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quinta-feira, 26 de setembro de 2024

Guiné 61/74 - P25983: A CCAÇ 675 - A Gloriosa - Como se “inventou” e gerou o mito – verdadeiro da Gloriosa CCaç 675 (Belmiro Tavares, ex-Alf Mil)


A CCAÇ 675

A Gloriosa

Como se “inventou” e gerou o mito – verdadeiro da Gloriosa CCaç 675


Como conseguimos os nossos objetivos com trabalho (muito trabalho), dedicação, honestidade, saber, coragem (muita coragem), valentia e ousadia q.b.

Primeira fase, em Évora, 07/01/1964 – 2.º ciclo de instrução (o 1.º foi ministrado, no ano anterior, em outras unidades).

Formação da CCaç 675

- Aperfeiçoamento físico técnico e mental para que ninguém acusasse fadiga… antes do tempo.
- Disciplina… disciplina…. Disciplina.
- Espírito de corpo – união fraterna entre todos os elementos da CCaç 675 que viria a ser a gloriosa.

Havia um cross semanal; o primeiro foi de 5 km e dezenas de soldados desistiram; o último tinha 35 km e não houve desistências.
Em tempo breve, os nossos soldados distinguiam-se de todos os outros pela disciplina, garbo, educação e respeito que exibiam em qualquer local. Todos se orgulhavam de pertencer à CCaç 675 – a Gloriosa; cada um de nós dava, diariamente, o seu melhor.
Estava lançado o mote… que se ia enraizando… Estávamos, no entanto, ainda longe de atingir os objetivos ideais que tinham sido traçados pelo nosso mui ilustre capitão.

Avançámos afoitos para a 2.ª fase:
- Bissau, 13/05/1964
- Aperfeiçoamento físico enérgico e vigoroso (quase violento) porque “a guerra é coisa séria” e encontrava-se ali ao lado da nossa porta.
- Mentalização técnica, física e psicológica – estávamos sempre na crista da onda.
- Era obrigatório saltar das viaturas, em movimento, até aos 50 km/hora.
- O nosso sábio timoneiro determinou que os subalternos não permitissem que os soldados vagueassem pela cidade (Bissau), onde encontravam um ambiente derrotista; quando fôssemos para o mato, eles já se sentiriam vencidos.
Assim os nossos soldados tinham o dia “todo ocupado”; podiam fazer o que quisessem… menos ir à cidade. O ambiente, ali, era o menos aconselhado a quem sentia ganas de vencer.

Surgiu uma nova alínea (“a cabeça” do nosso afoito capitão não parava!):
- Saltar da viatura e disparar, ainda antes de “aterrar”, porque – ensinamento do nosso douto capitão: “apenas o primeiro tiro deles é perigoso; ouvindo os nossos disparos, eles baixam a cabeça, levantam o cano da sua arma e… já não acertam”

3.ª fase – Binta 29/06/1964 – Estávamos prestes a “abrir as portas da nossa guerra”
- Organização dentro do aquartelamento.
- Preparativos para a defesa das instalações… precárias.
- Entrada na guerra, de rompante e em força, 04/07/1964.
- Demonstração de coragem, ousadia e valentia… a todas as horas; ali, a guerra era total e cobria toda a zona.
- Força, no seu máximo expoente.

Em breve, as emboscadas dos nossos adversários eram “montadas”, cada vez mais longe do “nosso itinerário” que não tínhamos e, a cada dia, com menos intensidade. Surgiu um novo parágrafo:
- “É preferível romper a sola das botas que os pneus das viaturas”.

Isto significava que era mais fiável e seguro andar a pé e fora dos caminhos e atalhos do que nas viaturas.
- Em breve, montávamos mais emboscadas que os independentistas – eles não estavam habituados a sentir tanta valentia e a ser tão pressionados.
- Instalávamos perigosas “armadilhas”, em locais criteriosamente escolhidos, provocando-lhes insegurança.

Nota: usando as viaturas, os nossos adversários sabiam onde nos encontrávamos e para onde nos deslocávamos; era fácil precaverem-se: ou montavam uma sempre perigosa emboscada ou afastavam-se… para fora da nossa zona.

- Sinalização, à entrada de uma ponte, acabada de reconstruir: “Atenção! Há armadilhas!”
Eles não acreditaram na nossa sinceridade e… pagaram caro.
- Eram forçados a viver, “sobre brasas” e … afastaram-se do nosso território.

- “PSICOSSOCIAL” junto à fronteira com o Senegal, “convidando” os guineenses ali refugiados, a regressar à terra que os viu nascer. - Garantíamos-lhe segurança e trabalho – sempre trabalho – muita amizade e proteção – Inicialmente, o regresso foi lento mas, logo, acelerou enormemente, apesar da vigilância do pessoal armado do PAIGC, para o impedir. A RECONSTRUÇÃO - a fase mais importante após a pacificação-.

