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quinta-feira, 13 de abril de 2023

Guiné 61/74 - P24220: Armamento do PAIGC (2): Ainda as viaturas blindadas BRDM-2: em finais de 1973/princípios de 1974, o PAIGC teria apenas 2 viaturas blindadas...



Infografia:  2ª Rep / CCFAG, s/d, citada por Nuno Rubim (2009)

"Viatura blindada BRDM-2, utilizada pelo PAIGC em meados de 1973 no sul da Guiné" (ou serua em Bedanda, em 31/3/1974 ?)

 Desenho e especificações...  "Cópia de um documento emanado pela 2ª Rep / Com-Chefe Guiné sobre os BRDM-2. Também existem no AHM referências ao modelo 1. Há uma carta do A. Cabral para o Pedro Pires (Dez 72) a 'sugerir' a utilização dos blindados nos ataques a alguns dos nossos aquartelamentos fronteiriços no Sul. Na Net encontrarás farta documentação sobre essas viaturas". (*)

Cortesia de Nuno Rubim (2009)


1. Todos os nossos leitores (com destaque para os antigos combatentes da Guiné) têm direito a saber qual o armamento usado na guerra, quer pelas NT quer pelo PAIGC... 

Começámos uma nova série, com o armamento do PAIGC (**). O primeiro poste foi sobre as "polémicas viaturas blindadas BRDM-2" que terão sido usadas em 1974 (sem sucesso, e desastradamente, diga-se de passagem) contra Copá (em 7/1/1974) e contra Bedanda (31/3/1974).

Sobre as BRDM-2 temos uma escassa dezena de referências, a primeira das quais no poste P5630 (**). É desse poste que retiramos a infografia acima publicada, com uma BRDM-2, vista de perfil, e com informação detalhada sobre a estrutura do veículo, que pesava 7,7 toneladas.

Ficha técnica, segundo a Wikipédia (em portugès):

O BRDM-2 (em russo: Боевая Разведывательная Дозорная Машина, ou Boyevaya Razvedyvatelnaya Dozornaya Mashina, traduzido "Veículo de combate de patrulha/reconhecimento") é um blindado anfíbio desenvolvido pela União Soviética. Ele também é reconhecido pelas designações BTR-40PB, BTR-40P-2 e GAZ 41-08. Este veículo foi amplamente exportado e é usado até os dias atuais por quase quarenta países. Ele é uma versão melhorada do BRDM-1, atualizado com armamentos mais avançados e capacidade anfíbia.

Tipo: Blindado de reconhecimento
Local de origem  União Soviética / Rússia
História operacional:  Em serviço: de 1962 ao presente.
Histórico de produção:  Criador V. K. Rubtsov | Fabricante GAZ, em Níjni Novgorod | Período de produção: 1962–1989 | Quantidade produzida: 7 200.
Especificações: Peso 7,7 toneladas |  Comprimento: 5,75 m | Largura: 2,37 m | Altura:2,31 m | Tripulação: 4 | Armamento primário:  Metralhadora pesada KPV de 14,5 mm | Armamento secundário: Metralhadora coaxial: PKT, de 7.62 mm | Velocidade; 100 km/h (na estrada) | 10 km/h (na água).

Outros dados. da Wikipedia (em inglês):  depósito de combustível (gasolima): 290 litros. Raio de ação: 750 km.  De qualquer modo, as blindagens destas viaturas (10 mm, no máximo) protegiam-nas apenas das balas das armas automáticas ligeiras, mas não das metralhadoras pesadas e muito menos do canhão s/r ou do LGFog, para não falar da artilharia. 

2. Segundo o o nosso Serviço de Informações Militares (SIM), no final do ano de 1972, o PAIGCG (com um efetivo de 7 mil combatentes, sendo 4100 do Exército e 2900 das milícias populares), teria já à sua disposição, entre outro material: 

(i) viaturas anfíbias PT-76 e BRT 40-P (designação por que também era conhecida a BRMD-1);

 (ii) viaturas blindadas BTR-152

e (iii) carros de combate T-34 (CECA, 2015, pp. 123/124) (***)

No final de 1973, e segundo a mesma fonte ( SIM), o PAIG disporia dos seguintes meios, embora aguardasse o fornecimento, por parte da URSS, de mais equipamento de guerra  (CECA, 2015, pp. 247/248): 
  • 73 bigrupos;
  • 15 grupos;
  • 13 batarias de artilharia;
  • 9 grupos de foguetões:
  • 2 grupos de artilharia convencional;
  • 10 grupos de artilharioa antiaérea (mísseis Strela);
  • 17 grupos de sapadores;
  • 3 bigrupos de fuzileiros;
  • 2 viaturas blindadas;
  • 1 grupo de canhões sem recuo:
  • 7 grupos especiais de LGFog.

No TO da Guiné, as primeiras viaturas blindadas só aparecem referenciadas  em 31/3/1974, em ataque contra a guarnição e povoação de Bedanda (CECA, 2015, pág. 494/49), não havendo referência à sua utilizaçáo em Copá, subsetor de Bajocunda (7/1/1974), certamente por falha na documentação consultada. (O destacamento de Copá, defendido por escasso número  de militares e milicias seria retirado em 12 fevereiro de 1974.). 

O alf mil António Rodrigues, da CCAÇ 5,  e que estava em Bedanda em 31/3/1974, fala em BTR-152. (Vive hoje em Vila Real, ver aqui o seu comentário, com data de 25/11/2012, ao poste P9375).

Temos  4 dezenas de referências a Copá no nosso blogue. Não há dúvidas de que no ataque a Copá, em 7/1/1974,  o PAIGC utilizou duas viaturas blindadas ("tanques anfíbios", diz o Bobo Keita ou Queita), mas não é possível confirmar que fossem BRDM-2. É mais provável que fosse a versão anterior, a BRMD-1 , dispondo as Guiné-Conacri de 10 viaturas dessas.(****).  

Para estes países (e movimentos, como o PAIGC), pobres, sem divisas para pagar,  a URSS mandava a "sucata" bélica... O "internacionalismo proletário" na época tinha muito de "blá-blá"...  O Marx e o Engels hoje teriam que reescrever o manifesto do partido comunista (1848): "Proletários de todo o mundo, uni-vos"... Sobrou o grande cinismo da(s) ideologia(s), política(s) ou religiosa(s)...
______________

Notas do editor:



(***) Fonte: CECA - Comissão para Estudo das Campanhas de África: Resenha Histórico- Militar das Campanhas de África (1961-1974) : 6.º Volume - Aspectos da Actividade Operacional: Tomo II - Guiné - Livro III (1.ª edição, Lisboa, Estado Maior do Exército, 2015).

sábado, 8 de abril de 2023

Guiné 61/74 - P24208: Armamento do PAIGC (1): As polémicas viaturas blindadas BRDM-2 que teriam sido utilizadas contra Copá (7/1/1974) e Bedanda (31/3/1974)

Foto nº 1A


Foto nº 1 > Guiné-Bissau > Bissau >Fortaleza da Amura > Museu Militar da Luta de Libertação Nacional > "Viatura blindada,  de fabrico russo, que terá sido usado pelo PAIGC em 1974 contra Bedanda e Copá" (*).  A legenda é lacónica, o Patrício Ribeir0 deixou aos nossos especialistas de armamento a responsabilidade de identificar as peças museológicas... Podemos acrescentar que, salvo melhor opinião, esta viatura, da antiga União Soviética (1964), é conhecida pela designação BRDM-2 , mas também GAZ-41-08 e ainda BRT 40PB, BRT 40P-2.

