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quinta-feira, 14 de novembro de 2024

Guiné 61/74 - P26154: Agenda cultural (870): Museu Nacional de Etnologia, 30 out 2024 / 2 nov 2025 > Exposição: “Desconstruir o Colonialismo, Descolonizar o Imaginário. O Colonialismo Português em África: Mitos e Realidades”








Avenida Ilha da Madeira, 1400-203 Lisboa
Telef: 21 304 11 60

Horário > 3ª feira: 14h00 – 18h00 |  4ª feira a Domingo: 10h00 – 18h00


Exposição >  “Desconstruir o Colonialismo, Descolonizar o Imaginário. O Colonialismo Português em África: Mitos e Realidades” 

Museu Nacional de Etnologia, Lisboa, Belém, 
30 out 2024 / 2 nov 2025


Folha de sala:

(i) estará patente ao público na maior sala de exposições temporárias do Museu Nacional de Etnologia entre 30 de outubro de 2024 e 2 de Novembro de 2025;

(ii) é co-organizada pelo Museu Nacional de Etnologia (Museus e Monumentos de Portugal, E.P.E.) e o Centro de Estudos Sobre África e do Desenvolvimento (Instituto Superior de Economia e Gestão, UL);

(iii) realiza-se no contexto da prioridade que o Museu confere ao estudo de proveniência das suas coleções extraeuropeias e da reflexão sobre o contexto colonial em que o museu foi fundado e procedeu à recolha das suas primeiras coleções, procurando o envolvimento do público e das comunidades na valorização e divulgação das suas próprias culturas;

(iv) concebida e coordenada pela historiadora Isabel Castro Henriques, a exposição visa apresentar as linhas de força do colonialismo português em África nos séculos XIX e XX;

(v) tem como objetivos:

  • desconstruir os mitos criados pela ideologia colonial;
  • descolonizar os imaginários portugueses;
  • e contribuir, de forma pedagógica e acessível, para uma renovação do conhecimento sobre a questão colonial portuguesa.

(vi) dois eixos centrais estruturam a narrativa da exposição:

  • o primeiro eixo organiza-se em painéis temáticos, nos quais texto e imagem se articulam, pondo em evidência as linhas de força do colonialismo português dos séculos XIX e XX, e dando a palavra ao conhecimento histórico;
  •  o segundo eixo pretende “fazer falar” as obras de arte africanas, como evidências materiais do pensamento e da cultura africanas, evidenciando a complexidade organizativa dos sistemas sociais e culturais destas sociedades, permitindo mostrar a criatividade, a vitalidade, a sabedoria, a racionalidade, a diversidade identitária e as competências africanas e contribuindo para evidenciar e desconstruir a natureza falsificadora dos mitos coloniais portugueses.

(vii) este segundo eixo da exposição é constituído por uma seleção de 139 obras, repartidas entre coleções do Museu Nacional de Etnologia, incluindo algumas peças em depósito da Fundação Calouste Gulbenkian e do colecionador Francisco Capelo, e obras de arte africana contemporânea dos artistas Lívio de Morais, Hilaire Balu Kuyangiko e Mónica de Miranda;

(viii) realizada no âmbito das Comemorações dos 50 anos do 25 de Abril, este projeto resulta das pesquisas desenvolvidas pela equipa de cerca de trinta investigadores que nele colaboraram, tendo igualmente contado com o indispensável contributo de muitas entidades, nacionais e estrangeiras, que cederam a profusa documentação iconográfica apresentada nos painéis explicativos em torno dos quais se desenvolve a narrativa da exposição:

(ix) a Comissão Executiva da Exposição é presidida por Isabel Castro Henriques e integrada por Inocência Mata, Joana Pereira Leite, João Moreira da Silva, Luca Fazzini e Mariana Castro Henriques, e a sua Comissão Científica, igualmente presidida por Isabel Castro Henriques, é constituída por 20 elementos, entre os quais António Pinto Ribeiro, Aurora Almada Santos, Elsa Peralta, Isabel do Carmo e José Neves;

(x) a museografia, instalação e apresentação ao público da totalidade das obras das coleções do Museu Nacional de Etnologia foi assegurada pela própria equipa do Museu, que igualmente assegurou a produção da exposição, com a colaboração da equipa da Museus e Monumentos de Portugal, E.P.E; 

(xi) o Projeto Expositivo e de Comunicação da exposição é da autoria do P 06 studio.