No fim do primeiro ano de Guiné, 12/05/1965 o nosso capitão falou às tropas, em parada, alertando:
- Soldados! Se a nossa comissão acabasse hoje, nós seríamos apelidados de vândalos, porque, na verdade, nós limitámo-nos, quase só a destruir. Agora, vamos iniciar uma nova fase da nossa guerra; será mais complicada que a anterior mas não menos importante, tentaremos trazer de volta os antigos habitantes desta região, proporcionando-lhes segurança e trabalho… muito trabalho.

Teremos:
- Restaurar casas;
- Edificar casas novas;
- Preparar jovens para a autodefesa de pessoas e bens e da tabanca;
- Criar condições de vida;

No fim da nossa guerra, poderemos dizer aos nossos familiares e amigos:
- Nós destruímos! Mas… Nós reconstruímos e construímos!
- Faremos regressar as pessoas que foram obrigadas a abandonar as suas casas e seus haveres, refugiando-se no vizinho Senegal, onde vivem, há vários meses, em miséria extrema!

E concluiu:
- Vamos a isto, valentes companheiros! Com soldados como vós… é fácil ser vencedor!
- Autodefesa da tabanca nova:
- Militarização de jovens voluntários.
Se ocorresse um ataque a CCaç 675, logo, acorreria em seu auxílio:

Nota: o tal “imaginado” ataque nunca aconteceu, porque… os nossos adversários nos respeitavam muito e não ousavam aproximar-se da “nossa casa”.
- Desenvolvimento social e cultural
- Conversas frequentes com os “homens-grandes”, à sombra do poilão – local sagrado dos mandingas – “ali ninguém poderia mentir”.
- Construímos:
- Um posto de socorros para o povo de Binta;
- Formámos enfermeiros para ali trabalhar;
- Nota: os casos mais intrincados “passavam” para a equipa médica da CCaç 675;
- Um parque infantil;
- Um jardim escola;
- Uma escola primária – aqui, mais de meia centena de crianças aprendiam a ler, escrever e contar, na “doce língua” de Camões, sob as ordens um “professor” que trouxemos de Farim, a “expensas” nossas; a miudagem entoava o Hino Nacional, diariamente, antes do início das aulas e, mais tarde, durante o hastear da Bandeira aos domingos e feriados. Foi uma enorme surpresa para todos nós, quando tal aconteceu pela primeira vez.
- Os jovens encarregados da auto-defesa prestavam honras à Bandeira… em dias determinados;
- Restaurámos uma boa parte das “moranças” da velha Binta; os nossos militares auxiliavam em tudo o que à construção e reconstrução dizia respeito; havia, porém, uma técnica para a qual não estavam preparados:
- Elaborar as coberturas das “moranças”, com capim; esta tarefa “pertencia” aos nativos.
- Construímos muitas moranças usando a construção em “tabuleiro de Xadrez”

Assim surgiu a “VILA TOMÉ PINTO!” A povoação era, agora, enorme – já não era a vulgar tabanca; ali, viviam em segurança quase total mais milhar e meio de pessoas.

Para produzir riqueza, aquele povo necessitava de sementes e também alimentos. Aqui, o nosso já célebre capitão “colocou em risco a sua já brilhante carreira”. Não conseguindo apoios de outras entidades decidiu contactar, diretamente, o senhor governador Geral da Guiné, General Arnaldo Schulz, que compreendeu as razões do excelso capitão e em breve enviou para Binta:
- Cinquenta toneladas de arroz para semear;
- Quarenta e cinco toneladas de arroz para alimentação:
- Cinquenta toneladas de amendoim para semear.

Além disso entregou “em mão” uma verba avultada para os primeiros encargos (aquisição de ferramentas e alimentos).

Em breve as mulheres de Binta produziam uma quantidade desmedida de produtos hortícolas que vendiam aos habitantes de Farim e também à tropa, ali sediada.

Quase diariamente, ao fim da tarde, um grupo de raparigas (bajudas) aparecia junto do comando da CCaç 675; sorrindo, dengosamente, solicitavam ao glorioso capitão que lhes facultasse transporte que as levasse a Farim. Meio mundo se admirava da quantidade de produtos da horta – especialmente tomates – que a cada dia, elas comercializavam, naquela vila.

Alguém encontrou a resposta:
“Em Farim, há uma enorme carência de… tomates!”

A sementeira foi grande! Lançaram à terra a totalidade das sementes fornecidas pelo governo e ainda cerca de duas toneladas de amendoim que o célebre capitão de Binta conseguiu, gratuitamente, em Farim: oferta da Ultramarina na pessoa do seu gerente, em Farim, o sr. Júlio Pereira.
A produção de amendoim e milho era tarefa dos homens; as mulheres tratavam do arroz e da horta.
A colheita foi volumosa! A tropa ajudou na arrecadação do produto, em local seguro, e no posterior transporte para o cais.

“A venda foi total!” aquele povo massacrado nunca recebeu tanto “patacão” (dinheiro) pela venda da “mancarra” (amendoim) porque, desta vez, eles receberam o valor total da mercadoria. Agora, como dantes, um kilo de amendoim 2$00 (dois escudos) mas, desta vez, eles recebiam o valor total da mercadoria não havia desvios como dantes!

