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terça-feira, 6 de fevereiro de 2024

Guiné 61/74 - P25140: Capas da Vida Mundial Ilustrada (1941-1946) - Parte III: 45 crianças, refugiadas (e provavelmente judias), polacas, alemãs, austríacas e uma russa, embarcam em agosto de 1941 no "Mousinho" a caminho da América



Legenda; "Depois de alguns dias de permanência em Lisboa e na Parede, partiram para a América do Norte 45 crianças, polacas, alemãs, austríacas, e uma russa, fugidas aos horrores da guerra. A foto mostra-nos algumas das mais pequeninas refugiadas no momento em que embarcavam a bordo do "Mousinho".






Legenda: "Um aspeto da entrada para o 'Mousinho' das 45 crianças refugiadas que há dias chegaram a Lisboa e seguiram para a América"



1. O drama dos refugiados de guerra é de ontem e é de hoje, é de todos os tempos, de todas as guerras.  Por Lisboa, última porta para a liberdade, passaram muitos refugiados durante a II Guerra Mundial.  Não se sabe como é que estas crianças chegaram a Portugal. O mais provável é terem sido acolhidas pela Comunidade Israelita em Lisboa, que mantinha uma cantinha económica, um albergue e um hospital... E entre os membros ilustres e solidários dessa comunidae, destaque-se o avò do nosso querido amigo Pepito (1949-2012), o eng. Samuel Schwarz (1880-1953), e irmáo do nosso João Schwarz da Silva, que vive em Paris e é membro da nossa Tabanca Grande.

Orfãs ?  Muito provavelmente judias (a avaliar pelo fenótipo de algumas). A "Vida Mundial Ilustrada" omite essa informação, não por  razões éticas ou de segurança, mas mais provavelmente por imposição da omnipotente e farisaica censura do regime... 

Sabemos que o regime de Salazar teve dois pesos e duas medidas em relação aos judeus. Por exemplo, em relação aos judeus com nacionalidade portuguesa, sefarditas, ou seus descendentes, na Holanda, nos Balcãs, na Turquia, na África do Norte..., muitos poderiam ter sido salvos... e não o foram...

Nesta foto, as crianças parecem  estarem  enquadradas por elementos da PVDE (Polícia de Vigilância e Defesa do Estado), antecessora da PIDE (Polícia Internacional e Defea do Estado)...

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Notas do editor:

2 de fevereiro de 2024 > Guiné 61/74 - P25128: Capas da Vida Mundial Ilustrada (1941-1946) - Parte II: embarque de tropas expedicionárias para os Açores, em maio de 1941

29 de janeiro de 2024 > Guiné 61/74 - P25120: Capas da Vida Mundial Ilustrada (1941-1946) - Parte I: embarque de tropas expedicionárias para Cabo Verde, em junho de 1941.... "Partiram alegres e confiantes"...

sábado, 12 de dezembro de 2020

Guiné 61/74 - P21638: Os nossos seres, saberes e lazeres (428): Em Belmonte, na companhia de Vitorino Nemésio, e não esquecendo Pedro Álvares Cabral (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 2 de Setembro de 2020:

Queridos amigos,
Não fosse eu assumidamente um info-excluído e outro galo cantaria. Andámos em digressão na região de Óbidos e vizinhança, primeira etapa, regressámos à base para retempero, e depois rumou-se a Pedrógão Pequeno, subiu-se à Serra da Estrela, com estadia em Manteigas, de novo em Pedrógão Pequeno para ir à Conservatória entregar a casinha a novo proprietário e montar a operação de ofertas e transferências de trastes.
Entrementes, tiraram-se imagens, muitas, para evitar perdas e a mágoa das mesmas, começou-se por Santa Maria das Salzedas, segue-se hoje Belmonte, agora há que preparar outra visita deslumbrante, ao Mosteiro de S. João de Tarouca, e logo de seguida fazer o elogio do burel, era matéria-prima que ignorava completamente a não ser em fatiota assim especificada. Como a roda da fortuna dá imensas guinadas, dei comigo a ler uma revista Panorama dedicada a Pedro Álvares Cabral, nado e criado em Belmonte, filho de alcaide, o nauta que chegou a terras de Vera Cruz, um número datado de setembro de 1968. E deleitei-me com a prosa de Vitorino Nemésio, chegarei a Belmonte numa atmosfera de canícula e uma neta a pedir constantemente água e sombra, visita abreviada, o guia foi Nemésio e a lembrança para esta terra de judiaria endereçou-se a Samuel Schwarz, como uma das nossas pechas nacionais é a ingratidão, bom seria que se desse ampla divulgação à investida cultural deste engenheiro de minas, que aproveitou poliglota para escrever em diferentes idiomas e portanto em diferentes publicações a importância do fenómeno judaico em Portugal.

Um abraço do
Mário


Em Belmonte, na companhia de Vitorino Nemésio, e não esquecendo Pedro Álvares Cabral

Mário Beja Santos

A revista Panorama publicou-se entre 1941 e 1974, editada pelo Secretariado Nacional da Informação, Cultura Popular e Turismo (outrora o SNI), e o número a que fazemos referência data de setembro de 1968, o tema era Pedro Álvares Cabral, sobre ele irão dissertar nesta publicação, entre outros, Damião Peres, Hernâni Cidade e Alberto Iria. Mas o texto, no meu modesto entender, de maior vibração, era assinado por Vitorino Nemésio e intitulava-se “Porto seguro em Belmonte”. Estou a relê-lo em Manteigas, amanhã iremos a Belmonte, passaremos ainda por Portalegre antes de arribar em Pedrógão Pequeno. Estou rendido a esta prosa de Vitorino Nemésio, que bom seria que este professor de Cultura Portuguesa amanhã pudesse estar em Belmonte, eu levava esta publicação e pedia-lhe que ele lesse parágrafos admiráveis como estes a propósito do nauta que aportou às terras de Vera Cruz:
“Filho de alcaide, neto de alcaides – eis o que ele é. Valente como as armas, passa de capitão delas em terra a capitão delas no mar. Nada menos parecido estruturalmente com um castelo da Beira do que um castelo de proa. Mas ele, Pedro Álvares, não ia à testa da Armada porque soubesse de rumos e mexesse em papa-figos, senão porque tinha qualidade, coragem e prestança para chefe de chefes. Três, pelo menos, dos seus capitães tinham folha rezada de coisas que não se sabe que ele fizesse: o grande Bartolomeu Dias, seu irmão Diogo Dias e Nicolau Coelho, expertos de larga pilotagem investidos de grandes missões anteriores”. E, mais adiante, caso pudesse acontecer que se ouvisse a voz um tanto roufenha, sibilante e nasalada por restos de falar terceirense deste Grão-mestre da língua portuguesa, pedia-lhe também que lesse o seguinte parágrafo, mas tinha que ser em terras de Belmonte:
“Fui outro dia a Belmonte, com amigos. Romagem cabralina e, para mim (vergonha de coscuvilheiro da história, descobridor sedentário de tudo e de nada!), o vero descobrimento do caminho pela Serra da Estrela desde a Guarda a Viseu. Covilhã, Penhas da Saúde, as lagoas Escura e Comprida a distância, - os brutos, imponentes topónimos de covões que exprimem a rudeza e frieltura da Serra explicados a mim pelo meu piloto em tudo isto, Fernando Russell Cortez. No alto que fizemos em Belmonte, propositadamente não passei de meia dúzia de notas: eu que não sei nada em pormenor de Cabrais e suas alcaidarias, do seu senhorio de Azurara, das muitas e esmeriladas miunças que hão-de colmatar a grande brecha de olvido aberta na vida gloriosa de Pedro Álvares. Preferi respirar o ar serrano do alto da torre albarrã, o ar beirão que sopra já cerca de Espanha, de onde dizem que não vem bom vento, mas vinha! E, por sinal que nestes tempos de calor, sem bafores. A torre, com o paço velho do alcaide-mor desenhado num arco e numa ou outra encosta, a cachorrada de granito sobranceira à porta sobrepujando o brasão das ‘duas cabras passantes’ que deviam estar ‘sotopostas de vermelho e armadas de negro’, mas onde apenas luzia o amarelo sujo do quartzo e o negro da mica corroída”.

