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sexta-feira, 20 de agosto de 2021

Guiné 61/74 - P22470: Meu pai, meu velho, meu camarada (66): Lembrando, no centenário do seu nascimento, a popular figura do lourinhanense Luís Henriques, o “Ti Luís Sapateiro” (1920-2012) - Parte IV


Cabo Verde > Ilha de São Vicente > Lazareto [?] > Novembro de 1941 > "Em diligência no paiol [?], eu e 30 colegas. Eu, ao centro”… Pormenor do grupo: ao centro. Luís Henriques está assinalado com um retângulo a amarelo. Foto: arquivo da família.



Cabo Verde > Ilha de São Vicente > Mindelo > RI 23 > "Num dos funerais que cá se realizou , ao passar nas salinas (?) em São Vicente. 1942. Luis Henriques" Foto: arquivo da família.



Cabo Verde > Ilha de São Vicente > Mindelo > RI 23 > No dia 15 de Fevereiro de 1942, os três amigos íntimos [, da direita para a esquerda,] Luís Henriques, António F. Delgado e José Leonardo... os três bigodinhos, à revelia do RDM,  querem é dizer que têm bigode... discreto, à Clark Gable (1901-1960)... [Eram três 1ºs cabos inseparáveis, todos da mesma companhia, sendo o José Leonardo, da Serra do Calvo, Lourinhã: emigrará depois para a América onde irá faleceu]. Foto: arquivo da família.



Cabo Verde > Ilha de São Vicente > Mindelo > RI 23 > "Duas secções [. Menos de um pelotão,] em diligência. No paiol, São Vicente, novembro de 1941. Luis Henriques". Foto: arquivo da família



Cabo Verde > Ilha de São Vicente > Mindelo > RI 23 > "Duas secções [. Menos de um pelotão,] em diligência. No paiol, São Vicente, novembro de 1941. Luis Henriques". Pormenor da foto anterior: o 1º cabo inf Luís Henriques é o segundo a contar da direita para a esquerda. Foto: arquivo da família


Cabo Verde > Ilha de São Vicente > Mindelo > Novembro de 1941. "(Ao fundo, navio italiano) Para as refeições [ilegível] nos juntávamos todos os 30 [do pelotão]". [Ao lado esquerdo, um grupo de miúdos, à espera dos restos...]. Foto: arquivo de família.



Cabo Verde > Ilha de São Vicente > Mindelo > RI 23 > 1941 > O primeiro Natal passado na ilha. Foto: arquivo de família.


Fotos (e legendas): © Luís Graça (2020). Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné.


Lembrando, no centenário do seu nascimento,
 a popular figura do lourinhanense Luís Henriques, 
o “Ti Luís Sapateiro” (1920-2012) - Parte IV




Cabo Verde > São Vicente > Mindelo > 1941 > Luís Henriques.
1º Cabo Inf da 3ª Companhia do 1º Batalhão do RI5. unidade mais tarde
integrada no RI 2.  Esteve no Mindelo entre julho de 1941 e setembro de 1943.  
Foto: arquivo de família.



4.  Figura muita popular e querida da sua terra natal, Lourinhã, e ainda ali  lembrado com saudade, nasceu há 101 anos,  em 19 de agosto de 1920 e morreu com 91 anos, os últimos cinco dos quais passados no Lar e Centro de Dia de N. Sra da Guia, na Atalaia. Foi um pequeno empresário (sapateiro), seccionista e treinador de futebol de camadas jovens do SC Lourinhanse (, de que era,antes de morrer, o sócio nº 1). 

Devido à pandemia de Covid-19, a família e os amigos  tiveram  que adiar a singela homenagem que tencionavam fazer-lhe, no dia 22 agosto de 2020, no centenário do seu nascimento. Também não será ainda neste ano da (des)graça de 2021, que essa homenagem se fará. Mas a família, no próximo domingo, irá recordar, em cerimónia privada, a sua figura: faria ontem 101 anos, se fosse vivo. Vamos continuar a publicar uma série de postes que já preparados, há um ano,  sobre a sua história de vida,  para publicação no nosso blogue  (*)


 
O RI 23 foi constituído em Cabo Verde, na Ilha de S. Vicente, sob o comando do Brigadeiro Augusto Martins Nogueira Soares (Agosto de 1941 a Dezembro de 1944). Faziam parte deste regimento as seguintes unidades (**):

  • 1 Batalhão do RI 5 (Caldas Rainha) ( a que pertencia o Luís Henriques e outros camaradas, naturais do concelho da Lourinhã)
  • 1 Batalhão do RI 7 (Leiria)
  • 1 Batalhão do RI 15 (Tomar)
  • Bateria de Artilharia Costa 1
  • Bateria de Artilharia Costa 2
  • Bateria Artilharia Contra Aeronaves 9,4 cm
  • Bateria Artilharia Contra Aeronaves 4 cm
  • Bateria de Referenciação, a 2 Divisões
  • 2ª Companhia de Sapadores Mineiros do Regimento de Engenharia 2

Ao RI 23 pertenciam ainda os seguintes serviços de apoio:

  • Parque de Engenharia
  • Secção de Padaria
  • Depósito de Subsistências e Material
  • Laboratório de Análise de Águas
  • Hospital Militar Principal de Cabo Verde
  • Depósito Sanitário
  • Tribunal Militar

À semelhança dos Açores (cuja guarnição militar foi reforçada com 30 mil homens, bem como da Madeira, com mil homens), para a defesa de Cabo Verde, e sobretudo das duas ilhas com maior importância geoestratégica, a ilha de São Vicente e a ilha do Sal, foram mobilizados 6358 militares, entre 1941 e 1944, assim distribuídos por 3 ilhas (i) 3361 (São Vicente): (ii) 753 (Santo Antão); e (iii) 2244 (Sal).

Mais de 2/3 dos efetivos estavam afetos à defesa do Mindelo (, ou seja, do porto atlântico, Porto Grande, ligando a Europa com a América Latina, a par dos cabos submarinos).

Os portugueses, hoje, desconhecem ou conhecem mal o enorme esforço militar que o país fez, na época da II Guerra Mundial, para garantir a soberania portuguesa nos territórios ultramarinos. Cerca de 180 mil homens foram mobilizados nessa época.

