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terça-feira, 26 de janeiro de 2021

Guiné 61/74 - P21810: Gloriosos Malucos das Máquinas Voadoras (35): Uma foto de 1966, em Aldeia Formosa, tirada por mim, com o Honório, grande piloto e amigo do peito (Maria Arminda Santos, ex-ten enf pqdt, FAP, 1961/70)


Guiné > Região de Tombali > Aldeia Formosa [Quebo] > 1966 > Estávamos de alerta 
numa Base de Operações. Eu também estava e tirei esta foto.  O Honório está de costas.  De frente o tenente pilav Velez Caldas  capitão pilav Carvalho Araújo. " 

[Segundo comentário do Virgínio Briote, "o tenente Velez Caldas, já falecido, está de boné vermelho. Participou em todas as op. helitransportadas que fizemos. Em 1966 o meu grupo foi transportado nos Al-III para Aldeia Formosa para participar numa acção que estava a decorrer na zona".]

Foto (e legenda): © Maria Arminda Santos  (20021) Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Mensagem da Maria Arminda [Santos] [, ex-tenente enfermeira paraquedista, FAP, 1961/70]

Data - 24/01/2021, 18:25




Boa tarde,  amigo Luís Graça:


Estive a ler os comentários sobre o Honório (*), grande piloto e um amigo do peito.

Envio-lhe aqui uma foto dele, no ano de 1966, em Aldeia Formosa, quando estava de alerta numa Base de Operações, em que eu também estava e tirei esta foto. 

O Honório está de costas. De frente o tenente [Velez] Caldas e o capitão Carvalho Araújo.

Tenho dificuldade em fazer os comentários na página. Parece que o Google está zangado comigo, está sempre a pedir a senha e rejeita-a. Na da Tabanca do Centro, não tenho nenhuma dificuldade.

Cá vamos continuando confinados, que isto não está famoso.

Um grande abraço
Mª Arminda Santos

2. Comentário do editor LG:

Obrigado, camarada!... Por email, responderei à questão dos comentários na nossa "caixa de comentários", que nem sempre é amigável. 

Boa saúde, cuidado com a "picada", cada vez mais cheia de "minas e armadilhas"... Um bj.

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sexta-feira, 22 de janeiro de 2021

Guiné 61/74 - P21794: Gloriosos Malucos das Máquinas Voadoras (34): Uma pequena homenagem a um grande piloto da FAP, o Honório (António Baltazar Dias, ex-Alf Mil Art MA, CART 1745, Ingoré e Bigene, 1967/69)



António Baltazar Dias, membro da Tabanca Grande,
desde  24 de setembro de 2020 (*)
 
 

1. Mensagem do  António Baltazar Valente Ramos Dias, ex-Alf Mil Art MA da CART 1745 (Ingoré e Bigene, 1967/69):


 Date: quinta, 21/01/2021 à(s) 16:48
Subject: Uma pequena homenagem a um grande piloto da FAP

Caro Luís Graça,

Segue um pequeno texto que pretende ser uma singela homenagem a um grande piloto da FAP de que, quem passou pela Guiné, por certo se recordará.

Se entenderes poderás publicá-lo no blogue.

Um abraço

António Baltasar Dias


Ao Honório: O mais louco piloto da FAP
por António Baltazar Dias



Honório Augusto Brito da Costa (1941-1993): 
caricatura do livro de fim de curso, 1961/62, 
da Escola de Regentes Agrícolas de Santarém, 
 




Quem não se lembra do Honório !? (**)

Era o mais louco e melhor piloto que tive o privilégio de conhecer.

Quando um avião se fazia à pista,  sabíamos já de antemão se se tratava ou não do Honório. As piruetas que antecediam a aterragem, eram a sua habitual assinatura.

Enquanto estive em Bigene, entre 1967/69, procurava ser sempre eu a recebê-lo na pista, quando ali se deslocava com o avião de sector ou por quaisquer outros motivos. Tínhamos, assim, uma relação mais próxima que, penso eu, ele deveria manter também com muitos mais camaradas que visitava nas suas inúmeras deambulações pelo território da Guiné.

Naquela época era conhecido em todo o território e as suas façanhas eram relatadas já de forma fantasiosa. As peripécias que lhe atribuíam,  ultrapassavam já, em muitos casos, a realidade.

Tal, porém, nunca foi suficiente para pôr em causa as verdadeiras capacidades e destemor do Honório, que todos reconheciam serem muito para além do que era considerado normal.

E, para que fique registado, relato em seguida duas situações de que fui testemunha presencial.

A primeira, durante uma operação da minha companhia ao corredor de Sambuiá, em que fomos fortemente embocados pelos guerrilheiros do PAIGC. Solicitado apoio aéreo, foram destacados para o local dois T6 que sobrevoaram o local da emboscada. Qual não foi o nosso espanto quando nos apercebemos que, de carlinga aberta, um dos pilotos fazia fogo de pistola sobre os combatentes do IN que debandavam só com a aproximação dos aviões. 

Soubemos depois que se tratava do 1º Sargento Honório. De quem mais se poderia tratar…? !

Outra das situações deixou-me marcas muito mais indeléveis. Mas para que se perceba bem o contexto há que relatar os seus antecedentes. Como atrás referi, procurava ser sempre eu a acolher o Honório quando das suas deslocações a Bigene e, por norma, eu comentava as “maluquices” que antecediam a aterragem.

Ele dizia-me sempre que estava pronto a levar-me para Bissau, quando eu pretendesse mas que teria que “pagar imposto”, leia-se “obrigar-me a vomitar”! Eu replicava que, com ele, nem pensar. melhor seria ir de barco ou mesmo a pé !

E assim se passaram muitos meses de comissão e muitas idas do Honório a Bigene.

Um dia, porém, tive que me deslocar a Bissau para tratar de assuntos da Companhia e, não obstante diversas iniciativas, não conseguia transporte para regressar para junto dos meus camaradas.

Após várias tentativas apenas foi possível transporte para o Norte numa DO-27, pilotada pelo Honório, que teria que ir a mais dois ou três aldeamentos e também a Farim, recolher um médico que era suposto ir para junto da minha Companhia.

Quando me viu, e se apercebeu que iria voar com ele, só me disse: “É hoje!"... E eu fiquei “ligeiramente” apreensivo, sem antecipar o que se seguiria.

E o que se seguiu … foi indescritível! Tentarei fazer um pálido relato do que ocorreu (pálido já, no início, porque no final da viagem eu deveria ter uma cor cadavérica…).

Após ter levantado voo de Bissau e na travessia do rio Mansoa, o Honório apercebeu-se de que uma canoa com supostos guerrilheiros estaria a atravessar o rio, pelo que a melhor solução seria derrubá-los com a asa do avião. Imaginem as acrobacias que efetuou! E só retomou a rota quando os ocupantes da canoa se atiraram ao rio,  para escaparem à hipotética colisão com a aeronave.

Depois foi o habitual espetáculo antes de cada aterragem, “para que todos soubessem que era o Honório o piloto”!

Em Farim embarcámos o médico. Eu já deveria ter uma cor ou branca ou amarelo - esverdeada e respondi à saudação do médico com um grunhido impercetível. O médico ainda não havia ouvido falar do Honório. Era, portanto, o seu batismo de voo naqueles propósitos…

Ao reentrarmos na DO-27 o Honório disse-me: “Vais para a tua terra, Bigene, portanto vamos fazer uma aproximação especial"…

De nada me valeria replicar, por isso preparei-me para o pior. E que é que me reservou o Honório? Uma aproximação rasante pela bolanha junto ao rio Cacheu e, depois aparecer de surpresa sobre a povoação sem que ninguém esperasse! 

Só que, a seguir ao voo rasante e sobrevoo da vegetação do tarrafe,  surgiram de repente duas palmeiras mesmo em frente do nariz da aeronave. Pensei: “É hoje!" …(Não o “pagar imposto”, como o Honório pretendia, mas o último dia da minha existência...).

Mas o Honório era o Honório. Numa rápida manobra inclinou a aeronave e passou com uma das asas entre as palmeiras, evitando assim a colisão. Depois foi o habitual, mas um pouco mais requintado espetáculo. Foi a “folha morta”, foi o voo rasante na pista, foi um mais não sei quê de manobras acrobáticas até aterrar com segurança.

Quando saí do avião,  lembro-me que o médico estava mais branco que a cal da parede e sem poder pronunciar palavra. Eu nem sei que cor teria e nem me atrevi a abrir a boca durante um largo período de tempo.

