Mostrar mensagens com a etiqueta BCAÇ 1888. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta BCAÇ 1888. Mostrar todas as mensagens

quinta-feira, 1 de junho de 2023

Guiné 61/74 - P24359: Tugas, pocos pero locos: algumas das nossas operações temerárias (3): Op Foguetão: mais uma dramática incursão à península de Madina/Belel, 27 e 28 de novembro de 1967, segundo a versão de Abel Rei (CART 1661, Fá, Enxalé, Bissá, Porto Gole, 1967/68).


Guiné > Região do Oio > Porto Gole > CART 1661 (1967/68) > O Abel Rei, que pertencia ao 3º Gr Comb, está aqui escrever algumas linhas do seu diário, mais transformado em livro. Sáo dele as palabras revelkadotras de uma gradne honestidade intelkectual: "A minha escassa formação primária não me proporcionou melhores ideias. Tudo o que ficou escrito, não se tratou senão de simples partes vividas, onde a realidade dava lugar a maiores esclarecimentos. E acabei por impor a mim próprio a chamada memória selectiva, e omitir factos tão ruins que eu nem os conseguia descrever, e com a sua omissão convencer-me de que nunca aconteceram."

 Foto (e legenda): © Luís Graça (2002). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Abel de Jesus Carreira Rei.  nascido em 1945, em Maceira, Leira, 
vive em Embra, Marinha Grande. É membro da Tabanca Grande desdce


Capa do livro de Abel de Jesus Carreira Rei – Entre o Paraíso e o Inferno: De Fá a Bissá: Memórias da Guiné, 1967/1968. Prefácio do Ten Gen Júlio Faria de Oliveira. Edição de autor. 2002. 171 pp. (Execução gráfica: Tipografia Lousanense, Lousã. 2002)


1. Tivemos ontem notícias do Abel Rei, ex-1º cabo at art, CART 1661 (Fá, Enxalé, Bissá, Porto Gole, 1967/68), através do formulário de contacto do Blogger... Há mais de  um ano que andávamos à sua procura e a pedir-lhe que fizesse "prova de vida"(*)

31 maio 2023 17:39

Quero desejar ao amigo Beja Santos muitos Parabéns e um dia feliz com saúde e um grande abraço com a sincera amizade deste amigo,Abel Rei, Ex-combatente, RT 1661.

Cumprimentos, Abel Rei | abel.rei@hotmail.com



2.   Hoje fomos revistar alguns dos seus postes, e nomeadamente as notas de leitura que fizemos do seu livro de memórias.  Um desses postes chamou-nos a atenção por nele se referir a Op Foguetão (**), mais uma dramática incursão à península de Madina / Belel. Ou seja, mais uma operação temerária que fica bem na série "Tugas pocos pero locos" (***) 


Op Foguetão: mais uma dramática incursão à península de  Madina/Belel, 27 e 28 de novembro de 1967

Depois de 73 dias em Bissá, o nosso 1º cabo Abel Rei regressa a Porto Gole, exausto e adoentado. Visto pelo médico, que lhe receitou “três injecções e comprimidos” (sic), voltou a estar apto, ele e os demais “companheiros de Bissá”, ao fim de três dias.

A 27 e 28 de novembro de  1967 vemo-lo a participar na Op Foguetão, para um golpe de mão uma acampamento da guerrilha na região de Madina / Belel. Tratou-se da repetição da Op Frango, envolvendo forças da CCAÇ 1646 (Fá Mandinga) e da CCAÇ 1749 (Mansoa), além da CART 1661 (Porto Gole).

A CCAÇ 1646 (que passou por Bissau, Fá Mandinga, Xitole, Fá Mandinga e Bissau, entre janeiro de 1967 e outubro de 1968) pertencia ao BART 1904 (Bambadinca), tendo por comandante o cap mil art Manuel José Meirinhos.

A CCAÇ 1749, por sua vez, passou por Mansoa, Mansabá e Quinhamel, entre julho de 1967 e junho de 1969. Era comandada pelo cap mil art Germano da Silva Domingos.

Na Op Frango, que se realizara uns dias antes,  a 16 de novembro de 1967, as NT não tinham atingido o objectivo, por se terem perdido e por haver falha nas ligações com o PCV. Diz a história da CCAÇ 1661, citada pelo Abel Rei (p. 120), que “o único guia que nos foi possível arranjar, informou não saber atingir o objectivo pelo itinerário determinado superiormente”.

