sábado, 20 de novembro de 2021

Guiné 61/74 - P22734: Os nossos seres, saberes e lazeres (477): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (25): Museu Nacional do Traje: uma viagem do estilo Império aos nossos dias, com leques e cartolas (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 25 de Outubro de 2021:

Queridos amigos,
Neste museu podemos circular pelos sistemas da moda ao longo de mais de dois séculos, há a impressionante riqueza do património alusivo ao estilo Império mas as indumentárias do estilo romântico até praticamente aos nossos dias estão bem expostas e num cuidado enquadramento com adereços e atavios que até despertam apetite para ir ver uma exposição singela, profundamente didática quanto ao uso que as diferentes classes sociais exibem no que põem na cabeça e de como se abanam. Se já fomos ao Palácio do Monteiro-mor com os seus belos jardins, se já percorremos o Museu Nacional do Traje e o Museu Nacional do Teatro, vamos agora dar um salto até ao concelho de Oeiras e falar de poesia, logo dos poetas que falam português e que têm outras nacionalidades.

Um abraço do
Mário



Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (25):
Museu Nacional do Traje: uma viagem do estilo Império aos nossos dias, com leques e cartolas


Mário Beja Santos

No catálogo de uma prestigiada exposição que ocorreu em 1992 no Museu Nacional do Traje e intitulada O Traje Império (1792-1826) e a sua época, a diretora do museu, Madalena Braz Teixeira, justifica na apresentação o porquê da valiosa coleção de traje Império, são em parte peças provenientes da Casa Real, transferidas após a queda da monarquia para o Museu Nacional de Arte Antiga, então designado como Museu de Belas-Artes. E observa igualmente as razões do acervo:
A permanência desta indumentária em território nacional está ligada a duas travessias do Atlântico: a primeira, motivada pela partida da família real para o Brasil, em 1807, deixando parte do seu guarda-roupa nos palácios reais e a segunda, devida ao apreçado regresso de D. João VI a Portugal. As vestes reais trazidas nas bagagens do rei, foram de imediato guardadas pois se encontravam irremediavelmente fora de moda. Reunidas ou não pelo grande amador das artes e antiguidades que foi D. Fernando II, o certo é que a coleção da Casa Real se encontrava em 1910 no Palácio das Necessidades. Este traje de corte ganhou o favor de objeto museológico, foi depois transferido para o Museu dos Coches onde se encontravam librés e trajes de cocheiros e sotas.

Deste traje Império já aqui se fez referência, marca uma rotura substancial com as indumentárias até então proeminentes, aboliu-se a cabeleira postiça, a profusão dos atavios e o uso de calções, no masculino apareceram as calças compridas e desapareceram as rendas dos punhos, o vestido rompeu com as formas rococó, passou a ser vincadamente neoclássico, recriou a moda grega e romana, tendo optado pela silhueta evocadora das vestais: linhas direitas, cintura alta, tecidos transparentes. A indumentária masculina virilizou-se, a feminina assume os novos tempos com grande liberdade, não há nem barbas de baleia nem anquinhas. Em Portugal tudo isto foi um processo marcado pela lentidão, D. Carlota Joaquina ainda sonhava com o passado, apresentava-se em público com tecidos indianos, o que já não acontecia nem em França nem em Inglaterra.

Como docente que fui em matérias de consumo, era obrigatório, sobretudo com o advento da industrialização, ir observando as modificações do gosto e os imperativos da moda em função quer das alterações sociais e dos respetivos estatutos, dá-se inclusivamente mudanças significativas no romantismo que envolvem a casaca, o calção, o colete, os lenços, a camisa de peitilho, o desaparecimento do bicórnio, depois do estilo Império o colete de abas e casaca modificam-se, o próprio calçado se adapta à calça longa e os símbolos inerentes às bolsas de senhora, luvas e leques, mesmo os xailes e a própria ourivesaria, registam novos códigos, dir-se-á que do romantismo se avançará para uma simplificação da indumentária que mudará completamente de look e natureza logo no fim da I Guerra Mundial. É esse o prazer que sinto com este percurso museológico e museográfico tão bem adaptado à compreensão de como evoluímos no gosto de vestir e cuidar da aparência nos últimos dois séculos
.


Importa não esquecer que estamos no Palácio Angeja-Palmela, não visitaremos nem cozinhas nem quartos mas podemos contemplar a capela e ali ao pé uma bela vitrina de objetos religiosos, obviamente que interessa dar atenção ao vestuário das imagens, elas também mudam e sofrem as vicissitudes do gosto.
Irrecusável não fotografar este atavio feminino, marca de distinção, é publicidade da Casa Mimoso, reporta-se ao inverno de 1908-09, as plumas marcam sensação, veja-se a figura central, o manifesto cuidado em mostrar o colo de graça e ombros enchumaçados.
Muito provavelmente vestia-se assim ao tempo de António Feliciano de Castilho, Júlio Dinis ou Camilo Castelo Branco, os tecidos podem ser ricos, há as reminiscências do estilo Império, encontraram-se formas de introduzir elementos na sobriedade, no homem a calça e a casaca chegarão ao século XX, com adaptações, é traje para qualquer cerimónia, a aristocracia e a burguesia rica vestem assim inclusivamente à mesa.
É para isto que serve a pedagogia da exposição, ao fundo um quadro de Veloso Salgado anuncia três gerações e complementarmente vamos vendo a evolução da moda, dos sapatos, dos chapéus, dos atavios. A saia vai subir, vão desaparecer os corpetes.
Chegamos aos Anos 20, vestidos para dançar o Charleston, todo este vestuário começa a ganhar multifuncionalidade, já não estamos nos tempos da rainha D. Amélia que era obrigada a mudar várias vezes a roupa por dia, de acordo com as obrigações. E décadas depois, a Coco Chanel imporá uma linha revolucionária, o tailleur, o saia e casaco, morreu a obrigação da mulher sair do trabalho e ter que ir a casa pôr outro vestuário para ir ao jantar mundano ou ao teatro.
Não é por acaso que se mostram aqui os chapéus, dentro em breve iremos a uma exposição de leques e chapéus, desapareceu a cabeleira farfalhuda, é um corte simples que permite um chapéu quase touca, marca um fenómeno de graciosidade, vai ser assim até aos anos 30 e mesmo 40, é um atavio que rapidamente marca o código social. No fundo, já estamos no século da mulher, são penteados e chapéus que anunciam uma visão da liberdade.
Um belo mostruário das mudanças operadas pouco mais de um século
Estamos agora na exposição, patente num anexo do Palácio Angeja-Palmela, com imensa simplicidade e buscando uma apreensão clara entre o que se veste, o que se põe na cabeça e o adorno que será sempre cúmplice das diferentes camadas burguesas – o leque, iremos percorrer os grupos populares do continente e ilhas, a importância do chapéu e do leque ao longo de décadas, e quais os seus códigos de representação, até chegarmos a uma vitrina com um mostruário multicultural, a eloquência das imagens e o elucidativo dos objetos permitem ver esta exposição e captar a simplificação do nosso tempo, a despeito de que a moda não morreu e está sempre a dar nas suas contorções as mais vibrantes provas de vida.
(continua)
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Nota do editor

Último poste da série de 13 DE NOVEMBRO DE 2021 > Guiné 61/74 - P22715: Os nossos seres, saberes e lazeres (476): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (17) (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P22733: Agenda cultural (789): Música afro-mandinga, com Mamadu Baio (voz e guitarra acústica) e João Graça (violino): hoje, das 20h30 às 22h30, no Com Calma - Espaço Cultural, Benfica, Lisboa




1. Hoje, sábado, dia 20 de novembro,  das 20h30 às 22h30, haverá nova sessão de música afro-mandinga  (*). Com o Mamadu Baio (guitarra acústica e voz) e e João Graça (violino) (**).

