Capa do livro de Bruno Crimi (texto) e Uliano Lucas (fotografia), "Guinea-Bissau: una rivoluzione africana" (Milano, Vangelista, 1970, 200 pp., italiano e francês) (Imagem da capa: Cortesia de Protest In Photobook.com Disponíveis também muitas outras das fotos do Uliano Lucas).
1. O Nelson Herbert, Nelson Herbert Lopes, é jornalista reformado, nascido em Bissau, filho da antiga glória do futebol cabo-verdiano e guineense, Armando Duarte Lopes, o "Búfalo Bill". Viveu nos EUA, onde trabalhou na VOA - Voice of America, Tem naciinalidade americana. Vive presentemente no Mindelo, ilha de São Vicente.
Tem cerca de 65 referências no nosso blogue. Integra a Tabanca Grande desde 16/3/2008 [Nelson Herbert, foto à direita]. Os pais ainda estiveram juntos no Mindelo em meados de 1943.
Na semana passada, quinta feira, 29/12/2022, 12:04, o Nelson mandou-nos uma lacónica mensagem. "Assunto - A propósito de uma reportagem...". Não tínhamos notícias dele desde a pandemia de Covid-19. Mandou-nos um link para um artigo publicado na DW - Deutsche Welle, a Voz da Alemanha.A grande reportagem "Guiné-Bissau, uma revolução africana", publicada em 1970, foi o resultado de três meses de trabalho do jornalista Bruno Crimi, falecido em 2006, junto com o fotógrafo Uliano Lucas.
Corriam os finais dos anos 1960. Na Europa, os ares eram de revolução cultural e 'boom' económico Em Itália, iniciavam-se os anos de chumbo do terrorismo político. Ao ultrapassar questões internas, a decisão de um jornalista e um fotógrafo italianos de documentar a luta pela liberação foi decisiva para o reconhecimento da independência da Guiné-Bissau.
Aos 80 anos, Uliano recorda com entusiasmo os meses transcorridos na mata guineense na companhia dos guerrilheiros.
"Praticamente encontrei um mundo – aquele da resistência, aquele das mulheres, aquele das escolas nas brigadas, um mundo que me abriu os olhos e, finalmente, eu podia ver uma guerra de liberação não cruel, assustadora, trágica, que fique claro, como aquela do Vietname", afirmou à DW.
Censura dos órgãos europeus
(...) Uliano partiu de Itália com uma ideia clara de romper o silêncio nos meios de comunicação europeus sobre o que acontecia nas então colónias portuguesas em África
"Antes de mais nada, não havia notícias, não se falava sobre isso. Sabia-se somente que Guiné-Bissau, Angola e Moçambique eram territórios ultramarinos de Portugal, colónias", começou por dizer o fotógrafo italiano, que utilizou as suas objetivas para mostrar o que não se via sobre a Guiné-Bissau.
"Não saíam informações sobre a guerra da liberação, havia um silêncio generalizado. O problema era conseguir derrubar esse muro de silêncio a respeito da luta pela libertação, de escrever ou fotografar aquilo que era a história em curso, mas também sobre o nascimento de uma nova democracia".
A frente democrática da luta de libertação nacional contra o jugo-colonial era liderada por Amílcar Cabral. Uliano Lucas teve um encontro com o 'Pai fundador' das nacionalidades guineense e cabo-verdiana já em território libertado, próximo à fronteira com o Senegal, ao final de três meses de campanha.
Entrevista a Amílcar Cabral
(...) "A ordem que Amílcar Cabral havia dado era que nós éramos 'preciosos', preciosíssimos, porque aquilo que estávamos fazendo significava uma abertura no sistema de comunicação e, por isso, nada poderia nos acontecer", recordou ainda Uliano.
"Já em Dakar, capital senegalesa, ficamos numa casa onde Bruno Crimi fez a entrevista e eu tirei as fotografias."
A entrevista foi publicada em cerca de 10 jornais, italianos e também noutros meios de comunicação social europeus, e abriu as portas da Europa para a causa da independência das colónias portuguesas em África, segundo Uliano Lucas.
"Conseguimos, seja na Itália que no exterior, realizar uma formidável operação de comunicação visual e, a esta altura, sentimos a necessidade de publicar um livro que se materializou a partir de algo complexo".
Reportagem mudou o rumo dos acontecimentos?
(...) Mas foram duas as principais conquistas obtidas a partir da publicação do livro em 1970.
A primeira foi em Roma durante a conferência das colónias portuguesas, com os três líderes, organizada em 1970. Uliano Lucas conta que o então líder angolano, Agostinho Neto, Cabral e dos Santos foram recebidos pelo Papa, chefe da Igreja Católica.
Segundo o fotografo italiano, foi um acontecimento não indiferente porque, na prática, Portugal era discretamente 'deixado de lado' pelo Vaticano. E o livro foi entregue ao Papa.
"Mas o fato mais importante foi que o livro chegou à Comissão da ONU que estabeleceu, por meio daquele livro, e claro, também outros documentos, que Guiné-Bissau tinha territórios livres e era realmente um Estado. Por essas duas coisas a viagem valeu a pena, tudo valeu a pena", afirmou em entrevista à DW, em Itália.