 O filme dos acontecimentos da Op Foguetão, de acordo com o diário do Abel Rei (29/11/1967, Enxalé, pp. 120-122) (**),  volta a mostrar-nos a ocorrência de alguns erros e falhas recorrentes nestas incursões à península de Madina / Belel, onde as NT iam uma vez por ano,  erros e falhas já listados, a título exemplifiativo,  na série "Tugas pocos pero locos" (***):
  • erros de planeamento;
  • guias que se perdiam ou que procuravam ludibriar as NT;
  • itinerários mal escolhidos ou de difícil progressão, com cursos de água de difícil cambança, capim alto, etc.;
  • PCV (antes da época dos Strela...) que denunciavam a presença das NT;
  •  falhas no abastecimento de água (ou na escolha das rações de combate);
  • progressão para o objectivo a horas proibidas (sob sol escaldante);
  • confusão de (ou chegada tardia aos objetivos);
  • flagelações e/ou queimadas do IN;
  • tabancas que se encontram abandonadas e que depois são queimadas pelas NT;
  • casos graves de exaustão, insolação e desidratação;
  • indisciplina de fogo;
  • ataques de abelhas e/ou formigas;
  • debandada geral;
  •  perda de armas e munições, e até de homens e cadáveres  que são transportados às costas em macas improvisadas;
  • regresso dramático ao Enxalé com viaturas a sair até São Belchior para transportar os mais "desgraçados";
  • tentativa de recuperação, no dia seguinte, do material perdido… e até dos cadáveres;
  •  e, claro, relatórios por vezes fantasiosos, pouco rigorosos, etc....
Eis, em resumo, o filme dos acontecimentos em 10  pontos, seguindo o teor do diário do Abel Rei (29/11/1967):

(i) (,,,) “partimos à meia noite do dia 27, com um ração de combate para cada dois homens, e a caminho dum acampamento dos ‘turras’, situado em Madina, onde eles tinham bastante armas pesadas, entre elas um ou dois morteiros 82 e canhão sem recuo (?)" (…);

(ii) as NT chegam ao objectivo por  “volta das dez e meia da manhã”;

(iii) nessa altura começam a ser sobrevoadas uma avioneta com um ‘major de operações’ (sic), leia-se, PCV

(iv) sob um “sol escandante”, depois de mais de uma hora parados e, obviamente, já localizados pelo IN, “fomos obrigados a avançar para o objectivo", quando "nessa ocasião fazia-se a entrada numa bolanha cheia de água” (recorde-se que estamos no fim da época das chuvas);

(v) há quatro baixas por exaustão e desidratação; esses  militares são helievacuados. ficam 20 homens a fazer segurança ao helicóptero. enquanto os restantes continuam a avançar para o objectivo;

(vi) a progressão faz-se no meio do capim alto (com “mais de três metros de altura”); a  zona em que o helicóptero está pousado, começa a ser batida por tiro de morteiro; avança-se para o objectivo;

(vii) (...)  “o tiroteio sucedia-se cobrindo aqueles matos!;  (…) os homens que ficaram atrás comigo, contaram que foram obrigados a retirar para fugir ao fogo dos ‘turras’ que batiam a zona; perderam-se…”

(viii) os “outros, são obrigados pelo capitão (de nome Figueiredo) [referência que nos parece explícita, ao cap Dias Sousa Figueiredo, da CART 1661], “a irmos contra as trincheiras do inimigo – apontando-lhes a sua arma, com ameaça de disparos, se não avançassem” (p. 122);

(ix) as NT sofrem “dois mortos e três feridos”, não lhes sendo possível “trazer os mortos: um soldado nativo das milícias, e o próprio guia, pois o fogo era intenso”;

(x) concluindo, chegaram já de noite, divididos em dois grupos, aqui ao quartel [do Enxalé], tendo andado perdidos uns dos outros; vinham estafados”…

A história da unidade (CART 1661) diz, seca, cínica e sucintamente, que “o objectivo de Madina foi atingido e destruído, tendo sido mortos 9 elementos IN; as NT tiveram um milícia morto e três feridos” (p. 122)… 

Não há qualquer referência ao pobre diabo do guia cujo cadáver lá ficou, também, para os jagudis… (Não sabemos se o guia era um prisioneiro, embora provavelmente o fosse, já que não foi contabilizado como baixa das NT.);