Local: @ Com Calma - Espaço Cultural, em Benfica (Lisboa). 

O Com Calma é um espaço associativo e cultural localizado em Benfica. Desde 2015 que é um local de promoção cultural, aberto ao debate e à partilha de conhecimento. Aqui podes Estar, Debater, Conviver, Ler, Petiscar, Aprender, Ouvir, Beber e Dançar... 

Com Calma - Horário: Quintas, sextas, sábados e domingos das 16h às 23h30

Com Calma - Espaço Cultural: Rua República da Bolívia nº5C 1500-543 Lisboa

O João Graça (médico e músico, ex-Melech Mechaya) tem 125 referência no blogue, e o Mamadu Baio 17. Ambos são membros da nossa Tabanca Grande. Conheceram-se em meados de dezembro de 2009, quando  o João foi à Guiné-Bissau e esteve na mítica tabanca de Tabatô, berço de grandes músicos, como o Mamadu Baio, que na Guiné-Bissau era então o líder do grupo Super Camarimba.

Ouvir aqui um "cheirinho" dos Super Camarimba, no vídeo (11' 03'') alojado em You Tube >  Jorge Ferreira (Cortesia do autor, membro da Tabanca Grande) (***). Mamadu Baio, com a colaboração de João Graça e outros músicos, está a gravar um segundo CD.


Guiné-Bissau > Bissau > 17 de dezembro de 2009 > Mamadu Baio, líder dos Super Camarimba, "experimentando" o violino do João Graça , instrumento que ele muito provavelmente nunca tinha pegado antes...

Foto (e legenda): © João Graça (2009). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

(***) Vd. poste de 5 de outubro de 2018 > Guiné 61/74 - P19071: Vídeos de guerra (17): "Buruntuma, algum dia serás grande", de Jorge Ferreira, no You Tube, com música de Mamadu Baio

Guiné 61/74 - P22732: (Ex)citações (396): A maldição da canoa papel está ainda na cabeça daqueles guineenses, etnocêntricos e xenófobos, que continuam a ter muita dificuldade em aceitar a unidade na diversidade (Cherno Baldé, Bissau)



Guiné > Bissau > s/d [. c 1960/70] > "Praça Honório Barreto e Hotel Portugal"... Bilhete postal, nº 130, Edição "Foto Serra" (Colecção "Guiné Portuguesa") (Detalhe).... Colecção: Agostinho Gaspar / Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2010).

A Praça, com o nome do "colonialista" e "esclavagista" Honório Barreto (1813-1859) (um guineense, de mãe guineense e pai cabo-verdiano, que foi governador do território, ou nelhor, capitão-mor do Cacheu, e também de Bissau,  por diversas vezes, e que como tal defendeu a integralidade da terra que é hoje a Guiné-Bissau, o que não impediu de, um século depois depois, ter sido diabolizado pelo PAIGC), seria rebatizada, em 1975, como Praça Che Guevara, um "internacionalista revolucionário", de origem argentina, e herói da revolução cubana,  que nunca pôs os pés na Guiné... 

E era aqui, neste sítio da  Bissauvelha,  onde, dizia a lenda, estaria enterrada a canoa papel...  Recorde-se a maldição lançada pelos balobeiros papéis: "Quando os estrangeiros se forem embora, esta canoa tem que ser desenterrada, e feita uma cerimónia para acabar com esta maldição, senão nunca mais haverá paz e felicidade na Guiné, por isso os pais têm que passar estas palavras para os seus filhos. Não se podem esquecer de fazer a cerimónia!" (*)
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Foto (e legenda): © Luís Graça (2009). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

1. A propósito de "a lenda da canoa papel", aqui (re)contada, no  Poste P22726 (*), comentou o Cherno Baldé:


 [ Cherno Baldé: nosso colaborador permanente, e nosso especialista em questões etno-linguísticas, nasceu no chão fula, e é muçulmano; tem formação universitária tirada na antiga União Soviética e em Portugal; é e um acérrimo crítico dos "demónios étnicos" que estão longe de ter sido esconjurados e expulsos do seu país;  além disso, é  membro da nossa Tabanca Grande desde 16/8/2009; com mais de 235  referências no nosso blogue, é autor da notável série "Memórias do Chico, menino e moço"]

Pudera que fosse só uma lenda como todas as lendas do mundo, mas na realidade trata-se de uma maldição com contornos reais na vida politica e social do nosso país e que impregnou fortemente o núcleo da ideologia e dos dirigentes do Paigc que dirigiram o país com mão de ferro. 

Inclusive a própria constituição está contaminada com os resquícios desta xenofobia anti-alienígena que pode constituir um forte obstáculo a construção dos fundamentos da unidade nacional. O ambiente politico e social na Guiné-Bissau ainda respira este sentimento que está associado as origens e a manutenção da lenda da canoa papel.

A lenda dá enfâse ao nome de N'tsinha Té, ou Intchinate,  que conseguiu vencer os rivais e ocupar o lugar do conhecido rei Papel, Bacampoló Có, quem, na realidade, teria concedido o terreno para instalação dos portugueses. Todavia o N'tsinha Té ter-se-ia notabilizado devido ao seu temperamento belicoso que criou sérios problemas na construção do forte, arrastando-se ao longo do tempo desde o séc. XVII.

Também é preciso dizer que, entre os "indígenas" da Guiné não existiam os conceitos de compra e venda quando se tratava da terra, pois que. não sendo seus reais detentores, de forma alguma podiam alienar um bem colectivo (comunitário) à guarda dos espíritos (Irãs). Esta incompreensão criou mal-entendidos e gerou muitos conflitos, mormente na Guiné, dita portuguesa.

Se há uma característa que particulariza os povos do litoral (ditos animistas) em relação  aos do interior (muçulmanos) é o forte espírito de ligação ao seu Chão (o solo) e o sentido patrimonialista que os leva, não raras vezes, a ostracizar os seus próprios compatriotas oriundos de outros Chãos do mesmo país. E isto reflecte-se imenso nas disputas políticas, eleitorais o que, muitas vezes, empresta o modo étnico-tribal como as diferentes comunidades e grupos sociais se posicionam no terreno político-partidário. 

O Paigc, designadamente, apesar do discurso aparentemente apaziguador e unitário nunca foi seguido de uma prática de justiça e de governação unificadoras, dai o desnorte e cacofonias actuais.

No âmbito da politica de reconstrução pós-independência empreendida pelo partido único, fui professor voluntário, na regiāo de Biombo, de 1981/85, e só muito tardiamente constatei que era visto e tratado como um estrangeiro e, sempre que prestava um serviço ou fazia um favor a alguém, no fundo, era percebido como uma obrigação, o pagamento do direito que me concediam pelo direito de viver no seu Chão, igual ao 'Dacha" que exigiam aos portugueses que viviam nas suas terras. 