Foto (e legenda): © Patrício Ribeiro (2023). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné

Foto nº 2 > Guiné > s/l > s/d (c. 1973/74) > "Guerrilheiros deslocando-se num carro blindado, Guiné-Bissau" (que não parece, vista da traseira, ser uma BRDM-2)

Foto do acervo documental de Mário Pinto de Andrade (1928-1990), dossiê do Arquivo e Biblioteca da Fundação Mário Soares. Estas viaturas, oriundas da base de Kandiafara, a sul de Guileje, na vizinha Guiné-Conacri, já estavam em em 1973 devidamente identificadas e referenciadas pelas autoridades militares portuguesas, contituindo um perigo potencial para as guarnições fronteiriças, tais como Guileje, Gadamael, Bedanda, Cacine ou Aldeia Formosa. É impossível, porém. saber se a viatura da foto está em território da então província portuguesa da Guiné ou em território da Guiné-Conacri. Ou se se trata apenas dc uma imagem de propaganda.

Foto (e legenda): Cortesia de © Fundação Mário Soares (2009). Direitos reservados



Foto nº 3 > Guiné  > Região de  Gabu > Bajocunda (ou Pirada?) > Pós-25 de Abril de 1974 >  "Esta viatura de origem russa é igual às três que atacavam Copá em Janeiro/Fevereiro de 74. É uma BRDM-2". 

Comentário de Amílcar Ventura ( ex-fur mil mec auto, 1ª CCAV / BCAV 8323(Pirada, Bajocunda, Copá, 1973/74), natural de (e residente em) Silves, membro da nossa Tabanca Grande desde 9 de maio de 2009; publicou a foto acima na nossa  na página do Facebook da Tabanca Grande Luís Graça, em 6/4/2023, 10;53.

Foto (e legenda): © Amílcar Ventura (2023). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné


Foto nº 4 > Guiné > Zona leste > Região de Gabu > Bajocunda (ou Pirada ?) > 1.ª CCAV/BCAV 8323, 1973/74 > "Encontro das Altas Chefias de Pirada depois do 25 de Abril [de 1974]". (**) Não dá para perceber de que tipo de viatura se trata (BRDM-1 ou 2).

Foto (e legenda): © Amílcar Ventura (2009). Todos os direitos reservados. 
[Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné


1. Publicámos há dias uma imagem de uma viatura blindada, existente no Museu Militar da Amura ("Museu Militar da Luta de Libertação Nacional") (vd. Foto nº 1, acima).  

E essa foto é a mesma que vai abrir este série sobre o armamento do PAIGC.  A existência ou não de "viaturas blindadas" ao serviço do PAIGC já deu origem aqui a alguma polémica (***)... O António Martins de Matos deu o  mote: "quem os viu de ver e não de ouvir?" (***). O António Graça de Abreu, nas suas memórias da Guiné,  dissse que sim, que já em 31 de março de 1974, foram utilizadas "viaturas blindadas" contra Bedanda (****), o que o alf mil António Rodrigues, da CCAÇ 5, vem confirmar, embora se refira a uma versão, a BTR 152, de que nunca ouvimos falar.

Os "bravos de Copá" já antes, em 7 de janeiro de 1974, tiveram que defrontar a BRDM-2, uma viatura blindada anfíbia, de reconhecimento e patrulhamento, de 7 toneladas, e uma tripulação de 4 elementos, estando equipada com duas metralhadoras (uma pesada, de 14,5 mm, e uma ligeira, de 7,62 mm).

Tanto em Copá como em Bedanda, a sua estreia parece terá sido desastrosa, para o lado do PAIGC.  Em Copá, morreu o Mamadú Cassamá, confirma o Bobo Keita (ou Queita), o "chfe dos blindados" ou "tanques anfíbios"(sic)...  Depois do 25 de Abril de 1974, o PAIGC passeou algumas destes "brinquedos" na fronteira Norte (Bajocunda, Pirada), conforme se pode ver nas fostos do Amílcar Ventura (Fotos nºs 3 e 4) (**).

Ficamos na dúvida sobre o "dono" das viaturas, o PAIGC ou o Sékou Touré...  E continmuamos a ter dúvidas sobre o tipo de viaturas, usadas contra Copá e Bedanda: BRDM.1 ou BRDM-2 ?

2. Em tempos escrevemos o seguinte comentário no poste P9375 (****), e não o vamos rever mesmo em face das fotos acima publicadas (a nº 1 é de facto de uma BRDM-2, mas não sabemos se é uma oferta da Guiné-Conacri para o museu militar da Amura...):

No Arquivo Amílcar Cabral, tratado e disponiblizado para o grande público pela Fundação Mário Sores, no portal Casa Comum, não há qualquer referência a viaturas blindadas entregues pelos russos no porto de Conacri... Estamos a falar de 10 mil documentos, que abrange todo o período da guerra de "libertação"...

Até finais de 1971, a ex-União Soviética só fornecia armas automáticas, RPG 7, munições, fardamento, medicamentos e coisas assim... E mesmo assim era preciso negociar com o "ciumento" Sekou Touré... que não perdoava a Amílcar Cabral o crescente prestígio e protaganismo a nível internacional e o leque de alianças e apoios (que ia da Suécia à China)...

Felizmente para nós, parte do armamento e das munições deviam ser "obsoletos"... São os próprios e "insuspeitos" cubanos que dizem que 40% das granadas lançadas contra Copá em janeiro de 1974 não rebentavam!... (As culpas tanto podiam ser dos fabricantes como, mais provável, das condições de transporte, armazenamento e operação).

BRDM-2 para o Amílcar Cabral? Devem ser fantasias dos burocratas da 2ª Rep, para justificar o seu ordenado ao fim do mês e as horas de tédio (e de algum cagufe) passadas em Bissau... A gente sabe como funcionava a nossa "inteligentsia" na Guiné, incluindo os "broncos" da PIDE/DGS... que tinham a 4.ª classe mal tirada...

O PAIGC nunca teve, ao que parece, este tipo de veículos... Os russos terão oferecido, em 1969, 10 BRDM-1 (5 toneladas e meia + 4 tripulantes e depósito de 150 litros de gasolina)... "Sucata" que o Sekou Touré poderá ter disponibilizado, depois da morte de Amílcar Cabral, aos homens do PAIGC... que ele precisava de controlar... Mas aquela viatura devia gastar 100 aos 100 !...

Como é que vocês queriam vê-la a passar o "arco de triunfo" em Bissau? Ou a passar a ferro as 3 fiadas de arame farpado de Jemberém?

Quanto às BRMD-2 (versão posterior, melhorada, 7 a 8 toneldadas!), era muito menos provável que os guerrilheiros do PAIGC alguma vez lhes tenham posto a vista em cima... a não ser, já reformados, em 1998, quando a Ucrânia ofereceu à Guiné-Bissau quatro veículos desses, se calhar a cair de pobres... Que até a caridade tem um preço!

Angola teve 50, mas já em plena guerra da chamada "2.ª independência"...

O BRMD-2 era um "besta" de 7 a 8 toneladas, com uma tripulação de 4 elementos (condutor, operador de rádio e observador, comandante e apontador de metralhadora pesada...) e um depósito de 290 litros de gasolina, 5,75 metros de comprido... Onde é que o PAIGC tinha gente com unhas para manobrar um "anfíbio" destes? E sobretudo logística? E depois era um alvo fácil para a nossa aviação...

(...) O BRDM-2 (Boyevaya Razvedyvatelnaya Dozornaya Mashina, Боевая Разведывательная Дозорная Машина, literally "Combat Reconnaissance/Patrol Vehicle"[5]) is an amphibious armoured patrol car used by Russia and the former Soviet Union. It was also known under the designations BTR-40PB, BTR-40P-2 and GAZ 41-08. This vehicle, like many other Soviet designs, has been exported extensively and is in use in at least 38 countries. It was intended to replace the earlier BRDM-1, compared to which it had improved amphibious capabilities and better armament. (...)