(xii) de entre o programa paralelo a desenvolver entre 2024 e 2025 no âmbito deste projeto, destaca-se-se a realização de exposição itinerante, de caráter exclusivamente documental, que circulará por escolas e centros culturais em Portugal, assim como em diversos espaços de língua portuguesa, em África e no Brasil;

(xiii) ainda em 2024 terá início, no âmbito desse programa paralelo, o ciclo Cinema e Descolonização, com projeções de filmes relacionados com a realidade pós-colonial, a decorrer no ISEG e no Museu Nacional de Etnologia, encontrando-se prevista a realização de outras ações de caráter científico, nomeadamente Conferências e Colóquios, também em parceria com outras entidades;

(xiv) a  realização da exposição é acompanhada pela edição de livro homónimo, publicado pelas Edições Colibri, em cujas 344 páginas os c. de trinta investigadores que colaboraram neste projeto desenvolvem os vários temas abordados.

sábado, 21 de setembro de 2024

Guiné 61/74 - P25963: Os nossos seres, saberes e lazeres (646): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (171): As mulheres carregam o mundo, exposição de Lekha Singh, Museu Nacional de Etnologia (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 3 de Junho de 2024:

Queridos amigos,
No mínimo, saímos dali sobressaltados: porque elas são milhões, transportam milhões de quilos, e por milhões de quilómetros, transportam na cabeça, nas costas ou nas espáduas; carregam o mundo e não se sabe desde quando, transportam os filhos, a lenha, a água, a comida, tijolos, pedras, montanhas de algodão. As imagens de Lekha Singh desvelam os fardos que lhes pesam, é uma homenagem a não sei qual percentagem de mulheres do mundo, sabemos que praticam desportos, são mulheres de família, alimentam os filhos, são verdadeiras mulas humanas, olhamos cuidadosamente para os seus rostos de pele gretada e engelhada, pegamos nos números que nos dão as agências das Nações Unidas e ficamos a saber que há pelo menos 2000 milhares de milhões de pessoas que não têm acesso a água, é trabalho de mulheres e também de crianças; há regiões onde elas transportam à cabeça o equivalente a 70% do seu próprio peso. Mas também ficamos a saber, quando olhamos estas imagens, que pelo mundo fora estas mulheres estão num processo crescente de afirmação e rompendo com as barreiras de género.

Um abraço do
Mário



Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (171):
As mulheres carregam o mundo, exposição de Lekha Singh, Museu Nacional de Etnologia


Mário Beja Santos

Não foram poucos os que me azucrinaram que era indispensável ir ver a exposição da Lekha Singh, no Museu Nacional de Etnologia. Esperei pelo último dia para ir contemplar este conjunto de imagens fora de série. Lekha Singh é uma artista visual norte-americana, o seu olhar e a sua sensibilidade têm o foco na enorme sobrecarga física que recai desde tempos imemoriais sobre a mulher, em inúmeros locais do planeta. Mas há outros alertas, a despeito do caráter vital das funções que as mulheres desempenham nas esferas familiar e económica, permanecem marcadas pela falta de reconhecimento. Fica por aqui a objetiva desta artista norte-americana, dá para que possamos ver as capacidades físicas das mulheres, tradicionalmente valorizadas apenas pela sua dimensão reprodutora, mas secundarizadas no que respeita à atividades produtivas; há como que um cuidado da artista em querer mostrar que as mulheres constituem uma crescente fonte de afirmação, estão a promover crescentes ruturas nas barreiras de género. Lekha Singh fotografou na Índia, no Butão, no Japão, em Marrocos, no Quénia, no Ruanda, na Tanzânia, na Namíbia e nos Estados Unidos da América. A sua obra fotográfica tem estado patente em instituições consagradas como a Smithsonian Institution, o Musée de l’Homme, ou The International Center of Photography de Nova Iorque.
Na apresentação desta exposição, observa o diretor do Museu Nacional de Etnologia, Paulo Ferreira da Costa, que “há virtuosismo da artista visual a tratar a condição feminina em sociedades de caráter tradicional ou moderno, Lekha Singh polariza-se nestas questões fundamentais em que nos desvela o mundo e a sociedade em que vivemos, mas também para pensarmos no mundo e as sociedades que queremos construir para o futuro, e o lugar que as mulheres neles devem ter.”
Cheguei tarde mas em boa hora para uma exposição notável. Não podendo o leitor desfrutá-la presencialmente, aqui lhe deixo uma mostra fotográfica de indiscutível valor que nos obriga a pensar sobre o modo de transporte não motorizado em que cabe à mulher deslocar de um lado para o outro cargas por vezes sobre-humanas.
Que desfrutem!