Esse é o espírito patrimonialista típico do guineense e que, porventura, pode ser muito mais acentuado nos grupos do litoral, designadamente entre os Papéis de Bissau, e quiçá da região de Biombo.

Para terminar, quero confirmar que, efectivamente foram feitas escavações na rotunda Che-Guevara (antiga praça Honório Barreto),  após o golpe de 14 de Novembro de 1980 e foi um desperdício de tempo e dinheiro. A canoa que buscavam no interior da terra, na realidade, estava na cabeça das pessoas que têm dificuldades enormes em aceitar a unidade na diversidade que é a maior riqueza da Guiné-Bissau e a única via para a construção de uma nação forte e unida.(**)

Com um abraço amigo, Cherno Baldé (***)
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Notas do editor:

(*) Vd. poste da série > 18 de novembro de 2021 > Guiné 61/74 - P22726: "Lendas e contos da Guiné-Bissau": Um projeto literário, lusófono e solidário (Carlos Fortunato, presidente da ONGD Ajuda Amiga) - Parte VIII: A lenda da canoa papel (...ou a maldição da pátria de Cabral)

(**) Vd. também postes de :


sexta-feira, 19 de novembro de 2021

Guiné 61/74 - P22731: O cruzeiro das nossas vidas (31): a minha viagem (pacífica) no N/M Ambrizete, de 3 a 9 de novembro de 1970, com partida (atribulada) oito dias depois do programado (Hélder Sousa, ex-fur mil trms, TSF, Piche e Bissau, 1970/72)


N/M Ambrizete, navio misto, da SG, Grupo CUF

Fonte: Álbum dos Navios da Marinha Mercante Portuguesa (Publicado pela Junta Nacional da Marinha Mercante em Junho de 1958). Reproduzido aqui com a devida vénia...

Construído em 1948 na Inglaterra, tinha cerca de 138 metros de comprimento e 5500 toneladas de arqueação bruta. Deslocava-se a uma velocidade de 13 nós (1 nó = 1 milha náutica/hora = 1,852 quilómetros/hora), tinha 37 tripulantes e pertencia à SG, a Sociedade Geral de Comércio, Indústria e Transportes, com sede em Lisboa (Grupo CUF). 

Recorde-se que a CUF - Companhia União Fabril estava representado na Guiné pela Casa Gouveia, adquirida na década de 1920 (1)... Eram cargueiros da SG como o Ambrizete que traziam para a Metrópole a mancarra com que a CUF fazia o seu famoso Óleo Fula (em 1929 conseguiu a autorização para produzir óleo alimentar, em regime de monopólio, e em clara concorrência, desleal, com os produtores de azeite) (*)

1. Texto enviado hoje pelo Helder Sousa (ex-fur mil trms,  TSF, Piche e Bissau, 1970/72):


A minha viagem para a Guiné no N/M “Ambrizete”



por Hélder Sousa


O nosso Amigo e Editor da “Karas”, da Tabanca do Centro, Miguel Pessoa, pediu-me colaboração com um texto para publicação. Entretanto, na procura de inspiração e de recordações, apareceu e li no Blogue “Luís Graça & Camaradas da Guiné” um conjunto de artigos e comentários sobre os navios que foram utilizados no transporte de tropas e de material e das memórias que isso concitavam (**).  A acrescentar, também o Amigo e Editor da Tabanca Grande, Luís Graça, me desafiou a relembrar a minha viagem com as suas particularidades.
Vinheta de propaganda da ARA,
referente à sabotagem do navio
de mercadorias Cunene, Lisboa,
em 26 de outubro de 1970.

Deste modo, juntando “as pontas” e as vontades, aqui me prontifico a fazer isso, tanto mais que as datas relacionadas não andam longe. Também devo referir que alguns aspetos da viagem, principalmente das circunstâncias anteriores à mesma, já foram referidos num dos primeiros artigos que escrevi para o Blogue e a que dei o título de “O último adeus”.

Começando pelo princípio devo dizer que a minha viagem, em rendição individual, estava marcada para
 a manhã do dia 26 de Outubro de 1970 (e ainda é a que figura na caderneta militar). Ora bem, como se podem lembrar, nessa madrugada ocorreu o chamado atentado ao N/M Cunene (**) e, nessa referida manhã, no Cais da Rocha, as dificuldades para os passageiros que deveriam tomar o transporte atribuído eram muitas. Não sei se por causa disso, não me recordo se foi ou não mencionado, a verdade é que o referido transporte, o N/M Ambrizete  estava ancorado no meio do Tejo e para lá chegar isso fazia-se nas lanchas da Sociedade Geral que serviam de comunicação.

O “Ambrizete” era um cargueiro que dispunha de 6 cabinas duplas, 
pelo que levava 12 passageiros, sendo 6 militares das Transmissões (3 Furriéis TSF e 3 TPF), ocupando no conjunto 3 cabinas; uma mãe, que a memória me sussurra ser cabo-verdiana, com 3 filhos,  ocupando 2 cabinas; e a restante era ocupada por dois civis, um homem já maduro que ia de contrato para ir trabalhar para a Tecnil e um outro, mecânico de automóveis, que não sei como, mas arranjou maneira de ir para a Guiné para fugir à perseguição que a sua mulher e o padeiro lá da terra lhe moviam a contas de uma alegada infidelidade conjugal entre ele e a mulher do tal padeiro, tendo a bordo
 apenas a roupa que tinha vestida, pois parece que não teve tempo para mais.

Na hora da despedida no Cais, o pessoal da lancha comentou baixinho para nós militares, que “não era preciso tanta despedida pois não íamos partir hoje”.

Ao chegar ao barco fomos convidados a escolher as cabinas e fomos informados que, devido a vários problemas, como por exemplo uma má distribuição da carga que fazia o barco adornar (inclinar) cerca de 13 graus a bombordo (à esquerda, tomando como referência a proa do navio) e também com uma avaria num dos frigoríficos. Não sei a que se devia a “má distribuição da carga”, se por o barco ter eventualmente largado o cais à pressa, devido à tal ação de sabotagem, para se colocar no meio do rio, ou por terem realmente depositado no porão vários materiais não tendo em conta os seus diferentes pesos, sendo que a carga era de natureza diversa, desde géneros alimentares (alguns chegaram lá à Guiné já em menores condições por não se ter conseguido colocar o frigorífico em boas condições), até bombas para avião, segundo disseram.

Pouco tempo decorrido da chegada a bordo, o cargueiro apontou à foz do Tejo, fazendo crer a quem estava no Cais que era a partida, mas na realidade o que se fez foi andar o resto da manhã e boa parte da tarde a “fazer agulhas” ao largo da baía de Cascais, com vista a tentar melhorar a distribuição da carga. Ao fim da tarde regressou-se ao ponto de partida e, como era 6ª feira, o Comandante do navio disse que quem quisesse podia ficar a bordo mas quem quisesse sair e passar o fim-de-semana em casa o podia fazer, pois durante o sábado e domingo não ia haver saída, mas com a condição de se voltar na 2ª da manhã.