18 de julho de 2016 às 14:59
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Notas do editor

(*) Vd. poste de 5 de abril de 2023 > Guiné 61/74 - P24200: Bom dia desde Bissau (Patrício Ribeiro) (34): Visita ao "Museu Militar da Luta de Libertação Nacional", na fortaleza da Amura


(***) Vd. postes de: 

16 de julho de 2016 > Guiné 63/74 - P16309: Controvérsias (131): Blindados do PAIGC ? Quem os viu de ver e não de ouvir ?... (António Martins de Matos, ex-tenente pilav, BA 12, Bissalanca, 1972/74, hoje ten gen pilav ref)


(***) Vd. poste de 16 de julho de 2016 > Guiné 63/74 - P16309: Controvérsias (131): Blindados do PAIGC ? Quem os viu de ver e não de ouvir ?... (António Martins de Matos, ex-tenente pilav, BA 12, Bissalanca, 1972/74, hoje ten gen pilav ref)

(****) Vd. poste de 20 de  janeiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9375: Excertos do Diário do António Graça de Abreu (CAOP1, Canchungo, Mansoa e Cufar, 1972/74) (5): ): "Uma novidade, os guerrilheiros utilizaram viaturas blindadas na flagelação a Bedanda [, em 31 de março de 1974]"...

(Comentário de António Rodrigues:).

Caros camaradas: 
Estava colocado em Bedanda aquando do ataque com viaturas blindadas, onde era alferes miliciano.

As viaturas com que fomos atacados eram as BTR 152 (soviéticas), equipadas com metralhadoras.

A sua quase entrada no perímetro deveu-se ao facto de elas terem atacado a partir da zona onde se situavam as tabancas da população civil e isso impedir que quer as "Bazookas" quer os canhões sem recuo não poderem ripostar.

Abraços, António Rodrigues | 25 de novembro de 2012 às 17:25

quarta-feira, 5 de abril de 2023

Guiné 61/74 - P24200: Bom dia desde Bissau (Patrício Ribeiro) (34): Visita ao "Museu Militar da Luta de Libertação Nacional", na fortaleza da Amura

Foto nº 1 > Guiné-Bissau > Bissau >Fortaleza da Amura > Museu Militar da Luta de Libertação Nacional > "Viatura blindada de fabrico russo que terá sido usado pelo PAIGC em 1974 contra Bedanda e Copá"... o que etsá por confirmar, de fonte independente.


Foto nº 1A > Guiné-Bissau > Bissau >Fortaleza da Amura > Museu Militar da Luta de Libertação Nacional > Viatura blindada (pormenor). Parece-nos ser a uma BRDM-2 (informção sujeita a confirmação).


Foto nº 2 > Guiné-Bissau > Bissau >Fortaleza da Amura > Museu Militar da Luta de Libertação Nacional > Artilharia portuguesa: se não erramos, uma peça 11.4 e um obus 14.


Foto nº 3 > Guiné-Bissau > Bissau >Fortaleza da Amura > Museu Militar da Luta de Libertação Nacional >  Posto emissor que foi usado em Conacri, nas emissões da "Rádio Libertação"


Foto nº 3A > Guiné-Bissau > Bissau >Fortaleza da Amura > Museu Militar da Luta de Libertação Nacional >  Estação emissora >Em 16 de julho de 1967, tiveram início as emissões da "Rádio Libertação", a partir de Conacri... Os nossos soldados chamavam "Maria Turra" à locutora de serviço,  a Amélia Araújo, natural de Angola, casada com o cabo-verdiano José Araújo. (Parece que ainda está viva, a viver em Cabo Verde.)


Foto nº 4 > Guiné-Bissau > Bissau >Fortaleza da Amura > Museu Militar da Luta de Libertação Nacional > O setor das armas pesadas


Foto nº 5 > Guiné-Bissau > Bissau > Fortaleza da Amura > Museu Militar da Luta de Libertação Nacional > A peça do lado direito não pode ser  o famigerado "canhão de 130 mm", de origem russa, fornecido pela Guiné-Conacri ao PAIGC nos ataques a Guileje e a Gadamael... A peça de artilhar 130 mm, M-46, tinha/ tem  um cano ou tubo de mais de 7 metros de comprimento...  Não era armamento do PAIGC,  deve ter sido cedida pelo Sekou Touré, exigia uma equipagem de 8 elementos e disparava do outro lado da fronteira... Angola foi um dos países lusófonos que dispunna desta temível arma, durante a chamada guerra da segunda independência.

Também não vemos aqui o "Grad", o lança-foguete 122 mm, o "jacto do povo", na gíria do PAIGC... Nem o Strela, o míssil terra-ar SA-7, a coqueluche do Manecas dos Santos...


Foto nº 6 > Guiné-Bissau > Bissau >Fortaleza da Amura > Museu Militar da Luta de Libertação Nacional > Uma antiaérea ZPU -1Havia as quádruplas, ZPU-4...


Foto nº 7 > Guiné-Bissau > Bissau >Fortaleza da Amura > Museu Militar da Luta de Libertação Nacional > Uma metralhadora pesada, um canhão sem recuo e um morteiro 82 (de que só se vê o prato)... A metralhadora será umantiaérea Degtyarev de 12.7 mm?


Foto nº 8 > Guiné-Bissau > Bissau >Fortaleza da Amura > Museu Militar da Luta de Libertação Nacional > Canhão s/r (B2 B-10?)


Foto nº 9 > Guiné-Bissau > Bissau >Fortaleza da Amura > Museu Militar da Luta de Libertação Nacional >  O célebre "carocha" do Amílcar Cabral (que esteve muitos anos abandonado na casa de Bafatá, onde o líder histórico do PAIGCnasceu em 1924)


Foto nº 9A > Guiné-Bissau > Bissau >Fortaleza da Amura > Museu Militar da Luta de Libertação Nacional >  O célebre "carocha" do Amílcar Cabral (pormenor)


Foto nº 10 > Guiné-Bissau > Bissau >Fortaleza da Amura > Museu Militar da Luta de Libertação Nacional > Vista exterior da Amura... Ao fundo, o estuário do rio Geba e a ilha de Rei e, à esquerda, o antigo edifício da Alfândega, do tempo colonial.

Fotos (e legendas): © Patrício Ribeiro (2023). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné


1. Mensagem do Patrício Ribeiro (nosso correspondente em Bissau, colaborador permanente da Tabanca Grande para as questões do ambiente, economia e geografia da Guiné-Bissau, onde vive desde 1984, e onde é empresário, fundador e diretor técnico da Impar Lda; tem mais de 130 referências no blogue: autor da série, entre outras, "Bom dia desde Bssau" (*):

Data(s) - 1/04/2023, 11:21 e 2/04/2023, 12:39

Assunto - Bom dia desde Bissau: visita ao museu da Amura,

Vou enviar diversas fotos.

Luis, para vosso conhecimento

1ª Parte

Em visita ao Museu da Amura, a convite da Cooperação Portuguesa para assistir a uma peça de teatro sobre a vida do Amílcar Cabral.

Tivemos a possibilidade de ver o Museu Militar, construído dentro da fortaleza da Amura.

Envio algumas fotos, das armas pesadas, que podemos encontrar no exterior. Para os comentários dos nossos especialistas do Blog.

Na 2ª parte, as tiradas no interior do museu. Existem algumas salas novas, onde nas paredes podemos observar dentro de expositores as armas ligeiras.

O Museu Militar da Luta de Libertação Nacional, inaugurado em 2017, pode ser visitado todos os dias, das 8 até 16 horas, sem marcação.

Diretor do museu, Tenente-coronel Quintino Napoleão dos Reis | WTS 00245 95 63556340 | tel. 95 595 90554 – 96663 2756.

Abraço. 
Patrício Ribeiro

sexta-feira, 10 de junho de 2022

Guiné 61/74 - P23341: Notas de leitura (1454): “La fin de l’empire colonial portugais, Témoignages sur un dénouement tardif et tourmenté”, por Éric e Jeanne Makédonsky; L’Harmattan, 2018 (2) (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 27 de Setembro de 2019:

Queridos amigos,
O casal Éric e Jeanne Makédonsky dão como explicação de que este acervo apreciável de testemunhos recolhidos junto de intervenientes guineenses, cabo-verdianos e portugueses, entre 1980 e 1982, não foi publicado logo a seguir atendendo a que a aura de que a guerrilha guineense se cobrira de glória, no campo internacional, perdera-se, deixou de haver interesse em acompanhar o fenómeno revolucionário da Guiné-Bissau, entrara-se por um caminho sombrio, a própria investigação, que continuou a fazer-se, perdeu muito do interesse inicial. No entanto, a despeito de que todos estes testemunhos introduzam novidades de maior, a sequência cronológica como se estrutura a obra permite ao iniciado seguir a trama de forma sequencial, do princípio a uma quase atualidade. Tudo começou em estado de tormenta e em tormenta e profunda inquietação prossegue.