Muitos minutos depois, já meio refeito, quando o Honório se preparava para regressar a Bissau ainda tive coragem de dizer à despedida: “Não me fizeste pagar imposto !!!”

De facto não cheirava a vomitado no avião, mas ficaram a pairar uns odores igualmente bem desagradáveis no habitáculo…

Grande Honório ! É a minha singela homenagem a um grande piloto que naquele tempo equiparávamos a Jaime Eduardo de Cook e Alvega, o famoso Major Alvega,  herói da nossa adolescência.

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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 24 de setembro de 2020 Guiné 61/74 - P21387: Tabanca Grande (503): António Baltazar Valente Ramos Dias, ex-Alf Mil Art MA da CART 1745 (Ingoré e Bigene, 1967/69): senta-se no lugar n.º 819 do nosso poilão

sexta-feira, 11 de setembro de 2020

Guiné 61/74 - P21347: Gloriosos Malucos das Máquinas Voadoras (33): O Honório [Augusto Brito da Costa] que eu conheci (Esteves Oliveira, ex-alf mil, CTIG, 1963/65)



Honório Augusto Brito da Costa (1941-1993): caricatura do livro de fim de curso, 1961/62, da Escola de Regentes Agrícolas de Santarém, hoje Escola Superior Agrária de Santarém.

Nascimento: 29 Ago 1941, Praia, Santiago, Cabo Verde
Companheira: Lina da Silva Soares (de quem  teve uma filha, Tatiana Soares Brito da Costa, nascida em 1982)
Óbito: 29 Ago 1993, Praia, Santiago, Cabo Verde com 52 anos de idade. (Terá morrido de AVC.)
Sepultura: Ago 1993, Praia, Santiago, Cabo Verde
Honório também usou o nome Honoriozinho.

Fonte: Genealogia dos cabo-verdianos com ligações de parentesco a Jorge e Garda Brito, a seus familiares e às famílias dos seus descendentes (com a devida vénia...) 


1. Mensagem do nosso leitor e camarada E. Esteves de Oliveira, autor do blogue A Sopa dos Pobres, natural de Angola, antigo alferes miliciano no CTIG, 1963/65:
 
Date: sexta, 11/09/2020 à(s) 13:07
Subject: O Honório que eu conheci   

Recentemente, a passear pelas páginas do vosso / nosso blog, descobri que escreveram sobre o piloto aviador Honório Augusto Brito da Costa. (*)

Foi durante a minha primeira passagem pela estância de férias da Guiné (1963-1965) que conheci o Honório, formidável figura que merecia ser descrita num livro. 


Para a malta rasteira era um santo, o piloto que nunca nos deixava mal, o inimigo temia-o, voava com qualquer tempo se fosse preciso - chegou a levantar voo à noite, contra ordens, para acudir a um aquartelamento cercado e debaixo de fogo cerrado, a simples presença do T-6 foi suficiente para o ataque terminar; os budas de Bissau queriam dar-lhe uma porrada exemplar, o relatório e os empenhos da malta do mato fizeram que a coisa ficasse por uma ensaboadela que lhe atrasou a promoção a sargento-ajudante.

Os oficiais superiores (majores, tenentes coronéis e coronéis) detestavam voar com ele, desistiam da viagem se fosse ele o piloto do avião-correio... Lembro-me de uma vez em que partilhei como passageiro com o ten cor,  comandante do batalhão de Buba,  um DO-27 pilotado pelo Honório, foi um festival! Descolagem STOL extrema, subida a pique, quebra repentina para o Rio Grande de Buba sobrevoado a uns metros da água, abaixo das copas das árvores, as curvas do rio dadas a rapar, até chegarmos à foz - assim, evitámos ser atingidos pelo eventual fogo antiaéreo do inimigo, explicou o Honório ao petrificado Luizinho das Perguntas, "como o senhor coronel sabe, eles estão por todo o lado...". 


Daí até Bissau foi um voo normalíssimo, a altitude de cruzeiro, dava para ver a paisagem, o enorme estuário do Geba e o casario de Bissau, onde aterramos sem percalço pouco depois. O ten cor saiu do avião de fininho, sem uma palavra, direito ao WC mais próximo, o Honório e eu fomos beber uns copos para celebrar mais uma vitória contra a hierarquia... 

São muitas as recordações do Honório como piloto militar, na Guiné e em Angola, onde o vim encontrar mais tarde, muitas vezes, já desmobilizado e a voar aerotáxis e aviões de fumigação. 

A notícia da sua morte deixou um buraco enorme no meu acervo de amizades e memórias. (**)

2. Comentário do editor LG:

Confirmo, mais uma vez, que o camarada Esteves de Oliveira, antigo alferes miliciano no CTIG, 1963/65, acompanha com maior ou menor regularidade o nosso blogue e já tem feito mais comentários.

E reitero o que já aqui escrevi: é uma pena não estar "formalmente" integrado na nossa Tabanca Grande, o mesmo é dizer, poder estar sentado à sombra do nosso mágico e fraterno poilão... Para mais conheceu a Guiné nos anos de chumbo (1963/65), além dos TO de Angola e Moçambique...

O convite continua de pé: só precisamos das 2 fotos da praxe...
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Nota do editor:

(*) Vd. poste de 10 de setembro de  2020 > Guiné 61/74 - P21344: Notas de leitura (1303): "O Cântico das Costureiras", de Gonçalo Inocentes (Matheos) - Parte II (Luís Graça)

(...) Não menos calorosa foi, num outro dia, a saudação que veio do ar, do na altura furril mil pil Honório Brito da Costa. Eram já amigos um do outro, do tempo da Escola de Regentes Agrícolas de Santarém. Um angolano, outro cabo-verdiano. Nas férias, em Lisboa, encontravam-se no Café Palladium, nos Restauradores, ou na Suíça, no Rossio. E tinham por hábito, ir a pé até à Portela de Sacavém, tomar uma bica na varanda do 1.º andar do aeroporto, só para "ver... os aviões".

Quis o destino que se encontrassem na Guiné, na mesma altura... mas sem o Honório saber onde estava o amigo... Até que o descobriu e fez-lhe uma surpresa... Numa manhã, o aquartelamento de São João foi sobrevoado, em voo rasante, por um T6 Harvard, pondo a tropa em sobressalto. Pela rádio, ouviu-se o piloto a pedir para chamar o furriel Inocentes. Finalmente, em contacto via rádio, o Honório em fúria desanca no Inocentes: "Cabrão, cabrão, cabrão! Ando doido à tua procura! Não sabias dizer onde estavas ?"... E deu-lhe um abraço "by air" que se ouviu em toda a Guiné... e em Bissalanca.

Claro que o Honório deve ter levado uma porrada... Mas esta é uma das histórias deliciosas que o Inocentes nos conta, e que eu resumo aqui para os nossos leitores. (...)

terça-feira, 4 de setembro de 2018

Guiné 61/74 - P18980: Blogpoesia (583): "Eu amo", poema de Júlio Corredeira, Piloto Aviador Reformado (Mário Santos)



1. Mensagem do nosso camarada Mário Santos (ex-1.º Cabo Especialista MMA da BA 12, Bissalanca, 1967/69), com data de 31 de Agosto de 2018:

Caro Carlos.
Com votos de que encontres bem, daqui te envio para publicação em tempo oportuno, mais um poema do meu bom amigo Piloto/Aviador reformado Júlio Corredeira.
Um hino ao amor e à vida que merece ser lido por todos que apreciam a beleza da palavra escrita com todo o seu esplendor e significado.

Grande abraço,
Mário Santos

********************

Eu amo

Eu amo a Natureza e tudo
o que ela encerra:
O mar, os rios, o límpido ribeiro,
As campinas de searas que enchem o celeiro
Ou a neve a cair nos píncaros da serra.

Amo as aves do campo que bicam a terra
Ou a terna andorinha que apanha o argueiro,
E deleitam-me as flores de aromático cheiro
E os animais da selva cuja voz me aterra.

Porém amo bem mais o sorrir da criança
Tão cheio de ternura, pleno de esperança,
Que, ás vezes, me parece uma vera miragem.