Aqui voltou a haver aspetos que normalmente não aconteceram com a maioria dos que embarcaram nos diversos navios e que foi, por exemplo, o transporte gratuito entre as margens do Tejo nas lanchas que levavam pessoal para Cacilhas e ligavam a Lisboa, facilidades que utilizei.

Os meus outros dois camaradas TSF foram a Setúbal, a casa do Nelson Batalha, pois por coincidência nesse fim de semana o F.C.Porto, clube da simpatia do Manuel Martinho, jogava lá com o Vitória local. Voltaram na 2ª feira, conforme aprazado e já não saíram, a não ser umas escapadas rápidas a Cacilhas nas tais lanchas. 

Eu aproveitei para ir a Vila Franca surpreender e assustar a minha mãe e quando na 2ª feira, 29, voltei, disseram-me nos escritórios da SG que “podia voltar para casa, pois os trabalhos estavam demorados e o melhor era ir telefonando para saber quando seria”, coisa que fiz então diariamente até ao dia 3 de Novembro de 1970, quando recebi a indicação de que “era hoje à noite, e tinha que apanhar, o mais tardar, a lancha das 22:00”.

Durante esses dias do intervalo de tempo fiz várias coisas, sendo que no tal dia 3 de Novembro fui ver um filme no “Tivoli”, com Sophia Loren e Marcello Mastroianni, com o título original em italiano “I girasoli” mas que foi intitulado em Portugal de “O Último Adeus”  e que tratava da busca de uma jovem italiana pelo seu marido dado como desaparecido, quando integrado num batalhão italiano que participava na invasão da Rússia pelas tropas alemãs na 2ª Grande Guerra Mundial. 

Em dada altura do filme vê-se o protagonista, o Marcello Mastroianni, caminhando num campo gelado e encontra alguns corpos congelados de camaradas seus e, quando tenta pegar num deles por um braço,  o mesmo parte-se como um pedaço de gelo. Nesta altura o filme interrompe-se para o intervalo e como já eram cerca das 17:00 horas, hora mais ou menos combinada com os escritórios da SG para o contacto diário da tarde, precipitei-me para o telefone do “foyer” e lá fiz a chamada, referindo com as cautelas necessárias para diminuir a identificação, mas sendo claro que se tratava “do militar que queria saber se a partida para a Guiné estava ou não prevista para hoje”. De lá disseram que sim, com referi no final do parágrafo anterior. 

Não me apercebi que se tinha formado uma fila de pessoas que também queriam telefonar e quando me voltei deparei com vários olhares de comiseração e de quem estava a “olhar para um morto”, pois por esses tempos a palavra “Guiné” era sinónimo de complicações….

Acabado o cinema,  fui jantar com a então minha namorada, num pequeno restaurante próximo de Santa Apolónia, que ainda lá está e que tenho ideia de se chamar “O Farol”, a seguir ela foi apanhar o comboio e eu o transporte para o Cais, onde a lancha me levou ao “Ambrizete”, houve mudança de turno e lá seguiu rumo à Guiné, agora com “apenas” 7 graus de inclinação.

Os meus companheiros de viagem já estavam ambientados, já estavam no barco há muito tempo, mas eu tinha acabado de chegar, vinha de uma despedida, vinha de um filme dramático e não estava com muita disponibilidade para grandes brincadeiras, grandes alegrias e por isso isolei-me, encostado à amurada, a olhar de modo a absorver tudo o que via para poder depois fechar os olhos e rever, e pensar no que o “destino” me poderia reservar.

Nisto, sou surpreendido pela presença do tal homem da Tecnil que me vem pedir para fazer “uma oração de despedida e de pedido de bom acompanhamento para a viagem”, pois os “sacaninhas” dos meus camaradas TSF, que se encontravam no deck superior a gozar a cena,  lhe tinham dito que eu era muito religioso e até tinha estado num Seminário…

Como me apercebi da tramoia,  não quis desiludir, nem tratar mal, o personagem, e lá o deixei contente e satisfeito, com a minha homilia, apesar de por esses tempos me encontrar militantemente afastado da Igreja.

Durante a viagem as refeições normais (geralmente muito boas) mereciam a companhia do Sr. Comandante do navio mas dada a falta de higiene do tal mecânico, que não tinha roupa para mudas, ele comentou haver um cheiro desagradável, o que fez com que se tivesse que “tomar medidas” e explorando a natural curiosidade do “nosso mecânico”,  houve quem o levasse a ver o “veio da hélice”, havendo então elementos da tripulação que aproveitaram para lhe proporcionar um banho de agulheta e depois, enquanto a roupa era lavada e posta a secar, houve que lhe emprestar alguma roupa interior, embora isso o obrigasse a ter as refeições no camarote.

A viagem em si mesma, ressalvando a tal inclinação a que nos habituámos depressa, correu bem. Tenho ideia que se navegou a 13 nós (não sei confirmar), que passámos por entre dois grupos das Ilhas Canárias, que aconteceu por várias vezes sermos presenteados com a companhia exibicionista de peixes-voadores e que durante a noite de 8 para 9 de Novembro ultrapassámos o “Carvalho Araújo” que seguia pachorrento com a sua “carga humana”, sendo que por isso chegámos a Bissau na manhã cedo do dia 9.

Ainda durante a viagem, por força do bom relacionamento e interação que se foi fazendo com a tripulação, numa das primeiras manhãs, aquando do que seria o pequeno almoço, perguntaram se não queríamos um “mata-bicho”. Pensando que se trataria de aguardente ou coisa assim, recusámos, mas lá nos explicaram que era uma refeição mais forte para o pessoal que saía de turno e que à hora do almoço estaria a descansar. Então venha de lá esse “mata-bicho”! Bem… recordo que o primeiro deles foi um “arroz à valenciana” bastante bom, o qual antecedeu então o café e o pão com manteiga habituais.

Pois, sei que nesses aspetos fui bastante beneficiado e protegido pelos “deuses”, com uma viagem quase particular, com uma cabina sem luxos mas funcional e apenas para duas pessoas, com refeições condignas, com a amável companhia do Comandante e suas palavras de conforto, nada comparado com os relatos das miseráveis condições em que viajaram inúmeros militares, principalmente os que tiveram a desdita de ocupar os porões “adaptados” dos navios, mas tendo sido essa a minha realidade, é essa que relato.

A aproximação à Guiné, na penumbra da pré-alvorada, com a visão da vegetação mal definida, o bafo quente que de lá vinha, os sons abafados que, entretanto, também chegavam, ajudavam a criar uma aura de mistério e de apreensão. Depois o barco ficou ancorado ao largo (mais uma vez),  deixando vago o cais acostável para o “Carvalho Araújo”, sendo que a passagem para terra se fez por meio daquelas espécies de pirogas, não sem que o Sr. Comandante se despedisse de todos e de cada um com simpatia e de modo a que o “Ambrizete” ficasse para sempre na memória.

Hélder Sousa
Fur Mil Transmissões TSF


2. Informação complementar do editor:

Reproduz-se aqui, com a devida vénia, a sinopse do filme, acima referido, com a devida vénia ao CineCartaz do jornal Público:

O Último Adeus

Título original:I Girasoli

Género: Drama
Classificação:M/12
Outros dados: ITA/URSS, 1970, Cores, 96 min.