Um abraço do
Mário



Assitiram à independência da Guiné, décadas depois publicam livro (2)

Beja Santos

“La fin de l’empire colonial portugais, Témoignages sur un dénouement tardif et tourmenté”, por Éric e Jeanne Makédonsky, L’Harmattan, 2018, é uma obra que forçosamente nos surpreende. Marido e mulher eram jornalistas que permaneceram longamente no continente africano. E abrem o seu livro explicando porquê, só agora, dão à estampa os testemunhos que recolheram décadas atrás. Entenderam os autores que a guerrilha guineense em poucos anos perdeu o furor e o entusiasmo com que eram vistos pelo movimento revolucionário à escala mundial. No entanto, não quiseram deixar de contribuir para que a investigação sobre os acontecimentos relacionados com a independência da Guiné-Bissau e Cabo Verde perdesse a possibilidade de conhecer os testemunhos de inúmeras personalidades intervenientes, do lado guineense, cabo-verdiano e português.

Após o testemunho dos guineenses (Nino, Paulo Correia, Vasco Cabral, Fidelis Cabral d’Almada) que dão conta da evolução da luta a partir de 1968, fica-se com uma apreciação do quadro político e militar até ao assassinato de Amílcar Cabral. É um dado curioso, atenda-se que estes testemunhos são recolhidos entre 1980 e 1982, do lado cabo-verdiano já há insinuações de compromisso guineense ao mais alto nível. Aristides Pereira chega a dizer quando foi raptado e metido numa lancha cuja marcha foi travada em Boké, ouviu elementos do complô referir nomes de altos dirigentes do PAIGC naturais da Guiné. Mas não diz quais. Refere a reação dos órgãos diretivos e a intensificação da luta. Pedro Pires enfatiza a preparação e execução da operação Amílcar Cabral e as consequências associadas aos mísseis Strela e ao uso de viaturas já no interior do território da Guiné para lançar mísseis sobre os quarteis. Pedro Pires recorda o pedido que fez a Aristides Pereira, então em tratamento em Moscovo, era necessário mais artilharia pesada, canhões 122, novas rampas de lançamento de mísseis GRAD e os temíveis morteiros de 120 milímetros, bem como canhões B10 e de 85 e 76 mm. O Conselho Executivo da Luta dera luz verde para uma ofensiva prevista para os meses de novembro e dezembro de 1974 com blindados T34 e BRDM, isto num quadro em que ainda se desconhecia qual seria a decisão da Organização de Unidade Africana, que tinha apelado à formação de um exército africano para expulsar as forças portuguesas.

Sobre as mesmas matérias do assassinato e da reação político-militar do assassinato de Amílcar Cabral, depõem José Araújo, Manuel dos Santos, Osvaldo Lopes da Silva, entre outros. E seguem-se os testemunhos guineenses de Nino, Vasco Cabral e Fidelis Cabral d’Almada. Uns atribuem o complô a quadros que se tinham marginalizado e que até viviam do roubo, há também quem atribua um papel relevante a Momo Touré e Aristides Barbosa, na época era uma acusação que parecia vingar, ainda não se sopesara tal inviabilidade quando o complô, como se veio a apurar, envolvera centenas de participantes de diferentes perfis. Do lado português irão depor Carlos Fabião, Otelo Saraiva de Carvalho e Carlos Matos Gomes. Fabião nega perentoriamente qualquer envolvimento de Spínola ou das Forças Armadas, mas fica a pairar no ar a possibilidade de uma intervenção completamente fora das regras clássicas de Alpoim Calvão, que ao tempo dirigia um discreto serviço de informações em Lisboa. Mas não exclui uma intervenção da PIDE, a título meramente institucional. Otelo também se mostra persuadido da intervenção da PIDE e recorda que encontrou Alpoim Calvão em Bissau em dezembro de 1972. À distância destes anos todos, estes depoimentos revelam-se profundamente datados, presunções sem mostra de prova.

Chegamos ao 25 de Abril, há um conjunto de depoimentos sobre o que era possível fazer de descolonização da Guiné, como se atuou em 25 de Abril, como se abriram conversações com o PAIGC, etc. Obviamente que os testemunhos cabo-verdianos remetem-nos para a realidade do envio de quadros para Cabo Verde, o modo como tal se processou é contado por Aristides Pereira, Pedro Pires, José Araújo, Silvino da Luz, Osvaldo Lopes da Silva, Julinho e Corsino Tolentino. Do lado guineense, Juvêncio Gomes confirma um depoimento que deu igualmente noutros locais sobre o seu papel de primeiro interlocutor do PAIGC após o 25 de Abril.

Insiste-se que a generalidade destes depoimentos não se reveste de aspetos inovadores. Nino Vieira, a propósito do golpe de 14 de novembro de 1980, repete que existia um quadro persecutório cabo-verdiano e que eram humilhantes para os guineenses os contextos institucionais existentes em Cabo Verde que inferiorizavam a Guiné, segundo Nino, Luís Cabral estava incapaz de ler a realidade. A linha guineense, caso de Fidelis Cabral d’ Almada, não deixará de referir os excessos da polícia de segurança, que gradualmente se tornou um Estado dentro do Estado. Dá-nos um quadro alucinante de uma pseudo insurreição dos antigos Comandos africanos, quando eles vieram do Senegal, aonde se tinham refugiado, apareceram praticamente sem qualquer armamento, quem os chamara dissera que vinham para apoiar Nino para fazer parte de um grande exército nacional, foram presos pela segurança e mais tarde executados.

No final desta recolha de depoimentos e dado que a sua publicação ocorreu em 2018, os autores dão-nos conta do que se passou com todos estes protagonistas: 

  • Fidelis Cabral d’Almada, Ministro da Justiça após o golpe de 14 de novembro de 1980, depois Ministro de Estado na Presidência, deixou a esfera pública em 1996 para se dedicar aos negócios, faleceu em 2002; 
  • José Araújo manteve-se em Bissau até ao golpe de 14 de novembro de 1980, foi para Cabo Verde onde seria Ministro da Educação, faleceu em 1982; 
  • Vasco Cabral manteve-se em funções governativas depois da rutura entre a Guiné e Cabo Verde, já faleceu;
  • Vítor Saúde Maria foi várias vezes ministro, será nomeado Secretário Permanente do PAIGC e membro do Conselho de Estado, faleceu em 2009; 
  • Paulo Correia irá ocupar altos cargos e será detido em 1986 acusado de tentativa de golpe de Estado, sujeito a espancamentos e depois fuzilado; 
  • Juvêncio Gomes será afastado do cargo de Presidente da Câmara Municipal de Bissau após o golpe de 14 de novembro, será depois recuperado e exercerá funções de responsabilidade, incluindo o Ministério do Interior, faleceu em 2016; 
  • Manuel dos Santos (também chamado Manecas) ficará na Guiné-Bissau depois do golpe de Estado e será várias vezes ministro, dedicar-se-á mais tarde aos seus negócios; não deixará de publicamente se insurgir quanto às pensões de miséria dos antigos combatentes, dando o exemplo de um velho combatente, com deficiência, não recebia mais de 21 euros de pensão; 
  • o destino de Nino é bem conhecido, irá gradualmente proceder como um ditador, será afastado do poder após o conflito político-militar de 1998-1999, para espanto geral regressa do exílio português e apresenta-se como candidato presidencial, será eleito, irá entrar em conflito frontal com as chefias militares, será acusado de ter mandado liquidar Tagmé Na Waié e em sua sequência, em março de 2009, morto em sua casa, de forma bárbara.