E amo todo o ser, um reflexo do amor
Que manifesta em si o dedo criador,
Mas, acima de todos, o Homem, sua imagem.

jc
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Nota do editor

Último poste da série de 2 DE SETEMBRO DE 2018 > Guiné 61/74 - P18972: Blogpoesia (582): "Brilhantina espanhola", "Magia das manhãs" e "O regato da serra", da autoria de J. L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil da CCAÇ 728

quarta-feira, 22 de agosto de 2018

Guiné 61/74 - P18945: Blogues da nossa blogosfera (101): "Dossier de Lutas", de Francisco George: uma pequena grande aventura na pátria de Cabral: Catió, 1983, o avião Dakota, aos comandos do lendário comandante Pombo, que pegou de empurrão...

Francisco Geoge. Foto da
Direção-Geral de Saúde
(Com a devida vénia...)

1. Francisco George é uma figura pública. Durante anos a sua figura carismática entrou pela casa dentro do portugueses, através da televisão, transmitindo segurança, sabedoria, empatia, confiança... 

Foi diretor-geral da Saúde entre 2005 e 2017. Jubilou-se em 31 de outubro de 2017, aos 70 anos, por ter atingido o limite de idade, legal, para exercer funções na administração pública.

É pois da mesma colheita do que eu, ambos nascemos em 1947. Foi meu colega, professor convidado na Escola Nacional de Saúde Pública da NOVA, e colaborador da revista que eu dirigi durante anos, a Revista Portuguesa de Saúde Pública.  Na mesma escola, em 1977, fez o Curso de Saúde Pública , tornando-se especialista em saúde pública. A partir de 1976, foi delegado de saúde, primeiro no concelho da Cuba e depois no concelho de Beja. Foi, de resto, aí que eu o conheci, em finais dos anos 70. A sua casa em Beja era uma verdadeira tertúlia. Tinha (e tem) o gosto de bem receber e era (e é) um notável conversador e contador de histórias. 

Do seu vasto currículo, destaca-se o seu papel, entre 1980 e 1991,  como funcionário da Organização Mundial da Saúde (OMS). Para além de Bissau e Harare, foi consultor em missões da OMS nos mais diversos pontos do globo (Pequim, Xangai, Brazzaville, Genebra, Rio de Janeiro, Maputo, Praia, São Tomé, Luanda, Bamako, Antananarivo, Maseru e Lusaka). E é aqui que se passa, na Guiné-Bissau, em 1983,  uma das histórias, deliciosas, que ele nos conta na sua página pessoal, "Dossier de Lutas".

Na qualidade de funcionário da OMS, ele fora designado, em  1980, como chefe do projeto Desenvolvimento dos Serviços de Saúde, na República da Guiné-Bissau.  E em 1986 é nomeado representante da OMS  neste país lusófono. Falou sempre da Guiné-Bissau como um grande amigo. É um poço de energia, incapaz de parar. Está hoje à frente da Cruz Vermelha Internacional, desde novembro de 2017.

Aqui fica, com a devida vénia, uma das suas pequenas grandes aventuras, passadas em África: Dossier de lutas > Memórias de África >  O avião que pegou de empurrão – Quinta Aventura.  A história tem a particularidade se passar, em Catió, em 1983, e de envolver também um conhecido nosso, o saudoso comandante Pombo, membro da nossa Tabanca Grande. 

Aproveito paa desejar ao dr. Francisco George muita saúde e longa vida porque ele merece tudo. Cada um de nós foi à sua vida e eu, lamentavelmente, não o pude homenagear, em devido tempo, quer na Direção-Geral de Saúde quer na Escola Nacional de Saúde Pública da NOVA. Aqui fica também esta pequena manifestação do  nosso apreço e amizade, na qualidade de editores do Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. 


2. Memórias de África > O avião que pegou de empurrão: quinta aventura

por Francisco George

Em 1983 as dificuldades nas ligações entre as várias regiões da Guiné-Bissau eram, ainda, imensas. Ir de uma localidade a outra impunha, quase sempre, cuidadosa e justificada preparação. O clima ditava escolhas e condicionava a programação, sobretudo no que se referia à estimativa de horas necessárias para as viagens.

Ora, como no início da estação das chuvas daquele ano, estavam previstas iniciativas de avaliação do Programa de Vacinação que decorria no Sul, era preciso planear meticulosamente o trabalho de campo e escolher os transportes mais apropriados.

Na Guiné Independente, o primeiro Governo do PAIGC tinha criado uma pista em Catió para os aviões da companhia aérea guineense poderem aterrar em regime de escala, nos voos regulares entre Bissau e Conacry. A construção do “aeroporto” tinha sido uma espécie de homenagem às populações das tabancas de Tombali que tinham participado na Luta. Era considerada uma medida para reduzir os efeitos do isolamento. A pista, rudimentar, sem torre nem comunicações, não dispunha mesmo de qualquer abrigo a imitar uma aerogare.

O espectáculo era sempre constante: o avião Dakota  aterrava depois de sobrevoar a pista para afastar o gado. Logo a seguir uns passageiros saíam, enquanto outros esperavam junto a uma balança colocada à entrada do porão a fim de pesarem as respetivas bagagens. Mais à frente, alinhava-se a fila de espera para o embarque na aeronave.

Quando acabou a visita de avaliação, acompanhado pela minha Colega pediatra, Clotilde Silva, no final de uma semana fora de casa, fomos ao encontro do voo que em meia-hora ligava Catió a Bissau. Os nossos bilhetes tinham sido previamente adquiridos e os lugares estavam garantidos. Já no local reservado ao embarque, surgiu, à hora prevista, o avião que viria a aterrar sem animais na pista.

aos comandos do seu Cessna  dos TAGP, c. 1972/74 
(Foto de Álvaro Basto, 2008)
Passados os habituais procedimentos, entrei no avião pela escada da frente que dava acesso ao
corredor central. Ao todo seriam cerca de 50 passageiros que completavam a lotação. Ocupei o meu lugar ao lado da minha Colega, ansioso por voltar a casa. Já com a porta fechada, o Comandante Pombo e o co-piloto tentavam, sem sucesso, ligar o motor do Dakota As hélices permaneciam teimosamente paradas. A ignição não funcionava. É então que o Comandante se levanta e pede a alguns passageiros para saírem e empurrarem o avião (tal como se faz aos automóveis quando a bateria falha). Lá fui com mais cinco. Imediatamente depois dos primeiros metros do empurrão, o motor pegou sem outros aparentes problemas.

Voltamos a entrar e já de novo com a porta fechada, a minha Colega vira-se para mim e com assinalável espanto perguntou-me:
– Francisco, tu vais? Viajas para Bissau num avião que pegou de empurrão?
– Eu cá não, respondeu ela com firmeza.

Sem a demover, expliquei que eu iria ver a família, uma vez que estavam à minha espera e que uma semana longe de casa era muito tempo. Disse-lhe, também, que por terra a viagem era muito longa e ainda mais arriscada, mesmo em jeep.

Imediatamente depois das minhas palavras, Clotilde saiu do avião. Quando cheguei a casa, relatei, com emoção, a aventura à família. Nessa mesma noite, durante um convívio de cooperantes Portugueses, voltei à mesma história que provocou rasgados risos. Mas, para meu espanto, ninguém acreditou…

Francisco George
Verão, 2013
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Nota do Editor:

Último poste da série > 19 de agosto de 2018 > Guiné 61/74 - P18937: Blogues da nossa blogosfera (100): Jardim das Delícias, blogue do nosso camarada Adão Cruz, ex-Alf Mil Médico da CCAÇ 1547 (19): Palavras e poesia

sexta-feira, 22 de junho de 2018

Guiné 61/74 - P18767: FAP (109): Testemunho sobre a minha ejecção na Guiné em 04OUT1973 (Alberto Roxo Cruz / Mário Santos)

FIAT G-91 R4 em voo


1. Mensagem do nosso camarada Mário Santos (ex-1.º Cabo Especialista MMA da BA 12, Bissalanca, 1967/69), com data de 6 de Junho de 2018:

Caro camarada Carlos.
Envio-te para publicação no blogue, este artigo descrito na primeira pessoa pelo meu amigo ex-Capitão Pil./Av. Alberto Roxo Cruz, do qual obtive prévia autorização para publicar.

Este é mais um dramático evento ocorrido nos dias da GUINÉ pelo Capitão Pil./Av. Alberto Roxo Cruz no decorrer da sua segunda comissão em Bissalanca em 04 Outubro de 1973.
Meu contemporâneo aquando da primeira estadia na BA12 em 1969 onde as acções se passaram dentro da normalidade de guerra, emparceirou depois entre 1972/74 com o nosso camarada tabanqueiro TGen. António Martins Matos que lhe deu cobertura após a ejecção do Fiat G-91 R4 n.° 5409 ocorrida em Outubro de 73.