Foi com este I Girasoli que Vittorio De Sica realizou o primeiro filme ocidental rodado na URSS, uma história de amor entre as personagens de Marcello Mastroianni e Sophia Loren. Ela é uma mulher italiana que procura o marido dado como perdido em acção durante a II Guerra. A travessia faz-se por paisagens urbanas e campos de girassóis. Foi o filme mais famoso da dupla de actores. Texto: Cinemateca Portuguesa

Vd. aqui o trailer do filme I Girasoli (1970).
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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 6 de fevereiro de  2008 > Guiné 63/74 - P2509: Estórias de Bissau (15): Na esplanada do Pelicano, a ouvir embrulhar lá longe (Hélder Sousa)

Vd. também poste de 14 de janeiro de 2008 > Guiné 63/74 - P2438: História de vida (9): O Último Adeus ou as peripécias da minha partida no N/M Ambrizete (Helder Sousa)

(***) Vd. 16 de novembro de 2021 > Guiné 61/74 - P22722: A nossa guerra em números (5): o Vera Cruz, o Niassa e o Uíge foram, de um frota de 15 navios, requisitados à marinha mercante, os que asseguraram o transporte de 3/4, da tropa mobilizada para o Ultramar

Guiné 61/74 - P22730: Esboços para um romance - II (Mário Beja Santos): Rua do Eclipse (79): A funda que arremessa para o fundo da memória

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 4 de Novembro de 2021

Queridos amigos,
São os derradeiros episódios em Bambadinca, ou quase. Porque umas boas décadas depois Cherno Suane encarregou-se de me revelar as suas recordações destes últimos tempos da minha comissão, por portas e travessas meteu férias e veio ter comigo a Bissau, que eu não esquecesse que era guarda-costas para toda a vida, como veio a acontecer. Contei a uma fascinada Annette a visita que ele me fez na primeira operação à L4, no Hospital de Santo António dos Capuchos. Apareceu-me com três garrafas de 1,5 L de água e aquilo que me pareceu um cacho de bananas, e quando protestei logo comentou que a água sempre faz falta e que a banana engana a fome, eu estava mesmo com aspecto de que andava a passar fominha, talvez exigências da operação, a banana tudo remedeia. Mas voltando àqueles acontecimentos, diluiu-se aquele primeiro choque da chegada do meu substituto e do protesto da tropa, foi no fundo a última manifestação a que assisti dos graves problemas raciais que não iludiam que a apregoada unidade Guiné-Cabo Verde não passava de um expediente de ocasião. Annette lá vai organizando metodicamente o final da comissão mas já por duas vezes perguntou a Paulo o depois, o que aconteceu depois, aquelas amizades inquebrantáveis, aquele fascínio pela Guiné era impossível extinguir-se. Paulo, meio a sorrir, perguntou-lhe se ela queria exercer o papel de Sherazade, fazer umas mil e uma noites de um afeto interminável e ela prontamente respondeu que se há amores para toda a vida eles merecem ser registados.

Um abraço do
Mário



Rua do Eclipse (79): A funda que arremessa para o fundo da memória

Mário Beja Santos

Annette, mon adorée infiniment, de posse do último alinhamento que fizeste para aqueles últimos tempos de Bambadinca, imagina tu que me ocorreram, inopinadamente, imagens dolorosas da derradeira visita que fiz àquele local onde vivi em permanência de novembro de 1969 a agosto de 1970, o aquartelamento, incluindo a capela, a escola, a mãe de água, a residência do administrador, a messe e o refeitório dos soldados, a rampa para o rio, o edifício dos CTT onde até conseguia telefonar para Lisboa, o estanco do Rendeiro, o estanco do Zé Maria Tavares, onde se realizou o meu almoço de despedida com os meus soldados na véspera de partir para Bissau. Imagens dolorosas, explico porquê. Não vinha à espera de encontrar as instalações cuidadas que tinham sido as dos oficiais e sargentos, mas era um equipamento tão funcional que para mim era inimaginável encontrá-lo em derrocada, ainda por cima estava ocupado por uma unidade militar. Houve um coronel que fez questão de me acompanhar na visita, penso que este senhor a certa altura julgou que eu ia ter um enfarte, foi crescendo uma lancinante crise de choro, soltaram-se impropérios, uns quase uivos ao presenciar aquela inusitada degradação de que trouxe fotografias que te enviei, casas de banho destruídas, canalizações roubadas, a messe e a cozinha em estado escalavrado, toda a ira se avermelhou de cólera no meu rosto, era inacreditável ter-se votado ao abandalhamento um espaço que era aprazível, quartos dignos, boas salas e a comodidade higiénica que dava aquela casa-de-banho. Era uma memória um tanto diacrónica, eu estava a rever aquelas imagens de destruição e a recordar as instalações em que vivi, o quanto suspirava chegar do fornecimento de munições a Taibatá e Demba Taco e ter este aconchego à minha espera, ou do regresso de uma coluna ao Xitole, e depois de termos levado à arrecadação os cunhetes das munições poder limpar a pele e vestir roupa lavada.

E a memória ainda foi mais longe, naquele fim de julho, quando regressei de algures a Bambadinca e alguém me anunciou que chegara o substituto e qual o meu espanto quando encontrei no quarto um jovial cabo-verdiano que não deve ter percebido muito bem a minha inquietação, seguiram-se aqueles momentos que já descrevi, a gente guineense em fúria, propagara-se como rastilho a notícia de quem me vinha substituir, depois de mudar de roupa desci a rampa do quartel e fui com o Nelson Wahnon Reis até à loja do Rendeiro, ali ficámos a bebericar um uísque e a formular as primeiras perguntas e a receber com avidez as primeiras respostas. Era um homem de formação europeia, quis saber quem iria comandar e eu fiz-lhe o gosto, não regateando que iria ter pela frente homens destemidos, a primeira água do valor militar. Tal como eu, tinha estudos interrompidos, quis depois saber o tipo de atividades que nos estavam destinadas, ouviu atentamente os tais destacamentos que havia no Cuor, os aquartelamentos do Xitole e do Xime e Mansambo, desfiei o nome das tabancas em autodefesa, as idas a locais que davam pelo nome de Samba Juli ou Sinchã Mamajã ou Saré Adè, regulados como o Cossé ou Badora, havia também as emboscadas no Bambadincazinho, as noites na ponte do rio Undunduma e as vigilâncias nos Nhabijões e, claro está, de vez em quando uma operação dentro deste vasto setor.

Ouvia-me atentamente, com leveza e discrição levantei o véu dos problemas raciais e ele respondeu com gentileza: “Gostaria muito de ser bem recebido, vê se me podes ajudar junto do pelotão, procurarei fazer o meu melhor, sabendo que há desconfiança da minha origem. Tenho que aceitar a decisão de me terem posto aqui. O que não tem remédio, remediado está”. Seguiu-se mais um uísque, era para desejarmos as maiores felicidades um ao outro. Irei acompanhar nos primeiros meses da nossa separação a vida daquela minha gente. Foram para Fá, não era propriamente um merecido descanso, ali ao lado formavam-se fornadas de Comandos africanos, havia que lhes prestar segurança. Escrevi várias vezes ao Nelson, fez-me a vontade de um pedido especial, que festejasse o Natal, foi cumpridor, enviou mesmo fotografia, enviei-te com o último maço de documentos. Conseguiu-se quebrar naquela última semana de sobreposição o pior das reticências dos soldados, pelas informações colhidas acabaram por se dar bem embora em março de 1971 por razões que nunca alguém me explicou, o Nelson partiu de Fá, com paradeiro incerto.