Quénia, desde que se casaram que transportam à cabeça a alimentação da sua família, é trabalho que fazem desde pequeninas, como farão as suas filhas, e depois as suas netas
Quénia, aquele cesto é todo o seu património
Índia, elas transportam grandes cestos de algodão
Índia, ao fundo da escadaria corre o rio onde ela lavou a roupa da família, agora sobe-a levando na cabeça toda essa roupa molhada
Butão, faça chuva ou faça sol o trabalho agrícola nunca falta, transporta-se às costas ou na cabeça
Estados Unidos da América, esta mulher transporta o seu filho, foi assim no passado, é no presente e será no futuro
Quénia, esta mulher percorreu uma longa distância para trazer à cabeça uma pedra que é fundamental para a lareira onde preparará a comida da sua família
Índia, esta mulher caminha para o rio Ganges, transporta todos os seus haveres à cabeça, o seu filhinho também se irá banhar no rio sagrado
Tanzânia, nas margens do lago Tanganica, esta mulher transporta um enorme pote de barro à cabeça, já percorreu uma longa distância com ele vazio, vai regressar a casa com o pote cheio de água, pesará 22 quilos
Índia, mesmo com o rosto protegido, esta mulher transporta ramos de acácia para fazer a sua lareira, a lenha continua a ser a fonte de energia mais usada pelos muito milhões de gente pobre de todo o mundo
Quénia, esta mulher, pertencente ao povo Pokot, usa pesados anéis de missangas ao pescoço, que nunca deverá retirar. Cada círculo representa uma determinada dimensão da sua biografia: marido, filhos e estatuto social. As missas são ainda investidas de significados próprios, consoante a cor: o amarelo promove a paz, o branco representa o leite, o verde simboliza a erva, o negro a pele, o vermelho o sangue, o laranja a beleza e o azul Deus nos céus.
Índia, trabalha-se em qualquer idade e por toda a vida
Estados Unidos da América, halterofilista que detém 7 recordes mundiais de levantamento de pesos
Índia, ela leva à cabeça a comida para toda a família
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Nota do editor

Último post da série de 14 de setembro de 2024 > Guiné 61/74 - P25942: Os nossos seres, saberes e lazeres (645): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (170): Restos de coleção de visitas inesquecíveis ou lugares esplendentes (Mário Beja Santos)

quinta-feira, 6 de junho de 2024

Guiné 61/74 - P25612: Os 50 anos do 25 de Abril (26): A exposição, na Gare Marítima de Alcântara, sobre os antecendentes e a origem (com enfoque na guerrra colonial) e os protagonistas do 25 de Abril de 1974... Para ver até 26 de junho - Parte I: Os bodes expiatórios do regime

 


Lisboa > Administração do Porto de Lisboa >  Gare Marítima de Alcàntara  (um belo edifício da arquitetura estado-novista, inaugurado em 1943, da autoria do arquiteto Pardal Monteiro, decorado com painéis a fresco de Almada Negreiros) > Fachada do edifício com os cartazes da Exposição "MFA 25A - O Movimento das Forças Armadas e o 25 de Abril". Horário: de quarta feira a domingo, das 14h00 às 20h00, de 14 de abril a 26 de junho de 2024.