Isto e muito mais passou-me pela cabeça, um puro devaneio, mas foi assim que Nemésio veio à procura do rasto de Pedro Álvares Cabral. É um calor tórrido, quase sufocante que nos recebe nesta encosta oriental da Serra da Estrela, é a chamada visita de médico, uma passagem fugaz por este belo castelo, quem resiste a não ficar especado diante daquela janela esplendorosa e vaguear sem olhar para trás no interior do castelo? Passa-se à Igreja de Santiago, há uma criança de nove anos a insistir que quer uma garrafa de água, entra-se no museu judaico com o firme propósito de ir cumprimentar o legado do Engenheiro de Minas Samuel Schwarz, um polaco que se afeiçoou por Portugal, que se naturalizou português e, entre outras proezas, comprou a Sinagoga de Tomar e a ofereceu ao Estado, não se fazem negócios com monumentos nacionais, acresce tratar-se da mais representativa sinagoga tardo-medieval em território português, examina-se cuidadosamente as vitrinas que o homenageiam, é pena saber-se tão pouco sobre este herói português que em boa hora veio trabalhar nas minas da região.

Mandaria o bom-senso turístico que toda esta visita se prolongasse e motivos não faltam, a vila romana da Quinta da Fórnea, as capelas e a sinagoga, visitar mesmo o Convento de Nossa Senhora da Esperança, com tantas ligações ao credo religioso de Cabral. Nisto se repete o que insistentemente já se escreveu noutros lugares e neste: a viagem nunca acaba, quem acaba são os viajantes ou os seus sonhos idealizados ou por idealizar, volta-se qualquer dia, há legítimo pretexto para regressar, estamos enamorados pelos dias de Manteigas e pelo que se visitou na Serra da Estrela, e pela descoberta do burel, de que mais adiante falaremos, há míngua de textos, daremos vazão às imagens, pois pode dar-se o caso de algumas delas valerem por mil palavras.
Uma imagem imponente do Castelo de Belmonte com janela manuelina
Pormenor do Castelo de Belmonte
Belmonte na Rede de Judiarias de Portugal, com Pelourinho à frente
Escritor Vitorino Nemésio
Igreja de Santiago e Panteão dos Cabrais
Revista Panorama, número de setembro de 1978
Sinalética para o Museu Judaico de Belmonte
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Nota do editor

Último poste da série de 5 de dezembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21613: Os nossos seres, saberes e lazeres (427): Na RDA, em fevereiro de 1987 (6) (Mário Beja Santos)

segunda-feira, 2 de dezembro de 2019

Guiné 61/74 - P20407: Agenda cultural (717): Homenagem a Samuel Schwarz: Belmonte, Museu Judaico, 19 e 20 de dezembro de 2019





Cartaz do programa de homenagem que Belmonte vai prestar, nos dias próximos dias 19 e 20, ao engenheiro de minas, arqueólogo, bibliófilo, poliglota, escritor,  investigador e historiador da comunidade judaica portuguesa,   Samuel Schwarz (Zgierz, Polónia, 1880 - Lisboa, 1953), "cidadão do mundo, português por opção", e que foi, além disso:

(i)  avó dos nossos amigos Pepito  (1949-2014)  [, tem 230 referências no nosso blogue] e João Schwarz da Silva [, autor do sítio "Des Gents Intéressants"];

(ii) pai da nossa "Mulher Grande", Clara Schwarz  (1915-2016) [, tem meia centenas de referências no nosso blogue];

(iii)  e bisavô (paterno) da nossa jovem amiga e grã-tabanqueira Catarina Schwarz que vive em Bissau.

O cartaz chegou-nos por email de João Schwarz da Silva, membro da nossa Tabanca Grande, nº 768, desde 30 de março de 2018. (Recorde-se que o João nasceu em Alcobaça em 1944, e foi para a Guiné pela primeira vez com 4 anos. Depois da morte do seu avô Samuel Schwarz em Lisboa , em 1953, voltou para Bissau onde frequentou o Colégio Liceu Honório Barreto, onde a mãe era professora,  até à sua vinda para a universidade, em Lisboa, em 1960.)

Informações adicionais:

Museu Judaico de Belmonte:

Aberto de Terça a Domingo
Horário de Inverno  (15 de Setembro a 14 de Abril)
das 9h00 às 12h30m e das 14h00m às 17h30m

Sinagoga de Belmonte:

Rua da Fonte da Rosa 41, 6250 Belmonte


Na sua página na Net, "Des Gens Intéressants", João Schwarz, membro da nossa Tabanca Grande, tem uma detalhada, extensa  e bem documentada nota biográfica, em francês, com alguns excertos em português,  sobre o seu querido avô, Samuel Schwarz.  (Na foto acima, que reproduzimos com a devida vénia, podemos ver avô e neto, em Lisboa, em 1952, um ano antes de o Samuel morrer ; na época, ele vivia no 1º andar do nº 118, da Av António Augusto de Aguiar.)

O João vive, de há muito,  em Paris. Mandou-me o programa de homenagem ao seu avô, dizendo-me que gostaria muito de me ver por lá..., em Belmonte.  Eu, também, gostaria, mas vai-me ser impossível deslocar-me a Belmonte, nessa data,. por compromissos de agenda: tenho de acolher os outros avós da minha neta, que acaba de nascer, e que vêm do Funchal passar o Natal connosco. Desejo ao João um feliz regresso a Belmonte, terra com a qual o seu avô tinha uma relação muito especial, única. Afinal, foi ele quem descobriu a comunidade cripto-judaica de Belmonte, nos anos 20 do século passado.

E,  a propósito, relembro algumas das conversas que tive o privilégio de manter, na Tabanca de São Martinho do Porto,  com a saudosa mãezinha do Pepito, do João e do Henrique, a Clara Schwarz, que foi, durante anos, a decana da nossa Tabanca Grande. Como os nossos leitores sabem, a nossa querida Clara morreu em 2016, com 101 anos: aliás, "não morreu, simplesmente desistiu de fazer anos"... Era uma grande senhora e tinha pelo pai um amor incondicional, uma admiração imensa... Não posso deixar de reproduzir o comentário que ela escreveu, em janeiro de 2011, na véspera de fazer 96 anos (!), a respeito do seu pai, Samuel:

 "Como não sentir uma forte emoção, ao dar-me conta de que o meu pai é ainda hoje lembrado e os seus trabalhos continuam a ser editados, passadas que são quase seis décadas depois da sua morte?

"Recordo-o como uma personalidade forte e empreendedora, um homem de uma cultura vastíssima, um hebraísta reconhecido, um militante sionista, que falava correntemente nove línguas e possuía uma valiosa biblioteca. Engenheiro de minas de formação, era também um estudioso e um escritor, tendo feito a primeira tradução, directamente do hebraico para o português, do 'Cântico dos Cânticos' de rei Salomão.

"Para além de 'Os Cristãos-Novos em Portugal no Século XX', uma investigação sobre a comunidade marrana da vila de Belmonte e os seus rituais secretos, o seu livro mais conhecido, publicado em 1925 e de que aqui se apresenta a tradução em língua francesa, cito de memória dois outros escritos seus: a monografia 'As inscrições Hebraicas em Portugal' e o livro editado postumamente sobre 'A Moderna Comunidade Israelita de Lisboa'.