Em Cabo Verde chegou a temer-se a invasão dos alemães, dado o valor estratégico do arquipélago, à semelhança do arquipélago dos Açores, cobiçado pelos aliados. Quantas vezes me falava disso, o “meu pai, meu velho, meu camarada”... Ele, que simpatizava com os Aliados, falava-me da presença discreta dos alemães na ilha: chegaram a fazer um desafio de futebol com a tripulação de um navio alemão (, não posso afirmar se civil ou militar). E antes do reforço do nosso dispositivo de defesa da ilha de São Vicente e Santo Antão, o que só começa a ocorrer em meados de 1941, os submarinos alemãs eram com relativa frequência avistados ao la largo da ilha de São Vicente,e  das que estão mais próximas (Santo Antão, São Nicolau mas também Santiago) (Vd. Adriono Miranda Lima - Forças Expedicionárias  a Cbo Verde na II Guerra Mundial, edião de autor, Tipografia S. Vicente, Mindelo, 2020,  pp. 105 e ss.)

No Mindelo, tal como em Lisboa, havia espiões de um lado e do outro, alemães, italianos, ingleses, portugueses... E terá sido nesta época de fome, de guerra e de desgraça que se começou a desenvolver o nacionalismo cabo-verdiano que estará na origem do futuro PAIGC, fundado e liderado por Amílcar Cabral (a partir de 1956).

Só havia “vapor” (barco), com mantimentos e correio, de dois em dois meses… A saudade da terra era mitigada pela presença de diversos lourinhanenses, o furriel miliciano Caxaria, o Jaime Filipe, ambos da Atalaia, o Boaventura Horta, da Lourinhã, o Leonardo, da Serra do Calvo, e outros, que pertenciam à mesma unidade (RI 23, constituído na Ilha de São Vicente, 1941/44). 

Todos, infelizmente, já falecidos, o último, o António Caxaria, com 102 anos (**)... Já há não sobreviventes dessa geração... Para mais, foi uma geração sem cronistas. É uma pena que as suas memórias desapareçam com a sua morte física, a  morte física nossos pais, últimos soldados do império tal como nós... Mas todos eles trouxeram consigo algumas lembranças da ilha, e nomeadamente fotografias do célebre estúdio Foto Melo... 

Enfim, estas pequenas histórias que aqui se deixam, do Luís Henriques e outros "expedicionários",  fazem parte da história comum de Portugal e Cabo Verde (**)...

Numa época de elevado analfabetismo (, mais de 40% dos homens no grupo etário dos 20-24 anos, em 1940, eram analfabetos!), o Luís Henriques sacrificava, com gosto, os seus tempos livres, escrevendo dezenas de cartas por semana em nome de muitos dos seus camaradas. Aos 91 anos ainda se lembrava dos números de tropa (!) de alguns dos seus camaradas, dos seus nomes completos e até das moradas (!) para onde enviava as cartas.

Em nome do Fortunato Borda d'Água, do Cercal, Azambuja, por exemplo, chegava a escrever 22 cartas por semana... O Fortunato tinha duas namoradas, uma morena e outra loura, "uma que chorava ao pé da mãe dele, e outra que se ria, em plena rua" (sic)... O meu pai um dia teve que o ajudar a decidir-se:

- Ó Fortunato, afinal de quem é que tu gostas mais ? Com quem queres casar, quando voltares à terra ? Quem é que vai a ser a mãe dos teus filhos ? A que se ri, na rua, ou a que chora no ombro da tua mãe ?...

- Ó Luís, claro que é da que chora np ombro da minha mãezinha...que eu gosto mais.

Durante anos, visitaram-se mutuamente.

Lembrava-se também dos nomes e de algumas histórias dos seus oficiais, alguns, bem “prussianos, militaristas, germanófilos”, de acordo com figurino da época, um deles herói da Guerra de Espanha, "com as pernas todas furadas por balas" (sic)...

Lembrava-se até dos resultados dos renhidos torneios de futebol e de voleibol que se realizavam no Lazareto, entre o Mindelo e o Monte Cara, entre tropas de diferentes subunidades... e em que ele participava. 

Claro, lembrava-se das praias e dos tubarões, dos navios, e até dos espiões (que lá também os havia, como em Lisboa, ao serviço de um lado ou do outro das potências beligerante)... E a chegada de qualquer navio era uma festa, tanto para os expedicionários como para os naturais da ilha...Chegou a ir a bordo de um navio da marinha mercante para estar com um vizinho, membro da tripulação, que era natural de uma povoação vizinha da Lourinhã (, Atougia da Baleia, se não erro).

Ia a missa aos domingos, como bom católico. E tinha uma menina, uma "Bia", que gostava dele, encontravam-se na igreja de N. Sra. Luz... O sonho das raparigas da ilha era arranjar um namorado metropolitano e sair daquela miséria...

Tinha o bom hábito de ler. Tinha uma bela caligrafia e uma escrita com desenvoltura. Fez a 4ª classe com 9 anos, e começou logo trabalhar. Era bom em números... No Mindelo, escreverá centenas e centenas de cartas, em nome daqueles que na época (e eram muitos...) não sabiam ler e escrever... Escrevia uma média de 20 e tal cartas por semana...

Muitas vezes eram os próprios rapazes cabo-verdianos, engraxadores de rua, escolarizados, alguns estudantes do liceu Gil Eanes (o único que havia nas ilhas, e cujo reitor era um professor goês, culto...) que liam as cartas recebidas pelos expedicionários, metropolitanos, analfabetos... Que triste ironia!... 

Para mais numa época de pavorosa seca e epidemia de fome que roubou a vida a milhares de cabo-verdianos (cerca de 25 mil) (**)... Apesar de menos sentida na ilha de São Vicente do que nas outras ilhas, a fome foi também aqui mitigada graças à solidariedade dos "nossos pais, nossos velhos, nossos camaradas"...

Mas, coisa linda e fantástica, os ex-expedicionários de Cabo Verde desta época continuaram a encontrar-se durante muitos e muitos anos, até à década de 1990... O meu velhote costumava ir aos encontros do 1º Batalhão do RI 5, nas Caldas da Rainha... até que as pernas começarem a fraquejar  e a maior parte deles, dos seus camaradas, acabou por morrer.  O António Caxaria  costumava dar-lhe boleia,de carro (***). 