1. Já aqui demos o devido destaque à exposição 'O MFA e o 25 de Abril', que  é uma iniciativa da Comissão Comemorativa 50 Anos 25 de Abril, de curadoria partilhada com a Associação 25 de Abril e em parceria com o Porto de Lisboa (*).

"Esta exposição pretende ilustrar o papel do Movimento das Forças Armadas (MFA) no derrube da ditadura e na construção da Democracia, através do recurso a materiais iconográficos, audiovisuais e sonoros. Será dinamizada através de visitas guiadas, conferências, debates e espetáculos, e complementada por um dossiê multimédia." (Fonte: Comissão Comemorativa 50 anosdo 25 de Abril).


Só há dias, em 26 de maio último, um domingo à tarde,  consegui lá dar um salto. Fiz bastantes fotos (cerca de 150). A exposição está bem orgsnizada por blocos temáticos, mas é muito extensa. Hora e meia foi o tempo que eu gastei. Julgo que para o grande público tem excesso de informação e cronologias (fitas do tempo) muito detalhadas. (Tem um erro fctual imperdoável: dar Madina do Boé como local onde o PAIGC proclamou a independência unilateral da Guiné-Bissau, em 24 de setembro de 1973.)

Os blocos temáticos são os seguintes: 

0. Memorial aos presos políticos; 1. A queda dos impérios colonais; 2. A guerra colonial; 3. Os militares, os bodes expiatórios do regime; 4.A conspiração; 5. O dia 25 de Abril; e 6. O legado do MFA.

O curador desta exposição, da parte da A25A, é o comandante, capitão-de-mar-e-guerra ref, Pedro Lauret, um dos "históricos" do nosso blogue: recorde-se que ele foi combatente no TO da Guiné, na qualidade de imediato da LFG Orion, de 1971 a 1973; tem 36 referências no nosso blogue; e foi um dos participantes do I Encontro Nacional da Tabanca Grande, na Ameira, Montemor-o-Novo, em 14 de outubro de 2006.

É uma exposição a não perder, sobre os antecedentes (próximos e afastados). a origem e os protagonistas do 25 de Abril: 

"Os oficiais do MFA tinham capacidade de comando, coragem, determinação e conhecimento operacional para que, no dia 25 de Abril, às três da manhã, de cerca de 30 unidades diferentes, de Norte a Sul do Pais, em simultàneo, saíssem  forças rumo aos seus objetivos, numa operação - Operação Viragem Histórica -  extraordinariamente bem concebida, planeada, conduzida e executada" (Fonte: excerto da folha de sala).

Faltam menos de 3 semanas para encerrar (**). Hoje reproduzimos alguns dos painéis do Bloco 3 (Os militares, os bodes expiatórios do regime) bem como do Bloco 2 (A guerra colonial), e nomeadamente imagens do armamento, das NT e do IN,  que está exposto em vitrinas.


Bloco 3 - Os militares, os bodes expiatórios do regime








Bloco 2 - A Guerra Colonial: armamento do IN e das NT









 Imagens colhidas e editadas por LG (2024), com a devida vénia...

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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 29  de abril de DE 2024 > Guiné 61/74 - P25457: Os 50 anos do 25 de Abril (15): Exposição na Gare Marítima de Alcântara, Porto de Lisboa, até 26 de junho próximo, de 4ª feira a domingo, entre as 14h00 e as 20h00: "O Movimento das Forças Armadas e o 25 de Abril": curador, Pedro Lauret, Capitão-de-Mar-e-Guerra Ref


(**) Último poste da série > 3 de junho de  2024 > Guiné 61/74 - P25598: Os 50 anos do 25 de Abril (25): Hoje, na RTP1, às 21:01, o 8º (e penúltimo) episódio da série documental, "A Conspiração", do realizador António-Pedro Vasconcelos (1939-2024)

quinta-feira, 11 de abril de 2024

Guiné 61/74 - P25369: Os 50 anos do 25 de Abril (8): Convite para a inauguração da exposição "O MFA e o 25 de Abril", amanhã, dia 12 de Abril, pelas 17h00, na Gare Marítima de Alcântara - Lisboa (Pedro Lauret, Capitão-de-Mar-e-Guerra Reformado)



1. Mensagem do nosso camarada Pedro Lauret, Capitão-de-Mar-e-Guerra Reformado, com data de 11 de Abril de 2024:

Meu caro Carlos Vinhal,
Venho convidar-vos a estar presentes na inauguração da exposição “O MFA e o 25 de Abril” amanhã pelas 17:00, na Gare Marítima de Alcântara, onde o nosso Blogue figura na Ficha Técnica, assim como o Miguel Pessoa e o Casimiro de Carvalho.