"Graças a ele, foi possível recuperar a Sinagoga de Tomar, a única que se conserva posterior ao decreto da expulsão dos judeus de Portugal, de Dezembro de 1496, mandada construir por Henrique, o Navegador, no século XV. Adquiriu-a, com o intuito de nela se vir a estabelecer um Museu Luso-Hebraico e, nesta condição, doou-a em 1939 ao Estado português.

"Lembro-me dele como uma pessoa tolerante, que com todos se relacionava, sem distinção de raça, cor da pele ou religião, um homem de uma grande bondade, mas sem disso fazer qualquer alarido. Soube, por exemplo, ainda há pouco tempo, com total surpresa, lendo o livro 'Mémoires', recentemente publicado em França, da autoria do irmão dele, o pintor e escultor Marek Szwarc, que foi o meu pai que lhe sugeriu a ida para Paris e o ajudou materialmente nos primeiros tempos da vivência nesta cidade.

"Nascido numa família de judeus polacos, sionista convicto, o seu sonho era o de poder um dia ir viver para Israel. Algo que se transformou numa intenção firme, sobretudo após o falecimento da mulher. A doença que o atingiu nos últimos anos da vida, impediu-o infelizmente de concretizar este desejo.

"Em 1953, estando junto dele com os meus dois filhos mais velhos [, Henrique e João]
, perdi-o para sempre. Ele foi para mim também um irmão, um amigo e um querido mestre, alguém por quem tinha uma adoração profunda e que permanecerá para sempre na minha memória.

"Clara Schwarz da Silva."


[Fonte: Página de João Schwarz >  Des Gens Intéressants >  Samuel Schwarz ] (com a devida vénia...)]
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Nota do editor:

terça-feira, 17 de abril de 2018

Guiné 61/74 - P18531: Agenda cultural (635): Convite para a inauguração da exposição "A Biblioteca de Samuel Schwarz, espelho de uma vida", amanhã, dia 18, 4ª feira, às 17h30, na Assembela da República (João Schwarz)


Cinquenta e cinco anos depois da nossa muito querida e saudosa amiga Clara Schwarz (1915-2016) ter chegado a um acordo com o Estado Português para a preservação e conservação da preciosa biblioteca do seu pai, Samuel Schwarz, Portugal homenageia a este homem, avô do Pepito e do João, que nos deixou um importante legado cultural.

Já o seu pai, Isucher Szwarc, nascido em Zgierz, na Polónia,  era detentor de uma um das  maiores bibliotecas  privada do país e a sua casa era o ponto de encontro de intelectuais de primeiro plano da Haskalá (movimento do iluminismo judaico, surgido na Alemanha no séc. XVIII).

Samuel veio para Portugal em 1914, e aqui prosseguiu os estudos sobre a história dos judeus portugueses, a par da sua atividade profissional como engenheiro de minas e homem de negócios. A biblioteca do pai, Isaque., foi pilhada   pelos nazis, desconhecendo-se o seu paradeiro.

A biblioteca do filho, Samuel  (e em especial a "biblioteca hebraica")  foi transferida para os arquivos históricos do Ministério das Finanças em 1953, em condições muito deficientes de transporte e depois de conservação, arquivo e salvaguarda. ...

Só em 1986 (!), a  biblioteca de Samuel Schwarz (ou que restava dela) foi finalmente parar a "boas mãos", a Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade NOVA de Lisboa...  Foi preciso mais de meio século para, na casa da democracia, se dar a conhecer aos portugueses algumas das raridades da biblioteca de Samuel Schwarz (que em vida reuniu mais de 10 mil livros)...De qualquer modo, o ncleoo importante da biblioteca é chamada "biblioteca hebraica" (c. de mil livros e incunábulos).

Eu lá estarei amanhã para homenagear este homem, a quem se deve, entre muitas outras coisas, a descoberta da antiga sinagoga de Tomar (, edifício que ele próprio comprou, com dinheiro do seu bolso, e de que fez doação ao Estado Português), a par da descoberta da comunidade cripto-judaica de Belmonte. Nunca esquecerei o amor filial e a admiração intelectual que por ele tinha a sua filha Clara Schwarz. Esse trabalho de culto da memória tem sido continuado pelo seu filho João, irmão do Pepito. (LG)


1. Mensagem que nos foi enviada pelo nosso grã-tabanqueiro João Schwarz da Silva, hoje, às 11h38:

Caro Luís

Junto envio um convite para a exposição que terá lugar a partir de amanhã na Assembleia da Republica.

Abraços, João,


2.  Trata-se de um convite da Assembleia da República e da Faculdade de Ciências e Humanas (FCSH) da Universidade NOVA de Lisboa (UNL) para a inauguração da exposição "A Biblioteca de Samuel Schwarz, espelho de uma vida", no edifício da Assembleia da República, amanhã, 4ª feira, dia 18 de abril,  às 17h30 (no final da sessão plenária).

O engº Samuel Schwarz (Zgierz, Polónia, 1880 - Lisboa, 1953) tem meia dúzia de referências no nosso blogue. Foi pai da nossa grã-tabanqueira Clara Schwarz (Lisboa, 1915-Lisboa, 2016), e avô (materno) do Carlos Schwarz da Silva, 'Pepito' (Bissau, 1949-Lisboa, 2014) e do João Schwarz da Silva, ambos membros da nossa Tabanca Grande, bem como bisavô (paterno) da nossa jovem amiga e grã-tabanqueira Catarina Schwarz que vive em Bissau.


3. Excerto da notícia relativa à à Biblioteca de Samuel Schwarz, que vai  ser exposta na Assembleia da República 

(...)  Samuel Schwarz juntou, ao longo de 73 anos de vida, uma extensa biblioteca, principalmente dedicada a temáticas judaicas. Depois de dezenas de anos no Arquivo Histórico do Ministério das Finanças, esta coleção está hoje a cargo da Biblioteca Mário Sottomayor Cardia, da NOVA FCSH. A partir de 18 de abril e até 22 de maio, fica em exposição na Assembleia da República.

Esta mostra biobibliográfica, que fará igualmente parte das comemorações do Parlamento de Portas Abertas, a 25 de abril, estará dividida em três núcleos: um dedicado ao percurso de vida de Samuel Schwarz, com vários objetos pessoais e fotografias, outro com uma seleção de livros da sua biblioteca pessoal (alguns bastante raros, do século XVI e seguintes) e o terceiro com obra do próprio.

Samuel Schwarz, com formação em engenharia de minas, naturalizou-se português em 1939 e distinguiu-se como investigador e historiador, tendo publicado obras de referência acerca da presença dos cripto-judeus, também chamados marranos, em Portugal. O seu trabalho foi fundamental no processo de desocultação dos cripto-judeus portugueses.

Chegou ao nosso país em 1914, para trabalhar na extração de volfrâmio. No entanto, ainda no início dos anos 20, iniciou uma atividade paralela como arqueólogo e etnógrafo, o que lhe permitiu identificar a sinagoga de Tomar, que adquiriu e ofereceu ao Estado português em 1939. Algumas das fotografias que o próprio tirou nessa época farão parte do primeiro núcleo da exposição no Parlamento português, em formato físico ou digital.

Será também exposta uma seleção do seu acervo bibliográfico, que constituirá o segundo núcleo da exposição. Marcel Paiva do Monte, da Divisão de Bibliotecas e Documentação da NOVA FCSH, refere uma biblioteca “de grande coerência”, cujas obras estão maioritariamente relacionadas “com o povo judeu, a sua história, religião, língua e cultura”.

Da sua carreira como investigador serão também expostos alguns exemplares das suas publicações, entre artigos, livros e ensaios, que constituirão o terceiro núcleo desta exposição. Estas obras estão presentes nas suas versões originais, datilografadas ou manuscritas, mas também em versões e edições mais recentes, atualmente disponíveis na Biblioteca Mário Sottomayor Cardia.