O sábio capitão alertou o representante da Ultramarina, em Binta como segue:
- Tu não recebes “mancarra” de ninguém sem a presença de um oficial ou sargento; no acto do pagamento, as contas terão de “bater certo!” Entendeste?
Não houve desvios!

Por estas e por outras (que não cabem em espaço curto) aquele povo considerava o douto capitão de Binta como… “o pai de todos”. Estas foram as palavras de Júlio Pereira, o gerente da Ultramarina, em Farim, quando ofereceu o amendoim de que dispunha, para aumentar a área semeada.
Neste ambiente de crescimento, cultural, social e económico os nossos combatentes (os europeus) não foram esquecidos.

Pusemos a funcionar:
- As aulas regimentais.

A partir de agora – fins de 1964 – a CCaç 675 já não era uma companhia… nem sequer um batalhão! Era um regimento!
Na CCaç 675 havia:
- Dois analfabetos;
- Trinta e quatro militares tinham a terceira classe de adultos – era quase o mesmo que nada!
- Os analfabetos “aprenderam qualquer coisita” o suficiente para escrever cartas aos pais e aos amigos, orgulhando-se da sua aprendizagem. Alegavam que os pais não queriam acreditar que eles já eram capazes de escrever cartas.
- Trinta e duas praças fizeram, em Farim, o exame da quarta classe.

O alf. Tavares (o responsável pelas aulas) não levou um soldado a exame por não estar devidamente preparado e outro reprovou. Um bom resultado! O “inventor daquelas aulas regimentais” alegava perante os alunos:
- Este diploma poderá não ser muito importante na vossa vida (será bom sinal, se assim acontecer) mas poderá sempre ornamentar qualquer espaço da vossa casa ou poderá ser colocado, até, sobre o aparelho de TV. Mas podem dizer aos vossos filhos, aos netos e aos amigos:
- Para conseguir aquele diploma, trabalhei muito, tirando horas, ao meu descanso diário – de manhã, espingarda na mão, ia para o mato atormentar os adversários e enviá-los para fora do nosso terreno; à tarde, lápis na mão e livro sobraçado, ia ouvir atentamente, as palavras dos nossos ensinadores, os oficiais e os furriéis da CCaç 675.


Também neste campo a CCaç 675 foi gloriosa e única.

Temos um passado – comissão na Guiné – glorioso mas no após-guerra continuamos a ser diferentes… pela positiva.
Em 1967, fizemos a primeira confraternização! Reunimos sempre com os familiares. No 1.º almoço eramos 24 antigos combatentes; no ano seguinte, reunimos 23; no 3.º ano éramos apenas 17!
Sob orientação ativa do nosso emérito capitão, sempre presente e com a prestimosa ajuda do sold. cond. auto Padre Eterno e outros, chegamos a reunir mais de 170 pessoas.

Após a pausa do Covid, a máquina entrou de novo em movimento; passámos a fazer duas reuniões anuais: - uma a norte e outra a sul. As nossas já provectas idades a isso nos obrigam.

Temos vindo a colocar lápides, nas sepulturas nos nossos mortos: - nos que morreram na guerra (os três foram trasladados) e nos que morreram cá, na peluda.

Quando e onde é que isto vai parar?

Vamos aguardando, andando, e resistindo; agora… sem grandes acelerações!

Nota: Em 2023, fizemos, em Évora a nossa confraternização anual para o pessoal do sul; o nosso general e o alf. Tavares foram de véspera para acertar agulhas. À noite, foram jantar, de surpresa, a um restaurante que pertence ao nosso companheiro Orlando Amoreirinha, primeiro-cabo n.º 2144. Após o jantar e uma agradável conversa, o Tavares sugeriu:
- Amoreirinha! Eu já não conheço estas ruas e becos; além disso, “de noite, todos os gatos são pardos”. Pega lá no teu carro e indica-nos até à messe de oficiais.

Conversámos, ali, mais um pouco e o nosso general manifestou o seu contentamento alegando:
- Fiquei muito feliz por saber que tu singraste na vida! Tens ali o teu ganha-pão e o dos teus filhos! Resposta do Amoreirinha:
- O que consegui na vida, agradeço-o ao meu general e ao meu alferes porque me deram a oportunidade de estudar e ensinaram-me para poder fazer o exame da 4.ª classe; sem esse diploma não conseguiria chegar onde cheguei.

O “inventor” daquela escola e o “responsável pelo seu funcionamento” ficaram radiantes ao ouvir aquelas palavras dum antigo aluno da “Escola Regimental” da CCaç 675, em Binta. Sem meios… mas com coragem e a vontade dos alunos… conseguimos!
Teríamos de ser vencedores! E fomos!

Acontece que o Amoreirinha já era 1.º cabo (e era dos bons) quando entrou naquela escola mas… não tinha a 4.ª classe.
Também o 1.º cabo corneteiro nº. 2446, J. Sousa Cunha, fez a 4.ª classe, naquela Escola… uns tempos depois de ser cabo.