Adorada Annette, segue também uma folha com uma visita que ocorreu, eu penso que a 24 ou 25 de julho, apareceram em Bambadinca deputados da Assembleia Nacional, quando entrei no bar estava ali sentado e com um copo na mão José Pedro Pinto Leite que eu tinha conhecido nas minhas andanças da Juventude Universitária Católica. A sala completamente vazia, pediu-me para eu me sentar e responder a algumas questões. Com frontalidade, disse-me que queria absoluta franqueza, o governador dera-lhe conta da gravidade da situação, pedia o meu ponto de vista sobre a guerra em curso, falei-lhe do que tinha vivido, lembro-me que até quis saber se havia por ali regiões libertadas, pedi licença e fui buscar vários mapas, mostrei-lhe em concreto onde vivia a população e atuavam as milícias e a tropa da PAIGC na região de Madina e Belel, bem como a partir da mata do Poidom e descendo o Corubal era impensável desalojar civis e guerrilheiros daqueles pontos para nós quase inatingíveis, uma coisa era chegar àqueles abarrancamentos e deitar-lhes fogo, outra coisa ali estacionar, esta era a lógica da guerrilha; e o que me parecia mais grave é que se via perfeitamente que aqueles guerrilheiros não quebravam e que tinham cada vez mais armamento sofisticado.

Agradeceu-me as informações, por duas vezes me deu a saber que iria informar o Presidente do Conselho da gravidade de tudo quanto lhe fora dado ver. Dias depois, veio a notícia da sua morte, seguia num helicóptero que foi tombado por um tornado sobre o rio Mansoa, morreu ele e outros deputados. E tens aí a narrativa de tudo quanto aconteceu nessa última semana, sempre ao lado do Nelson Reis houve um pouco de tudo em patrulhamentos, visitas a tabancas, vigilâncias. Do novo comandante de Bambadinca recebi a anuência de louvar alguns dos meus bravos, guardo os louvores que me saíram do punho e que foram dados a Benjamim Lopes da Costa, Domingos da Silva, Queta Baldé, Manuel da Costa Victória, Quebá Sissé, Cibo Indjai, António da Silva Queirós, minha adorada, enviei-os também num maço de documentos, para meu orgulho impante vieram todos a ser dados por oficiais-generais.

Rememorando todos estes aspetos da sobreposição, fiquei felicíssimo, como disse atrás, por se ter quebrado tão rapidamente o gelo entre os soldados e o futuro comandante, fiz todo o possível durante essa semana em que andámos todos juntos em apresentar um por um as praças e os sargentos ao Nelson. E assim chegou aquela noite da inevitável despedida, já me foi entregue uma guia de marcha, no princípio da tarde do dia seguinte tomarei a lancha Alfange no Xime. Enternecido, ouvirei cumprimentos de despedida e numa curta cerimónia o segundo comandante leu uma proposta de louvor que seguia para Bissau, ouvi tudo de cabeça baixa e as lágrimas a dançarem-me nos olhos. Tens aí a fotografia daquele jovem, Mamadu Soncó, filho do antigo guia e picador Quebá Soncó, há semanas que montou tenda no nosso quarto-camarata, estranhei não ter havido nenhuma queixa dos outros alferes, creio que eles se aperceberam que o jovem estava plenamente convencido que eu o traria para Lisboa, o Mamadu já conversava com toda a gente, era um dado adquirido que o nosso alfero cumpria as suas obrigações com a família Soncó, a que se vinculara.

Na derradeira manhã em Bambadinca passei o termo de responsabilidade para o Nelson, assinámos a papelada necessária, o mesmo fiz na secretaria. E na hora aprazada a coluna saiu de Bambadinca, já me despedira das famílias dos meus soldados, daquela gentil professora primária que tanto apreciava conversar comigo sobre o passado recente da Guiné, ela fora professora no Cuor, quando me dirijo para a coluna vejo o insólito de levar a bandeira portuguesa hasteada, toda a gente fardada num brinco, tudo solicitude, vieram ao quarto buscar as caixas e as malas que transportarei comigo. Haverá muitos acenos pelo caminho, os que estão na ponte do rio Undunduma exigem abraços, o régulo de Amedalai, toda a milícia, um ror de população, veio cumprimentar-me. O mesmo acontecerá no Xime, estou emocionalmente dividido, a guerra acabou, está a entrar por uma nesga da minha alma a saudade inextinguível, despeço-me de todos, noto que o meu guarda-costas desapareceu e explicam-me que ele está em grande sofrimento, o seu maior amigo vai desaparecer da sua vida, nós, os africanos, nosso alfero, não quero que nos vejam a sofrer e muito menos a chorar. Tomo o meu lugar na Alfange, é o último aceno para terra, a lancha começa a viagem, estou terrivelmente só, espacialmente perdido entre aquele passado turbilhonante, a inquietação do presente, os sonhos ardentes do futuro.

Minha adorada, vou agora contar-te um encontro que tive com o Cherno Suane aqui há uns dias atrás, perto do local onde ele trabalha, almoçámos na Pérola de São Paulo, o Cherno fez-me uma surpresa de ter passado a escrito aqueles últimos tempos em Bambadinca, espero que fiques maravilhada com as recordações deste homem que eu amo como um irmão.

Parto dentro de três dias, estou ansioso por saber o que o destino nos reserva, sem qualquer ponta de exagero acho que merecemos que esta oportunidade de trabalhar em Bruxelas se concretize, a despeito da multitude de problemas que tenho para resolver em Lisboa, só que tu, e a felicidade dos meus filhos, se sobrepõem a estes pequenos obstáculos. Vou telefonar esta noite, para te dizer que sonho viver contigo e, quando tu quiseres, casarmos. Un quilomètre de bisous, Paulo.


Aqui houve o bar da messe de oficiais, estamos em Bambadinca
Aqui houve uma cozinha equipada
Aqui funcionou no espaço da cozinha a zona dos fogões
Imagem do corredor que ligava a entrada para os quartos e que se prolongava até à messe dos oficiais
Aqui houve chuveiros e uma casa-de-banho perfeitamente equipada
Foi neste lugar, no início de agosto de 1970, no estanco do Zé Maria Tavares, que ofereci o almoço de despedida aos bravos do pelotão
Rua Oliveira Salazar. Bilhete Postal, Coleção "Guiné Portuguesa, 135". (Edição Foto Serra, C.P. 239 Bissau. Impresso em Portugal, Imprimarte, SARL)
Outra imagem do Bissau Velho, quase na atualidade
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Nota do editor

Último poste da série de 12 DE NOVEMBRO DE 2021 > Guiné 61/74 - P22712: Esboços para um romance - II (Mário Beja Santos): Rua do Eclipse (78): A funda que arremessa para o fundo da memória

Guiné 61/74 - P22729: As Nossas Mães (17): Uma pequena grande prova de amor, um recorte de jornal de Angola (, com a notícia do juramento de bandeira do 1º ciclo do COM), guardado durante mais de meio século na carteira da mãe, recentemente falecida aos 98 anos, do nosso camarada João Rodrigues Lobo

 




Pedaço de jornal, guardado, na sua carteira, pela mãe do nosso camarada João Rodrigues Lobo, durante  mais de meio século: o recorte refere-se ao juramento de bandeira do 1º ciclo do Curso de Oficiais Milicianos, realizado em Nova Lisboa, Angola, na EAMA, no dia 23 de dezembro de 1967...