Quem não puder estar presente a exposição estará aberta até fim de Junho, acesso livre, nos horários do Convite.

Forte Abraço
Pedro Lauret

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Nota do editor

Último poste da série de 9 DE ABRIL DE 2024 > Guiné 61/74 - P25359: Os 50 anos do 25 de Abril (7): exposição em Santiago do Cacém, "Filhos da Terra, Soldados do Ultramar"

sábado, 2 de dezembro de 2023

Guiné 61/74 - P24909: Os nossos seres, saberes e lazeres (603): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (131): Querubim Lapa, mago da cerâmica azulejar, mas irrefutável pintor e desenhador neorrealista (2) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 29 de Agosto de 2023:

Queridos amigos,
Aqui acaba a visita a uma exposição surpreendente, alvo de um catálogo de referência, num espaço arquitetónico único, concebido por Alcino Soutinho e onde se revela que Querubim Lapa é muito mais do que um grande ceramista azulejar, foi o nome maior da pintura neorrealista, a sua obra é a demonstração eloquente de que os neorrealistas não bebiam todos da mesma cartilha e como escreve o curador da exposição, David Santos, "Ao desenvolver um sentido poético da análise social do nosso país nas décadas de 1940 e 1950, Querubim Lapa realizou uma pintura singular, como poucas, soube conciliar o testemunho social com uma observação lírica da comunicação artística". No texto anterior, encetámos a viagem por esse Pós-Guerra em que uma nova geração, manifestamente congregada em oposição ao Estado Novo, assumia um compromisso entre a arte e a sociedade. Diga-se o que se disser, "os objetivos reclamados pelo neorrealismo constituíram-se como uma verdadeira alternativa cultural para a maioria dos artistas portugueses da terceira geração modernista - onde se inclui Querubim Lapa, nascido em 1925 - aqueles que na segunda metade dos anos 1940 frequentavam ativamente as escolas de belas artes, pressentindo no fim do conflito mundial a oportunidade de uma mudança política no nosso país". Iremos neste apontamento acompanhar a evolução do artista até se chegar a uma nítida fase de afastamento das formulações e inspirações usadas no período inicial, é quando chegamos ao distanciamento que se pode constatar como este artista plástico, atraído pela explosão da cor, e porventura pelas necessidades impostas pela vida, optou pela cerâmica azulejar, onde foi grão-mestre entre mestres.

Um abraço do
Mário



Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (131):
Querubim Lapa, mago da cerâmica azulejar, mas irrefutável pintor e desenhador neorrealista (2)


Mário Beja Santos

É uma exposição surpreendente, o nome Querubim Lapa (1925-2016) associa-se instantaneamente a notabilíssimos trabalhos de cerâmica azulejar, de que ele foi um artista de referência, está agora patente no Museu do Neo-Realismo, em Vila Franca de Xira, até 29 de outubro de 2023, uma exposição que tem o propósito de dar a conhecer a sua atividade quando ele aderiu a um cânone que marcou uma geração. São cerca de duas centenas de trabalhos entre as décadas de 1940 e 1960. Querubim começou por desenhos de pequeno formado que realizou entre 1945 e 1948, profundamente inspirados no realismo de observação social, vamos ver mendigos, feirantes, vendedeiras, cenas de circo, tudo marcado pelo realismo. Esta observação social prolongar-se-á até à década de 1960, findo o arco temporal que justifica o título da exposição Querubim Lapa, uma poética neorrealista.