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Este foi um acidente vivido já nos dias do Strela pelo Cap.Piloto/Aviador Alberto Roxo Cruz que se ejectou no Fiat G-91 5409 e felizmente sobreviveu para hoje nos poder contar como foi. A descrição contém opiniões e relata factos que não poderão obviamente ser comprovados, pela distancia temporal e também porque muita documentação relativa ao acidente foi destruída. 

Mário Santos

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Testemunho sobre a minha ejecção na Guiné em 04OUT1973

Alberto Cruz

Este acidente ocorreu a cerca de 50km Nordeste de Bissau, na zona do Tancroal.

Eu fazia parte, como asa, de uma formação de dois Fiat G91 R4.

Estávamos a desenvolver uma acção de bombardeamento, seguida de metralhamento, numa área onde tinha sido referenciada, por informações, a existência de um Grupo de atiradores de Míssil Strela. Creio que posteriormente estava prevista uma acção de pára-quedistas ou outras forças terrestres transportadas por helicópteros Alouette III.

Após termos executado dois passes de bombardeamento com bombas de 50 e 200 kg, iniciamos, um de cada vez, um passe de metralhamento de ângulos grandes (MAG).

Quando iniciei o disparo das metralhadoras, senti um grande estrondo no avião e a perda total de controlo do mesmo, assim como uma enorme quantidade de luzes acesas e a piscar.
Não era possível identificar qual a origem da "avaria", pois as vibrações eram tão violentas que me faziam bater com o capacete na "canopy" do avião. Ainda tentei desligar os "Yaw dampers", mas logo vi que não era essa a origem do problema.

Como me encontrava em ângulo de picada de 60º, decidi ejectar-me, pois entretanto as vibrações passaram à sensação de espiral descontrolada e tão violenta que perdi a capacidade de fixar a visão. Só via umas manchas verdes e cinzentas, que deduzo serem o solo e o céu que se apresentava nublado com alto-estratos.

A ejecção deve ter acontecido com cerca de 450 nós, que estava perto do limite do cabo de disparo do pára-quedas de abertura (470 nós).
Ainda arranjei tempo para decidir ejectar-me com a alavanca superior, por permitir melhor posição e menos danos da coluna.

Após esse accionamento, só me recordo de uma explosão muito forte, e perdi os sentidos. No entanto, fiquei num estado de semiconsciência, e que permiti interrogar-me como isto me tinha acontecido; “vi” a minha vida a correr em “flashes” rapidíssimos.

Segundo os dados da cadeira a ejecção, até à abertura do pára-quedas decorre um período de 1 a 2 segundos. Eu tive a sensação de terem passado mais de 5 minutos…

Acordei muito lentamente, e um sentido de cada vez, ainda com o pára-quedas em desaceleração. O primeiro sentido a recuperar foi a visão com a explosão do avião, bastante perto. Nessa altura ainda não ouvia nem sentia.

 BA 12, 1973 - Cap Alberto Cruz

De repente, começo a ouvir um silvo que provinha do pára-quedas. Seguidamente, sinto uma corrente de ar enorme na cabeça e vejo meu corpo pendurado, mas sem me conseguir mexer.

De seguida, reparo que tenho sangue a cair-me nas luvas e nos braços.
Mais tarde é que vi que o sangue provinha de uma perfuração do lábio inferior por embate do meu estimado Breitling, que ainda mantenho.
Aí, apercebi-me que tinha perdido o capacete, que estava com o francalete bem justo, assim como a máscara e a viseira colocadas. Quem quiser, que experimente retirar o capacete da cabeça nestas circunstâncias. Nós tentamos essa experiência e ninguém conseguiu!

A cadeira naquela época ainda era a primeira versão da Martin Baker, que tinha uma aceleração de cerca de 39/45 G's no disparo da cadeira. Logo aí sofri a primeira compressão da coluna. Seguidamente, a velocidade a que o pára-quedas abriu foi tal, que senti um grande esticão.
Após um grande formigueiro em todo o corpo, recuperei os movimentos. O tempo de queda foi de cerca de 15 a 20 segundos, mas naquelas condições é difícil medir o tempo. No entanto, ainda me permitiu desfrutar do maravilhoso silêncio do voo de pára-quedas. A chegada ao solo não foi directa; fiquei pendurado numa árvore a cerca de 5 metros do solo. Fui deixando o pára-quedas deslizar até que a cerca de 2 metros ele se desprendeu e caí desamparado no solo; mais uma compressão na coluna.

As dores lombares e num joelho, bem com a perda de visão de um olho, foram as sequelas de que logo me apercebi. Mais tarde, confirmou-se que tinha ficado mais baixo 2cm e que tinha fractura ligeira da vértebra D5, lesão no joelho com derrame do líquido sinovial e lesão traumática no olho esquerdo durante a ejecção, possivelmente pelo “arrancamento” do capacete.

Ainda me consegui deslocar para uma clareira, com a intenção de me sinalizar. No entanto, dos “very-light” que levava só restaram os que me tinham sido entregues pelo Cap. Pedroso de Almeida, quando fez o “desquite”. Bem-haja!

Quando comecei a pensar, apercebi-me que tinha o fato de voo do meu amigo Cap. Pinto Ferreira, ainda com o nome dele na “etiqueta” de identificação. A primeira coisa que fiz, foi enterra-la e disfarçar esse local com vegetação.
Começo a olhar para o ar, e vejo o meu chefe de parelha, o então Cor. Tir. Lemos Ferreira, Comandante da Zona Aérea Cabo Verde e Guiné a voar em círculos.
Pensei que me tivesse visto a aterrar, mas por eu já estar tão baixo, vim mais tarde a saber que apenas viu a explosão do avião, e por um segundo, o pára-quedas ser “engolido” pelas árvores.

Seguidamente, começo a ouvir vozes e alguns assobios, o que em África, devido ao silêncio que todos conhecem, tanto podiam estar perto como longe.
Imaginei que poderia ser “recolhido” pela população ou pelos guerrilheiros que tínhamos acabado de bombardear. Não iam de certeza levar-me um whisky com Perrier…

Comecei a criar um espaço onde poderia colocar o pára-quedas, para assinalar a minha posição, mas comecei a ter dores violentas nas costas; mesmo rolando no solo, de maneira a deitar o capim que tinha mais de dois metros de altura, não consegui espaço para estender o pára-quedas.
Entretanto, comecei a sair do estado de choque e comecei a “engendrar” a conversa que teria se fosse capturado. Estabeleci um plano, e fiquei a aguardar que me fossem recuperar. Ainda notei que o meu chefe de formação abandonou o local (deve ter aterrado “seco”), e apareceu outro Fiat a sobrevoar a zona, que mais tarde vim a saber ter sido o Ten. A. Matos. Pensei cá para mim: estou safo, estava perto da Base e ainda não eram 15:00 horas.

Passaram cerca de 40 minutos, que a mim me pareceram horas, e começo a ouvir o “santo” ruído de um Heli e em “stereo”; eram dois, mas um, eu nunca o vi.
Levantei-me com muito custo e preparei os “flares” para me sinalizar.
A clareira onde me encontrava estava rodeada de árvores, e apenas num pequeno ângulo, é que tinha visão horizontal.

Como os Helis não tinham informação precisa da minha posição andaram ainda uns tempos à procura, e eu que só tinha dois “flares”, resolvi accionar um, quando ouvi um Heli mais perto.
Passado um tempo, que não consigo calcular, vi pela primeira vez um Heli; quando ele passou pela abertura das árvores, disparei o “flare” que me restava mesmo apontando ao Heli, pois era a maneira mais certa de não o atingir…

Fui visto! O piloto do Heli tenta uma aproximação já na clareira, mas o capim, com 2 metros, teima em não baixar com o vórtice do rotor principal. Nesta altura, em que o piloto tenta baixar o máximo possível, eu noto que o rotor de cauda se aproxima perigosamente de uns troncos secos e grossos que emergiam do capim já “abatido”.

Entretanto, eu que já estava em pé novamente, mas com muita dificuldade, reparo que o Heli é um Heli-canhão. E agora? O Heli-canhão descolou de Bissalanca, voou, no máximo meia hora, deve estar com muito peso e eu embora magro, vou provocar “overload”. Ainda pensei que íamos lá ficar à espera de um Heli sem canhão.
Mais tarde, fiquei a saber que tinham descolado dois heli-canhão para me dar protecção e me localizar. Como a zona era muito problemática, tomaram a decisão de me recuperar mesmo com o canhão.