O ousado e insigne capitão de Binta pensou e determinou! Os seus subordinados… cumpriram! E de cara alegre! O resultado é, ainda, bem visível! Há de continuar! Ninguém o esquece! A CCaç 675 merece!

Belmiro Tavares
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Nota do editor

Vd. post de 24 de abril de 2024 > Guiné 61/74 - P25441: CCAÇ 675 - Guiné 1964 / 66 - Retalhos do nosso pós-guerra - II (Parte III e última) (Belmiro Tavares)

sábado, 23 de março de 2024

Guiné 61/74 - P25300: Os nossos seres, saberes e lazeres (620): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (147): Com que satisfação regressei à Princesa do Alentejo, uma incompreensível ausência de décadas (7) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 21 de Novembro de 2023:

Queridos amigos,
Com a continuação da visita ao Paço dos Condes de Basto, a que se seguiu assistir a um recital de violoncelo e guitarra num espaço esplendoroso do Museu Nacional de Évora, e depois de ter vistoriado, com muito gosto, a esplêndida obra azulejar de Jorge Colaço, um artista que em Paris chegou a trabalhar para Le Figaro e que durante muitos anos compôs os seus magníficos trabalhos na Fábrica de Cerâmica Lusitânia (que ainda conheci, estava prantada onde é hoje a sede da Caixa Geral de Depósitos, restam alguns vestígios como uma chaminé), regressei a Lisboa, de coração afogueado, um belo fim de semana, procurei meter o Rossio na Betesga, impossível, não deu para registar os valores da arquitetura popular tradicional, desta arquitetura civil manuelina não passei do Páteo de São Miguel e do Paço dos Condes de Basto, embora tenha visto por fora o Palácio dos Condes de Cadaval, confesso que foi uma revelação visitar o que já se designou por casas de Vasco da Gama e Palácio da Inquisição e que hoje é o Centro de Arte e Cultura da Fundação Eugénio de Almeida, bem gostei das casas pintadas e das belas exposições ali patentes. Basta de me lamuriar, há palácios, conventos e igrejas, a universidade e até o Teatro Garcia de Resende a pedir nova visita, assim me dê Deus vida e saúde, até lá dar-vos-ei notícias de umas andanças por Arraiolos e Torre de Moncorvo.

Um abraço do
Mário



Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (147): Com que satisfação regressei à Princesa do Alentejo, uma incompreensível ausência de décadas (7)

Mário Beja Santos

A arquitetura civil manuelina em Évora tem belíssimos espécimes. O que se costuma designar por estilo manuelino é uma combinação do tardo-gótico, do mourisco e dos primeiros sinais do Renascimento. Atestam esta riqueza a Galeria das Damas do Palácio Real de S. Francisco ou de D. Manuel, o Páteo de São Miguel da Freiria ou dos Condes de Basto (onde viveram os reis D. Sebastião, Filipe II e D. João IV) assente nos muros romano-árabes do castelo, com janelas de arcos de ferradura e tendo no interior as célebres pinturas mitológicas e históricas; mas há também o Paço do Almirante, o Palácio dos Duques de Cadaval, o mirante da Casa Cordovil e outras reminiscências, como o varandim da Casa Soure, a janela da casa do cronista Garcia de Resende, o Solar dos Condes de Portalegre, os restos arquitetónicos do Paço dos Condes de Vimioso.
Continuo a visita neste Paço dos Condes de Basto, Túlio Espanca descreve-o no seu livro Évora, encontro com a cidade, uma edição de 1997, faz saber que é um edifício de grande caráter e diversidade arquitetónica, refere as majestosas salas, as tais pinturas murais do estilo renascentista e outras maneiristas, dá conta da linhagem dos Castros que aqui viveram, referindo que o Palácio no período de 1678-89 recebeu grandes melhorias para nele se alojar o arcebispo de Évora, primo de D. Pedro II, e aqui esteve temporariamente instalada, em 1699, D. Catarina de Bragança, a viúva de Carlos II de Inglaterra. Em 1958, após longa agonia de ruína e degradação, o palácio foi adquirido por Vasco Eugénio de Almeida que o restaurou cuidadosamente com a assistência da Direção-Geral dos Monumentos Nacionais e nele instituiu a Fundação que tem o seu nome. Mais impressionado se fica quando se deambula por estas instalações ricamente intervencionadas e se pode ver um vídeo que mostra o estado de degradação em que se encontrava este monumento e as instalações anexas antes destas obras magnificentes. São estas as derradeiras imagens que se mostram do interior do palácio, há divisões que estão fechadas, o que está patente é exibido com muito bom gosto e mostra as cuidadas intervenções.