Observa David Santos, diretor científico do Museu do Neo-Realismo, “Se hoje Querubim Lapa é pela história de arte identificado como um dos nomes mais decisivos da arte moderna em Portugal ao nível da cerâmica azulejar, ele deve ser igualmente reconhecido como um dos maiores pintores neorrealistas que o nosso país reconheceu”. Não nesta sua arte nada que se aparente com o cânone do realismo socialista, mas também não há folclore, o cômputo é uma poética de liberdade singular, não pelos temas, esses sim, recorrentes na obra destes jovens que partilhavam de uma oposição ao Estado Novo, cenas de trabalho, um mostruário da vida dos pobres, dos sacrificados, não faltando mesmo cenas circenses, uma das poucas ilusões de magia que era permitida aos marginalizados, os do fundo da pirâmide social; mas o que o distingue é o sopro lírico, os revérberos da luz, das cores, a filiação cultural ampla, ao longo da sua trajetória neste domínio das artes plásticas encontra-se a sua forte atração por temáticas do mundo antigo, na sua busca diferenciadora encontramos algo da iconografia russa, da influência bizantina, do gótico italiano, o que se exprime na postura dos corpos, na evidência das formas.

Também no estudo que David Santos preparou para este catálogo de referência se observa a atração de Querubim pelo espelho, o outro eu que atua como um reflexo, e o historiador tece considerações sobre o uso do espelho, já patente no seu autorretrato de 1949, no uso de elementos distrativos para confundir os códigos dos elementos que ele coloca na obra, que tanto pode ser a cor vermelha como o símbolo da alcachofra. Um crítico observou que Querubim era um guloso da cor, um trapezista da linha. Muito exigente na experiência, com o seu caminho próprio no realismo social, esgotados os filões perfilhados pelo uso da arte em que a forma devia estar ao serviço do conteúdo, Querubim, chegada a década de 1960, enveredará por outros rumos, tal como outros artistas da sua geração (caso de Jorge Vieira, Nikias Skapinakis, Rolando Sá Nogueira). Poder-se-á dizer, contudo, e volto a citar David Santos: “Querubim Lapa meter-se-á fiel, no essencial, a um compromisso pessoal que, não abdicando da esperança coletiva de uma sociedade, insistirá na realização de uma arte que exige de si própria um equilíbrio entre o humanismo das suas referências reais e iconográficas e a surpresa das descobertas determinadas pelo fazer artístico.” Há uma linha sequencial que vamos encontrar em cenas como a hora do almoço, o regresso do trabalho agrícola, as figuras das vendedeiras até à fase terminal desta poética neorrealista em que se representa o descanso, porventura em fainas agrícolas. É uma síntese dessas imagens que eu pretendo aqui mostrar para acicatar o desejo do leitor em vir visitar este esplêndido edifício concebido por Alcino Soutinho e percorrer dois andares para conhecer o pulsar do artista plástico, o seu compromisso, a sua estética humanista.

Vamos, pois, continuar a visita.