Como o Heli não conseguia aterrar, aproximou-se de mim e fui içado à mão, ficando com o estribo de entrada entre as pernas e agarrado à estrutura vertical onde fecham as portas.
Descolámos, mas passado pouco tempo, começo a escorregar, prevendo que me ia estatelar no solo. O mecânico, atirador do canhão, ao ver a “cena”, largou tudo e enquanto me agarrava pelo pescoço, ia gritando para o piloto aterrar o mais depressa possível, que eu estava a cair. O piloto quase que fez um “quick stop” e eu aterrei primeiro do que o Heli; saltei para dentro dele, batendo com a cabeça não sei onde, e tombei desmaiado sobre a caixa das munições do canhão.

Chegamos a Bissalanca, e eu, já acordado, noto que alguém estava à minha espera com um copo numa bandeja. Como sabiam que eu gostava, na altura, de me refrescar com água Perrier um dedo de whisky, tentei sair em pé da viatura que me transportou do Heli para o Grupo Operacional, armado em herói; claro está que se não me agarrassem rapidamente, lá ia mais outra queda.
Bebi o copo de um golo.

Já na enfermaria da Base, começo a sentir a cabeça à roda e um enjoo terrível. Pensei que me estava a acontecer alguma coisa pós-choque, mas não era mais do que a “doença” provocada pelo “refresco” que os malandros dos meus amigos adulteraram. O “refresco” da Perrier com um dedo de whisky era afinal whisky com um dedo de Perrier. Ainda hoje não sei quem foi o artista.

Fui para o Hospital Militar, regressei à enfermaria, e fui evacuado para a “Metrópole” no primeiro avião militar.

Regressei à Guiné nos primeiros dias de Fevereiro de 1974, e por coincidência (?), a primeira missão operacional teve lugar no mesmo local onde me tinha ejectado. Ao fazer o passe de metralhadoras, o dedo parecia que não queria accionar o gatilho; respeitei esta hesitação do dedo e não premi o gatilho.
Na missão seguinte, tudo se normalizou, após uma consciente reflexão sobre a lei das probabilidades…
A minha ejecção já foi na segunda comissão.

Eu era um dos dois únicos pilotos que tinham sido nomeados para uma segunda comissão, em Fiat, para a Guiné; o outro foi o então Ten. Cor. Vasquez, como Comandante do Grupo Operacional.
Apenas alguns dias após o 25 de Abril, convivemos com os guerrilheiros que combatíamos em 1969 nas antiaéreas, onde eu fui protagonista e tendo feito parte das missões mais complicadas, que incluíram uma tentativa (gorada) de, com a acção dos pára-quedistas, os “apanharmos à mão”.
O ataque às antiaéreas na zona do Quitafine a Sudoeste de Bissau, perto do rio Cacine e a fronteira com a Guiné-Conakri, eram missões que tínhamos que fazer para que os guerrilheiros não nos conquistassem esse território, pois as forças terrestres já lá não tinham acesso…

Foram conversas interessantíssimas, e pelas quais vim a saber que eles para não serem afastados pelas bombas que rebentavam dentro do "caracol" (local onde eram colocadas as antiaéreas), eram atados às armas. Normalmente usavam as ZPU-4 de 14,5mm ou as duplas de 12,7mm.
Nessa época ainda não tinham chegado à Guiné os Grupos de mísseis.
No entanto, em 1972 (?) já havia conhecimento de que estavam a ser treinadas as equipas dos mísseis na URSS.

Eu vim a saber disso, porque sendo adjunto do Comandante de Grupo, na segunda comissão, ao arrumar uns arquivos, encontrei documentação de 1972 (?) com informação detalhada dos EUA sobre os mísseis Strela, bem como um completo estudo do seu envelope de acção. Também referiam ter informações fidedignas que o aparecimento dos mísseis SAM-7 estaria para breve no Teatro de Operações da Guiné e só mais tarde em Moçambique.
Na Guiné, nessa altura, já ninguém era apanhado de surpresa…
Mas mesmo assim, e como o outro elemento da parelha sobrevoava a zona em altitude, não viu a saída do míssil, eu fiquei convencido que se tinha aberto o painel das metralhadoras do lado esquerdo, pois na inspecção antes do voo notei que já apresentava alguma folga.

Isto deu origem a uma consulta à Força Aérea Alemã, que informou que apenas tinham conhecimento de um caso desses, a baixa velocidade, e que isso foi fatal para o piloto. A grande velocidade, o avião destruía-se em voo, não dando a mínima hipótese ao piloto.
Mesmo assim, devido a essa dúvida, foram inspeccionados todos os Fiat's e descobriu-se que a maior parte apresentavam fadiga de material na fixação das metralhadoras. Isso obrigou à respectiva reparação em todos os aviões. A causa dessa fadiga e de algumas fracturas terá que ficar confidencial… por enquanto!

Mais tarde, e já após o 25 de Abril, chegou uma informação proveniente do PAIGC, de que o meu avião (5409) tinha sido abatido por um grupo residente nessa área, e que até encontraram o meu capacete. As razões porque fui “abatido” dentro do "envelope" do míssil terão também que ficar pela confidencialidade…
No entanto, continuo convencido que não fui abatido pelo Strela, mas que tive uma violenta falha estrutural. Mas como me pareceu que era mais conveniente, para os então “poderes constituídos”, tratar o acidente como “abate”, em vez de falha estrutural, eu fui-me calando…

Alberto Cruz
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Nota do editor

Último poste da série de 14 de junho de 2018 > Guiné 61/74 - P18742: FAP (108): Memórias sobre "Alguns dos Falcões que passaram por Monte Real em 1964/65" (Mário Santos, ex-1.º Cabo Especialista MMA da BA 12)

quinta-feira, 14 de junho de 2018

Guiné 61/74 - P18742: FAP (108): Memórias sobre "Alguns dos Falcões que passaram por Monte Real em 1964/65" (Mário Santos, ex-1.º Cabo Especialista MMA da BA 12)



1. Mensagem do nosso camarada Mário Santos (ex-1.º Cabo Especialista MMA da BA 12, Bissalanca, 1967/69), com data de 6 de Junho de 2018:

Caro Carlos.
Daqui te envio mais uma relíquia para publicação.

Grande abraço,
Mário Santos

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Memórias sobre "Alguns dos Falcões que passaram por Monte Real em 1964/65" e muitos deles mais tarde também pela Guiné

Esta foto foi retirada de um blogue de um destes Aviadores, infelizmente já desaparecido.
Como Especialista em F-86 e Fiat G-91, na BA12 em Bissalanca e mais tarde na BA5, em Monte Real, cruzei-me pessoalmente com muitos deles. No resto fui ajudado na identificação pelo Major PilAv Alberto Roxo Cruz e pelo Coronel PilAv Vítor Silva.
Como é obvio nesta foto não cabem todos os "Falcões" até porque como todos nós, eles são de idades, incorporações e cursos diferenciados.
A intenção quando publicamos a foto no nosso Blogue foi apenas de uma singela homenagem a estes homens com quem tive a honra de servir a nossa Pátria.
Para mim, independentemente da habilidade de cada um deles a voar, conta mais o humanismo, o espírito de justiça e o avaliar sensato das situações a resolver e que tornaram alguns, verdadeiros exemplos a seguir.

De acordo com o Coronel Vítor Silva, 6 morreram a voar, e muitos outros também já não se encontram entre nós devido à lei da vida.
Que descansem em Paz!

Em pé, da esquerda para a direita:
1º Vitor Silva, 2º F. Fernandes, 3º Rui Balacó, 4º L. Quintanilha, 5º Moura Pinto, 6º Soares Moura 7º C. Araújo, 8º Firmino Neves, 9 º Menezes, 10º E. Guerra, 11º António Abrantes.

Em baixo, da esquerda para a direita:
1º Luís António, 2º Bispo, 3º Amílcar Barbosa, 4º Luís Tuna, 5º M. André, 6º Calhau, 7º Mónica, 8º José Nico, 9º Costa Joaquim.

