Em ambos os casos sem qualquer consequência material ou pessoal para as NT.
Sabíamos que o IN andava por ali perto e que atravessava, frequentemente, algumas linhas principais de infiltração, para o interior da nossa ZA a saber: de Choquemone, Infaide, Biambe, pela península de Unche para Iuncume, quando se dirigiam para Nhacra.
As principais prioridades da nossa Companhia eram:
- a garantia da segurança do Centro Emissor de Nhacra,
- o itinerário Bissau–Mansoa;
- e, através de intensa actividade (patrulhamentos e reconhecimentos), evitar que o IN se aproximasse de forma a evitar que pudesse atacar a cidade/capital de Bissau, o Aeroporto de Bissalanca, os complexos miltares de Brá e da Sacor, bem como as instalações militares e civis do Cumeré.
Em onze meses de permanência em Nhacra, nunca tivemos contacto com IN, nem as instalações sofreram qualquer ataque.
Os aglomerados populacionais da ZA da nossa Companhia distribuíam-se por dois regulados:
- o Regulado de Nhacra com as tabancas de Nhacra, Teda, Sal, Bupe, Sucuto, Incume, Sumo, Nhoma e Cholufe;
- e o Regulado do Cumeré com as tabancas do Cumeré, Com, Cuntanga, Quide, Birla, Caiana, Som Caramacó, Cola, Nague, Ocozinho, Rucuto e Oco Grande (reordenamento zincado).
A estrutura agrícola existente baseava-se numa economia básica de subsistência, cujos produtos, que ocupavam lugares especiais de relevo, eram o amendoim, o arroz, o milho, a mandioca, o feijão, a cana sacarina e pouco mais.
Era evidente e manifesto o desagrado em abater, ou mesmo vender, qualquer cabeça de gado, fosse para alimentação ou para outros fins industriais.
Os Balantas eram dotados de uma impressionante constituição física, trabalhadores, valentes, enérgicos e com grande força de vontade pela vida, ao que acrescentaria que eram bons agricultores, arrancando da terra os meios de subsistência de que necessitavam, alimentando-se à base de arroz, azeite de palma, milho e mandioca. Além disso, eram polígamos e condenavam o celibato. Extremamente supersticiosos, acreditavam na transfiguração da alma, atribuindo à feitiçaria as suas desgraças.
Praticavam o roubo, em especial de gado, com a consciência de um ato não criminoso, mas sim um admirável e enaltecedor sinal que revelava a perícia pessoal, bem com de toda a sua própria tribo.
Os Fulas de um modo geral eram hospitaleiros, considerando mesmo a hospitalidade como um dever sagrado. Apesar da influência que o Islamismo tinha entre eles, praticavam ainda o feiticismo e criavam gado, considerado este facto como um sinal de respeito e nobreza.
A acção psicológica desenvolvida pela NT na zona era bastante intensiva, apesar de se constatar, em alguns núcleos, certa reserva em relação à mesma, quando não nula, com maior evidência nas tabancas de Sal e Bupe.
As populações tinham:
- apoio médico/sanitário,
- transporte em viaturas militares,
- assistência educativa prestada por missões religiosas em várias escolas, um professor militar e vários elementos africanos que estavam adidos à Companhia,
- sendo também de salientar a assistência religiosa prestada por padres missionários aos domingos.