O mesmo se passava com os outros regimentos: RI 7 (Leiria), RI (11 (Setúbal), RI 15 (Tomar)... Cabo Verde ficou-lhes no coração para sempre...

Capa do romance de Manuel Ferreira (1917-1992), que fazia parte da exposição comemorativa
do 1º centenário do escritor Manuel Ferreira (1917-1992), também ele expedicionário em São Vicente, neste período, com o posto de furriel miliciano


O autor de "Hora di Bai" (1962) era natural da Gândara dos Olivais, Leiria, onde tenho amigos e familiares que o conheceram em vida. Morreu em Linda a Velha, Oeiras.

Expedicionário do RI 7 (Leiria), o fur mil Manuel Ferreira (1917-1992), futuro capitão SGE e escritor, conheceu, no Liceu Gil Eanes, aquela que virá a ser a sua muher e mãe dos seus filhos, também ela escritora, notável contista, Orlanda Amarílis (1924-2014). Ambos frequentavam este liceu. Orlanda era colega de turma do Amílcar Cabral (1924-1973) ... A família de Amílcar Cabral mudou-se para o Mindelo em 1937: é de todo provável que nos dois anos e tal que lé esteve, entre julho de 1941 e setembro de 1943, o meu pai se tenha cruzado com o futuro dirigente do PAIGC.

Manuel Ferreira acabou por ficar seis anos no Mindelo (1941-1947) e ser um dos cofundadores e animadores da revista literária "Certeza" (1944), de vida efémera mas com grande impacto na vida cultural da ilha.



Cabo Verde > Ilha de São Vicente > Mindelo > "Dia 14 de agosto [de 1942], data gloriosa para a nossa gente lusa (Aljubarrota). Recordando essa data em Mindelo com o içar da bandeira nacional junto ao liceu Gil Eanes e marchando o regimento de infantaria 5 nas ruas da cidade". Foto: arquivo de família.

É um edifício com história, hoje conhecido como Liceu Velho... A elite do Mindelo passou por aqui... O liceu Gil Eanes (antes, Infante Dom Henrique) funcionou aqui de 1938 a 1968. A sua construção data de meados do séc. XIX. Teve vários usos, além de estabelecimento de ensino, foi quartel e correios...



A seca e a fome que assolaram Cabo Verde nessa época, e que fizeram milhares e milhares de mortos (inspirando o romance de Manuel Ferreira (1917-1992), “Hora di Bai”, publicado em 1962), tiveram impacto na consciência de bom português, bom cristão e bom lourinhanense, que era o 1º cabo Luís Henriques. O seu "impedido", o Joãozinho, que ele alimentava com as suas próprias sobras do rancho, também ele morreria, de fome e de doença, em meados de 1943.

Ainda se comovia, passados tantos anos, ao dizer-me que deu à família do miúdo todo o dinheiro que tinha em seu poder (c. de 16$00) - na altura, estava hospitalizado -, para ajudá-la nas despesas do enterro. 

Lembro-me de ele me dizer que um 1º cabo, em comissão em Cabo Verde, ganhava na época qualquer coisa como 130$00 por mês... De volta à metrópole, não terá mais do que 200$00 ou 300$00 no bolso. Para ele o dinheiro “nunca foi fêmea”...

Para se ter um ideia do valor do dinheiro nessa época de racionamento alimentar e especulação de preços dos géneros mais essenciais, podemos acrescentar o seguinte: 

(i) um quilo de bacalhau, em 1943, no Porto, custava 10$40, preço tabelado, ou 16$00, no mercado negro; 

(ii) um quilo de arroz, em 1941, na Guarda variava entre os 2$80, preço tabelado, e os 4$00, no mercado negro; 

(iii) o preço de um litro de azeite, em 1941, na Guarda, variava entre os 7$50 (azeite corrente) e os 8$50 (azeite extra), mas no mercado negro os preços podiam atingir 3, 4 ou 5 vezes mas;

(iv) um assalariado agrícola, na década de 1950, dez anos depois, não ganhava mais do que 20$00.

Numa população, como a do Mindelo, que não devia ultrapassar os 15 mil habitantes, a passar por graves problemas como o desemprego crónica, a seca, a fome e a emigração forçada, a presença de mais de 3300 “expedicionários” na ilha, entre 1941 e 1944, teve um grande impacto, com aspetos positivos e negativos (Vd. o livro do nosso camarada Adriano  Lima, 2020)(**). Manuel Ferreira, por ex., refere o seguinte, no seu livro “Morabeza” (1ª edição, 1958):

“Durante a última guerra, com a presença da tropa, o ritmo da vida do arquipélago, em muitos aspetos foi alterado, e daí terem surgido várias mornas alusivas a factos que mais chocaram a população, principalmente a de São Vicente [B.leza, pseudónimo de Xavier Cruz, compôs uma morna intitulada “punhal de vingança” onde refere que as moças agora só se encantam com “furrié”]. [p. 30]

 [ Citado por João Serra, in: 4 de junho de 2017 > Guiné 61/74 - P17507: Memória dos lugares (361): Mindelo em plena II Guerra Mundial, visto por Manuel Ferreira (1917-1992) (João Serra). Disponível em https://blogueforanadaevaotres.blogspot.com/2017/06/guine-6174-p175007-memoria-dos-lugares.html   ]

(Continua)
__________


Notas do editor:

(*) Vd. postes anteriores:

22 de agosto de 2020 > Guiné 61/74 - P21282: Meu pai, meu velho, meu camarada (65): Lembrando, no centenário do seu nascimento, a popular figura do lourinhanense Luís Henriques, o “Ti Luís Sapateiro” (1920-2012) - Parte III


(**) Vd. também:

14 de junho de  2021  > Guiné 61/74 - P22279: Notas de leitura (1361): "Forças Expedicionárias a Cabo Verde na II Guerra Mundial", de Adriano Miranda Lima; Março de 2020, Edição de Autor (Mário Beja Santos)

11 de setembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21346: Notas de leitura (1306): "Forças Expedicionárias a Cabo Verde na II Guerra Mundial", livro de Adriano Miranda Lima (edição de autor, Mindelo, 2020, 241 pp.): a história escrita com paixão, memória e coração (José Martins)

sexta-feira, 11 de setembro de 2020

Guiné 61/74 - P21346: Notas de leitura (1306): "Forças Expedicionárias a Cabo Verde na II Guerra Mundial", livro de Adriano Miranda Lima (edição de autor, Mindelo, 2020, 241 pp.): a história escrita com paixão, memória e coração (José Martins)


Cabo Verde > Ilha de S. Tiago > Praia > Junho de 1941 > O 1º cabo Feliciano Delfim Santos, da 1ª companhia do 1º batalhão expedicionário do RI 11 [Setúnbal], na linha da frente, é o terceiro a contar da direita para a esquerda. (*) Este batalhão foi  colocado na Ilha do Sal, integrado no RI 24. 