Esta exposição teve origem num projeto de estudo e preservação do fundo de Samuel Schwarz, financiado pela Fundação Calouste Gulbenkian com o apoio da Direcção-Geral do Livro dos Arquivos e das Bibliotecas.(...)

(Fonte: FCSH / UNL,  14 abr 2018. Adapt. , com a devida vénia)

4. Sobre a biblioteca de Samuel Schwarz, ver ainda aqui, no síto do seu neto, João Schwarz:

Des Gents Interessants > Samuel Schwarz >  La bibliothéque de Samuel Schwarz [2012, em francês]

Vd. também o artigo a “Les bibliothèques de Isucher et Samuel Schwarz” [, em formato pdf, 9 pp., em francês].


Página do nosso amigo e grã-tabanqueiro João Schwarz > Des Gens Intéressants > "Eis aqui um mundo de outrora e de gentes que tiveram uma vida interessante. O que vai de Odessa a Lisboa, passando por Lisboa, Paris, Rio de Janeiro, Dacar, Montreal, Tel-Avive. Bissau e Zgierz. Todos têm por único atributo comum fazer parte da mesma família e ter conhecido sob uma forma ou outra as agruras da gierra ou da perseguição". [tradução do francês, LG]

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Nota do editor:

sexta-feira, 30 de março de 2018

Guiné 61/74 - P18471: Tabanca Grande (459): João Schwarz, novo grã-tabanqueiro, nº 768


João Schwarz da Silva, nosso novo grã-tabanqueiro, nº 768..
É o autor da página Des Gens Intéressants,
onde tem perpetuado as memórias de amigos e familiares.
Tem já uma dezena de referências no nosso blogue.


1. Mensagem do João Schwarz, com data de hoje, enviada às 09:29


Olá,  Luís. Aqui vai a fotografia.

Quanto à autoapresentação,  proponho um texto com pequenas recordações da Guiné. Não são duas ou três linhas mas são elementos de uma vida.

Nasci em Alcobaça em 1944, e fui para a Guiné pela primeira vez com 4 anos. Depois da morte do meu avô Samuel Schwarz em Lisboa [, em 1953,] voltei para Bissau onde frequentei o Colégio Liceu Honório Barreto até à minha vinda para a universidade, em Lisboa, em 1960. 

Éramos sete na turma a terminar o 7° ano do Liceu. Destes sete, três vieram para a Universidade em Lisboa. Os outros três desapareceram para o Senegal ou para a Guiné Conakri. Durante muitos anos o reitor do Liceu de Bissau era o Sr. Pequito que toda a gente chamava Sr. Periquito. 

Homem de muita idade, o Sr. Pequito não podia conceber que os rapazes tivessem um certo interesse pelas raparigas. Nos intervalos das aulas os rapazes do pavilhão de baixo iam ver as meninas do pavilhão de cima brincar. Um belo dia o Sr. Pequito viu que havia rapaziada a mais e mandou um berro que entrou para a história: "Saias para cima,  calças para baixo". Acho que não teve outra solução se não  a de demitir-se depois de uma tal bronca.

Com os meus pais [Clara Schwarz e Artur Augusto da Silva,]  visitei toda a Guiné numa época em que só havia 60 km de estrada alcatroada entre Bissau e Mansoa. Passávamos as férias do Natal e da Páscoa em Varela,  no hotel do Sr. Pireza. 

No Natal pendurávamos "neve artificial" nas casuarinas en frente do hotel. Havia um conjunto de casas que tinham sido construídas por varias instituições nas quais eram albergados os amigos deste ou daquele. Para evitar qualquer potencial conflito de interesses,  o meu pai comprou um terreno onde mandou construir uma casota de férias. Lembro-me de assistir ao desembarque, na praia de Varela, de centenas de tartarugas,  o que nos levava a fazer omeletes gigantescas de ovos de tartaruga com sabor a peixe. 

A partir de Varela íamos muitas vezes a Ziguinchor [, no Senegal,]  comprar "coisas modernas" tais como iogurtes. Em Varela lembro-me também de assistir à prospecção de petróleo por uma companhia americana que, quando se foram embora,  deixaram por todo o lado frigoríficos, barcos de fundo chato e material de transporte. O meu pai comprou um desses frigoríficos que era tão bom que só foi reformado em 2014, ou seja,  com 60 anos de serviço. O conceito de obsolescência programada não tinha ainda integrado o mundo industrial. 

Em 1958, com 14 anos, os meus pais decidiram mandar-me em visita à família no Canadá e nos Estados Unidos. Com um passaporte emitido em Bissau e um visto americano concedido em Dakar, lá parti em viagem. Chegado a Chicago, vindo de Montreal, a polícia decidiu entrevistar-me durante umas boas horas pois não sabiam onde era a Guiné.

No meu melhor inglês expliquei que a Guiné era em África e até pedi um mapa do mundo para melhor explicar a situação.Tanto olharam para aquele passaporte que perdi o avião para São Francisco. A polícia não fazia a minima ideia sobre a existência de um continente além do continente americano. 

Em 1968 fui de férias a Bissau onde tirei a carta de condução num dia. Lembro-me que tive que responder à pergunta "O que se faz quando a cancela do comboio esta baixada?". Várias vezes fomos a Dakar de carro com passagem por Bathurst [, hoje Banjul, capital da Gâmbia], uma verdadeira expedição tantos eram os percalços durante o percurso, com travessias em múltiplas jangadas.

Num dos regressos a Bissau, vindos de Dakar, demos boleia ao Amilcar Cabral.

Mais tarde em 1976, com o Luís Cabral como presidente, voltei à Guiné onde trabalhei durante seis meses como perito das Nações Unidas. Dava aulas de matemática ao pessoal do emissor de Nhacra, e fiz um plano para uma rede de rádio FM que cobria toda a Guiné.

Tempos formidáveis onde se concebia o futuro de ânimo leve. A exceção eram os momentos em que havia um problema de saúde. Entre os médicos russos e cubanos que lá estavam lembro-me que os únicos que tinham mesmo cara de ser médicos eram os Cubanos.

Um grande abraço

João


2. Comentário do editor LG:

O convite,  para o João ingressar na nossa Tabanca Grande, tem dois dias (*):

"Gostava que o João se sentasse à sombra do poilão da Tabanca Grande, no lugar nº 768... Não é um lugar físico, é penas simbólico... Somos já 767, entre vivos e mortos, os amigos e camaradas da Guiné, formalmente registados na nossa comunidade virtual...

"Como sabe, exercemos aqui o direito e o dever de memória... A Guiné é o nosso traço de união. O João é um construtor de pontes tal como o Carlos. E, se aceitar o nosso convite, passamos a tratar-nos por tu, à boa maneira romana, dá mais jeito... Só gostaria de ter,eventualmente, uma foto sua, atual, e duas linhas de autoapresentação.".

Obrigado, João, "quem bebeu a água do Geba", fica com o bichinho da Guiné, vacinado contra muitas doenças e sobretudo protegido contra alguns vícios dos filhos dos cavaleiros do apocalipse:  a estupidez, a intolerância, a arrogância, o racismo...