Só quinze dias depois é que o Abel volta escrever, para nos dar conta da existência da ‘arma secreta’ da CART 1661, o famoso ‘granadeiro’, uma “viatura pesada blindada com chapas metálicas e areia”, que é utilizada numa coluna auto, de reabastecimento a Bissá… “Pela estrada, em que fomos sempre pé, picando a área em todo o percurso, ao longo da nossa deslocação foram encontrados jornais de propaganda subversiva terrorista” (14/12/1967, Enxalé) (***ª)…

No final do ano de 1967, o comando da CART 1661 muda-se para Porto Gole, passando o Enxalé a ser apenas um simples destacamento, depois na primeira daquelas localidades se terem construído as necessárias instalações para o pessoal, bem como o depósito de material. Foi também construído uma pista de aterragem para aeronaves tipo D0 27…

(Seleção / compilação / revisão e fixação de texto / negritos e itálicos:  LG)


3. Ficha de Unidade> Companhia de Artilharia nº  1661

Identificação:  CArt 1661
Unidade Mob: RAC - Oeiras
Crndt: Cap Mil Art Luís Vassalo Namorado Rosa (1935-2018) | Alf Mil Art Fernando António de Sá | Cap Art Manuel Jorge Dias de Sousa Figueiredo
Divisa: -
Partida: Embarque em 01Fev67; desembarque em 06Fev67 | Regresso: Embarque em 19Nov68

Síntese da Actividade Operacional

Em 06Fev67, deslocou-se para Fá Mandinga, a fim de substituir a CCaç 818 e realizar, inicialmente, um curto período de adaptação operacional, sob orientação do BCaç 1888 e actuar depois nas regiões de Xime, Enxalé e Xitole, até 08Mar67.

Após rotação, por fracções, com a CCaç 1439, assumiu em 03Abr67 a responsabilidade do subsector de Enxalé, com pelotões destacados em Missirá, Porto Gole e Bissá, mantendo-se integrada no dispositivo e manobra do BCaç 1888 e a partir de O1Jul67 do BCaç 1912, por alteração dos limites dos sectores daqueles batalhões.

Em 21Dez67, a sede da subunidade foi transferida para Porto Gole, com destacamentos em Enxalé e Bissá, mantendo-se no mesmo sector do BCaç 1912, onde a par de várias operações e acções efectuadas nas regiões de Mato Cão, Mantém, Malafo e Colicunda, orientou a sua actividade para a construção e desenvolvimento dos reordenamentos de Enxalé e Bissá, este a partir de Mar68.

Em 07Nov68, foi rendida no subsector de Porto Gole pela CArt 2411, tendo recolhido seguidamente a Bissau, a fim de aguardar o embarque de regresso.

Observações - Tem História da Unidade (Caixa n." 81 - 2.ª Div/4ª  Sec, do AHM).

Fonte: Excertos de Portugal. Estado-Maior do Exército. Comissão para o Estudo das Campanhas de África, 1961-1974 [CECA] - Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África (1961-1974). 7.º volume: Fichas das Unidades. Tomo II: Guiné. Lisboa: 2002, pág. 450
___________

Notas de L.G.:

(*) Vd. poste de 27 de janeiro de 2022 > Guiné 61/74 - P22942: O que é feito de ti, camarada ? (15): Abel Rei, ex-1º cabo, CART 1661 (Fá, Enxalé, Bissá, Porto Gole, 1967/68), autor do livro, "Entre paraíso e inferno, de Fá a Bissá, memórias da Guiné, 1967/68... O João Crisóstomo manda-te um "hello", de Nova Iorque

`(**) Vd. pposte de 24 de agosto de 2009 > Guiné 1963/74 - P4858: Notas de leitura (16): Memórias do inferno de Abel Rei (Parte III) (Luís Graça)


30 de agosto de 2009 > Guiné 63/74 - P4882: Notas de leitura (18): As memórias do inferno de Abel Rei (Parte IV e última) (Luís Graça)

(***) Último poste da série > 25 de maio de 2023 > Guiné 61/74 - P24339: Tugas, pocos pero locos: algumas das nossas operações temerárias (2): Op Gavião (Madina / Belel, 4-6 de abril de 1968): 300 homens desbaratados pelas abelhas, armas extraviadas, um cadáver abandonado, um homem perdido, etc.

quarta-feira, 12 de abril de 2023

Guiné 61/74 - P24218: As nossas geografias emocionais (3): Fá Mandinga, o "Bairro da Paz", ao tempo do Pel Rec Daimler 1113 e do BCAÇ 1888 (1966/68)... Nunca foi atacado, uma das coroas de glória do "alfero Cabral"... Nem aqui viveu e trabalhou o outro Cabral, engenheiro agrónomo... Foi aqui que se formou a 1ª CCmds Africanos.

Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Bambadinca > Fá (Mandinga) > 1968 > Aqui esteve instalado, de agosto a novembro de 1966, o Pel Rec Daimler 1133 (Fá Mandinga e Bambadinca, 1966/68), comandasdo pel alf mil cav Carlos Manuel de Sá Ramalho; estava então adido ao BCAÇ 1888 e depois ao BART 1904.

Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Bambadinca > Fá (Mandinga) >  1968 >  Outra perspetiva do "Bairro da Paz"... Fotos do álbum do Jaime Machado, ex-alf mil cav, Pel Rec Daimler 2046 (Bambadinca, 1968/70) (*)

Fotos (e legendas): © Jaime Machado (2008).Todos os direitos reservados.[Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Bambadinca > Fá (Mandinga) > 1968 > CART 2339 (1968/69) > Parada do quartel: o grupo de combate do alf mil Torcato Mendonça (1944-2021), cerimónia do arriar da bandeira... Os "Viriatos" estiveram aqui três meses (de fevereiro a maio de 1968) antes de partirem para Mansambo para ali construirem um quartel, novo, de raiz. (**)

Foto (e legenda): © Torcato Mendonça (2009). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

Guiné > Zona Leste > Sector L1 >  Bambadinca > 2.º semestre de 1970 > Velhinhos e periquitos > A rapaziada, à civil, em Santa Helena, nos arredores de Bambadinca, a caminho do bife com batatas fritas da Transmontana e das bajudas de Bafatá. Malta da CCAÇ 12, na sua maioria, e da CCS do BART 2917 (1970/72). Eis a legenda do fotógrafo:

(...) "Passeio dominical à Transmontana, em Bafatá, para ir comer o célebre bife com batatas fritas, pois batatas era um luxo na messe. Reconhecem-se na 2.ª fila da esquerda para a direita: o 1.º não me lembro, o 2.º, de camisola azul, é o Bilocas da Cooperativa de Riba d'Ave, ex-alf mil dos reabastecimentos do BART 2917 [o Abílio Machado, de contabilidade e adminmistração]; o 3.º, fardado, era o alf mil de, julgo, transmissões do BART 2917; e o condutor era o Rocha da CCAÇ 12.

"Na 1.ª fila são todos da CCAÇ 12, a começar pelo José Luís Vieira de Sousa, furriel miliciano, o Zé da Ilha, tocador de viola, baladeiro, hoje mediador de seguros no Funchal; a seguir, o 2.º é o Pedrosa, que era o fur mil mecânico (periquito que foi substituir o nosso 1.º mecânico que era o Joaquim Moreira Gomes, do Porto e que quando cá veio de férias em 69 arranjou uma cunha no Hospital Militar lá no Porto e já não voltou à Guiné); em 3.º temos o Arlindo Teixeira Roda, fur mil, natural dos Pousos-Leiria, mas agora a residir em Setúbal onde dá, ou já deu, aulas (chmávamos-lhe o Tê Rodas); o 4.º é este ilustre vosso servo com 23 ou 24 anos (que saudades!) e vestido de verde, eu que até sou simpatizante, de meia tigela mas sou, do SLB; a seguir em 5.º é o António Manuel Martins Branquinho
 [1947-2103], fur mil. alentejano de Évora (trabalhou no Centro Regional de Segurança Social de Évora); e por último o alf mil José António Gonçalves Rodrigues, já falecido, e que trabalhava no Centro Regional de Segurança Social, aqui em Lisboa na Av Afonso Costa no Areeiro"(...)
 

Guiné >  Região Leste > Região de Bafatá > Sector L1 (Bambadinca) > Fá Mandinga > 1970 >  Era aqui a sede do Pel Caç Nat 63 e da 1.ª Companhia de Comandos Africanos... Diversos furriéis e alferes da CCAÇ 12 e da CCS / BART 2917, de visita a Fá Mandinga (e possivelmente a caminho de Bafatá para almoçar, em traje domingueiro, em meados de 1970: reconheço do lado direito, o alf Machado (CCS) e o alf Abel Maria Rodrigues (CCAÇ 12). Do lado esquerdo, também à civil, de camisola vermelha, o fur António Branquinho 
[1947-2013] e de camisola verde o fur Humberto Reis, ambos  da CCAÇ 12.