Foto do álbum do pai do nosso camarada e grã-tabanqueiro Augusto Silva dos Santos (que reside em Almada e foi fur mil da CCAÇ 3306/BCAÇ 3833, Pelundo, Có e Jolmete,  1971/73). 

Foto (e legenda): © Augusto Silva Santos (2017). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Cabo Verde > Ilha de S. Vicente > Mindelo >  Praia da Matiota > RI 23 > c. 1943/44 >  Foto do álbum do 1º cabo Ângelo Ferreira de Sousa, pai  do nosso camarada Hélder Sousa [ex-fur mil Trms TSF, Piche e Bissau, 1970/72), e que deveria pertencer ao 1º Batalhão Expedicionário do RI 7 (, proveniente de Leiria), estacionado no quartel de Chã de Alecrim. (**)



Cabo Verde > São Vicente > MIndelo > RI 23 > 1º Batalhão Expedicionário do RI 7 (Leiria) > 10 de setembro de 1944 > Chão de Alecrim > O 1º cabo Ângelo Ferreira de Sousa, recordação da despedida de Cabo Verde, com dois 2ºs cabos nativos, seus amigos. (**)

Fotos (e legendas): © Hélder Sousa (2009). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Cabo Verde > São Vicente > Regimento de Infantaria 23 > Hospital Militar Principa de Cabo Verde > O sold aux enf, Porfírio Dias, de joelhos, em primeiro plano, à porta de um enfermaria, om outros camaradas enfermeiros e com o allferes médico (o que não tem bata branca). (***)

Foto do álbum do pai do nosso camarada Luís Dias [ex-Alf Mil At Inf da CCAÇ 3491/BCAÇ 3872,´Dulombi e Galomaro,1971/74]

Foto (e legenda): © Luís Dias (2012). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]





José Martins, nosso colaborador permanente;
ex-fur mil trms, CCAÇ 5, "Gatos Pretos" (Canjadude, 1968/70);
profissionalmemnte foi revisor oficial de comtas, 
vive em Odivelas, 

1. Mensagem.com data de ontem, José Martins,   ex-fur mil trms, CCAÇ 5, "Gatos Pretos" (1968/70), nosso colaborador permanente:

Proposta de leitura do livro "Forças Expedicionárias a Cabo Verde na II Guerra Mundial", da autoria de Adriano Miranda Lima (edição de autor, Mindelo, São Vicente, Cabo Verde, 2020, 241 pp.) (****)

Se me fosse proposto resumir, numa simples frase, o livro “Forças Expedicionárias a Cabo verde, na II Guerra Mundial”, seria:

A história escrita com paixão, memória e coração.

Cabo-verdiano de nascimento e nabantino ou tomarense por opção, Adriano Moreira Lima, coronel da situação de reforma e nosso camarigo, transmite-nos, ao longo das quase duas centenas e meia de texto e fotografias da época, a forma de vida e sentimentos de dois povos: o metropolitano, na medida em que foi representado pelos militares que para o arquipélago foram destacados; e o povo cabo-verdiano, nas populações que tão bem souberam receber os que ali aportaram.

No início dos anos quarenta do século XX, com o eclodir da II Guerra, numa atitude dissuasiva do governo português, apesar da neutralidade declarada, enviou para as ilhas atlânticas milhares de militares, não deixando de continuar a embarcar para África – Angola e Moçambique – destacamentos de reforço às guarnições locais.

            O maior contingente foi destinado ao arquipélago dos Açores, com cerca de 30.000 militares, sendo o envio para a Madeira de uma força de mais ou menos 1.000 militares, como reforço das unidades recrutadas localmente.

            Cabo Verde foi o destino de quase 6.000 militares, a serem distribuídos pelas ilhas de S. Vicente, cerca de 3.000; para o Sal, em número de mais de 2.000; e para Santo Antão, mais de 700 militares.

            Não podemos esquecer que a plataforma continental poderia ser, aliás como se veio a provar, pretendida não só pelos espanhóis como pelos alemães, para expansão do território no primeiro caso, apesar da Tratado Ibérico, e na segunda hipótese, para obstar o desembarque, de forças inglesas, nas costas de Portugal.

            Caso algum desses cenários se verificasse, o governo português rumaria para os Açores, mas havia que assegurar um efectivo militar que activasse o retardamento das tropas invasoras, quer pela destruição de estradas e pontes com utilização de explosivos, pela engenharia, quer pela utilização de forças combinadas, infantaria e artilharia, em acções de emboscadas 

[Ver Rós Agudo, Manuel –  A Grande Tentação, Os Planos de Franco para Invadir Portugal - Casa das Letras, Setembro de 2009, páginas 228 e 328 a 333, e «https://en.wikipedia.org/wiki/Operation_Felix» (consultado em 10/09/2020)].

No aspecto social, não há duvida alguma do impacto que a chegada dos militares teve na vida das populações. A população da ilha de São Vicente, estava estimada em cerca de 15.000 habitantes; com a chegada de 3.000 militares, houve uma alteração demográfica, ainda que temporalmente, de mais 20% dos habitantes.


Capa do livro de Adriano Miranda Lima: Preço de capa (incluindo portes
 de correio: 12 €). Pagamento através de transferêmcia bancária: 
IBAN PT50 0035 0813 00010554900 36 

Pedidos ao autor: endereço de email:
 limadri64@gmail.com

Como indica no texto, inicialmente, Adriano Lima, tinha em mente descrever a acção do seu RI 15, mas acaba por fazer menção às outras unidades, a tal ponto que, tendo eu investigado sobre o batalhão do RI 7 (Leiria), acabarei por encontrar mais elementos e fotos que, ou me escaparam ou não me “empenhei” tanto quanto devia, apesar da minha investigação não ser só sobre o período de 1941 a 1944. Há referências aos batalhões de infantaria saídos de Tomar (RI 15), Caldas da Rainha (RI 5), Leiria (RI 7), Setúbal (RI 11) e Abrantes (RI 2), assim como de outras armas, mormente artilharia, que foram guarnecer Cabo Verde.