Obrigado, João, pela bem humorada e pessoalíssima apresentação à Tabanca Grande onde se reúnem amigos e camaradas da Guiné. Os camaradas tratam-se por tu, encurtando eventuais distâncias e facilitando a comunicação.  O João, filho da Clara e do Artur, mano do Pepito, está à vontade para me tratar por tu. Por mim, é uma honra acolhê-lo, a partir de agora, nesta comunidade que é mais do que virtual: a Tabanca Grande é a mãe de todas as tabancas, incluindo a Tabanca de São Martinho do Porto.. Pode ser que, com o João, a gente ainda volte lá em dia, em agosto, para homenagear os nossos grã-tabanqueiros, a Clara e o Pepito. (**)

Enfim, para os novos grã-tabanqueiros, costumamos sugerir a leitura, por alto, das 10 regras da política editorial do blogue...
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Notas do editor:


(**) Último poste da série > 26 de março de  2018 > Guiné 61/74 - P18461: Tabanca Grande (458): António Joaquim Alves, natural da Malveira, Mafra, a viver no Carregado, Alenquer: ex-sold at cav, CCAV 8351, "Os Tigres de Cumbijã", destacado no COMBIS, Bissau, 1972/74... Senta-se à sombra do nosso poilão no lugar n.º 767

quinta-feira, 29 de março de 2018

Guiné 61/74 - P18466: História de vida (45): O meu saudoso mano mais novo, Carlos Schwarz da Silva, "Pepito" (1949-2014) (João Schwarz da Silva) - Parte II


Alcobaça > São Martinho do Porto > 13 de Agosto de 2011 > Convívio da Tabanca de São Martinho do Porto > Os facebook..eiros Isabel, Pepito e Alice...

Foto (e legenda):© Luís Graça (2011). Todos os direitos reservados [ Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Alcobaça, São Martinho do Porto > Casa do Cruzeiro > 11 de agosto de 2012 > 3ª edição do convívio anual da Tabanca de São Martinho do Porto > O anfitrião do encontro e régulo da Tabanca, Pepito,  diretor executivo da AD - Acção para o Desenvolvimento, de férias em Portugal. Sempre otimista (mesmo em relação ao futuro do seu país, onde nada funcionava até então, a nível da administração pública...), falou-me com grande entusiasmo do novo projecto em que a AD estava envolvida, "Cacheu, caminho de escravos"...

Foto (e legenda): © Luis Graça (2012). Todos os direitos reservados. [ Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Continuação da publicação do texto do João Schwarz da Silva sobre o seu malogrado mano mais novo, membro da nossa Tabanca Grande, que nos deixou há 4 anos atrás. e que tem por título Carlos Schwarz (Pipito), 

Revisão / Fixação de texto / Subtítulos / Fotos: LG (*)


O meu saudoso mano mais novo, Carlos Schwarz da Silva, "Pepito" (1949-2014) (João Schwarz da Silva) - Parte II



Entrada para o Instituto Superior de Agronomia, 
em Lisboa, em 1966

No período 1961-1967, passei pelo Técnico e pela faculdade de Ciências mas o que mais me divertia era o processo de contestação em vigor. Os dias de luto estudante seguiam-se a outros dias de manifestações e a corridas a fugir da polícia de choque. O Pipito entrou para Agronomia em 1966 e antes só o víamos nas férias em São Martinho.

No verão de 1967, depois de ter sido convocado a apresentar-me no quartel onde me esperava uma carreira de paraquedista militar na Guiné, desapareci calmamente para o Canadá,  tendo assim deixado Portugal, como país de vida, para sempre.

Em fins de 1973 fomos passar uns dias a Ayamonte (Espanha) onde os meus pais dispunham de uma apartamento emprestado na Isla Canela. O Carlos, a Isabel e a pequena Pepas [,Cristina,] lá apareceram. Lembro-me de passeios na praia apesar do frio natalício.

Mais tarde e ainda como residente no Canadá, respondendo a um anóncio da UIT [, União Internacional de Telecomunicações,] fiz um pedido para trabalhar na Guiné como perito em radiodifusão. Passei seis meses em Bissau em 1976, em condições de sonho, pois tinha um carro posto à disposição pelas Nações Unidas, vivia em casa do Pipito, tinha um local de trabalho no edifício dos correios onde estava situada a rádio e vivia um período de renascimento da Guiné onde tudo parecia possível.

Grande admirador dos filmes do Charlot

Foi um época extraordinária com a Guiné a atravessar um período revolucionário onde tudo ou quase tudo resultava do contributo de cada um. As barreiras sociais caíram, éramos todos camaradas. Assim quando era preciso descarregar um barco apelava-se à presença de voluntários. Nessa altura as lojas pouco ou nada vendiam e, quando chegava uma remessa de um bem qualquer, ele desaparecia imediatamente dos Armazéns do Povo. Foi assim que um dia vi alguém sair dos Armazéns do Povo tendo, à cabeça, dezenas de rolos de papel higiénico, ou seja todo o stock do que estava disponível.

No cinema da UDIB,  e graças a acordos com outros países revolucionários, havia festivais de cinema nomeadamente argelino, com a projecção de filmes tais como “Chronique des années de braise” e “Le vent des Aurès”.

A propósito de cinema, o Pipito grande admirador de Charlie Chaplin,  tinha uma colecção de filmes do Charlot muito completa. Na casa onde ele vivia, na Rua Vitorino Costa, assisti a numerosas sessões de projecção de filmes do Charlot com o projector instalado em cima do muro exterior da casa e com o ecrã na varanda da casa. Os miúdos que viviam ali ao pé, vinham aos montes assistir às sessões de cinema a tal ponto que começaram a aparecer miúdos que aproveitavam a sessão de cinema para vender mancarra. Lembro-me que o filme mais apreciado pela miudagem era o Charlot Policia que fazia as delicias de todos.

As ilusões revolucionárias perdidas...
mas não a necessidade de continuar a lutar
por uma sociedade mais justa

Ao jantar em casa do Pipito tínhamos muitas vezes discussões de natureza politica. Ele nessa altura continuava a ser um marxista-leninista convicto, guiado que era pela necessidade de resolver com iniciativa, trabalho e abnegação os problemas sociais e económicos do país. Lembro-me nomeadamente de discussões épicas sobre o papel de Mao na China e sobre os resultados a que se tinha chegado neste país. As vezes eu tinha a audácia de mencionar os “ilustres feitos” do camarada Enver Hodja, da Albânia revolucionária, mas o Pipito não admitia que se pudesse pôr em causa a utopia na qual ele acreditava. Eu tentava proclamar que o marxismo-leninismo era obsoleto, e o Carlos afirmava que eu era um adversário e inimigo do proletariado e da revolução.

Penso que mais tarde perdeu as ilusões revolucionárias sem no entanto perder o fundamental, ou seja,  a necessidade de lutar para uma sociedade justa, sem prepotências, sem abusos, sem uma dominação financeira. Acreditava no esforço próprio, na liberdade, na necessidade de evoluir experimentando e na disciplina individual e colectiva. Era um radical determinado mas praticava uma radicalidade sem prepotência.

Anos mais tarde, ainda eu estava no Canadá, penso que devia ter sido em 1980, voltei no Natal à Guiné e fomos todos com os meus pais acampar em Varela. O Pipito levou o material de campismo, os mantimentos, o frigorífico e o gerador eléctrico pois em Varela já não havia hotel e luz eléctrica muito menos. Passámos um fim do ano formidável e até houve fogo de artificio.

Em 1981 apareceu uma oportunidade de trabalho nas Nações Unidas em Genebra. Candidatei-me sem muitas esperanças e, em 1982, deixei o Canadá para sempre. Passei nove anos em Genebra. O Carlos aparecia de vez em quando, pois ia a Genebra tratar de vários assuntos com o Conselho Ecuménico das Igrejas que financiava as múltiplas iniciativas do Carlos na Guiné.


As férias em São Martinho do Porto...
e as suas últimas horas de vida na casa da nossa mãe 

Quando íamos de férias a Portugal, passávamos uma parte do verão em São Martinho do Porto sempre na mesma casa que pouco a pouco se foi tornando muito pequena, pois as crianças iam crescendo. A casa tinha sido oferecida aos meus pais pelo meu avô [, Samuel,] quando os meus pais se casaram. A barafunda quando lá estávamos todos era gigantesca a tal ponto que,  depois da morte do nosso pai, em 1983, decidi mandar construir uma casa ao lado da casa dos meus pais.