Reconheça-se que o trabalho de Éric e Jeanne Makédonsky merece realce relativamente à cronologia dos acontecimentos desde a era das independências africanas até ao período pós-independência da Guiné e Cabo Verde. São relatos após a recente rutura entre a Guiné e Cabo Verde, há, como é evidente, alguns indícios de ressentimentos, mas no essencial os testemunhos guineenses e cabo-verdianos mantiveram consistência ao longo de décadas.

Éric Makédonsky
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Nota do editor

Último poste da série de 6 DE JUNHO DE 2022 > Guiné 61/74 - P23331: Notas de leitura (1453): “La fin de l’empire colonial portugais, Témoignages sur un dénouement tardif et tourmenté”, por Éric e Jeanne Makédonsky; L’Harmattan, 2018 (1) (Mário Beja Santos)

quarta-feira, 25 de outubro de 2017

Guiné 61/74 - P17902: (D)o outro lado do combate (12): Amílcar Cabral e Sékou Touré, em setembro de 1972: alianças e dependências... Dos desertores do PAIGC à recolha de fundos... (Luís Graça)


Amílcar Cabral, secretário geral do PAIGC > c. 1970 > Foto  incluída em O Nosso Livro de Leitura da 2ª Classe, editado pelos Serviços de Instrução do PAIGC - Regiões Libertadas da Guiné (sic). Tem o seguinte copyright: © 1970 PAIGC - Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde. Sede: Bissau (sic)... A primeira edição teve uma tiragem de 25 mil exemplares, tendo sido impresso em Upsala, Suécia, em 1970, por Tofters/Wretmans Boktryckeri AB.


Comentários do nosso editor aos postes P17898, P17480 e P17537 (*) 


I. Jorge, também se escreve nas entrelinhas ... E até Deus escreve por linhas tortas, segundo a sabedoria popular. Pois, devo dizer-te que do teu paciente e valioso trabalho de leitor e analista da papelada do Amílcar Cabra (AC),  retive duas ideias: o PAIGC tinha problemas comuns com os governos de Salazar e, depois, de Caetano:

(i) a falta de efetivos era dramática e o nº de "refractários, faltosos e desertores" tirava-lhe o sono;

e, por outro lado, (ii) o patacão que não chegava para tudo, muito menos para "alimentar o ventre da guerra"...

Ambos os atores principais desta guerra tinham problemas demográficos, logísticos e orçamentais, o que é normal em todas as guerras... (Daí que todas as guerras têm um princípio, meio e fim,  mesmo a guerra dos cem anos...)..

Em relação ao primeiro ponto, leia-se com atenção uma das propostas que o AC faz ao seu anfitrião, Sekou Touré (ST):

(...) "Em cooperação com as autoridades locais, a JRDA [Juventude da Revolução Democrática Africana] e a Milícia Popular guineense [organização a quem foi oficialmente atribuído, a partir de 1969, um papel equivalente ao exército], recuperação imediata dos combatentes [do PAIGC] que desertaram [sic] da frente para se refugiarem na República da Guiné Conacri (Cadinhá, Djabada, Kanfrandi, Boké, Boffa, Koba, Conacri, Koundara, Gaoual, etc.). O seu retorno imediato às frentes da luta para serem reintegrados nas nossas Forças Armadas." (...)

O AC não escamoteia o problema: o PAIGC tem desertores e não são poucos, diluídos entre a população refugiada, em diversas prefeituras do território vizinho, mais próximas (são referidas explicitamente nove!)...

Não temos números sobre a "deserção" nas fileiras do PAIGC... Mas o problema devia ser "sério", senão mesmo "grave"...

Sabemos que o PAIGC, como no caso de outros movimentos revolucionários em África e por todo o mundo, não podia contar "só" com a militância política, o idealismo e a generosidade dos jovens, o sentimento anti-colonialista do povo, a consciência nacionalista, etc. Tinha que fazer uso de métodos menos "ortodoxos" como o recrutamento forçado, a coação, o rapto, a violência...

O AC não era ingénuo, conhecia bem a realidade da Guiné e de África...

Por outro lado, a vida no mato era duríssima (tanto para as populações sob controlo do PAIGC como para a guerrilha), havia uma refeição por dia, quando havia, as "barracas" (acampamentos do mato) não tinham estruturas fixas, as baixas eram elevadas, os cuidados médicos e de enfermagem muito precários, não havia hospitais no interior da Guiné, apenas "postos de primeiros socorros" na melhor das hipóteses, os feridos e os doentes levavam vários dias a chegar à Guiné-Conacri ou ao Senegal, a guerra prolongava-se sem fim à vista, o moral era necessariamente baixo...

Um homem insuspeito, que combateu ferozmente o PAIGC, como Alpoim Calvão, fez, em tempos, antes de morrer, numa entrevista que deu, uma implícita homenagem ao guerrilheiro do PAIGC que, embora melhor adaptado ao terreno do que os soldados metropolitanos portugueses, era frugal, combativo e sobretudo revelava uma grande capacidade de resiliência, resistência, sofrimento... (Os "meus homens", fulas, da CCAÇ 12, "desarranchados", levavam para dois dias de operações no mato duas mãos cheias de arroz cozido, embrulhado num lenço; nós, os graduados, metropolitanos, tínhamos direito a duas "malditas" rações de combate que, com o tempo e a experiência,. ficavam no quartel em Bambadinca...).

Jorge, um dia destes tens que pegar de novo  neste tema... que tem a sua "delicadeza". Ninguém gosta de falar de desertores, mas a verdade é também os incentivávamos a entregar as suas armas nos nossos quartéis... Não sei se a campanha foi frutuosa, mas houve casos.... Tu estiveste no Enxalé, e sabes do que falo: no teu tempo acolheram-se lá dezenas e dezenas de "refugiados", vindos do "mato"...

Enfim, há muitos mitos, de um lado e do outro do combate. Nós, que já não somos "meninos de coro" (, ou será que ainda os há ?), temos a obrigação de identificar e desvendar esses mitos... Por uma razão simples: é também a nossa história e a história não se faz com historietas da carochinha...


II. Para colmatar as "brechas" nas fileiras do PAIGC, e já que o recrutamento no interior da Guiné, passados os primeiros anos, deixou de ser possível, a base demográfica do PAIGC era cada vez mais restrita, circunscrevendo-se aos núcleos de população "refugiada" nos países vizinhos (Guiné-Conacri e Senegal)... e, em muito menor escala, em Cabo Verde (onde o PAIGC foi buscar sobretudo quadros, bons quadros, de resto).


Daí a explicação para este pedido, algo insólito, ao Sékou Touré:

(...) "Permissão para o recrutamento de jovens (de 17 aos 25 anos), cidadãos imigrantes do nosso país ou descendentes de imigrantes na República da Guiné Conacri.

a) – Concentração destes recrutas em Conacri.

b) – Formação acelerada, em Kindia, no campo de treino da OUA [Organização da Unidade Africana] (...) . A formação dos recrutas visa a sua integração nas frentes da luta." (...).

Kindia fica  a cerca de 130 km a nordeste de Conacri e já era então uma importante base militar da Guiné-Conacri. Era, pois, para lá que eram encaminhados os jovens guineenses da "diáspora", apanhados pelo recrutadores do PAIGC (,seguramente com a cobertura das autoridades da Guiné-Conacri). Temos que admitir que uma boa parte ou até uma grande parte desses jovens recrutas não iria de livre vontade para Kindia e depois para o interior da Guiné, sabendo como se tinha intencificado a guerra, de um lado e do outro. 

Estas propostas do AC ao ST datam 14 de setembro de 1972, quase dois anos depois da invasão de Conacri, em 22 de novembro de 1970 (Op Mar Verde) e a escassos 4 meses da conspiração contra o líder do PAIGC e do seu assassinato (em 20 de janeiro de 1973, em Conacri). Como sabemos, ainda hoje está por esclarecer o papel de ST no assassínio contra AC.