No serviço de saúde, que além de servir a população militar foi estendida à população civil, havia além das enfermarias regimentais, Hospitais Militares em São Vicente e Sal, tendo como Hospital de retaguarda, o Hospital Militar da Estrela, para onde seriam enviados os militares que necessitassem de cuidados mais especializados ou prolongados.

            Os que morreram devido a doença ou acidente, e que foram inumados nos cemitérios locais, lá estão todos enumerados. Porem o número de baixas mortais poderá ter sido superior, pois pode ter havido casos de morte nos evacuados para o .HMP [, Hospital Militar Principal, Lisboa].

Os “protagonistas” deste livro, é a geração imediatamente anterior â nossa. Daí haver entre os combatentes, que fazem parte da Tabanca Grande, membros cujos pais ou tios, estiveram nesta expedição.

O livro refere que não há muita informação, oficial ou oficiosa, que nos permita estudar a presença de militares portugueses nesta expedição. Tal facto pode resultar da destruição ou extravio da documentação gerada nesse período, Os batalhões expedicionários ao serem constituídos, passavam a ter “Ordens de Serviço” autónomas às dos regimentos; por outro lado, no caso da infantaria que era para ser constituída em “Comando de Batalhões”, evoluiu para a constituição de dois Regimentos de Infantaria, os números 23 (São Vicente) e 24 (Sal), agregando as forças dos batalhões, originando nos arquivos militares, novas cotas.

   Faço votos para que, com o aparecimento deste livro, os descendentes destes militares – nós, os nossos filhos/sobrinhos e netos – recuperem dos baús da memória, e óptimo seria com fotos com legendas, a documentação que “está ali” à espera de uma oportunidade para ver a luz do dia. Sim, porque memórias na primeira pessoa já não deve haver, mas há, ainda, quem se recorde de factos contados nas reuniões de família, ou naquelas alturas em que vinham à memória “as mornas de Cabo Verde”, e a saudade «falou para os mais novos», na altura.

Apesar de ter sido esse a solicitação do Luís Graça, por não estar tão envolvido nestes factos como o Luís pois, os seus escritos e o acervo fotográfico foram, sem dúvida, uma “mais valia” para o texto que nos é apresentado, sendo também, uma homenagem a quem, até ao fim dos seus dias, sempre recordou a sua passagem por aquelas paragens agrestes.

Não me achei com a capacidade de escrever a recensão do Livro (*****), mas tão só uma pequena nota a incentivar a leitura do mesmo. E não estou tão “longe ou afastado” deste tema, apesar de não ter tido familiares à época, em condições de ser mobilizado. Porém, as “buchas” que introduzi neste apontamento, são fruto, de alguma forma, devidas, ao estudo da matéria em questão.

O livro “Forças Expedicionárias a Cabo Verde”, reúne e amplia alguns textos do blogue “Praia do Bote”, assim como se suporta no excelente espólio de “Luís Graça e Camaradas da Guiné” através da rubrica “Meu pai, meu velho, meu camarada”.

Resumindo: Dentro de vinte anos comemorar-se-á o centenário desta expedição.

A História Militar deste país pouco tem sobre a matéria, mas os homens que escreveram estas páginas de glória, não podem ficar no esquecimento.

Esperemos que as entidades militares e civis, unam esforços, recuperando nos arquivos que existem – ordens regimentais, cadernos de recenseamento, processos individuais – o nome de quem foi para as ilhas atlânticas, e se possa dar à estampa, novos factos e nomes de Portugal.

 José Martins
10 de Setembro de 2020 
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terça-feira, 2 de junho de 2020

Guiné 61/74 - P21031: Meu pai, meu velho, meu camarada (61): In Memoriam: António Correia Caxaria (Atalaia, Lourinhã, 17/12/1917 - São Bartolomeu dos Galegos, Lourinhã, 1/6/2020): o últmo expedicionário de Cabo Verde, ex-fur mil, RI 5 / RI 23, São Vicente, 1941/43




1. Acabei de saber, ontem à noite, pela página do Facebook da Oestefune - Serviços Funerários Lda, com sede na Lourinhã, da morte do meu conterrâneo,  amigo e camarada do meu pai, o António Correia Caxaria, nascido na Atalaia, Lourinhã, em 17/12/1917. 

Fiquei muito triste, mesmo sabendo que ele era um resistente, ia fazer no final deste ano 103 anos. E era, muito provavelemente, o últmo, até então vivo, dos mais de 6 mil e tal homens que, durante a II Guerra Mundial, defenderam a soberania portuguesa do território de Cabo Verde, em especial nas ilhas de São Vicente, Santo Antão e Sal.

O Caxria esteve com o meu pai, Luís Henriques (1920-2012) em São Vicente, entre 1941 e 1943, ambos mobilizados pelo RI 5 (Caldas da Rainha) e integrados no RI 23.

Durante mais de meio século os dois iam, todos os anos ou quase todos os anos, ao convívio do seu batalhão, nas Caldas da Rainha. Era o Caxaria, que vivia em Lisboa, que dava boleia, de carro,  ao meu pai.

Conheci-o pessoalmente no Restaurante Foz, na Praia da Areia Branca, não há muitos anos, talvez por volta de 2012, ano em que morreu o mei pai.. Era um hoimem afável e jovial, vendendo saúde aos 90 e tais anos!... E chegou a visitar os maus pais, no Lar de Nossa Senhira da Guia, na Atalaia.

Aos sábados, era frequente encontrá-lo lá,  no Restaurante Foz, com o filho, nora e netos...Prometi-lhe que o iria visitar um dia na sua quinta, em São Bartolomeu dos Galegos,  Lourinhã... Queria ver o seu álbum de fotografias do Mindelo e São Vicente. E falar desse tempo, das suas recordações, da sua amizade e camaradagem com o meu pai e outros conterrâneos que passaram pelo RI 23.