 Vista aérea da BA 12 - Bissalanca - 1970

 BA 12 - Bissalanca - Guiné

Equipa de Fiat's G91, Guiné, 1968
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Nota do editor

Último poste da série de 5 de junho de 2018 > Guiné 61/74 - P18711: FAP (107): O dia em que a Guerra na Guiné quase terminou… (Mário Santos, ex-1.º Cabo Especialista MMA da BA 12)

domingo, 3 de setembro de 2017

Guiné 61/74 - P17727: In Memoriam (304): Faleceu o Comandante Pombo, José Luís Pombo Rodrigues, uma figura lendária dos céus da Guiné. As cerimónias fúnebres terão lugar segunda e terça-feira, no Carregado e Póvoa de Santa Iria (Manuel Resende / Maria João Alves Pombo Rodrigues)


Comandante José Luís Pombo Rodrigues
Foto: Manuel Resende

IN MEMORIAM

O nosso camarada Manuel Resende, através de contacto telefónico, deu conhecimento ao Blogue do falecimento do Comandante José Luís Pombo Rodrigues.

Contactada a sua filha Maria João, pela Magnífica Tabanca da Linha, foi-lhe remetida a seguinte mensagem:

Estimados amigos, 

Cumpre informar das cerimónias fúnebres do Capitão José Luís Pombo Rodrigues:

Segunda-feira - Velório a partir das 12 horas nas capelas mortuárias do Centro Paroquial do Carregado, Rua Vaz Monteiro, 55 - Carregado. 

Terça-feira - Missa das 10h30 às 11h na Igreja Paroquial do Carregado e posterior cremação às 12 horas no crematório da Póvoa de Santa Iria - a cerca de 20 minutos de carro - Rua Quinta da Piedade, 13, - 2625-099 Póvoa de Santa Iria. 

Maria João Alves Pombo Rodrigues


Guiné > Arquipélago dos Bijagós > Ilha de Bubaque > A esposa do Coronel Henrique Gonçalves Vaz, os três filhos mais novos e o Capitão Pombo, na pista de Bubaque na Páscoa de 1974...  O da ponta esquerda é o nosso amigo e grã-tabanqueiro Luís Gonçalves Vaz.

Foto: © Henrique Gonçalves Vaz.


O Comandante Pombo Rodrigues com a sua filha Maria João.


Dois Gloriosos Malucos da Máquinas Voadoras, TGen António Martins de Matos e Comandante Pombo Rodrigues.

Fotos: © Manuel Resende

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Comentário do editor CV:

À amiga Maria João Pombo Rodrigues, filha do Comandante Pombo Rodrigues, assim como à restante família, a tertúlia e os editores deste Blogue deixam o seu abraço solidário e apresentam os mais sentidos pêsames.

O comandante Pombo tem já cerca de 2 dezenas de referências no nosso blogue. Por proposta do fundador, administrador e editor do blogue, Luís Graça, ele passa doravante a integrar,  a título póstumo, a nossa Tabanca Grandem  sob o nº 752.  Enfim, é uma figura lendária dos céus da Guiné e muitos de nós guardam dele uma grata recordação. Falta-nos saber o ano em que nasceu, para completar o processo da sua inscrição na Tabanca Grande
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Nota do editor

Último poste da série de 25 de agosto de 2017 > Guiné 61/74 - P17700: In Memoriam (303): Faleceu António Pedro Carneiro de Miranda da CART 1689/BART 1913. O seu funeral realiza-se amanhã, dia 26 de Agosto, pelas 18h45, na Igreja de S. Pedro, em Amarante (José Ferreira da Silva / Alberto Branquinho)

quarta-feira, 4 de fevereiro de 2015

Guiné 63/74 - P14218: Gloriosos Malucos das Máquinas Voadoras (32): Falei ao telefone com o comandante Pombo, amigo de Luís Cabral e de 'Nino' Vieira... e sobretudo um orgulhoso sobrevivente dos Strela (em 1973/74) e da "Operação Atlas", em agosto de 1961 (travessia, com uma esquadra de F-86F “Sabre”, Monte Real-Bissalanca, num total de 3888 km e o tempo de 7h50 sobre o Atlântico) (Luís Graça, com José Cabeleira, cap TMMA ref, Leiria)

1º Srgt Pombo, piloto de F-86-F Sabre,
BA 5, Monte Real, 1961.
Cortesia de José Cabeleira (2011)
1. Tive anteontem o privilégio de falar com o comandante Pombo. A filha, Maria João, ligou-me e passou-me o telemóvel. Ela tinha ido com o pai a uma consulta médica.

O nosso camarada, José Luis Pombo Rodrigues, popular e carinhosamente conhecido como o comandante Pombo, começou por falar-me dos problemas de saúde que o preocupam de momento, mas que vai superar, seguramente. Foi a convicção que lhe transmiti, em meu nome e em nome dos amigos e camaradas da Guiné. Depois disso, recuperada a saúde, ele arranjará, por certo, disposição para passar à escrita muitas das suas histórias e memórias e partilhá-las connosco.

Nunca nos encontrámos pessoalmente na Guiné, embora no tempo em que eu lá estive (CCAÇ 12, Contuboel e Bambadinca, maio de 1969/março de 1971), o comandante Pombo já fosse uma figura conhecida e respeitada. Aliás, eu transmiti-lhe (e reforcei) essa ideia, que pode ser colhida pela leitura do nosso blogue. A filha tem-lhe falado do blogue.

O Pombo é hoje capitão pil, reformado Fez, segundo bem percebi, 4 comissões na Guiné. Voltou há pouco para Portugal, vive hoje em Bucelas, e é amigo pessoal do major gen paraquedista Avelar de Sousa, que passou pelo TO da Guiné, integrando o BCP 12, como comandante da CCP 123 (1970/71), e foi ajudante de campo, entre 1976 e 1981, do gen Ramalho Eanes, 1º presidente da república eleito democraticamente no pós 25 de abril. E esse fato é relevante para se perceber a influência, discretíssima, que o comandante Pombo terá tido na libertação do ex-1º primeiro ministro da Guiné-Bissau, Luís Cabral, depois do golpe do ‘Nino’ Vieira em 1980.

O comandante Pombo privou com os dois, e dos dois era amigo. Ao ‘Nino’ Vieira tratava-o inclusive por tu. E o Pombo continuou a ser o comandante Pombo, depois da independência da Guiné-Bissau. Terá havido um acordo entre as novas autoridades de Bissau e o governo português para que ele ficasse na Guiné... O PAIGC não tinha pilotos. O comandante Pombo pilotava o pequeno Falcon que fora oferecido ao Luís Cabral. Este gostava muito dele, e sempre que viajava com ele trazia-lhe uma garrafa de.. champagne.

Depois veio o golpe do ‘Nino’ e o Luis Cabral ficou preso na Amura… Sem cinto!... O comandante Pombo foi visitá-lo e encontrou-o sem cinto, com as calças na mão… Diziam-lhe, os seus carcereiros,  que era para ele não poder fugir. Achando essa uma situação indigna, o Pombo foi falar ao seu amigo ‘Nino’, que lhe deu razão…

Mais tarde o Pombo moveu as suas influências, junto do Avelar de Sousa… O presidente Ramalho Eanes, como é sabido publicamente, exerceu forte influência junto de ‘Nino’,  no sentido de obter a libertação de Luís Cabral que, primeiro, foi para Cuba e mais tarde para Portugal, onde veio a morrer. Ramalho Eanes e Luís Cabral tinham muita estima mútua.

Mas, e contrariamente ao boato que corria na Guiné, no tempo da guerra colonial, o comandante Pombo não estava feito com os “turras”… E a prova disso é que umas das aeronaves (não era um Cessna, era uma outra avioneta tipo DO 27…) foi perseguida por dois mísseis Strela, já depois do último avião da FAP ter sido abatido…

Ele contou-me os pormenores ao telemóvel: deve ter sido, deduzo eu, por volta de março ou mesmo abril de 1974, um ano depois do aparecimento dos Strela. O comandante Pombo vinha de Bissau para Farim, na “carreira normal” dos TAGP… O PAIGC conhecia o horário e os apontadores do Strela estavam à espera dela nas imediações de Farim… Havia a indicação de que a guerrilha queira mesmo cortar todas as ligaçãoes aéreas com nordeste da Guiné. Deve ter havido falhas na segurança militar, nas imediações da pista de aviação… Para iludir os guerrilheiros, o comandante Pombo vinha coma sua avioneta a baixa altitude e a baixa velocidade. Mas antes de chegar ao destino ele fez uma mistura de combustível que não deixava rasto, isto é,  fumaça…  E, antes de aterrar, terá feito uma manobra de subida, na vertical,  seguida de um voo a pique… Foi o que eu percebi, desculpem-me se o relato é tecnicamente grosseiro… Mesmo assim não se livrou de ver passar-lhe, por perto,  dois Strelas que lhe vinham dirigidos…

Mas, finalmente, conseguiu aterrar em segurança… "Não ganhei para o susto: os auscultadores saltaram-me da cabeça!" ...