Região Militar de Angola (RMA) > Nova Lisboa > EAMA (Escola de Aplicação Militar de Angola) > 1º Ciclo do  COM  (Curso de Oficiais Milicianos) > 23 de dezembro de 1967 > Juramento de bandeira... (Capa da revista da RMA, nº 18, janeiro de 1968)

Fotos (e legendas): © João Rodrigues Lobo (2021). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Mensagem de João Rodrigues Lobo:

(i) ex-alf mil, cmdt Pelotão de Transportes Especiais / BENG 447 (Bissau, Brá, dez1967/fev1971);

(ii) fez o 1º COM, no último trimestre de 1967, em Angola, na EAMA, Nova Lisboa, Angola, onde viveu na sua juventude (*); 

(iii) natural de Óbidos, vive em Torres Vedras onde trabalhou durante mais de 3 décadas como chefe dos serviços de aprovisionamento do respetivo hospital distrital;

(iv) é membro nº 841 da Tabanca Grande (**);

(v) a titulo particular, comunicou-nos, há dias, o falecimento da sua querida mãe, no dia 14 do corrente, na Lourinhã:


Data - quarta, 17/11, 15:35 
Assunto - Recordação
 
Boa tarde,

Hoje mais uma vez me vieram lágrimas aos olhos.

Ao verificar a carteira dos documentos da minha Mãe,  encontrei bem lá no fundo este recorte de jornal muito velhinho.

As mães guardavam recordações que desconhecíamos durante tantos anos.

Quis compartilhar com os camaradas.

Um abraço, João.

2. Comentário do editor LG:

João, tiveste a gentileza de comigo  partilhar ha tempos a tua alegria por ter, ainda com vida, saúde e autonomia, a tua mãe de 98 anos... Há dois meses e tal, ela sofreu uma queda, e acabou por ser internada num lar, em Santa Bárbara, perto da Lourinhã... Como bom filho, ias visitá-la,  dia sim, dia não, às terças,  quintas e sábados... 

Não conseguimos agendar uma hora para nos encontrarmo-nos na Lourinhã, estando eu também a fazer fisioterapia todos os dias da semana, da parte da manhã... E tendo de vir com alguma frequência a Lisboa.

Há dias sou surpreendido com a  triste notícia da morte da senhora tua mãe,  aquela notícia  que sabemos que nos vai um dia chegar, mas que não queremos acreditar que um dia nos chegue. Já tive ocasião de, particularmente,  te enviar um abraço de solidariedade na dor, na minha qualidade de teu camarada evvizinho. Mas agora faço-o na qualidade de editor do blogue e em nome da nossa Tabanca Grande. E  venho cumprir  a tua vontade expressa  de partilhar com os nossos leitores esta pequena grande prova de amor de mãe, traduzida num simples recorte de jornal, sem data, mas que sabemos que deve  ser de finais de  dezembro de 1967, e talvez de uma semanário de Nova Lisboa ou de um diário  de Luanda.   

A tua mãe tinha muito orgulho em ti!...Haveremos de nos encontrar na Lourinhã, se possível ainda antes do Natal. (***)
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(**) Vd. poste de 20 de junho de 2021 > Guiné 61/74 - P22300: Tabanca Grande (518): João Rodrigues Lobo, ex-alf mil, cmdt Pelotão de Transportes Especiais / BENG 447 (Bissau, Brá, dez 1967/fev1971)... Fez o 1º COM, em Angola, Nova Lisboa. Vive em Torres Vedras. Senta-se à sombra do nosso poilão no lugar nº 841.

Guiné 61/74 - P22728: Parabéns a você (2005): Mário Migueis da Silva, ex-Fur Mil Rec Inf - CCS/QG/CTIG, BART 2917 e CCAÇ 2701 (Bissau, Bambadinca e Saltinho, 1970/72)

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Nota do editor

Último poste da série de 14 d4e Novembro de 2021 > Guiné 61/74 - P22717: Parabéns a você (2004): César Dias, ex-Fur Mil Sapador Inf da CCS/BCAÇ 2885 (Mansoa e Mansabá, 1969/71); Jacinto Cristina, ex-Soldado At Inf da CCAÇ 3546/BCAÇ 3883 (Piche e Camajabá, 1972/74) e Maria Arminda Santos, Ex-Tenente Enfermeira Paraquedista (1961/1970)

quinta-feira, 18 de novembro de 2021

Guiné 61/74 - P22727: Agenda cultural (788): Convite para a apresentação do livro "Guerra, Paz... e Fuzilamentos - Guiné - 1970-1980", de Manuel Amaro Bernardo, a ter lugar no dia 25 de Novembro, pelas 17h30, na Bibilioteca Municipal António Ramos Rosa, Rua Pintor Carlos Porfírio, 20, em Faro

C O N V I T E



Post Scriptum do Coronel Manuel Amaro Bernardo:
Em 16DEZ2021, pelas 15H00, ocorrerá outra sessão na Livraria Municipal Oeiras/Programa Fim do Império, em que o apresentador será o Coronel "Comando" Raúl Folques.

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Nota do editor

Último poste da série de 4 DE NOVEMBRO DE 2021 > Guiné 61/74 - P22686: Agenda cultural (787): Mamadu Baio Trio, sábado, dia 6, 20h00, no Camones CineBar, Graça, Lisboa... Música autoral afro-mandinga, um novo projecto dos nossos grã-tabanqueiros João Graça e Mamadu Baio, a que se junta o Avito Nanque

Guiné 61/74 - P22726: "Lendas e contos da Guiné-Bissau": Um projeto literário, lusófono e solidário (Carlos Fortunato, presidente da ONGD Ajuda Amiga) - Parte VIII: A lenda da canoa papel (...ou a maldição da pátria de Cabral)




A lenda da canoa papel: 
 ilustrações do   pintor guineense Lemos Djata (pp. 55 e 57): Lemos Mamadjã Hipólito Djatá, de seu nome completo,  conquistou a Medalha de Ouro para a Guiné-Bissau em Paris, França, numa exposição coletiva organizada pela “Associação da Amizade e das Artes Galego Portuguesa”, que decorreu na capital francesa entre os dias 5, 6 e 7 de Outubro 2018, na sala de exposições do "Carrousel du Louvre". 

Nascido em Bafatá, em 1981, filho de Hipólito Djata e de Mariama Foli Baldé. é licenciado em Línguas Estrangeiras Aplicadas, pela  Universidade de Évora. Só em 2000 é que descobre o seu talento artístico. É pintor e escultor.