III.  Um dos problemas do AC é que não tinha diamantes nem petróleo. O AC teve que estender a mão à "caridade" internacional: os países do bloco soviético, a China. mas também a Suécia (a partir de 1969) e outros países e organizações ocidentais... A Suécia vai doar quase   6 milhões de euros (em avalor atual) ao PAIGC antes da independência, entre 1969 e 1973.

O Amílcar Cabral humilha-se claramente perante o Sékou Touré, estendendo literalmente a mão à "caridade" do seu anfitrião... para mais sendo a Guiné-Conacri, também ela, um país pobre... 

Era ingenuidade do Amílcar Cabral ou apenas uma forma (cínica)  de lisonjear um homem que, tanto quanto sabemos, tinha ciúmes da craveira intelectual e do prestígio internacional do histórico dirigente do PAIGC ? No fundo, seria uma forma de associar também o ST ao "sucesso" da luta que se travava no território vizinho...

Releia-se, com atenção, esta  outra proposta do AC ao ST:

(...) "No domínio financeiro

1. Comprar, ao melhor preço para o Ministério do Comércio, as quantidades de certos produtos de primeira necessidade (gasolina, sabão, fósforos, alguns tecidos, etc.) quando as nossas disponibilidades não ultrapassem as possibilidades para o consumo imediato.

2. Permissão para que o nosso Partido possa receber quotas (voluntárias) dos cidadãos do nosso país instalados [residentes] na República da Guiné Conacri, para o desenvolvimento da luta.

3. Realização, por intermédio do PDG. [Partido Democrático da Guiné], especialmente da JRDA [Juventude Revolucionária Democrática Africana], da CNTG  [Confederação Nacional dos Trabalhadores da Guiné] e da UNFG [União Nacional das Mulheres da Guiné], de festas, missões, quermesses, etc., para a obtenção de receitas destinadas à luta.

Estas medidas poderiam ajudar o nosso Partido, de modo significativo, a fazer face às exigências cada vez maiores da luta no domínio financeiro." (...)

Também nunca saberemos (, porque os principais dirigentes do PAIGC morreram e poucos  foram ao "confessionário da História"...) quanto rendeu ao PAIGC estas e outras formas de "recolha de fundos" na terra do Sékou Touré... Não acredito que o AC, homem inteligente, tivesse expetativas muito altas em relação  à recetividade e sobretudo à implementação destas propostas (e das outras propostas) apresentadas ao ST em setembro de 1972.

Enfim, é a leitura (seguramente superficial e descontraída...) que eu faço, dos documentos que tu, Jorge, tiveste  a pachorra e a gentileza de ler (em francês) e traduzir para nós...


IV. Jorge: uma guerra, como qualquer conflito, é sempre uma relação (de antagonismo) entre duas partes, ou atores (como dizem os sociólogos). Cada uma da partes, tem depois os seus apoios (externos, internos...) e os seus trunfos, os seus pontos fortes e fracos...No final, há que está melhor posicionado para negociar do que o outro...

Sékou Touré não deve ter sido um "aliado fácil" do Amílcar Cabral e do seu partido, mas é evidente que a Guiné-Conacri foi, desde o início, um "santuário", absolutamente imprescindível para o PAIGC (contrariamenet ao Senegeal de Senghor)... Sem essa retaguarda estável e relativamente segura (não obstante a invasão de Conacri em 22/11/1970...), nunca a luta de guerrilha teria ido tão longe...

É muito interessante o documento que divulgas, para conhecimento de todos nós, até porque é revelador das fragilidades do PAIGC a nível logístico, por exemplo.. O AC tinha plena consciência de que as bolanhas das "regiões libertadas" nunca poderiam alimentar a guerrilha e a população que vivia no mato, sem falar do "estado maior" e forças operacionais e de apoio em Conacri e nas bases de retaguarda, nas zonas fronteiriças.. Amilcar tem que negociar a compra de 100 toneladas de arroz ao "amigo e camarada" Sékou Touré... Ninguém faz a guerra de estômago vazio, apesar do "estômago espartano" do homem africano...

Quando Amílcar Cabral pede 100 toneladas de arroz para o seu pessoal instalado na Guiné-Conacri, incluindo os combatentes junto à fronteira, mesmo que o arroz seja "pago pelo Partido" (o mesmo é dizer, pelos "amigos" suecos, russos e outros...), isso coloca-o numa posição de subalternidade e dependência em relação ao Sékou Touré...

O papel e a personalidade deste homem ainda estão em grande parte por esclarecer.  O brilho intelectual e o prestígio do Amílcar Cabral, dentro e fora de África, deviam-no ofuscar...Amílcar Cabral era de outro planeta, da estatura de um Nelson Mandela... E o Sékou Touré apenas um aprendiz de ditador, com um passado de sindicalista e de nacionalista de "duro de roer" aos olhos dos franceses...

O maior erro de Amílcar terá sido, a meu ver, nunca ter percebido a "pedrinha do sapato" do PAIGC que era a liderança dos cabo-verdianos que estavam a anos-luz dos guineenses... Veja-se como os guineenses aplaudem o miserável golpe de Estado de 'Nino' Vieira contra Luís Cabral..., ditando o fim do mito da unidade Guiné-Cabo Verde... 'Nino' que eu conheci pessoalmente em 2008,  não era uma "estadista", não era um "líder", era apenas um "senhor da guerra", como milhares de "cabos de guerra" que emergiram no caos do pós-colonialismo,  por exemplo, o Ansumane Mané...

Mas... e o combustível para os camiões e os célebres BRDM-2, as viaturas blindadas anfíbias de patrulha e reconhecimento, que ainda hão de aparecer no fim da guerra para dar um arzinho da sua graça ? Chamar-lhes "carros de combate" é uma grosseria, é um insulto à arma de cavalaria... E, tal como as nossas velhas "latas" (as Daimler. as Panhard...), deveriam gastar 100 aos 100 ou mais... Não sei se eram a gasolina ou gasóleo...

Este assunto, das BRDM-2, já aqui mereceu honras de primeira página no nosso blogue... Mas convirá chamar a atenção para os incautos leitores: nesta altura, em setembro de 1972, o PAIGC não tinha viaturas blindadas, nem muito menos combustível para pôr a marchar a sua "cavalaria"... Em qualquer guerra, os "cavalos" são mais mais difíceis de "alimentar" do que os "infantes", para mais nas dificílimas condições de terreno e do clima da Guiné...

Jorge, não podes acabar este conjunto de três artigos sem nos dares algumas pistas sobre o seguimento das propostas: ficou tudo em águas de bacalhau, ou o Amílcar ainda conseguiu,  em vida, ver concretizadas algumas das suas propostas ?

Um abraço com todo o meu apreço pelo teu trabalho de pesquisa, roubado ao tempo de descanso e da família e... se calhar também ao "tempo do patrão"...(**)


Vd. postes anteriores:

17 de junho de 2017 > Guiné 61/74 - P17480: (D)o outro lado combate (8): Regime de Sékou Touré e PAIGC: propostas de reforço da cooperação militar, elaboradas por Amílcar Cabral, 4 meses antes de ser assassinado (Jorge Araújo)

3 de julho de 2017 > Guiné 61/74 - P17537: (D)o outro lado do combate (9): Regime de Sékou Touré e PAIGC: propostas de reforço da cooperação militar, elaboradas por Amílcar Cabral, 4 meses antes de ser assassinado (Jorge Araújo) - Parte II


terça-feira, 19 de julho de 2016

Guiné 63/74 - P16317: Controvérsias (132A): Quem conta um conto, acrescenta-lhe sempre um ponto... A morte do comandante Mamadu Cassamá,e as viaturas blindadas, em Copá, em 7/1/1974 (confrontando duas versões, a do guineense Bobo Keita, "o comandante dos tanques anfíbios" e a do escritor cubano Ramón Pérez Cabrera)

1.  Depoimento de Bobo Keita, comandante do PAIGC (1939-2009) sobre a morte de Mamadú Cassamá(*), em Copá, em 7/1/1974:


"Mamadú Cassamá morreu no ataque a Copá. Tomei parte nesse ataque, juntamente com o camarada Paulo Correia. O Mamadú era dos que ainda acreditavm na 'força' dos amuletos... Avançou muito e foi até aos arames  que circundavam o quartel,  Pegou nos arames e fez força para os arrancar. Foi localizado e um tiro cverteiro silecncoiu-o de vez. O Mamadú Cassamá era o camdante daqule zona".