Enfim, é uma história incrível que merece ser, deste já, registada e partilhada aqui, com os nossos leitores.

Espero que o comandante recupere rapidamente a saúde e aceite o meu convite para se sentar à sombra do poilão da nossa Tabanca Grande e nos poder contar, na primeira pessoa,  estas e outras histórias da sua longa vida na Guiné…


2. O que muita gente não sabia (e eu também não …) é que o comandante Pombo é um orgulhoso sobrevivente da “Operação Atlas”, a primeira (e única) travessia Monte Real – Bissalanca, feita pela Esquadra 51/201 (BA 5), constituída por aviões F-86F “Sabre”, realizada em agosto de 1961… Era então um jovem 1º sargento piloto...

Fiquei com o bichinho da curiosidade e fui tentar saber mais, depois da nossa conversa ao telefone, que demorou ainda uns bons 20 minutos.

José Cabeleira, cap TMMA ref, Leiria
E a propósito encontrei um referência a este marco da história da FAP num blogue do cap TMMA ref José Cabeleira (que vive em Leiria, terra onde tenho bons amigos). O blogue chama-se Trajecto de uma vida entre o mar e o ar – Memórias. E tem apenas um poste com data de 17 de novembro de 2011 > Operação “Atlas” fez 50 anos (1961-2011).

José Cabeleira, que veio da aviação naval, é um histórico da Esquadra 51 da BA5 (Monte Real). É  autor do livro “Trajecto de uma vida entre o mar e o ar – Memórias 1948-83” (edição de autor, J. Cabeleira, Leiria, J. Cabeleira, 2005).

O poste acima referido é uma transcrição do seu livro (que não consta da PorBase - Biblioteca Nacional)… Nele descreve os preparativos desta arrojada missão e as etapas emocionantes vividas pelos seus protagonistas (pilotos e mecânicos) desde o dia da partida (8 de agosto de 1961) ao dia de chegada a Bissalanca (15 de agosto de 1961), com várias escalas técnicas (Base do Montijo, aeroporto de Gando, nas Canárias, aeroporto do Sal, em Cabo Verde).

À guisa de conclusão escreve o José Cabeleira:

“Quero ainda sublinhar que foi a primeira e única “travessia” em aviões de “reacção” (F-86F “Sabre”) de Monte Real para a Guiné-Bissau (no total de 3.888 km e o tempo de 07H50 sobre o Atlântico) e pelo menos não é do meu conhecimento que estas aeronaves estando ao serviço de Forças Aéreas de outros países, nomeadamente os da NATO, tivessem percorrido distância semelhante sobre os Oceanos.”

Participaram na “travessia” Monte Real – Guiné-Bissau os seguintes pilotos:

 (i) cap pilav Ramiro de Almeida Santos, chefe de missão;

(ii) cap pilav José Fernando de Almeida Brito;

(iii) ten pilav Aníbal José Coentro Pinho Freire;

(iv) ten pilav Alcides Telmo Teixeira Lopo;

(v) 1sgrt pil António Rodrigues Pereira;

(vi) 1Srgt pil José Luís Pombo Rodrigues

(vii) 1sgrt pil Humberto João Cartaxo da Silva; e

(viii) 2sgrt pil Rui Salvado da Cunha.



Oito gloriosos "malucos" das máquinas voadoras, alguns infelizmente já desaparecidos (como o Almeida Brito, abatiodo por um Strela em 1973)... 


Para além da perícia e coragem dos seus pilotos,  esta façanha da FAP foi possível graças a uma vasta equipa que o José Cabeleira evoca e enumera individualmente, e com toda a justiça: (i) equipa técnica de apoio durante o movimento (escalão prrecursor); (ii) equipa técnica do escalão de apoio no destino; e (iii) equipa técnica de apoio às aeronaves do “ferry” na BA6 – Montijo.

Estes homens, nossos camaradas da FAP, reunem-se anualmente em Monte Real para relembrar e celebrar este feito. Imaginei um brilhozinho nos olhos do comandante Pombo quando ele me falou deste feito e do encontro anual dos que ainda estão vivos.

E conclui o nosso camarada José Cabeleira (que deve ser um "jovem" camarada com 80 e picos anos e para quem envio um abraço com votos de grande apreço, homenagem e muita saúde):

“Finalmente, alguns militares que tiveram a alegria de participar neste evento, que na época foi um risco, mas como ficou provado muito bem calculado e superiormente executado (com o factor sorte do nosso lado), já não estão connosco em corpo, aqui lhes presto a minha singela e comovida homenagem e quem sabe, talvez ainda haja tempo de lhes prestar uma justa e merecida homenagem a título póstumo.”

Paraq quem quiser saber mais, a pormenorizada descrição da Operação Atlas está disponivel aqui. [E, a propósito, é triste que não haja um único comentário, de aplauso e de apreço pela partilha destas memórias, no blogue do José Cabeleira].




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terça-feira, 3 de fevereiro de 2015

Guiné 63/74 - P14216: Gloriosos Malucos das Máquinas Voadoras (31): Os CESSNA dos TAGP e os seus pilotos - Um aparelho com piloto automático? (Luís Paulino, ex-Fur Mil da CCAÇ 2726, Cacine e Cameconde, 1970/72)

1. Mensagem do nosso camarada Luís Paulino, (ex-Fur Mil da CCAÇ 2726, Cacine e Cameconde, 1970/72), com data de 28 de Janeiro de 2015:

Olá Companheiro e Amigo Vinhal,

Sequenciando o tema do companheiro Jorge Araújo, sobre a Aeronáutica na Guiné, veio-me à lembrança um voo que efectuei em Dezembro de 1970, de regresso a Cacine, após gozo de férias na Metrópole.

Parti do aeroporto de Bissalanca numa dessas Cessnas civis de apenas 2 lugares, em que o passageiro viajava ao lado do piloto.

Recordo-me que, após termos levantado voo conversámos algum tempo, mas fui-me apercebendo que lentamente, se ia perdendo a fluidez do diálogo.

Estranhando o sucedido, olhei para a minha esquerda, e para meu espanto, verifico que o piloto pendia a cabeça para a frente, com alguma frequência, dando a entender que estaria a dormitar.
Fiquei assustado e alertei-o de imediato com um valente berro.

Não sei se o aparelho tinha piloto automático, mas sei que a Cessna, durante esse espaço de tempo não alterou a rota, pois passados alguns minutos aterrámos em Cacine, tendo tudo acabado em bem.


Já em terra cumprimentámo-nos, tendo ele pedido desculpa pelo sucedido, tendo-se justificado com o cansaço provocado pelo excesso de horas de voo que estava a efectuar diariamente.

Saudações Fraternas,
Luís Paulino
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Nota do editor

Último poste da série de 3 de fevereiro de 2015 > Guiné 63/74 - P14215: Gloriosos Malucos das Máquinas Voadoras (30): "Blue on Blue" - Querem ver que acertei nos nossos? (António Marins de Matos, TGen Pilav Ref)

Guiné 63/74 - P14215: Gloriosos Malucos das Máquinas Voadoras (30): "Blue on Blue" - Querem ver que acertei nos nossos? (António Marins de Matos, TGen Pilav Ref)

1. Mensagem do nosso camarada António Martins de Matos, TGen Pilav Ref (ex-Tenente Pilav, BA 12, Bissalanca, 1972/74), com data de hoje, 3 de Janeiro de 2015:

Caros amigos
Cá vai mais uma estória passada na Guiné

Abraços
Antonio Martins Matos


Blue on Blue

Quando se faz um planeamento de exercícios militares, é procedimento habitual identificar as forças intervenientes por duas cores, os “nossos” são sempre marcados como sendo os Azuis (BLUE), até há pouco tempo os opositores (quaisquer que fossem) eram sempre denominados como sendo os Vermelhos (RED).

Depois da queda do Muro de Berlim e do desmoronamento do Pacto de Varsóvia, tendo em conta uma aproximação mais “politizada”, os opositores deixaram de ser Red e passaram a ser Laranja (ORANGE). Enfim, modas, quando eram RED sabíamos para onde nos voltar, agora com o ORANGE, temos de olhar para tudo à volta, só espero que qualquer dia não mudem para BLACK ou YELLOW.

“BLUE ON BLUE” é o termo utilizado quando forças “amigas”, por razões estranhas e indeterminadas, disparam contra outras forças, posições ou entidades igualmente “amigas”.
Por vezes também aparece a designação de FRIENDLY FIRE (fogo amigo) ou COLLATERAL DAMAGE (danos colaterais).