Uma bela tapeçaria flamenga alegórica a um triunfo do imperador Marco Aurélio
Um pormenor do jardim mostrando ao fundo um vestígio da muralha
Saindo do Palácio dos Condes de Basto, havia a indicação de que se podia visitar a biblioteca, estão aqui os arquivos das propriedades da família Eugénio de Almeida
Aquando da visita ao Museu Nacional de Évora (estávamos a 1 de outubro) noticiava-se que a pretexto de ser o Dia Mundial da Música se ia realizar neste belo espaço um concerto com a violoncelista Sofia Azevedo e o guitarrista Marco Banca, pareceu-me um duo bem ousado, foi um belo recital com música brasileira para violoncelo e violão, música adaptada do rock onde não faltou Mozart e composições a partir de José Mário Branco. Uma bela despedida do centro histórico, agora ponho-me rumo à estação e não posso deixar de exaltar a classe da azulejaria da responsabilidade de Jorge Colaço, painéis que envolvem a estação rodoviária com motivos eborenses, desde a Sé Catedral, quadros históricos como a Revolta do Manuelinho de Évora (1637), um auto vicentino que aqui se estreou em ambiente régio, cenas de trabalhos agrícolas, impressiona não só o estado de conservação, mas também a combinação cromática que Jorge Colaço urdiu, emoldurando o azul e branco de belas molduras que fazem ressaltar as cenas que nos remetem para Évora, isto passa-se numa estação ferroviária que vem de meados do século XIX e que já teve ligações a ramais, hoje extintos. Regresso a Lisboa, mas já estou saudoso de voltar. Entretanto, vou viajar até Arraiolos e Torre de Moncorvo, não deixarei de dar notícias.
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Nota do editor

Último post da série de 16 DE MARÇO DE 2024 > Guiné 61/74 - P25278: Os nossos seres, saberes e lazeres (619): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (146): Com que satisfação regressei à Princesa do Alentejo, uma incompreensível ausência de décadas (6) (Mário Beja Santos)

sábado, 16 de março de 2024

Guiné 61/74 - P25278: Os nossos seres, saberes e lazeres (619): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (146): Com que satisfação regressei à Princesa do Alentejo, uma incompreensível ausência de décadas (6) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 20 de Novembro de 2023:

Queridos amigos,
Folheio uma obra de Túlio Espanca sobre a cidade de Évora e fica-me o ressaibo de indisfarçada amargura de amanhã partir de regresso a casa sem visitar o antigo quartel dos Dragões de Évora, o Palácio de D. Manuel (ou o que dele resta), passear-me no Aqueduto da Água da Prata, ver o mirante da Casa Cordovil e algumas igrejas que são tesouros, como a Igreja de S. Francisco. Fica para a próxima. Deu-me enorme prazer sair do Centro de Arte e Cultura da Fundação Eugénio de Almeida e ver outros empreendimentos da Fundação como a coleção de carruagens e o Páteo de S. Miguel e o Paço dos Condes de Basto, visitas que a todos se recomenda quando vierem à princesa do Alentejo, estou pronto a regressar, e sem demora.

Um abraço do
Mário



Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (146):
Com que satisfação regressei à Princesa do Alentejo, uma incompreensível ausência de décadas (6)

Mário Beja Santos

Os fotógrafos de smartphone, com os quais alinho, têm o dever de ir eliminando imagens da câmara para que não chegue o pesadelo da lentidão da máquina. Estava a proceder a essa filtragem quando fiquei um tanto embasbacado quando descobri que não tinha incluído este magnífico presépio, imagem captada no Museu Nacional de Évora, no episódio apropriado, correspondente à dita visita. Por o achar muito belo, entendi que o leitor perdoaria o dislate e podia ver com agrado um vistoso presépio de que nos podemos orgulhar ter uma vastíssima coleção de obras únicas que não se confinam aos trabalhos portentosos de Machado Castro, dispomos de peças de rara sensibilidade por museus e templos religiosos e até casas particulares. Aqui fica o registo.
Presépio esplendoroso, de uma espantosa riqueza figurativa na sua organização

Visitado que foi o Centro de Arte e Cultura, havia que visitar um outro tesouro da Fundação Eugénio de Almeida, a coleção de carruagens, assente no antigo celeiro do Cabido da Sé de Évora. O edifício foi adquirido em 1959 por Vasco Eugénio de Almeida com o objetivo de integrar o conjunto edificado do pátio de S. Miguel. Abriu ao público em 1998 e foi alvo de requalificação entre 2008 e 2011, temos aqui uma coleção de carruagens que reúne os atrelados e utilitários de viagem que estiveram ao serviço da Casa Eugénio de Almeida entre a segunda metade do século XIX e os primeiros anos do século XX. A exposição não deixa de mencionar que com os primeiros anos do século XX as carruagens entraram progressivamente em desuso. A família Eugénio de Almeida começou a ter carros a partir de 1907, houve que adaptar as cocheiras do Parque de Santa Gertrudes. Décadas depois, quando as carruagens não passavam de relíquias, vieram expeditas por caminho de ferro até Évora. Mas veio o racionamento da Segunda Guerra Mundial, as velhas carruagens não tardaram a ser resgatadas e postas ao serviço, até que terminou a guerra. São estas as carruagens de família e outras peças adquiridas em leilões, caso da cadeirinha que podemos ver com imensa satisfação.
Imagens recolhidas na coleção de carruagens
Já muito se passeou e o palato pede uma açorda com muito coentro e uns cubos bem olorosos de carne de porco. É nesse ínterim que se percorrem as arcadas da Praça do Giraldo e dá-se conta que numa intervenção foi encontrado um fresco e ali ficou mantido em estado de boa conservação para nos recordarmos de outras eras em que seguramente estas arcadas, já de si garbosas, possuíam frescos.