In: Norberto Tavares de Carvalho, De campo a campo: conversas com o comandante Bobo Keita. Edição de autor, Porto, 2011. (Impresso na Uniarte Gráfica, SA; depósito legal nº 332552/11). Posfácio de António Marques Lopes. p. 244.


Bobo Keita, já antes, noutra passagem se tinha referido a Copá e à utilização de viaturas blindadas;(p. 193):

"Para o assalto a Copá, que fica a uns trinta quilómetros da cidade senegaleas de Wassadou,  peguei em dois dos meus tanques (sic), constitui um comando e fomos à emboscada.  A operação em Copá contou com Quemo Mané, comandante de infantaria. Copá também não foi fácil para os tugas, Alinhámos um número razoável de combatentes, menor que Guileje e Guidaje, e o objetivo era o de isolar os colonialistas. A tomada do quartel não nos interessava, queríamos somente convencê-los  de que não tinham mais nenhuma escapatória e que deviam partir da nossa terra".

Infelizmente, Norberto Tavares de Carvalho, nas longas conversas com Bobo Keita, não explorou devidamente o fato de este ter sido nomeado, ainda em vida de Amílcar Cabral, " comandante dos tanques anfíbios" (sic) ou   "chefe dos blindados",  em substituição do Inocêncio Cani (1938-1973), antigo comandante da marinha do PAIGC, que iria ser o carrasco do  líder do PAIGC, em 20/1/1973 (vd. pp. 165 e ss.)...

No início do cap. XII, pode ler-se (p. 177): "Depois do funeral do Amílcar, realizado no dia 1 de fevereiro de 1973 em Conacri, fui tomar conta dos tanques anfíbios (sic)", tendo seguido depois  "de Boké para o Leste em março de 1973".

Em conclusão: o PAIGC já tinha viaturas blindadas anfíbias e vai usá-las contra Copá, em janeiro de 1974, de acordo com o testemunho (insuspeito) do nosso camarada António Rodrigues, um dos bravos de Copá (*). 

Mas fica a dúvida por esclarecer:  o PAIGC  tinha duas ou mais "viaturas blindadas" de tipo anfíbio  ? Eram mesmo do PAIGC ? Ou eram emprestadas pelo Sékou Touré ? Seriam do tipo  BRDM-2 ? Se sim, por que é que o Bobo Keita não se faz transportar nelas,  na "viagem triunfal" até Bissau,  em setembro de 1974 ?

2.Excerto de: Ramón Pérez Cabrera - "La historia cubana en África: 1963-1991: pilares del socialismo en Cuba" (edição de 2005), p. 1979


[Com a devida vénia...Sublinhados nossos] [Extensas partes do livro podem ser consultadas, em modo de pré-visualização, no portal da Kilibro]


3. Aristides Ramón Pérez Cabrera (n. 1939) não é nem jornalista nem historiador, e muito menos um investigador independente.  É um "homem de partido", é um homem do regime castrista, que chegou ao comité central do Partido Comunista, pelo que se não pode esperar do seu livro "La historia cubana en África", publicado em 2003, uma obra isenta, objetiva, imparcial, crítica, etc. Tal como muita da tralha "chauvinista", "trauliteira e patrioteira" que todos  nós escrevemos e continuamos a escrever sobre o glorioso passado dos nossos países europeus (nós, os portugueses, os espanhóis, os franceses, os ingleses, os alemães, os italianos, os suecos, os russos, etc.).

Muito menos foi, tanto quanto sei, o nosso Cabrera,  um combatente "internacionalista" que tenha arriscado o coirão nas bolanhas da Guiné ou nas savanas do sul de Angola... Os elementos que juntou para escrever "La historia cubana en África" e as informações que publicou, devem ser tomadas com as naturais reservas... É um trabalho de pesquisa bibliográfica e de recolha de testemunhos, que tem alguém interesse documental.  

Não tendo formação (científica) em história, é natural que corra o risco de descambar para o panegírico, a propaganda, a tirada patrioteira, sem grande preocupação com o rigor factual e o respeito pela verdade, o contraditório, a triangulação, a exploração  de outras fontes documentais, etc.

É o caso, por exemplo,   do nome do comandante das forças que atacaram Copá em janeiro de 1974... O homem que morreu em 7/1/1974 não era Mamadou Cassamba (sic), mas sim Mamadu Camassá... E não terá morrido a tripular uma das "quatro" (sic)  viaturas  blindadas BTR (ou BRMD) que o PAIGC não devia ter na altura, mas sim de um tiro certeiro, talvez no coração ou noutro órgão vital... disparado pelo nosso António Rdorigues ou algum outro dos bravos de Copá.

O Ramón Pérez Cabrera estava a milhares de quilómetros de distância, provavelmente em Havana, não viu o horror e o heroísmo desses dias em Copá, nem cita fonte idónea... Inclino-me mais facilmente para aceitar, como versosímil,  a versão do  Bobo Keita, que afirma ter estado em Copá nessa noite, tal como o comandante da Frente Leste, o Paulo Correia, valente guerrilheiro balanta, com várias  e importantes funções políticas a seguir à independência, que irá morrer muito mais tarde, em 1986, fuzilado, depois de barbaramente torturado  pelos esbirros do 'Nino' Vieira, na sequência de uma inventona....

Enfim, tudo indica que o  Cabrera, ingénua ou deliberadamente,  terá inventado um versão "heróica" para a morte (estúpida) de um comandante de guerrilha que nem sequer devia ter "carta de condução" de BTR (ou BRDM)... 

Aliás, o Bobo Keita, velha glória do futebol no tempo dos "tugas", não parece ter grande consideração pelo seu camarada Mamadu Cassamá: dele diz, com ironia, que  "era dos que ainda acreditavam na 'força' dos amuletos", a exemplo do próprio 'Nino' Vieira (leia-se, dos "mésinhos" que tornavam o "corpinho de bó" impenetrável às balas do "tuga")...

Moral da história: quem conta um conto, acrescenta-lhe sempre um ponto...  LG

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Vd. poste anterior:

segunda-feira, 18 de julho de 2016

Guiné 63/74 - P16315: Controvérsias (132): Blindados do PAIGC? Não os vi em Jemberem, ninguém os viu em Bissau, Gadamael, Cacine, Mansoa, etc... aquando da transferência dos nossos aquartelamentos, o que seria normal e expectável se o PAIGC os tivesse... (Joaquim Sabido, ex-alf mil art, 3.ª CART/BART 6520/73 e CCAÇ 4641/73, Jemberem, Mansoa e Bissau, 1974)

1. Comentário, ao poste P16309 (*), do nosso camarada Joaquim Sabido

[foto à direita, abaixo: Joaquim Sabido, ex-alf mil art, 3.ª CArt/BArt 6520/73 e CCaç 4641/73, Jemberém, Mansoa e Bissau, 1974);  foto à esquerda: Joaquim Sabido, hoje, advogado, a viver em Évora;  é nosso grã-tabanqueiro desde 24/8/2010; tem uma dezena de referênciasno nosso blogue]



No meu modesto entendimento, este tema encontra-se estreitamente ligado à questão da "guerra perdida vs. guerra ganha".

Naturalmente que não podemos nunca deixar de equacionar que a situação não se poderia eternizar. Por vezes, há camaradas que aqui vêm quase pedir contas àqueles que, como eu, nos encontrávamos no TO do CTIG a 25 de Abril de 74 e que entregámos o território. Sinto-me quase na obrigação de pedir desculpa por ter nascido mais tarde e, por isso, de lá estar no ano de 1974 e não antes.