Sendo algo triste, preocupante e de lamentar não é um acontecimento tão raro como se possa supor, sempre aconteceu e acontecerá em todos os conflitos, sejam eles pequenos, médios ou grandes.
E não se julgue que os estragos possam ser sempre pequenos, apenas dois exemplos:

- Na Batalha Naval de Algeciras (1801) dois navios espanhóis (Real Carlos e San Hermenegildo), por engano lutaram furiosamente um contra o outro, no final ambos foram ao fundo, cerca de 1700 mortos.

- No final da Segunda Guerra (1945) 3 navios mercantes foram afundados pela RAF à saída do porto de Lubeck, transportavam sobreviventes judeus de campos de concentração e prisioneiros de guerra Aliados, mais de 5000 mortos.

Parece que os campeões destas modalidades de tiro ao alvo são os americanos, sempre foram rápidos no gatilho, só no Vietnam houve mais de 7000 incidentes deste tipo.

Em sua defesa o que posso dizer é que os americanos tem a mania de reportar tudo o que se lhes ocorre, enquanto muitos outros tem a mania oposta, a de varrer para debaixo do tapete, só quando já cheira mal é que os acontecimentos aparecem, estou-me a lembrar do Airbus da Malaysian Airlines abatido na Ukrania, agora e segundo as últimas notícias publicadas na imprensa, parece que não foi ninguém…

Nos dias de hoje não há que fugir, as aviações (e agora os drones) estão quase sempre envolvidos nestas tramas, seja por terem bombardeado a “nossa tropa”, por engano do piloto ou do drone-driver, seja por terem sido abatidos pela “nossa tropa”, por engano de alguns artilheiros mais escrupulosos ou descuidados.

Não sei se na nossa Guerra do Ultramar aconteceram alguns destes casos, não devemos ser excepção à regra, não tenho conhecimento de nenhum mas … tampouco ponho as mãos no fogo.

Nesta coisa de tentar apoiar as forças terrestres uma coisa era certa, quartéis em que o pessoal quase nunca saia para o mato tornavam-se mais simples, podíamos bombardear “tudo à volta”, sem medo de acertar em alguém amigo.

Para os outros era mais complicado, até porque a tropa não estava habituada a falar ao rádio, perdiam-se em MIKE, OSCAR, ROMEU, TANGO, ECHO, INDIA, ROMEU, OSCAR, só para dizer uma palavra tão simples como “morteiro” e, vá-se lá saber o porquê, nunca tinham potes de fumo à mão (as duas únicas maneiras de sabermos onde andava a tropa, uma tela laranja ou um pote de fumo).

A partir de 1973 e como os apoios de fogo se tornassem cada vez mais frequentes, violentos e confusos, passámos a gravar as comunicações entre o chão e o avião, o Fiat G-91 permitia isso já que dispunha de um gravador interno.

A fita gravada era guardada um certo período de tempo, se nada de relevante tivesse entretanto acontecido, era reutilizada.

Mas nem tudo era mau, com os pára-quedistas não eram precisas grandes conversas, pote de fumo, a partir do pote o inimigo está na direcção x, distancia y, tudo dito.

Quanto aos fuzileiros, tropa difícil de entender…




A estória que hoje conto, não sendo um “blue on blue”… podia ter sido.

Ainda não eram 6 da manhã e já o “Alerta aos Fiat” soava no altifalante.

Devido à falta de pilotos que se fazia sentir, até às 8 horas apenas havia um piloto a pé, o outro descansava num quarto perto das Operações da Base, quando o alerta soava iam-no chamar, o piloto mais acordado ia avançando para o objectivo, de lá acabava por dizer ao “dorminhoco”, entretanto arrancado da cama, se a sua presença ainda era necessária.

Lá fui eu, sozinho, rumo sul na direcção do Cantanhez.

No caminho e pelo rádio lá me foram dando mais alguma informação, era um grupo de fuzileiros que, ao atravessar uma bolanha, tinha tido um encontro com o PAIGC.

Fuzileiros, tropa difícil de entender…

Não foi preciso contactá-los, ao ouvirem o avião logo se chegaram ao rádio e contaram o que se estava a passar, tinham sido surpreendidos por fogo IN, precisavam de atravessar uma bolanha mas tinham medo de, a meio da travessia, serem emboscados.

Aquela bolanha… Para eles só havia aquela bolanha, visto cá de cima bolanhas era mato!

- “Qual bolanha?”

- “Um momento….. BRAVO OSCAR LIMA ……” o fuzileiro esmerava-se em me dar as coordenadas do local, devia pensar que eu podia esticar um mapa em cima de uma mesa e ir à procura do que me dizia…

- “Ó homem, deixe-se de conversa e abra um pote de fumo !”

Quando o fumo branco apareceu junto da copa das árvores logo fiquei a saber três coisas, onde estavam, qual a bolanha da discórdia e o sentido que a tropa queria seguir.

O passo seguinte foi fazer uma picada em direcção à mata que tinham pela frente e disparar os 8 foguetes que trazia, tentando neutralizar alguma possível emboscada,.

O pessoal agradeceu, fiquei a sobrevoar o local enquanto eles se meteram a caminho, a travessia fez-se sem qualquer incidente, só que….

Pelo tempo entretanto decorrido calculava que já deviam ter completado o percurso e avançado mata adentro, mas sem uma ideia precisa onde,... quando o fuzileiro do rádio me chamou:

- “Estão a disparar contra si!”.

Num momento tudo se modificou, ao olhar para a zona já não havia qualquer fumo branco, no meio do verde iam aparecendo aqui e ali uns pequenos cogumelos de fumo ou pó, sinal que alguma coisa ia rebentando, e riscos vermelhos que vinham lá da orla da mata e passavam perto de mim.

A minha reacção foi rápida e um pouco instintiva, voltei o avião para o onde vinham as balas tracejantes, iniciei uma picada apontado ao local, encolhi-me dentro do cockpit e … gastei as munições das minhas 4 metralhadoras.

Ainda estava a recuperar da picada e já o fuzileiro no rádio gritava a plenos pulmões que tinham 4 ou 5 feridos…

A dúvida instalou-se-me… “Querem ver que acertei nos nossos?”

Não podia ser, só tinha disparado para o local de onde saiam as malditas tracejantes a mim apontadas mas, por outro lado, uma coisa também era certa, já não fazia a mínima ideia por onde andariam aqueles fuzos tresmalhados.

Quando a situação serenou regressei a Bissau com as dúvidas a avolumarem-se, o ter ido à missão sozinho tornava-me mais vulnerável, não ter com quem desabafar ou partilhar ideias.

Uma vez aterrado resolvi ir falar com o Cmdt Grupo, lá lhe expliquei o que se tinha passado e os meus temores.

Ouviu-me atentamente, fez um comentário sobre os fuzileiros (censurado), no final deu-me folga para o resto do dia e um conselho, ir averiguar.

Assim fiz, soube que tinha saído o Dakota para Cufar para recolher os feridos, ao fim da tarde estava à espera da chegada do avião, lá vinham eles, 4 feridos, em macas, todos ligados e a soro, não podiam responder às minhas dúvidas.

Estava neste impasse quando, saídos do meio dos feridos, apareceram umas calças de camuflado e uma tshirt branca, a enfermeira pára-quedista que tinha feito o acompanhamento e agora ajudava a transportar os feridos do avião para a ambulância, ninguém melhor que ela para me poder dar a informação pretendida.

Muito de mansinho lá me fui abeirando e, num tom de voz aparentando alguma indiferença (o meu coração a bater), cumprimentei-a, que tal o tempo em Cufar, se a missão tinha corrido bem, … já agora… se os ferimentos eram graves e de que tipo.

Olhou-me espantada com aquele meu súbito interesse, algo não encaixava na sua cabeça, um piloto dos Fiats a tentar “meter conversa” nas horas de serviço?????

Depois abriu um sorriso, deve ter percebido os meus problemas.

- “Náa, têm uma série de buracos mas não correm perigo, levaram com estilhaços de um RPG”

A VIDA É BELA!!!

António Martins Matos
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Nota do editor

Último poste da série de 28 de janeiro de 2015 > Guiné 63/74 - P14197: Gloriosos Malucos das Máquinas Voadoras (29): Aeronáutica na Guiné - Os CESSNA dos TAGP e os seus pilotos (Jorge Araújo)