É a última deambulação do dia, a visita ao Palácio dos Condes de Basto ou Paço de São Miguel, a sorte favorece os audazes, esta tarde o Paço é visitável, coisa que raramente acontece. Diz o guia de Évora que a origem deste palácio remonta, pelo menos, ao período muçulmano. Conheceu-se sucessivas modificações, não falta no seu interior o estilo manuelino e mudéjar. Assenta sobre troços da muralha medieval (e romana) e tem uma aparência exterior fortificada. A elegâncias das reformas manuelinas traduz-se nas janelas geminadas e nos arcos ultrapassados de um dos corpos principais, o conjunto é discreto e funde-se com a malha urbana da cidade. Só penetrando no páteo é que se começa a vislumbrar a extensão do palácio. O corpo adjacente situado a poente é mais moderno, teve obras entre 1570 e 1573. É aqui que encontramos três salas ornamentadas por programas fresquistas. Deve-se a Vasco Eugénio de Almeida, no século XX, a profunda intervenção de conservação e restauro de todo o complexo de edifícios do Páteo de São Miguel. O Paço está classificado desde 1922 como Monumento Nacional.

A Sala Oval é coberta por uma abóbada artesoada preenchida por uma copa de árvores cujos ramos e vegetação se encontram entrançados; entre estes ramos brincam crianças colhendo frutos, num ambiente de fortuna e prazer, rodeados das oitos ninfas segundo as Metamorfoses de Ovídio. A Sala da Tomada de La Goleta é coberta por 22 painéis com frescos cuja temática é a abundância.
Sala de bilhar
Um encantador sinal da arte mudéjar.

Aviso o leitor que vamos prolongar esta visita. Enquanto por aqui se deambulava, uma amável cicerone indicou uma sala onde se podia ver como era o Páteo de São Miguel antes das obras, fica-se de boca aberta com o estado de degradação, de completo abandono em que se encontravam grande parte das instalações adjacentes ao Paço. Houve a preocupação de ler Túlio Espanca antes de vir a Évora. Ele refere a importância da cidade na História de Portugal, refere mesmo a arquitetura civil manuelina e não esquece o Paço dos Condes de Basto. Este importante divulgador cultural refere a sua história e fala do edifício do seu interior desta maneira:
“Edifício de grande caráter e acentuada diversidade arquitetónica, assenta na torre e muralha mediévicas, em cujo flanco oriental rompe a hoje obstruída Porta da Traição e no maior bloco se ergue o imponente pavilhão de telhados de quatro águas, rasgado por janelas minadas, de arcos de ferradura, de ladrilho e delicada capitelação de pedra regional. No interior, disposto em majestosas salas, subsistem curiosas pinturas murais do estilo renascentista e outras maneiristas, de temática mitológica ou histórica.”

Vamos a seguir concluir a visita a tão impressionante conjunto de edifícios.

(continua)

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Nota do editor

Último post da série de 10 DE MARÇO DE 2024 > Guiné 61/74 - P25257: Os nossos seres, saberes e lazeres (618): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (145): Com que satisfação regressei à Princesa do Alentejo, uma incompreensível ausência de décadas (5) (Mário Beja Santos)

domingo, 10 de março de 2024

Guiné 61/74 - P25257: Os nossos seres, saberes e lazeres (618): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (145): Com que satisfação regressei à Princesa do Alentejo, uma incompreensível ausência de décadas (5) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 14 de Novembro de 2023:

Queridos amigos,
Este Centro de Arte e Cultura da Fundação Eugénio de Almeida excedeu todas as expetativas, primorosamente requalificado foi o Palácio da Inquisição, as exposições são de primeiríssima água, tudo se percorre com gosto e apetece ter tempo para demorar. As casas pintadas são uma surpresa total, a exposição Fenda é inexcedível, um bem aplicado murro no estômago, e finalmente vejo desvendado aquela zona do Parque de Santa Gertrudes que conheço desde a antiquíssima Feira Popular da ciganita Dora, do autoshoot e do castelo fantasma, e depois os passeios nos jardins Gulbenkian, mas sempre ficava aquela sensação de mistério de ver a residência da família Eugénio de Almeida guardada em segredo, vejo finalmente como lá se vivia, e foi necessário regressar a Évora para perceber o que a cultura portuguesa e o património devem a esta prestimosa Fundação.