Sei que a família fez-lhe uma bonita dos festa dos 100 anos. Ia sabendo notícias dele  através do filho ou do Restauante Foz. Hoje recebo a triste notícia de que chegou ao fim a sua viagem terrena. Aprontava-me para ir ao seu  funeral mas vejo que, por vontade expressa da família, as cerimónias fúnebres são restritas ao círculo familiar.

 Mesmo assim, estando em Lisboa, quero ver se ainda dou um salto à Lourinhã, para estar às 3 e picos, à porta da Igreja do Convento de Santo António, para lhe dizer um "Até sempre, meu pai, meu velho, meu camarada!"... Porque os pais dos nossos camaradas, para mais tendo sido expedicionários no Ultramar, também são nossos pais e camradas.

A um dos filhos, que conheço pessoalmente, o eng. Carlos Augusto Amaro Caxaria, especialista em geologia e minas (, que foi presidente, de 2013 a 2016, da EDM-Empresa de Desenvolvimento Mineiro, S.A.), endereço as minhas condolências, em meu nome pessoal, em nome da família do Luís Henriques e em nome também da Tabanca Grande (onde temos aqui vários filhos de antigos expedicionários que foram contemporâneos do Caxaria, em Cabo Verde: o Hélder Valério Sousa, o Augusto Silva Santos, o Luís Dias, o Nelson Herbert).

PS - E peço desculpa à família se algumas vezes troquei o apelido do António: Caxaria, e não Caixaria,  lapso de resto já corrihido no blogue.



Cabo Verde > Ilha de São Vicente > Mindelo > "Parada do Dia 14/8/1942. Foto Melo"... No verso, escrito pelo punho de Luís Henriques: "Comemoração de Aljubarrota em São Vicente. Desfile de todas as tropas e viaturas. A 1ª e a 3ª companhaias do RI 5"... Seguramente que o fur mil António Caxaria também participou neste desfile,,, Infelizmente não tenho nenhuma foto dele com o meu pai... Foto do álbum de Luís Hnriques (1920-2012).

[ O nosso camarada e grã-tabanqueiro Adriano Miranda Lima,. cor inf ref, natural do Mindelo,a viver em Tomar, e agora autor de um livro sobre os expedicionáriso em Cabo Verde ao tempo da II Guerra Mundial,  descreve o sítio, num poste do blogue Praia de Bote, como sendo a Rua do Coco, e chama a a atenção para o pormenor do comandandante da companhia em segundo plano, e que vem a cavalo, como era hábito ainda na época. O dia 14 de agosto é o dia da Infantaria, ]

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Nota do editor:

sexta-feira, 23 de novembro de 2012

Guiné 63/74 - P10712: Meu pai, meu velho, meu camarada (34): Tropas expedicionárias portuguesas, em São Vicente, Cabo Verde, 1941/45, mostram solidariedade com o povo sofrido da ilha (Adriano Miranda Lima, cor inf ref, Tomar; cortesia de Praia de Bote)


Reprodução (parcial) do poste nº 8 da série Tropas expedicionárias portuguesas em Cabo Verde durante a II Guerra Mundial, da autoria de Adriano Miranda Lima, publicado no blogue Praia de Bote


1. Já aqui falámos do blogue Praia de Bote e do nosso leitor Adriano Miranda Lima, cor inf ref, residente em Tomar, e natural de São Vicente, Cabo Verde. O cor Miranda Lima serviu, durante muitos anos, no RI 15, o prestigiado RI 15, donde saíram, ao longo da nossa história, milhares e milhares de combatentes. E tem um especial carinho não só pela sua terra de origem, Mindelo, São Vicente, Cabo Verde, como pelos "nossos pais" que estiveram lá, em missão de soberania durante a II Guerra Mundial... 


Sobre esses "expedicionários" ele tem vindo a escrever no blogue Praia de Bote, estando de resto autorizado a utilizar textos, vídeos e fotos do nosso blogue, e nomeadamente da série "Meu pai, meu velho, meu camarada"... Com data de ontem, 22, saiu mais um poste, que traz um sugestivo título: "Levaram na mochila o espírito de solidariedade"... Tenho pena que o "meu velho" já não esteja vivo para lhe poder ler alguns excertos... 

 Aqui vão eles, de qualquer modo, para conhecimento dos nossos leitores, enquanto ao mesmo tempo reitero o meu convite ao Adriano Miranda Lima para aceitar o meu convite para ingressar na Tabanca Grande (ambos temos no coração Cabo Verde, e esta terra está intimamente ligada à história da Guiné e da guerra colonial) (*): 

(i) (...) " Até as praças do contingente expedicionário arranjaram o seu 'impedido', glosando-se aqui, claro, o significado militar do vocábulo. E quem eram esses 'impedidos'? Nada mais que a miudagem que se acercava dos portões dos quartéis à procura de um pouco de alimentação. As praças precisavam de alguém que lhes levasse a roupa a uma lavadeira, que lhes desse um recado ou até que lhes engraxasse as botas".

(ii) (...) "Em relatos que ouvi a muitos desses ex-militares, raros são os que não conservaram para sempre na memória o triste episódio da fome que assolava o arquipélago e dizimava impiedosamente vidas humanas (cerca de 50.000 mortos entre 1943 e 1945). É por esta razão que o coração dos militares não era insensível ao espectro da fome estampado nos rostos dos rapazinhos que se abeiravam dos quartéis. Muitos reservavam um pouco da sua alimentação diária aos seus 'impedidos', quer fosse pão quer fosse comida confeccionada nos caldeiros do rancho geral. Só quem nunca sentiu a tortura da fome não imagina o valor que teria naquela altura uma simples côdea de pão ou uma tijela com uns restos de sopa". (...)




Cabo Verde, Ilha de São Vicente > "Luís Henriques, em 10 de maio de 1942. Na praia do M. [Monte] Branco, Lazareto, São Vicente". Foto do álbum de Luís Henriques (1920-2012). No verso, além da legenda transcrita, há  um carimbo com os dizeres: "MELO Foto. Secção de amadores. São Vicente".

 Foto: © Luís Graça (2012). Todos os direitos reservados



Cabo Verde, São Vicente, Mindelo (?) > "Festa em San Vicente, nosse terre. Nativos em festa. Recordação da minha estada em C. Verde, expedidição 1941-1943. Luís Henriques". Foto do álbum de Luís Henriques (1920-2012).