A partir dai a nossa relação sofreu uma distanciação que nunca aceitei. O Carlos por razões que era difícil explicar, era capaz de pôr um termo a uma relação de um dia para o outro. Ainda durante a vida do nosso pai,  o Carlos deixou de lhe falar durante uns tempos, muito simplesmente o Carlos não aceitava, nem a brincar, que se pudesse criticar, mesmo a sorrir, o comportamento dele. Eu cometi o erro de lhe falar da “valise en carton” [, "mala de cartão",] que ele levava quando ia a Paris. Não gostou da piada e a partir dai nunca mais teve uma conversa aberta comigo.

Em 2014, horas antes da morte do Carlos, ainda ele estava em casa da minha mãe, fui vê-lo deitado na cama. Todos sabíamos que a partida do Carlos estava para breve. Falei-lhe nas cassetes dos cursos de direito do nosso pai na escola de Direito de Bissau, que eu tinha descoberto. No fim perguntei-lhe se precisava de alguma coisa. Sorriu com tristeza e baixou a cabeça de cansaço ou de dor. Repousa hoje no cemitério de Bissau na mesma campa que os meus pais e o meu irmão Henrique [, o Ica].

6 dez 2017 14:28

Texto: © Joao Schwarz da Silva (2017). Todos os direitos reservados
__________

Nota do editor:


quarta-feira, 28 de março de 2018

Guiné 61/74 - P18463: História de vida (44): O meu saudoso mano mais novo, Carlos Schwarz da Silva, "Pepito" (1949-2014) (João Schwarz da Silva) - Parte I


Lisboa > São Sebastião da Pedreira (ou S. Martinho do Porto?) > 1950 > Em primeiro plano, o Carlos, ainda bebé de meses,  mais os irmãos Henrique (Iko) e João.  Foto do amigo de família, António Lopes. (*)

Foto: © António Lopes (2009). Todos os direitos reservados.[Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Portugal >  Lisboa >  s/d > Anos 50 > Clara Schwarz com os filhos, da esquerda para a direita, João, Carlos (1949-2014) (**) e Iko [Henrique] , também já falecido recentemente. (**)

Foto: © João Schwarz da Silva (2015). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem; Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné] 



Guiné-Bissau > Bissau > Quelelé > Campo polivalente do Quelelé > 18 de março de 2014 > Homenagem da ONGD AD - Acção para o Desenvolvimento ao Pepito > Homenagem ao Pepito, Carlos Augusto Schwarz da Silva (Bissau, 1949-Lisboa, 2014), por parte dos funcionários e parceiros da AD, bem como dos seus muitos amigos e admiradores. É no bairro do Quelelé que fica a sede da AD e a casa do Pepito e da Isabel bem como de outros amigos próximos (por ex., o Nelson Gomes).. Na foto, da esquerda para a direita, a filha mais velha, Cristina ("Pepas), a outra filha,  Catarina, a  viúva, Isabel Levy Ribeiro e o Henrique Schwarz da Silva, o irmão mais velho do Pepito.


Guiné-Bissau > Bissau > Quelelé > Campo polivalente do Quelelé > 18 de março de 2014 > Homenagem da ONGD AD - Acção para o Desenvolvimento ao Pepito > Em primeiro plano, o irmão, Henrique Schwarz  da Silva, o Ika (que vivia em Lisboa, enquanto o irmão João vivia e vive em Paris). O Ika, infelizmente, também já nos deixou o ano passado,

Fotos da AD - Acção para o Desenvolvimento, Bissau (2014).[Edição e legendagem; Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]  (***)


Guiné > Região de Tombali > Guileje > 1 de Março de 2008 > Visita ao antigo aquartelamento e tabanca de Guileje, no âmbito do Seminário Internacional de Guiledje (Bissau, 1-7 de Março de 2008) > Pepito, um dos fundadores e então director executivo da AD - Acção para o Desenvolvimento, com sede em Bissau. Integrou a Tabanca Grande em finais de 2005. Era o único dos três irmãos que ficara a trabalhar em Bissau. Tinha apenas a nacionalidade guineense e vinha regularmente a Lisboa.

Foto (e legenda): © Luís Graça (2008). Todos os direitos reservados [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Mensagem de Luís Graça, com data de 5 do corrente, enviada ao João Schwarz da Silva, que vive em Paris, e administra e edita a página Des Gens Intéressants [, em francês, Pessoas Interessantes ou Notáveis].

Só agora li o seu depoimento sobre o Carlos, na página, que tem vindo a construir com tanta ternura, cumplicidade, labor, rigor e saudade... 

E confesso que me emocionei... Conheço mal o João, passei a conhecê-lo um pouco melhor... E gostei de ler o seu escrito, as suas (in)confidências sobre a vossa relação de uma vida, com todos os pequenos grandes problemas que há em todas as famílias do mundo...

Eu tive o privilégio de ser amigo (infelizmente, da 23ª hora...) do seu mano e da sua mãe, dois seres humanos de eleição, daqueles que precisamos de ter e manter no olimpo dos deuses, porque são mais do que homens, menos do que deuses... Quero eu dizer: precisamos dos seus exemplos, das suas histórias de vida, as suas memórias... 

Conhecemo-nos em 2006, como sabe, e a Guiné foi o nosso traço de união... Tornámo-nos bons amigos, nós e as nossas famílias.

O Carlos tem mais amigos e admiradores no nosso blogue da Tabanca Grande... E eu gostaria de poder partilhar com eles (e com um público mais vasto: o nosso blogue tem cerca de um milhão de visualizações de página por ano) a "petite histoire de vida" do Carlos, contada pelo mano João. 

Como podemos fazê-lo ? Através de um simples link para a sua página ? Ou da reprodução de alguns excertos, ao meu critério ?

O João logo me dirá o que é mais confortável para si e para a memória da família que eu prezo acima de tudo.

Uma boa noite, um "alfabravo" (ABraço) do Luís.

2. Amável resposta do João Schwarz da Silva, com data de 6 do corrente:

Caro Luís,

Obrigado pelos comentários. Utilize como bem entender o conteúdo do meu site. Não tenho preferências nenhumas. Tudo que possa contribuir para manter a memória do Pipito será sempre bem-vindo.

Um grande abraço, João


3. Damos início à reprodução do texto do João Schwarz da Silva sobre o seu malogrado mano mais novo, membro da nossa Tabanca Grande, e que tem por título Carlos Schwarz (Pipito), que nos deixou há 4 anos atrás.

Revisão / Fixação de texto / Subtítulos / Fotos: LG (****)


O meu  saudoso mano mais novo, Carlos Schwarz da Silva, "Pepito" (1949-2014)  (João Schwarz da Silva) - Parte I


O nascimento do Carlos Schwarz da Silva 
 em 1 de dezembro de 1949


Não me lembro bem que horas eram, mas sei que foi no dia 1 de Dezembro de 1949, à noite pois tanto o Ica como eu estávamos a dormir, quando o nosso pai Artur, nos acordou para anunciar com muita satisfação o nascimento do novo irmão. Tinha eu nessa altura 5 anos feitos e o meu irmão Ica (Henrique) 8.

Perguntei como se chamava, Carlos disse o meu pai que nos deixou voltar a dormir. Vivíamos nessa altura numa casa alugada na actual rua Marien N’Gouabi [, em Bissau,] que tinha a particularidade de ter uma enorme varanda que partilhávamos com os nossos vizinhos Osório e Isilda Flamengo, os pais do Fananeca que viria a ser grande amigo do Carlos.

Da varanda da casa podíamos ver do outro lado da rua, um descampado com um enorme poilão. À esquerda desse descampado havia uma casa que devia estar alugada a uma associação de músicos que se reuniam regularmente, penso eu, aos sábados para tocar musica. Para nós era uma atracção enorme pois eles conseguiam fazer uma barulheira incrível com trombetas e saxofones.

Depois do nascimento do Carlos, ficamos em Bissau mais uns meses pois entretanto a nossa avó Agatha tinha morrido em Lisboa em Agosto de 1950.