Fotos (e legendas): © Humberto Reis (2006). Todos os direitos reservados 
[Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Guiné > Região de Bafatá > Setor L1 > Bambadinca > Carta de Bambadinca (1955), escala 1/50 mil (1955) > Posição relativa de Fá Mandinga, a escassa meia dúzia de quilómetros de Bambadinca, na direção de Bafatá. Ficava na margem esquerda do rio Geba Estreito. Foi, durante anos, sede de batalhões e também Centro de Instrução Militar: nele foi formada, por exemplo, a 1.ª CCmds Africanos.


Guiné > Zona leste > Região de Bafatá >  Setor L1 (Bambadinca) > Carta de Bambadinca (1955) > Escala 1/50 mil > Posição relativa de Nhabijões, Mero e Santa Helena, três tabancas consideradas, desde o início da guerra, como estando "sob duplo controlo", ou seja, com população (maioritariamente balanta) que tinha parentes no "mato" (zona controlada pelo PAIGC) e que recebiam "visitas do mato"...

Em Finete, Missirá e Fá Mandinga havia destacamentos das NT. Entre Bambadinca e Fá Mandinga ficava Ponta Brandão. Havia aqui uma destilaria, de cana de acúcar... Bambadinca era sede de posto administrativo e tinha correios, telégrafo e telefone, além de um posto sanitário ("missão do Sono")... Era, além disso, um importante porto fluvial. Era banhado pelo caprichoso Rio Geba (ou Xaianga), temível em Mato Cão... Até 1968 as LDG da Marinha chegavam até lá... Depois, já em 1969, ficavam-se pelo Xime que passou a ter "porto fluvial" (na realidade, um cais acostável)... De Bambadinca a Bafatá (cerca de 30 km) a estrada era já alcatroada... no tempo da CCAÇ 12  (1969/71).

Infografias: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2014).


1. Esta série é dedicada à(s) "Memória(s) dos lugares"... Logo no princípio do nosso blogue, tínhamos, na badana (ou coluna estática) do lado esquerdo uma listagem (com links) de lugares por onde passámos, documentados com fotografias e infografias...

Ia já em 24 topónimos, mas faltavam muitos mais... Começámos a sua recuperação com o topónimo Bafatá, e depois Bambadinca.(***)

As imagens estavam originalmente alojadas na página pessoal do nosso editor, Saúde e Trabalho - Luís Graça, no servidor da ENSP/NOVA. Foi descontinuada, em 2022, com o redesenho da página oficial da instituição. Estamos agora a recuperá-la através das capturas feitas pelo Arquivo.pt, bem como dos ficheiros originais. É uma tarefa morosa e ingrata...

Luís Graça > Subsídios para a história da guerra colonial > Guiné > Antologia, preservada pelo Arquivo.pt

E vamos aproveitar para refrescar e atualizar os nossos álbuns fotográficos, por topónimos da Guiné (se não todos, pelo menos os principais). Afinal, trata-se de não perder  as nossas "geografias emocionais". Muitas das fotos que vamos publicando estão dispersas. São de diferentes autores e anos... É agora a altura de as tentar reunir.


2. Fá Mandinga ficava na margem esquerda do rio Geba Estreito. Durante anos foi sede de batalhão (ou de subunidades de diversas armas: infantaria, cavalaria, artilharia), sucedendo-lhe Bambadinca (como sede do Sector L1). 

E, mais tarde, foi centro de instrução militar: no 1.º semestre de 1970, foi lá que se formou a 1.ª CCmds Africanos, comandada pelo cap graduado 'comando' João Bacar Jaló. Foi de lá  que partiu, a 1.ª CCmds Africanos, para a aquela que viria a ser mais tarde, em 22 de novembro de 1970, a Operação Mar Verde (invasão anfíbia de Conacri). E a seguir à 1.ª, vieram lá formar-se as 2.ª e 3.ª CCmds Africanos, com as quais se constituiu mais tarde o Batalhão de Comandos Africanos.

Também foi sede do Pel Caç Nat 63, ao tempo do  nosso glorioso "alfero Cabral" (1969/70), antes de ser transferido para Missirá em meados de 1970. 