Foto: © Luís Graça (2012). Todos os direitos reservados


(iii) (...) "De entre muitos testemunhos, vale a pena registar aqui o do antigo expedicionário 1º cabo Luís Henrique, do Batalhão de Infantaria 5, aquartelado em Lazareto, que me foi transmitido em mail pessoal pelo seu filho (,..), editor do blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné, espaço no qual o mesmo testemunho foi reportado há alguns anos, assim como factos relevantes da vida militar do seu pai em terra cabo-verdiana. 

Textualmente, transcreve-se esta seguinte passagem do citado mail: 'O meu pai lembra-se da epidemia de fome que assolou as ilhas, no tempo em que lá esteve (1941/43). O seu 'impedido', o Joãozinho, que ele alimentava com as suas próprias sobras do rancho, também ele morreu, de fome e doença, em meados de 1943. Comove-se ao dizer que deu à família do miúdo todo o dinheiro que tinha em seu poder (cerca de 16$00), para ajudá-la nas despesas do funeral'. Luís Graça explicou que o seu pai estava na altura hospitalizado mas que acompanhou o triste episódio da morte do seu 'impedido' .(...) 

 Não há exemplo mais tocante e mais grandioso do que o daquele que dá o pouco que tem para mitigar a fome e o sofrimento do seu semelhante. Foi o caso do senhor Luís Henrique e de muitas praças dos contingentes militares expedicionários" (...).

(iv) (...) "Em narrativas anteriores, referi a importância particular que para mim reveste o Batalhão de Infantaria 15, nomeadamente a sua 3.ª Companhia de Atiradores, a que ficou em S. Vicente enquanto o grosso do Batalhão foi destacado para a ilha vizinha. Vamos ver o porquê desse meu sentimento. Essa companhia, sob o comando do capitão Fernando de Magalhães Abreu Marques e Oliveira, ficou aquartelada no centro do Mindelo (...). Aquele capitão era venerado pelos seus antigos subordinados, que o recordavam pela sua competência profissional e pelo espírito humanitário oculto atrás do seu ar sóbrio e grave. (...)

(v) (...) "Condoído com aquela dramática situação [, a fome que lavrava na ilha], o capitão Oliveira ordenou ainda a montagem de um mais organizado serviço de distribuição de sobras de rancho, autorizando que aqueles pobres civis entrassem mesmo para dentro da área militar. À certa altura, reparando que o número de necessitados crescia a olhos vistos, disse ao furriel que tinham de arranjar um processo de maximizar as sobras de alimentação de forma a responder melhor àquela situação. Perante as dúvidas do subordinado, explicou-lhe que era preciso recorrer a todas as situações administrativas e meios possíveis". (...)





" Foto pertencente à família do capitão Paiva Nunes e por ela cedida ao autor [, Adriano Miranda Lima]. Os oficiais presentes são todos capitães. (...) À frente, e da esquerda para a direita, o capitão Mário de Paiva Nunes e o capitão Fernando de Magalhães Abreu Marques e Oliveira (aos 40 anos de idade), benfeitor do povo faminto do Mindelo", assinalado com elipse a vermelho. 




(vi) (...) "Recorda-se ainda [, aquele antigo furriel,] de o seu comandante de companhia ter ido falar com o comandante do Regimento de Infantaria 23, designação da unidade que englobava os batalhões de infantaria de S. Vicente, no sentido de sugerir ao seu superior hierárquico que todas as companhias procedessem de igual forma, e dentro dos possíveis, para ajudar as pessoas carentes de alimentação. E a verdade é que o gesto humanitário do capitão Oliveira em prol dos necessitados de S. Vicente não tardou a ser seguido nas outras companhias e baterias destacadas na ilha de S. Vicente". (...)

(vii) (...) "Mas o apoio e o espírito de solidariedade das forças militares tiveram uma expressão alargada e transversal, passando por actos individuais e colectivos e por diferentes sectores das estruturas militares. Destaca-se a acção médica e medicamentosa que a população recebeu durante a permanência das tropas de uma forma sem precedentes na história colonial das ilhas, sobretudo em S. Vicente. Essa acção permitiu salvar inúmeras vidas mediante intervenções cirúrgicas e uso de meios terapêuticos que não teriam sido 
possíveis sem a presença dos militares". (...)


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Nota do editor:

Último poste da série > 7 de outubro de 2012 > Guiné 63/74 - P10496 Meu pai, meu velho, meu camarada (33): Mais notícias das forças expedicionárias da ilha de São Vicente, Cabo Verde (1941/45) (Adriano Miranda Lima, cor inf ref)


sábado, 22 de setembro de 2012

Guiné 63/74 - P10420: Meu pai, meu velho, meu camarada ( 32): Luís Henriques (1920-2012) evoca, em entrevista gravada em 10 de março de 2010, os sítios onde passou 26 meses, na ilha de São Vicente, em plena II Guerra Mundial: Mindelo, Lazareto, Matiota, São Pedro, Calhau...


Cabo Verde > Ilha de São Vicente > Mindelo > RI 23 > "No dia15 de Fevereiro de 1942, os três amigos íntimos [,da direita para a esquerda,] Luís Henriques, António F. Delgado e José Leonardo... os três bigodinhos querem é dizer que têm bigode... invisível!... [Eram três 1ºs cabos inseparáveis, todos da mesma companhia e


Cabo Verde > Ilha de São Vicente > Mindelo > RI 23 > "Num dos funerais que cá se realizou , ao passar nas salinas (?) em São Vicente. 1942. Luis Henriques"




Cabo Verde > Ilha de São Vicente > Mindelo > RI 23 > Parte da festa do 1º de dezembro de 1941. Corrida de cavalos. Lazareto, São Vicente, Cabo Verde. Luis Henriques"


Cabo Verde > Ilha de São Vicente > Mindelo > RI 23 > "Uma das partes mais brilhantes do programa da festa da restauração: a ginástica. No dia 1 de dezembro de 1941. Lazareto, São Vicente, Cabo Verde. Luis Henriques"


Cabo Verde > Ilha de São Vicente > Mindelo > RI 23 > "Duas secções em diligência. No paiol, São Vicente, novembro de 1941. Luis Henriques".