Quanto à temática dos blindados no terreno. Nunca dei conta de tal e, à época da alegada aparição de viaturas blindadas, estávamos, precisamente, em Jemberém. O buraco a que se chamava quartel, era mesmo em cima de uma estrada que foi alcatroada e que ia até Cadique (isso eu sei) e diz-se que fazia ligação com a Guiné Conakry (isso eu não sei).

Mas blindados só se eram como os que alegadamente o Sadam teria no Iraque.

De facto, o pessoal até dizia que os ouvia o IN noite dentro a circular. Isto apesar de lhes explicar e demonstrar que aquilo que efectivamente escutavam, com maior nitidez durante a noite, como é óbvio, tratava-se, a final da maré a encher ou vazar no braço de mar que ia ter ou que vinha do Cacine e que se situava a cerca de 3 kms do aquartelamento.

Estou certo de que se tratava, mais de um mito "urbano". No mato nunca tal foi avistado.

Nem, posteriormente, em Bissau, ouvi a nenhum dos elementos do PAIGC com os quais contactei - por razões de passagem de testemunho da guarda ao Palácio do Governador e outras actividades de segurança na cidade - falar desse material de guerra.

Senão atentemos que, por exemplo, quando lhes foi entregue Gadamael, Cacine, Mansoa ou até mesmo Bissau, apareceu algum desse equipamento? Não seria de bom tom, se tivessem esses blindados, que os viessem apresentar? Parece-me que a resposta só pode ser que sim, que apareceriam com eles.

Então no relato do tal cubano [, Ramón Pérez Cabrera,] não se diz que se deram ao trabalho de resgatar o blindado inutilizado pela mina? Teriam lá também o reboque do ACP?

Num dos almoços do BART 6520/73, é que o meu Camarada Eiras (de Bragança e fur mil de transmissões da minha 3.ª CART) me recordou uma situação por ele vivida em Bissau, e que passo a relatar:
No quartel onde ele se encontrava colocado,  depois de termos regressado de Jemberém, e estando ele na parada,  acompanhado do seu adjunto também em Jemberém, o cabo das transmissões, foi abordado por dois elementos do PAIGC, e que lhes disseram de imediato: "Vocês estavam em Jemberém, não estavam?" A resposta não podia deixar de ser afirmativa.

Acontece que um desses elementos que até nem falava português, apenas o crioulo, disse através do outro que o cabo de transmissões, uma vez no cais de Jemberém, tinha tido a arma apontada à cabeça quando se encontrava em cima de uma Berliet - numa situação de reabastecimento e no transbordo da LDP (era só o que lá chegava).

Isto porque o nosso cabo de transmissões era facilmente reconhecido e identificável devido a umas malhas brancas que, aos 21 anos, já tinha no cabelo.

Concluíram dizendo que não dispararam nem nos atacaram ali, porque tiveram medo e não eram muitos, estavam a recrutar pouco. Afinal também tinham medo.

E estamos a falar de uma base importante na região, esta que eles tinham ali ao nosso lado. Que ao que se dizia até tinha hospital.

E cubanos também, meu caro Pereira da Costa. Sendo certo que entendo perfeitamente o que dizes e a vossa posição. E, pessoalmente, agradeço pelo 25 de Abril. Apesar dos níveis de adrenalina a que aquela terra, a guerra e o embrulhanço nos levavam, não podíamos manter a situação por muito mais tempo. Por esse andar já lá tinha ido o meu filho e um dia deste ia o meu neto. Não!

Concluindo: blindados nem vê-los. Estávamos à espera que entrassem por ali dentro e levassem as três fiadas de arame farpado que por lá tínhamos. Mas não.

Um grande abraço para todos e continuo a partilhar e a concordar com as opiniões expendidas nos textos (as quais já tive oportunidade de escutar atentamente e de viva voz) do nosso camarada e amigo AMM (*).

Joaquim Sabido


Uma das raras fotos de viaturas blindadas, alegadamente ao
ao serviço do PAIGC no final da guerra. Foto (pormenor) do
Arquivo Mário Pino de Andrade / Casa Comum /
Fundação Mário «Soares.
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2. Comentário do nosso editor LG (*):

No Arquivo Amílcar Cabral, tratado e disponibilizado para o grande público pela Fundação Mário Soares, no portal Casa Comum, não há qualquer referência a viaturas blindadas entregues pelos russos no porto de Conacri... Estamos a falar de 10 mil documentos, que abrangem todo o período da guerra de "libertação",,,

Até finais de 1971, a ex-União Soviética só fornecia armas automáticas, RPG 7, munições, fardamento, medicamentos e coisas assim... E mesmo assim era preciso negociar com o "ciumento" Sekou Touré... que não perdoava a Amílcar Cabral o crescente prestígio e protagonismo a nível internacional e o leque de alianças e apoios (que ia da Suécia à China)...

Felizmente para nós, parte do armamento e das munições deviam ser "obsoletos"... São os próprios e "insuspeitos" cubanos que dizem que 40% das granadas lançadas contra Copá em janeiro de 1974 não rebentavam!... (As culpas tanto podiam ser dos fabricantes como, mais provavelmente, das condições de transporte, armazenamento e operação).

BRDM para o Amílcar Cabral? Devem ser fantasias dos burocratas da 2.ª Rep, para justificar o seu ordenado ao fim do mês e as horas de tédio (e de algum cagufe) passadas em Bissau... A gente sabe como funcionava a nossa "intelligentsia" na Guiné, incluindo os "broncos" da PIDE/DGS... que tinham a 4.ª classe mal tirada...

O PAIGC nunca teve, ao que parece, este tipo de veículos... Os russos terão oferecido, em 1969, 10 BRDM-1 (5 toneladas e meia + 4 tripulantes e depósito de 150 litros de gasolina)... "Sucata" que o Sekou Touré poderá ter disponibilizado, depois da morte de Amílcar Cabral, aos homens do PAIGC... que ele precisava de controlar... Mas aquela viatura devia gastar 100 aos 100!...

Como é que vocês queriam vê-la a passar o "arco de triunfo" em Bissau? Ou a passar a ferro as 3 fiadas de arame farpado de Jemberém?

Quanto às BRMD-2 (versão posterior, melhorada, 7 a 8 toneladas!), era muito menos provável que os guerrilheiros do PAIGC alguma vez lhes tenham posto a vista em cima... a não ser, já reformados, em 1998, quando a Ucrânia ofereceu à Guiné-Bissau quatro veículos desses, se calhar a cair de podres... É que até a caridade tem um preço!

Angola teve 50 destes veículos, mas já em plena guerra da chamada "2.ª independência"... E Angola tinha petróleo e diamantes, contrariamente à pátria de Amílcar Cabral...

O BRMD-2 era um "besta" de 7 a 8 toneladas, com uma tripulação de 4 elementos (condutor, adjunto, comandante apontador de metralhadora pesada...) e um depósito de 290 litros de gasolina, 5,75 metros de comprido, 2 metralhadoras (uma pesada e outra ligeira)... Onde é que o PAIGC tinha gente com unhas para manobrar um "anfíbio" destes? E sobretudo logística? E depois era um alvo fácil para a nossa aviação...

Ler aqui mais dobre o BRDM-2 (em inglês):

(...) O BRDM-2 (Boyevaya Razvedyvatelnaya Dozornaya Mashina, Боевая Разведывательная Дозорная Машина, literally "Combat Reconnaissance/Patrol Vehicle"[5]) is an amphibious armoured patrol car used by Russia and the former Soviet Union. It was also known under the designations BTR-40PB, BTR-40P-2 and GAZ 41-08. This vehicle, like many other Soviet designs, has been exported extensively and is in use in at least 38 countries. It was intended to replace the earlier BRDM-1, compared to which it had improved amphibious capabilities and better armament. (...)
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Nota do editor:

16 de julho de 2016 > Guiné 63/74 - P16309: Controvérsias (131): Blindados do PAIGC ? Quem os viu de ver e não de ouvir ?... (António Martins de Matos, ex-tenente pilav, BA 12, Bissalanca, 1972/74, hoje ten gen pilav ref)