Aparentemente  Fá (Mandinga, havia outra, Balanta, perto de Santa Helena) teve um papel discreto na guerra... Pertencia ao regulado de Badora. Ao que parece, nunca foi atacada ou flagelada, contrariamente a Missirá (que já pertencia ao regulado do Cuor).

Durante muito tempo esteve associada, erradamente, ao nome do engº agrónomo Amílcar Cabral. De facto, a estação agrária experimental de Fá tinha boas instalações, entretanto desafetadas com o início da guerra. Mas Amílcar Cabral nunca ali trabalhou, e muito menos lá viveu. Ele e a sua primeira esposa, portuguesa, Maria Helena Rodrigues, silvicultora, viveram e trabalharam na estação agrária experimental de Pessubé, nas imediações de Bissau, entre setembro de 1952 e março de 1955, como recordou o nosso amigo Pepito, também ele engenheiro agrónomo (1949-2014) (****)

Também houve aqui, em tempos (1947), uma moderna serração mecânica, do empresário Fausto da Silva Teixeira, antigo deportado político.


Guiné - Bissau > Regiáo autónoma de Bissau > Pessubé >2013 >  Fotografia atual da casa onde Cabral e Maria Helena viveram na Granja Experimental de Pessubé, de 400 hectares.  Num notável artigo sobre o Amíllcar Cabral enquanto engenheiro agrónomo na Guiné, o nosso amigo Pepito (1949-2014) escreveu:

(...)  Ele e Maria Helena instalam-se na casa da Granja Experimental do Pessubé, atribuída ao seu diretor, na altura situada muito longe do centro de Bissau, num bairro popular da periferia e numa zona isolada e de difícil acesso. A Granja dispunha de cerca de 400 ha onde existia grande número de essências florestais e um pequeno número avulso de algumas espécies frutícolas, como por exemplo cacaueiros.

Nesta altura, quando começa a exercer a sua profissão, Amílcar está convencido de que o processo de independência decorrerá de forma pacífica, nos moldes como se virá a processar nos outros países africanos, pelo que decide começar a construção do novo edifício conceptual agrícola que iria substituir gradualmente o modelo colonial existente.

A Granja de Pessubé vai ser o ponto de partida, para começar a pôr em prática uma estratégia, em três vertentes principais, que ele considera importantes para o desenvolvimento da agricultura guineense- (...) (****)

Foto (e legenda): © Carlos Schwarz (2013). Todos os direitos reservados, [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Unidades que passaram por Fá Mandinga 

Unidade
Origem
Chegada
Saida
Destino
BCaç  697 -   CCS
RI 15
Jul 64
Abr 66
Fim comissão
CCaç   674
RI 16
Jul 64
Jul 64
Fajonquito
CCav    678
RC 7
Set 64
Jan 65
Ponta do Inglês
Pel Rec  Daimler 809
RC 6
Nov 64
Jan 66
Dulombi
BCaç 1856 - CCaç 1417
RI 1
Set 65
Mai 66
Bajocunda
Pel Mort 1028
RI 2
Set 65
Nov 66
Bambadinca
BCaç 1888 -  CCS
RI 1
Abr 66
Nov 66
Bambadinca
BCav  705 - CCav   702
RC 7
Abr 66
Mai 66
Fim comissão
BCaç 1887 - CCaç 1547
RI 1
Mai 66
Set 66
Bula
Pel Rec Daimler 1133
RC 6
Ago 66
Out 66
Bambadinca
BCaç 1887 - CCaç 1546
RI 1
Out 66
Dez 66
Bissau
BCaç 1888 - CCaç 1551
RI 1
Nov 66
Jan 67
Xitole
BCaç  1894 - CCaç 1589
RI 15
Dez 66
Abr 67
Madina do Boé
CCaç   817
BC 10
Jan 67
Fev 67
Fim comissão
CCaç   818
BC 10
Jan 67
Fev 67
Fim comissão
CArt  1661
RAC
Fev 67
Abr 67
Enxalé
BCaç 1912 – Ccaç 1685
RI 16
Abr 67
Out 67
Fajonquito
CCaç 1426
RI 16
Abr 67
Mai 67
Fim comissão
CCaç 1439
BII 19
Abr 67
Mai 67
Fim comissão
BArt 1913 - CArt 1689
RAP 2
Mai 67
Jul 67
Catió
BArt  1904 - CArt 1646
RAP 2
Ago 67
Jan 68
Xitole
BArt  1904 - CArt 1646
RAP 2
Set 67
Out 69
Fim comissão
BCaç 1933 - CCaç 1790
RI 15
Out 67
Jan 68
Madina do Boé
BCaç 1888 - CCaç 1551
RI 1
Nov 67
Jan 68
Fim comissão
CArt  2338
RAL 3
Jan 68
Abr 68
Nova Lamego
CArt  2339
RAL 3
Fev 68
Mai 68
Mansambo
CCaç 2383
RI 2
Mai 68
Jul 68
Nova Lamego
CArt  2413
RAP 2
Ago 68
Set 68
Xitole
BCaç 2852 - CCaç 2405
RI 2
Dez 68
Dez 68
Galomaro
BCaç 2851 – Ccaç 2403
RI 1
Fev 69
Abr 69
Mansabá
1ª CCmds Africana
CTIG
Jul 69
Jul 69
Bajocunda
1ª  CCmds Africana
CTIG
Set 70
Jul 71
Brá
Pel Caç Nat  52
CTIG
Jan 71
Jul 71
Missirá
2ª CCmds Africana
CTIG
Abr71
Out 71
Brá
3ª CCmds Africana
CTIG
Abr 72
Set 74
Extinção  Unidade
Pel Caç Nat   52
CTIG
Abr 72
Jul 72
Ponte R Unduma
Pel Caç Nat 63
CTIG
Jul 69
Ago 74
Desativada
BArt 3873 - CArt 3493
RAP 2
Dez 73
Jan 74
Bissau