Clara, a nossa mãe, que adorava o pai Samuel, quando da morte de Ágata, não quis deixar o pai sozinho e pensou que seria uma boa ideia mandar-me a mim e ao Ica para Lisboa onde o avô Samuel se encarregaria da nossa educação. O Carlos ficou a viver em Bissau por ser pequeno demais e só voltamos a viver juntos depois da morte de Samuel que teve lugar em Junho de 1953.

No entanto nas férias do verão de 1951, os nossos pais vieram até Lisboa. Enquanto eu andava na escola primária ali mesmo, ao lado, na qual fiz a segunda e terceira classe, o Ica entrou para o Liceu Camões onde foi até ao 2° ano do liceu (terminou o primeiro ciclo).

Lembro-me particularmente do meu pai trazer latas de chocolate Cadbury-Mackintosh que tinha quilos de bombons que infelizmente tínhamos que partilhar com a numerosa primalhada que aparecia em casa do meu avô.

Em Lisboa vivíamos no 118, 1°,  na Av António Augusto Aguiar em frente ao que é hoje o Corte Inglês. Era um apartamento enorme com um corredor todo à volta e com tantos quartos que alguns estavam sempre fechados. Havia também uma sala dedicada à biblioteca do meu avô na qual se entrava em silêncio.


Lisboa, c. 1920 > Clara Schwarz (1915-2016), com os pais, Samuel e Ágata. 
Foto: cortesia de João Schwarz

A origem do 'nick-name', Pepito 
[ou Pipito]

Depois da morte de Samuel, em princípios de Outubro de 1953, regressamos a Bissau no navio Ana Mafalda que tinha algumas cabines de passageiros. A viagem durava sete dias e passamos pela Madeira e por Cabo Verde. A chegada a Bissau, como não havia ainda uma ponte cais, o navio ancorava no meio do rio e os passageiros iam para terra num barco a motor. O Ica tinha entretanto ido para Montreal no Canadá onde passou um ano em casa do tio Oles e da tia Sónia.

De regresso a Bissau em 1953, fui para a escola primária que nessa altura estava mesmo atrás do tribunal e lá fiz a quarta classe. Numa carta que escrevi ao Ica em Fevereiro de 1954 queixava-me de não ter ninguém com quem brincar pois o Pepito só queria andar de triciclo. Lembro-me que nessa altura tínhamos uma empregada doméstica, a Vitoria (Toia), que levava o Carlos a passear até à ponte cais do Pidgiguiti. Passando um dia em frente do tribunal, tentei explicar ao Carlos que era ali que o nosso pai trabalhava

As únicas revistas de banda desenhada para jovens que se podiam comprar em Bissau eram o Mundo de Aventuras e o Cavaleiro Andante que apresentavam heróis como o Sitting Bull, o Beau Geste ou o capitão Hadock. Numa das múltiplas histórias contadas no Cavaleiro Andante aparecia um herói que se chamava Agapito. Não sei porque razão pensei em atribuir ao Carlos o nome de Agapito, o facto é que ele não conseguia dizer Agapito e dizia em vez Pipito. Ficou-lhe o nome para a vida inteira, pelo menos na Guiné.

Continuamos a viver na mesma casa com o Fananeca ao lado. O Pipito durante esse tempo mostrou-se sempre extremamente irrequieto, passando a vida a aparecer debaixo das cadeiras ou surgindo debaixo da mesa, a tal ponto que usávamos a expressão “lagartixa eléctrica” para nos referirmos a ele.

Frequência do liceu Honório Barreto 
e férias em Varela


Entrei para o primeiro ano do liceu, na altura colégio-liceu Honório Barreto, no Outono de 1954. Situado na praça do Império à direita do palácio do governador, era um liceu muito pequeno com um número muito reduzido de alunos, que mais tarde foi convertido em museu. Fiz neste edifício o primeiro ciclo.

Durante a minha estadia na Guiné, de Outubro 1953 ao verão de 1962, íamos todos os anos pelos menos na altura do Natal e na Páscoa até Varela, onde ficávamos hospedados no hotel do Sr. Pireza. Nos primeiros tempos a ida de Bissau para Varela era uma verdadeira expedição que levava quase 8 horas com a travessia de dois rios (e duas jangadas) e com múltiplos percalços no percurso (pontes de madeira sem traves, vacas a passear, jiboias a atravessar a estrada) passando por Mansoa, Bissorã, Barro, Ingoré, Sedengal, São Domingos , Susana e finalmente Varela.

Em Varela, o Pipito quando não íamos à praia, passava o tempo a jogar pingue-pongue com os amigos, e a brincar com o chimpanzé do Sr. Pireza que passeava em liberdade pelo restaurante no terraço a pique sobre o mar.

Ao fim de um certo tempo o meu pai decidiu mandar fazer uma casa que hoje é uma ruína.

A diferença de idades entre o Pipito e os irmãos mais velhos (8 anos e 5 anos) levou a que ele fosse sempre tratado pelos irmãos com uma certa condescendência. Aproveitávamos o facto de sermos mais velhos para lhe dar ordens, às vezes com atitudes muito despóticas. Uma vez em Bissau consegui levar o Pipito a tal extremidade de desespero que ele me atirou uma faca de cozinha que veio a voar até se espetar na porta que eu tive tempo de fechar.

Em Lisboa no apartamento da rua Augusto Gil, alugado pelos meus pais (Setembro 1961) em preparação da nossa vinda para a universidade, lembro-me de duas histórias que levavam o Pipito ao auge da revolta contra o despotismo. Uma delas fazia alusão ao facto de a certa altura o Pipito ter engordado mais do que seria de esperar. Deveria ter ele 11 ou 12 anos. O meu irmão Ica começava o gozo com um anúncio radiofónico da extracção da lotaria Santa Casa da Misericórdia. O Ica ia dando os números sorteados e eu respondia, 10 contos, 20 contos etc., e o Pipito começava a espumar. O anúncio dos números sorteados continuava até que finalmente saía o primeiro prémio. Nessa altura o locutor da Santa Casa gritava que nem um possesso “Saiu a Gorda” e o Pipito entrava em transe pois o Ica e eu começávamos a dançar à volta dele uivando “A Gorda”, “A Gorda”.

Mais tarde e não sei porque razão se não a de colocar o Pipito em transe, uma nova história foi inventada. Dizia o Ica num tom muito solene “O general saiu a dar o seu passeio matinal, selem o minhoca” . Nessa altura eu obrigava o Pipito a agachar-se para que o general pudesse montar a cavalo. O Ica exibia uma chibata fictícia para acelerar o processo e o Pipito perdia totalmente as estribeiras.

Talvez tenha sido por este motivos que o Pipito durante toda a vida deu provas de irritação quando confrontado com o abuso de poder. Manifestava uma aversão total em relação à arrogância de uns, ao despotismo de outros e à imbecilidade de muitos.  Neste último caso reagia contra, com um humor acérrimo herdado do pai,  o que penso deve ter contribuído para um certo número de inimizades.

No verão vínhamos quase sempre a Portugal e passávamos as férias em São Martinho do Porto, com toda a primalhada. No verão de 1958, fomos todos, em dois carros, até Bruxelas para ver a Exposição Universal. Quatro anos mais tarde fomos a Marrocos de carro,  passando por Algeciras, Ceuta Tetuão e Tânger.