1. Transcrição das págs. 55-57 do livro "Lendas e contos da Guiné-Bissau", com a devida autorização do autor (*)


J. Carlos M. Fortunato >
Lendas e contos da Guiné-Bissau



O autor, Carlos Fortunato, ex-fur mil arm pes inf, MA,
CCAÇ 13, Bissorã, 1969/71, é o presidente da direcção da ONGD Ajuda Amiga



Capa do livro "Lendas e contos da Guiné-Bissau / J. Carlos M. Fortunato ; il. Augusto Trigo... [et al.]. - 1ª ed. - [S.l.] : Ajuda Amiga : MIL Movimento Internacional Lusófono : DG Edições, 2017. - 102 p. : il. ; 24 cm. - ISBN 978-989-8661-68-5


A lenda da canoa papel  
(pp. 55/57)


Segundo reza a lenda transmitida oralmente pelos papéis, quando os portugueses chegaram à Guiné, os contactos que estabeleceram com os papéis da ilha de Bissau foram amigáveis e estes até lhes cederam um terreno para se poderem instalar e negociar. 
Podem ficar com este terreno  disse o Rei Insinhate (31). 

Nesse terreno está hoje o Forte da Amura, mas naquele tempo era um antigo curral, o que serviu para os papéis se divertirem, fazendo troça dos novos moradores. 

Com o tempo, o poder dos portugueses foi crescendo, e começaram a exercer o seu domínio sobre todas as terras circundantes (32). Os papéis ficaram revoltados, porque os estrangeiros diziam que agora era tudo deles, e decidiram partir para a guerra. 
– Os estrangeiros querem roubar o nosso chão, querem cobrar impostos, temos que os expulsar! – diziam os papéis. 

Travaram-se muitas batalhas, mas nelas os papéis perceberam que nunca conseguiriam vencer pelas armas o inimigo. Então os papéis recorreram aos espíritos para os expulsarem, e dirigiram-se aos baloberos (33),  pedindo auxílio. 

Os baloberos responderam: 
–Podemos lançar uma maldição, que irá lançar a infelicidade nas terras da Guiné, e os estrangeiros ir-se-ão embora. 

Mas acrescentaram: 
– Cuidado, porque não haverá mais paz nem prosperidade na Guiné, enquanto os estrangeiros não se forem embora e não for feita uma cerimónia para acabar com esta maldição. Será tanta a desgraça, que ninguém aqui quererá viver, mas vocês têm que aguentar o sacrifício, se querem a vossa terra de volta.
– Nós aguentamos, façam a cerimónia para expulsar os estrangeiros  responderam os papéis. 

Foi feita uma canoa em madeira, e os baloberos, reunidos em cerimónia, invocaram todos os espíritos malignos, fazendo-os entrar na canoa. A seguir enterraram a mesma. Na altura a canoa foi enterrada no mato, mas nesse mesmo local foi mais tarde construído o palácio do Governador, sendo presentemente o palácio da Presidência da República. O local preciso onde a canoa foi enterrada, foi mesmo em frente do Palácio, no local onde está o monumento aos heróis. 

Depois da cerimónia do enterro da canoa, os baloberos lembraram mais uma vez: 
– Quando os estrangeiros se forem embora, esta canoa tem que ser desenterrada, e feita uma cerimónia para acabar com esta maldição, senão nunca mais haverá paz e felicidade na Guiné, por isso os pais têm que passar estas palavras para os seus filhos. Não se podem esquecer de fazer a cerimónia! 

Os baloberos ainda acrescentaram: 
– Esta canoa anda debaixo de terra. O poder dos espíritos é muito forte, ele faz a canoa mover-se debaixo da terra espalhando o mal por todo o lado. Só nós conseguiremos saber onde ela está. 

Quando Portugal reconheceu a independência da Guiné-Bissau, e retirou as suas tropas, os papéis correram a chamar os baloberos, pois chegara a hora de desenterrar a canoa, mas os baloberos disseram: 
- Os estrangeiros ainda não foram todos embora, o Presidente da Guiné-Bissau é Luís Cabral, um estrangeiro, um cabo-verdiano. 

A 14 de Novembro de 1980, o Presidente Luís Cabral é derrubado por um golpe de Estado encabeçado, pelo mítico comandante militar do PAIGC, o papel João Bernardo Vieira, mais conhecido pelo seu nome de guerra 'Nino' Vieira.

 'Nino' Vieira suspende a Constituição e fica a liderar o país à frente do Conselho Militar da Revolução, com nove membros. Os papéis rejubilaram, a canoa tinha expulsado os portugueses dando-lhes a independência, e agora expulsava os cabo-verdianos; todos os estrangeiros tinham sido afastados, e agora era um papel que detinha o poder. 

Tinha chegado a hora de desenterrar a canoa e anular a maldição, e os papéis correram novamente pedindo a intervenção dos baloberos. Poucos dias depois os papéis reuniram-se no centro de Bissau, na Praça A Lenda a Canoa Papel /  'Che' Guevara, pois era ali que os baloberos diziam que estava a mítica canoa. 

Juntou-se uma multidão à volta da praça, e asfalto, cimento, tudo foi arrancado, sendo aberto um buraco enorme em forma de canoa, mas para desespero dos papéis nenhuma canoa apareceu. 

Os papéis, desiludidos com os baloberos, esqueceram a canoa e deixaram de contar esta história aos seus filhos. O Presidente 'Nino' Vieira seria assassinado a 2 de Março de 2009. Perdida e esquecida, será que a canoa papel continua a navegar debaixo do chão, espalhando a sua maldição? 

Esta é lenda da canoa papel.
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Notas de Carlos Fortunato:

(31) Insinhate – O rei Insinhate deu autorização para construção de uma fortaleza e vendeu o chão para a sua construção, conforme documento celebrado a 2 de Janeiro de 1697, do livro “A Guiné do século XVII ao século XIX”, pag.76.

(32) Ocupação da Guiné  Portugal, à semelhança das restantes potências europeias, decide impor a sua soberania às suas possessões, pois sem uma ocupação real corre o risco de perder os seus territórios em África, é uma intervenção de difícil realização para Portugal face aos
poucos recursos de que dispõe, e que exige alianças locais, capacidade de comando e muita coragem.

A divisão da África pelas diferentes potências tem o seu ponto alto na Conferência de Berlim (1884-1885), e leva a uma maior intervenção das potências europeias nas suas colónias. Os papéis nunca aceitarão o domínio estrangeiro, e os seus ataques serão frequentes, infringindo várias derrotas ao exército colonial. Apenas com a derrota imposta a 20 de Julho de 1915 por Teixeira Pinto, Portugal consegue o domínio total sobre a ilha de Bissau (História
da Guiné II - René Pélissier, pag. 176).

(33) Baloberos é a designação dada em crioulo aos sacerdotes animistas que realizam cerimónias nos locais sagrados, as balobas. Cada balobero  coloca o seu pote com água na baloba, junto ao poilão sagrado, para receber os poderes do mesmo e a poder usar nas cerimónias que realiza. (**)

2. Como ajudar a "Ajuda Amiga" ?

Caro/a leitor/a, podes ajudar a "Ajuda Amiga" (e mais concretamente o Projecto da Escola de Nhenque, que já foi inaugurada dia 8 deste mês, com pompa e circunstância), fazendo uma transferência, em dinheiro, para a Conta da Ajuda Amiga:

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Para saber mais, vê aqui o sítio da ONGD Ajuda Amiga:

http://www.ajudaamiga.com
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