Fonte: José Martins (2014) (com correções do nosso saudoso Jorge Cabral: (i) O Pel Caç Nat 63 foi para lá em julho de 1969; e  (ii) a 1ª CCmds Africanos chegou em fevereiro de 1970.


3. Estranhamente não temos muitas fotos de Fá Mandinga, a não ser as que se salvaram do álbum do Jorge Cabral (1944-2019). Mas temos cerca de 150 referências a este topónimo.

Em contrapartida, temos alguns descrições do aquartelamento. Escolhemos três:

(i) Armandino Alves [1944-2014] , ex-1.º Cabo Aux Enf,
CCAÇ 1589 (1966/68)

(...) Sobre o Aquartelamento de Fá Mandinga, ainda recordo que:

Em Dezembro de 1966, a minha CCAÇ 1589, recebeu guia de marcha para Fá Mandinga.  Embarcámos em Bissau numa LDG em direcção a Bambadinca e daí seguimos em viaturas, pela estrada em terra batida, que estava a ser aberta pelo Batalhão de Engenharia, em direcção a Bafatá [mais tarde alargada e asfaltada, no 2º semestre de 1967].

A certa altura virámos à esquerda e entrámos na picada que nos ia levar a Fá. Era tão estreita que mal lá cabiam uma GMC ou uma Mercedes. Passámos o Aquartelamento de Fá de Cima e começámos uma íngreme descida até Fá de Baixo.

O Aquartelamento era constituído por 4 grandes barracões, dois de cada lado, com uma grande parada no meio. À volta era só capim, que era preciso desbastar para podermos ver mais longe e evitar surpresas “desagradáveis”, embora o pessoal de Fá de Cima nos protegesse pois, devido à sua posição no cimo da colina, viam muito mais longe. Mas, pelo que eu sei, Fá nunca foi atacada.

A partir daqui fizemos várias operações, com outras Companhias que tinham a sua base em Porto Gole. A maior delas foi à mata do Saraoul, durou 10 dias e foi feita a nível de Batalhão.

(...) Pouco tempo depois recebemos guia de marcha para Madina do Boé.

Quanto ao quartel de Fá, lembro-me que o 1.º barracão se situava do lado direito de quem entrava no quartel e servia de caserna dos praças e quartos dos sargentos, e o 2.º destinava-se aos Comandantes e, creio que também, a camarata dos oficiais.

Nas traseiras do 1.º barracão estava instalado o “meu” Posto de Socorros e o reboque com o material de Campanha do SS, que nunca foi usado. O 2.º pavilhão, do lado esquerdo, só estava meio ocupado por nós, pois a outra metade estava vedada com rede e tinha guardado o material, para a fazenda do Amílcar Cabral [informação errónea, já que o eng agr Amilcar Cabral nunca trabalhou aqui, mas sim na Granja de Pessubé, a norte de Bissau (LG)].