Cabo Verde > Ilha de São Vicente > RI 23 > Calhau > Janeiro de 1942 > Um amigo do Fundão, no verso pode ler-se a seguinte dedicatória: "Ofereço ao meu amigo [Luis Henriques] com verdadeira amizade, esta fotografia em Cabo Verde. Seu amigo António João Abel, 1º cabo nº 267/41, RI 15"... Ao fundo, vê-se o "jardinzinho", no Calhau,  a que o Luís Henriques se refere nesta entrevista abaixo...






Lourinhã, cemitério local, 22 de setembro de 2012 > A lápide de Luís Henriques, homenagem de seus filhos, netos e bisnetos.

Fotos: © Luís Graça (2012) / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Todos os direitos reservados




Lourinhã > 20 de março de 2010 > Luís Henriques (1920-2012), ex-1º cabo  inf  nº 188/41, 1º Pelotão, 3ª Companhia, 1º Batalhão, Regimento de Infantaria nº 5 (Caldas da Rainha). Esteve no Mindelo, Ilha de S. Vicente, Cabo Verde, entre Julho de 1941 e Setembro de 1943. Neste episódio, evoca alguns dos sítios da ilha por onde passou ou que conheceu: Mindelo, Lazareto, Matiota,  São Pedro, Calhau, Monte Verde, Monte Cara... Na época ainda estava longe de ser mundialmente famosa a praia da Baía das Gatas... Fala também das duras condições de vida na illha, responsável por dezenas mortes entre o pessoal do RI 23...

Vídeo: 13' 02'. © Luís Graça (2012). Alojado no You Tube > Nhabijoes




Mapa da ilha de São Vicente (Cortesia de Wikipédia):   A azul, assinalam-se alguns dos topónimos aqui referidos na entrevista dada por Luís Henriques, em 10 março de 2010. Morreu em 8 de abril de 2012, sem nunca ter voltado a São Vicente, ilha de que falava com muito afeto...

(...) São Vicente (em crioulo: Sanvicente ou Soncente) é a segunda ilha mais populosa de Cabo Verde, localizada no grupo do Barlavento, a noroeste do arquipélago. O canal de São Vicente separa-a da vizinha ilha de Santo Antão. O Aeroporto Internacional Cesária Évora localiza-se a sul da cidade do Mindelo, o principal centro urbano da ilha e segunda maior cidade do país, onde se concentra grande parte da população da ilha que no seu todo conta com 74.136 habitantes. Mindelo é frequentemente considerada informalmente a capital cultural de Cabo Verde

A ilha, de aspecto seco e árido, tem na pesca, no turismo e na exploração do seu movimentado porto de mar ― o Porto Grande ― as suas principais fontes de receita.  São Vicente tem muitos pratos típicos, muitos deles tendo o marisco por base. Para além da célebre "cachupa", pontificam o "arroz de cabidela de marisco à Dadal" e o "guisado de percebes".

São Vicente é também conhecida pelo Festival de Música da Baía das Gatas ― realizado no primeiro fim-de-semana de lua cheia do mês de Agosto ― e por ser a terra natal da célebre cantora Cesária Évora " (...).


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Nota do editor:

Último poste da série > 21 de agosto de 2012 > Guiné 63/74 - P10284: Meu pai, meu velho, meu camarada (31): Expedicionários em Cabo Verde, mortos entre 1903 e 1946 e inumados nas ilhas de São Vicente e Sal (Lia Medina / José Martins)

sábado, 14 de abril de 2012

Guiné 63/74 - P9744: Meu pai, meu velho, meu camarada (28): O RI 23, (re)constituído na Ilha de S. Vicente (agosto de 1941/dezembro de 1944): a unidade a que pertenceram Luís Henriques, Ângelo Ferreira Sousa, Porfírio Dias e Armando Lopes (José Martins)

1. Comentário do nosso colaborador permanente José Martins, com data de 11 do corrente, ao poste P4926 (*):


A foto nº 2 [, à esquerda,] tem uma referência, com interrogação, acerca do RI 23.
[Cabo Verde > Ilha de São Vicente > Mindelo > Foto nº 2 > Ângelo Ferreira de Sousa (1921-2001), pai do nosso camarada Hélder Sousa, natural de Vale da Pinta, Cartaxo, ex-1º Cabo n.º 816/42/5 da 4ª Companhia do 1º Batalhão de Infantaria do R.I. 23 (?)... Tem a data de 18 de Outubro de 1943 e na legenda refere ser 'recordação de S. Vicente'.]


O RI 23 foi constituído em Cabo Verde, na Ilha de S. Vicente, sob o comando do Brigadeiro Augusto Martins Nogueira Soares (Agosto de 1941 a Dezembro de 1944).


Faziam parte deste regimento:


1 Batalhão do RI 5 (Caldas Raínha)
1 Batalhão do RI 7 (Leiria)
1 Batalhão do RI 15 (Tomar)
Bateria de Artilharia Costa 1
Bateria de Artilharia Costa 2
Bateria Artilharia Contra Aeronaves 9,4 cm
Bateria Artilharia Contra Aeronaves 4 cm
Bateria de Referenciação, a 2 Divisões
2ª Companhia de Sapadores Mineiros do Regimento de Engenharia 2


Mais os seguintes serviços de apoio:


Parque de Engenharia
Secção de Padaria
Depósito de Subsistências e Material
Laboratório de Análise de Águas
Hospital Militar Principal de Cabo Verde
Depósito Sanitário
Tribunal Militar


Ab
José Martins


2. Comentário do editor:


A origem do RI 23 remonta à epoca da Restauração (1641). A designação de RI 23 data de 1806. Notabilizou-se na luta contra as tropas napoleónicas (por ex., defesa de Almeida e  batalha do Buçaco, 1810). Ao RI 23, (re)constituído na Ilha de São Vicente, Cabo Verde, durante a II Guerra Mundial, pertenceram os "nossos camaradas" Luís Henriques (1920-2012) (pai do Luís Graça), Ângelo Ferreira de Sousa (1921-2001) (pai do Hélder Sousa), Porfírio Dias (1919-1988) (pai do Luís Dias) e Armando Lopes (felizmente ainda vivo) (pai do Nelson Herbert). (**)

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