(Continua)

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Nota do editor - Leituras adicionais: vd. página de João Schwarz:

(i) Sobre o avô materno Samuel Schwarz (Zgierz, Polónia, 1880 - Lisboa, 1953) > Des Gents Intéressants > Samuel Schwarz (em francês);

(ii) Sobre o avô paterno Artor Augusto da Silva (Nova Sintra, Ilha da Brava, Cabo Verde, 1912 . Bissau, 1983) > Des Gents Intéressants > Artur Augusto Silva

(iii) Vd. também, no nosso blogue, o texto autobiográfico do Pepito > 31 de Julho de 2008 > Guiné 63/74 - P3101: História de vida (13): Desistir é perder, recomeçar é vencer (Carlos Schwarz, 'Pepito', para os amigos)

(***) 27 de março de 2014 > Guiné 63/74 - P12904: Notícias dos nossos amigos da AD - Bissau (35): Grande e sentida homenagem ao Pepito (1949-2014), no bairro do Quelelé, em Bissau, onde fica a sede da ONDG e a casa de família

(****) Último poste da série > 4 de dezembro de 2015 >  Guiné 63/74 - P15445: História de vida (43): Anda(va) meio mundo a enganar o outro... Ou o conto do vigário em que caiu a minha pobre mãe quando eu estava em Galomaro e lhe apareceu à porta de casa um falso camarada meu... (Juvenal Amado, autor de "A tropa vai fazer de ti um homem", Lisboa, Chiado, Editora, 2015, 308 pp.)

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2016

Guiné 63/74 - P15740: Agenda cultural (464): Lançamento, em Paris, no Museu de Arte e História do Judaísmo (MAHJ), dia 18, 5ª feira, da edição francesa do livro de Samuel Schwarz (1880-1953), "Os cristãos-novos em Portugal no séc. XX" (1ª ed, 1925) (João Schwarz)



Cartaz de promoção do encontro Os Marranos [os descendentes dos judeus, sefarditas, que viviam na Penínsual Ibérica e que,  tendo sido obrigados a  converter-se ao cristianism - daí o nome cristãos-novos- ,  não abandonaram a sua fé judaica]. 5ª feira, dia 18 do corrente, às 19h30, em Paris, no Museu de Arte e História do Judaísmo (MAHJ). nº 71, da Rua do Templo [Rue du Temple], 750'03 Paris.


Os cristãos-novos em Portugal
no século XX

Autor: Samuel Schwarz
Editora: Cotovia, Lisboa
Colecção: Judaica
Ano de Edição: 2010
N.º de Páginas: 200
ISBN: 978-972-795-309-7
O pretexto é o lançamento do livro de Samuel Schwarz, "La Découverte des Marranes, les crypto-juifs du Portugal" [A descoberta dos marranos, os cripto-judeus de Portugal"], publicado em 2015 sob a chancela da editora Chandeigne.

O encontro terá a participação de: (i) Nathan Wachtel,, professor do Colégio de França; (ii) João Shcwarz, neto do autor;  (iii) Livia Parnes, historiadora; (iv) Anne Limma, editora; e (v) Anny Dayan Rosenman, Universidade de Paris-Diderot, moderadora.

Nota sobre o autor: Samuel Schwarz (1880-1953), judeu polaco, chega a Portugal em finais de 1914; engenheiro de minas no nordeste do país, fez a descoberta, em 1917, de comunidades marranas. Ao fim de oito anos de observação, publica em 1925 um livro, que fez história, e onde se traça o retrato destas comunidades marranas. Ao descrever os seus ritos e os seus hábitos culinários, e ao transcrever as suas orações,  Samuel Schwarz estabelece as bases em que assenta hoje a investigação e o estudo dos marranos. Este livro é publicado pela primeira vez em francês. [Tradução e adptação livre de LG]




1. Mensagem que nos acaba de enviar o doutor João Schwarz,  engenheiro, investigador, a viver em França, neto de Samuel Schwarz, filho da nossa decana Clara Schwarz (n. 1015), e irmão do nosso sempre lembrado e chorado Pepito (1949-2014): 

Caro Luís

Obrigado a si e ao Mário Beja Santos pelos postes sobre Tomar e a Sinagoga (*). Junto envio um anuncio de uma palestra que terá lugar em Paris na semana que vem e que celebra a publicação do livro do meu avô em Francês. Se estiver em Paris é bem-vindo.

Abraços, João


2. Comentário do editor LG:

Samuel Schwarz, aos 20 anos.
Foto do neto,
João Schwarz (com a devida vénia...) 
João, filho de Artur Augusto Silva e de Clara Schwarz, irmão de Henrique e de Carlos (Pepito), neto de Samuel, bisneto de Isuchaar... É um prazer receber notícias do meu amigo. Obrigado pelo convite, mas estou longe em Paris, por esta Lisboa que o viu nascer... Vou, com todo o gosto, dar a notícia no nosso blogue, na nossa agenda cultural.(**)

Sobre o seu avõ, recordo ainda, para os nossos leitores, que ele se instalou em Lisboa com a I Guerra Mundial, já então casado com uma jovem russa, de Odessa (hoje, na Ucrânia). 

Samuel Schwarz, em 1952, em Lisbia,
um ano antes de morrer, com o neto João, Cortesia de
João Schwarz





Samuel Schwarz (1880-1953) será, em Portugal.  um engenheiro de minas e um homem de negócios de sucesso. Mas ficará sobretudo conhecido pela sua erudição, e pelo seu interesse pela história e cultura dos judeus sefarditas (que viviam na Península Ibérica), e em particular pelos marranos, Foi ele que identificou (e salvou do abandono, do esquecimento, da discriminação) a comunidade cripto-judaica de Belmonte.

Foi também ele quem comprou, salvou da ruina  e doou ao Estado Português a antiga sinagoga de Tomar...

A filha (única) de Samuel, Clara Schwarz, foi casada com o advogado e escritor, de origem caboverdiana, Artur Augusto Silva. O casal viveu em Bissau duas décadas, de  1948 a 1966. Formada em letras pela Universidade de Lisboa, Clara Schwarz pertenceu ao núcleo dos fundadores e dos primeiros professores do Liceu Honório Barreto, ao tempo do Governador-Geral da Guiné, Sarmento Rodrigues (1946/49). Vai fazer 101 anos, no domingo, dia 14, dia dos namorados. 

Leituras suplementares:  

(i) Página de João Schwarz (em francês) > Des Gents Intéressants > Samuel Schwarz

(ii) Wkipédia > Samuel Schwarz

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Notas do editor:

(*) Vd. postes de:

10 de fevereiro de 2016 > Guiné 63/74 - P15732: Os nossos seres, saberes e lazeres (140): O ventre de Tomar (4) (Mário Beja Santos)


14 de fevereiro de  2015 > Guiné 63/74 - P14249: Homenagem da Tabanca Grande à nossa decana: a "mindjer grande" faz hoje 100 anos... Clara Schwarz da Silva, mãe do Pepito (1): 100 anos não é apenas uma vida, são muitas vidas, que atravessam dois séculos e muitos lugares do mundo (Luís Graça)

23 de outubro de  2014 > Guiné 63/74 - P13788: Da Suécia com saudade (39): A estrela de David, os Torquemada de Burgos, os marranos de Belmonte... Olhares desde a Lapónia...(Joseph Belo)

19 de fevereiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5841: Controvérsias (67): Como diria o meu avô Samuel, há orações que os lábios murmuram, mas o coração não sente (Carlos Schwarz)

1 de dezembro de  2009 > Guiné 63/74 - P5386: Parabéns a você (46): Carlos Schwarz Silva, simplesmente Pepito, para os felupes, os nalus, os fulas, os companheiros da AD e os tugas... do nosso blogue (Luís Graça)


(**) Último poste da série >  5 de fevereiro de  2016 > Guiné 63/74 - P15709: Agenda cultural (463): Apresentação dos livros "Por Chanas do Leste de Angola", da autoria de Ernesto Fonseca e "Desbravando as Silenciosas Picadas dos Dembos, MX-11-26", da autoria de Aniceto Pires, dia 11 de Fevereiro de 2016, pelas 15 horas, na Messe do Militar do Porto, Praça da Batalha (Manuel Barão da Cunha)