Não me lembro onde ficavam a cozinha nem as oficinas auto. (...) (*****)


(ii) Torcato Mendonça  [1944-2021], ex-alf mil art, CART 2338 
(Fá Mandinga e Mansambo, 1968/69)

(...) Finalmente chegaram. Já a tarde ia alta e Fá Mandinga aí estava. Não parecia um aquartelamento. A entrada tinha a cancela com arame farpado, uma leve protecção para o militar da porta de armas e, enquanto rolavam aquartelamento dentro, iam aparecendo os edifícios adaptados à tropa. 

Coluna parada e ordem para desembarcarem. Deu-se então o reencontro com um alferes e um sargento que, umas semanas antes, por via aérea os tinham precedido a fim de tratarem das burocracias e instalação da Companhia Independente. Tiveram recepção calorosa e a vida, de burocracias e instalação facilitada. Breve formatura, material diverso arrumado e está a tratar da instalação. 

A ele e ao outro alferes indicaram-lhe uma “vivenda”. Já lá estava o outro alferes instalado. A dita vivenda, certamente de algum antigo colaborador de Amílcar Cabral, tinha quartos para os alferes, messe de oficiais e sargentos, cozinha e arrumos e duas ou três casas de banho. Não sabia que aquele quarto, que agora ocupava e onde ia arrumando as suas roupas, livros e demais haveres, seria o primeiro e único quarto onde viveu na Guiné. Nunca mais teve tal luxo. No futuro seria o abrigo, a morança das tabancas ou, se pernoitasse em Bambadinca ou noutra cidade, lá teria o quarto de empréstimo. Houve outros poisos mas são outras vidas… 

Bateram à porta e disse: 
- Entre. 

Abre-se a porta e aparece um africano com um sorriso alvar e franco. 
- Sou o Lali e trabalho aqui para os oficiais. Venho acender o Lion Brand. 
- Vem acender o quê? - disse. 

O Lali ria, mostrava uma caixa e disse: 
- É para os mosquitos fugirem. 

Foi a vez de ele rir. Depois de acender, perguntou se ele precisava de alguma “coisa”. 

- Sente-se aí, que quero fazer umas perguntas. 

De pronto o Lali respondeu: 
- Não posso sentar… 

Olhou-o e compreendeu.
 - Logo falamos então. 

Saiu e dirigiu-se às instalações do Grupo, apanhando o ar, ainda quente, do final da tarde, sentindo aqueles cheiros e sons tão diferentes. Estava tudo a correr bem, conversaram um pouco, viram escalas e serviços e sentia-se, os outros também certamente, deslocado naquele ambiente. Depois do jantar veio até cá fora um pouco e não tardou a regressar ao quarto. Agora é que era e “a dança ia começar”. (...) (**)


(iii) António Eduardo Ferreira (ex-1.º Cabo Condutor Auto,
CART 3493/BART 3873, Mansambo, Fá Mandinga, Cobumba 
e Bissau, 1972/74) 

(...) Em Fá Mandinga, local onde passámos "uma espécie de férias”, existiam instalações de grandes dimensões em que as telhas que as cobriam, pelo menos algumas, tinha sido fabricadas na então metrópole, na região de Porto de Mós, onde existiam muitas fábricas, o que me tocava ainda mais dada a proximidade da minha terra. 

Existia também no local, um espaço em mau estado com vários motores inoperacionais que noutro tempo ali teriam funcionado para produzir energia. Um pouco mais abaixo, junto à bolanha, havia mais instalações, onde os padeiros da nossa companhia iam fazer o pão. Creio que não estou errado… foi há muito tempo...

Dizia-se que aquelas instalações pertenciam a Amílcar Cabral quando a guerra começou. Mas diziam-se tantas coisas…

Durante o tempo que lá estivemos, para além do pessoal da cozinha e os padeiros, não me lembro que mais alguém tivesse feito qualquer serviço, eu sei que não fiz assim como os outros condutores. Mas o lado psicológico não deixava ninguém tranquilo. A mais pequena coisa... levava a comportamentos nada comuns. 
(...)  (******)
___________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 5 de junho de 2008 > Guiné 63/74 - P2918: História da Cavalaria em Bambadinca (1): Pel Rec Daimler 1133 (1966/68) adido ao BCAÇ 1888 e ao BART 1904 (Jaime Machado)

(**) Vd. poste de 11 de agosto de 2009 > Guiné 63/74 - P4809: Estórias de Mansambo II (Torcato Mendonça, CART 2339) (12): Fá Mandinga, o único sítio onde tive direito ao luxo de um quarto