Um abraço do
Mário



Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (145):
Com que satisfação regressei à Princesa do Alentejo, uma incompreensível ausência de décadas (5)


Mário Beja Santos

Estou agora no Centro de Arte e Cultura da Fundação Eugénio de Almeida, que já se chamou Fórum. Évora e o Alentejo em particular, e o país em geral, devem muito a esta fundação que têm um histórico de empresários que estiveram associados ao setor do tabaco e às transformação de produtos agrícolas, detentores de propriedades imensas, um património que não esqueceu a vitivinicultura, membros da família receberam títulos de Conde de Arge e de Conde de Vill’Alva, a fundação foi instituída em 1963 com a missão de promover o desenvolvimento cultural, educativo, social e espiritual da cidade de Évora e do Alentejo.
O Centro de Arte e Cultura possui uma dinâmica de exposições de referência, todo este património edificado impressiona, o visitante não sabe para onde se voltar, desceu até um amplo espaço denominado casas pintadas. O que se vai ler na legenda é complementado com o roteiro de Évora da Porto Editora, datado de 2016. Neste roteiro fala-se nas casas pintadas como a Casa dos Silveira-Henriques ou Casas Pintadas “de Vasco da Gama”, obra manuelina, posteriormente adaptada devido ao desmembramento do vizinho Paço dos Condes da Vidigueira. Em 1631, passou a ser morada dos inquisidores e incorpora o Palácio da Inquisição. No pátio, na galeria claustral existente encontra-se um notável conjunto de frescos nas paredes com temas profanos, o que é raro. Avulta em importância o conjunto de animais e plantas aqui figurados, inspirados em temas moralistas e em várias fábulas de Esopo. O que consta da legenda junto das Casas Pintadas é o seguinte: “Este espaço pertenceu a D. Francisco da Silveira, Coudel-mor dos Reis D. Manuel I e D. João III. As armas desta família podem ver-se nos fechos das abóbadas. Este facto desmente a lenda de que o proprietário da casa foi o famoso navegador português Vasco da Gama, cujas casas se situavam no lado sul da mesma rua. Em finais do século XVI, as Casas Pintadas foram anexadas ao Palácio da Inquisição. Realizados na década de 1520, os frescos são um exemplar único da pintura mural palaciana de caráter profano, da primeira metade do século XVI. Aqui encontramos cinco painéis decorados com animais comuns e seres fantásticos que, evocando o imaginário das fábulas e narrativas medievais, estão simbolicamente associados a características morais, virtudes e vícios próprios da natureza humana.”

Imagens das Casas Pintadas

Uma das exposições ali patentes intitula-se No tempo dos dias lentos – Casa e Parque de Santa Gertrudes, um conjunto de três séries fotográficas realizadas entre 2017 e 2019, após a morte de Maria Teresa Eugénia de Almeida, constituem-se como uma representação posterior à vivência deste espaço doméstico. Em aditamento, aparecem outros elementos que ajudam a contextualizar as muitas apropriações que este emblemático lugar teve ao longo dos séculos XIX e XX – desde a instalação do primeiro jardim zoológico de Lisboa, ao velódromo de Palhavã ou acolhimento da Feira Popular de Lisboa.
A Casa e o Jardim de Santa Gertrudes
A biblioteca da família

Temos agora outra exposição, intitula-se Fenda, interroga a relação da sociedade e da arte com a pobreza, em várias épocas, tem peças do passado que dialogam com linguagens contemporâneas, é de grande valor o número de obras apresentadas, desde Daniel Blaufuks, Domingos Sequeira, Júlio Pomar, Pedro Barateiro, Pieter Bruegel ou Vieira Portuense. Bem interessante é o texto do documento oferecido à entrada da exposição, da responsabilidade dos curadores: “A exposição aborda a clivagem social gerada pela desigualdade profunda na distribuição da riqueza e alguns aspetos da forma como a arte olhou (e olha) para essa desigualdade. Na conceção cristã que marcou a sociedade ocidental, a pobreza podia ser um valor que traduzia o desprendimento do mundo e nos aproximava da salvação, fosse pela sua condição, fosse pelo exercício da dádiva que nos aproximava dela. Mas no mundo pós-renascentista começou a instalar-se a consciência de que a profunda desigualdade era, antes de mais, um problema social e arte, sobretudo a pintura, traduziu muitas vezes um olhar profundamente crítico sobre a pobreza. Procurámos expor vários exemplos que materializam a simbologia da palavra FENDA como um lugar de corte, neste caso observando o sistema de desigualdades económicas. A existência de fendas na sociedade é, desde sempre, o ponto de partida para constatar um problema, mas é, também, o impulso para a vontade de mudança.”
São Martinho, autor desconhecido, séc. XVII, coleção do Museu Nacional de Arte Antiga
Beatriz Costa num programa de distribuição de esmolas a pobres, Rio de Janeiro, 1941
D. Luís e D. Maria Pia entregando esmola aos pobres do Porto, por Leonel Marques Pereira, 1872, coleção do Palácio Nacional da Ajuda
Cozinha de Alcântara, a confeção da sopa
Cozinha dos Anjos, 1959, aspeto do refeitório
As mães, por Júlio Pomar, 1951, coleção do Museu do Neo-Realismo, doação do artista
Aspetos do teto do Palácio da Inquisição

(continua)
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Nota do editor

Último post da série de 2 DE MARÇO DE 2024 > Guiné 61/74 - P25230: Os nossos seres, saberes e lazeres (617): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (144): Com que satisfação regressei à Princesa do Alentejo, uma incompreensível ausência de décadas (4) (Mário Beja Santos)

sábado, 2 de março de 2024

Guiné 61/74 - P25230: Os nossos seres, saberes e lazeres (617): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (144): Com que satisfação regressei à Princesa do Alentejo, uma incompreensível ausência de décadas (4) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 14 de Novembro de 2023:

Queridos amigos,
Visitado, e com imenso agrado, o piso térreo do Museu Nacional de Évora, fui desfrutar da valiosíssima coleção pictórica que ele alberga, estão ali representados os nomes sonantes da pintura antiga portuguesa, o Mestre de Sardoal, Frei Carlos, Grão Vasco, Álvaro Pires de Évora, Josefa de Óbidos, e outros mais. Uma coleção que vai do século XVI à contemporaneidade, continuam as doações e os empréstimos, e não faltam artistas modernos. O ponto alto é dado pelo retábulo do altar-mor, inegavelmente obra de flamengos, como também estará presente Francisco Henriques, um outro flamengo que viveu na cidade no início do século XVI, um dos grandes momentos de apogeu de Évora. Sem pretender enfastiar o leitor, alinham-se algumas dessas imagens que me cativaram, e não esqueci de captar um Santo António bem juvenil no momento da saída, na escadaria. E daqui parti para outra casa de cultura de envergadura, o Centro de Arte e Cultura da Fundação Eugénio de Almeida, havia que fazer render o escasso fim de semana neste magnificente centro histórico onde é urgente voltar.

Um abraço do
Mário



Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (144):
Com que satisfação regressei à Princesa do Alentejo, uma incompreensível ausência de décadas (4)


Mário Beja Santos

O Museu Nacional de Évora – Frei Manuel do Cenáculo, instalado no que foi a residência do Arcebispo de Évora, possui a singularidade de ter coleções que vão desde a presença romana até ao século XX, o visitante pode usufruir de vestígios de casas senhoriais e conventos, de heráldica imponente, peças góticas, alfaias religiosas de lavra impressionante, tudo ao nível do piso térreo. No andar superior, a sua secção de pintura é impressionante, atenda-se que o acervo do museu recolhe obras provenientes de outros tempos religiosos, de doações e não deixa de merecer a atenção as riquezas pictóricas adquiridas fundamentalmente no século XVI, o retábulo do altar-mor da Sé de Évora é bom exemplo, os artistas flamengos trabalharam aqui afanosamente e legaram-nos obras-primas inconfundíveis. Estão presentes alguns dos maiores pintores portugueses e flamengos, como Francisco Henriques, Avercamp, Bruegel, o Jovem, temos Grão Vasco, Frei Carlos, Josefa de Óbidos, Álvaro Pires de Évora, Silva Porto, João Vaz, entre outros. É o resultado desta deambulação que pretendo mostrar ao leitor, seguidamente a itinerância passará para o Centro de Arte e Cultura, Fundação Eugénio de Almeida, outra agradável surpresa.

Nossa Senhora da Graça, Santa Julita e S. Guerito, por Francisco Henriques, pintor flamengo ativo em Portugal entre 1506 e 1518
Retábulo do altar-mor da Sé de Évora, autoria do mestre do Retábulo da Sé de Évora (círculo de Gerard David 1460-1523), Escola Flamenga, circa 1500
Escola Flamenga, Ascensão
Ressurreição, por Gregório Lopes, século XVI
A Virgem e o Menino entre S. Bartolomeu e Santo Antão sob a Anunciação, por Álvaro Pires de Évora, Escola Italiana, circa 1410
Cordeiro Pascal, por Josefa de Óbidos, séc. XVII
Patinagem na Neve, por Hendrick Avercamp, Escola Flamenga, séc. XVI
Porto marítimo ao anoitecer, por João Vaz
Santo António de Lisboa, azulejos do séc. XVII, registo apanhado no corredor, à saída, é uma singularidade pôr o santo na natureza, tem direito a uma aura desmedida, o Menino bem de pé e uma grande cruz no braço direito

(continua)

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Notas do editor:

Vd. post de 24 de Fevereiro de 2024 > Guiné 61/74 - P25208: Os nossos seres, saberes e lazeres (615): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (143): Com que satisfação regressei à Princesa do Alentejo, uma incompreensível ausência de décadas (3) (Mário Beja Santos)

Último poste da série de 24 DE FEVEREIRO DE 2024 > Guiné 61/74 - P25210: Os nossos seres, saberes e lazeres (616): Visita técnica no âmbito da minha Ordem Profissional, a OET (Ordem dos Engenheiros Técnicos), à chamada "Linha Circular" do Metro de Lisboa (Hélder Valério de Sousa)