O tema do espelho, obsidiante na sua obra
As carquejeiras, o trabalho duro reservado aos mais humildes
As carquejeiras num contexto de atividades laborais que tanto podem ser a costura como a faina agrícola
O regresso do trabalho, a censura não terá gostado do motivo, a foice não engana, mas o contraste lírico não é menos pesado, aquele pai com o seu menino às cavalitas, com um furacão de luz ao fundo
A mulher omnipresente, no óleo, na tinta-da-china, na aguarela, lápis, o rosto inteiro, o perfil, em atividades laborais com outras, com o menino ao colo, com o espelho partido, em desespero, caçando borboletas, vendeira de peixe, com uma pomba em ambas as mãos… É a expressão mais evidente constante do compromisso do artista com observação social. Como, aliás, se escreve no catálogo: “De modo singular, Querubim Lapa concilia no seu exercício de consciente situação histórica, uma mais subtil relação com o ambiente reivindicativo do realismo social, voluntariamente adotado desde os desenhos iniciais. Essa era uma opção que o situava, sob o ponto de vista discursivo, na esfera desse encontro entre o passado clássico e o presente moderno.”
Ousadia, irrequietude, a febre da experiência. Tendo como fundo uma volumetria que nos parece convocar para um castelo tipo São Jorge e a descida do casario numa geometria organizada, há depois um tropicalismo que parece saído do Brasil… É um choque, mas Querubim queria mesmo experimentar. Este quadro que não tem título, data de 1955, tenho para mim que o artista, já trabalhava em cerâmica azulejar, pesquisava novas formulações, aliás o final da exposição termina com o tópico “Memória e distanciamento”, atingira-se uma nova dimensão cromática e volumétrica, vamos por ali à volta desta atmosfera experimental e procuramos analogias que nos mostram os prelúdios do afastamento, o encontro com novos processos, no íntimo o visitante vê também a evolução de outros artistas, caso de Maria Keil, Rogério Ribeiro, Nikias Skapinakis. Mas a identidade de Querubim é inatacável, é como estar a ver Almada Negreiros e saber que é impossível não ser Almada Negreiros, ou Cruzeiro Seixas ou Raúl Perez
Exemplos dessa inventividade, temos agora uma paleta mais alegre, um novo tratamento das figuras, nota-se outros chamamentos de artistas figurativos seus contemporâneos, um deles, indubitavelmente, Marc Chagall.
O processo da cor está em alteração, esta vendedeira distancia-se das figuras criadas no Pós-Guerra
Este óleo dá pelo nome “O fardo”, é de 1963, a cromática é de Marc Chagall, a distância do processo neorrealista é insofismável.
“O descanso”, tema que apaixonou os naturalistas, os tardo-naturalistas, modernistas como Almada Negreiros, o que é marcante é a expressão lírica da obra, o apaziguamento, a manipulação magistral dos tons neutros e dos verdes e o poder da luz, como se houvesse um candeeiro a iluminar o repouso destes trabalhadores.
Obra icónica de Querubim Lapa na Pastelaria Mexicana, entre a Praça de Londres e a Avenida Guerra Junqueiro
Querubim Lapa na Avenida da Índia, Lisboa
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Notas do editor:

Vd. poste de 25 DE NOVEMBRO DE 2023 > Guiné 61/74 - P24886: Os nossos seres, saberes e lazeres (601): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (130): Querubim Lapa, mago da cerâmica azulejar, mas irrefutável pintor e desenhador neorrealista (1) (Mário Beja Santos)

Último poste da série de 30 DE NOVEMBRO DE 2023 > Guiné 61/74 - P24900: Os nossos seres, saberes e lazeres (602): Abandono do Património Histórico (Victor Costa, ex-Fur Mil At Inf)

sábado, 6 de maio de 2023

Guiné 61/74 - P24292: Os nossos seres, saberes e lazeres (571): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (101): Veloso Salgado no MNAC – Museu do Chiado: O maravilhamento de obras desconhecidas de amigos franceses (3) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 4 de Abril de 2023:

Queridos amigos,
Esta exposição de Veloso Salgado tem o mérito de nos revelar que não há biografia definitiva sobre quem quer que seja, pensava-se ter um conhecimento mais ou menos aprofundado sobre o currículo de Veloso Salgado, eis que a neta doa um acervo de centenas de peças ao MNAC - Museu do Chiado, entre elas a correspondência deste talentoso pintor e vem-se a saber que estabeleceram ao longo da vida uma relação afetuosa com um conjunto de pintores franceses e que fora profundamente marcado por ter pertencido ao grupo da Escola de Wissant, no norte da França, isto além dessa mesma correspondência revelar as amizades do pintor por outros bolseiros portugueses, caso de Teixeira Lopes e Ventura Terra. É o aturado trabalho de Maria de Aires Silveira que levou a esta portentosa exposição. E aproveitou-se a oportunidade para dar notícia de duas outras exposições, uma sobre a arte e literacia em saúde e a outra para homenagear um grande artista recentemente desaparecido, Nikias Skapinakis.

Um abraço do
Mário



Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (101):
Veloso Salgado no MNAC – Museu do Chiado, notícias sobre outras exposições (3)


Mário Beja Santos

Esta exposição alusiva a Veloso Salgado espraia-se por todo o seu processo artístico e a sua formação, este homem de origem galega formou-se em Lisboa foi professor na Escola de Belas Artes, teve intervenção em grandes espaços decorativos, caso do Palácio da Bolsa, da Escola de Medicina do Porto, da Assembleia da República. Este acervo vem na continuidade da exposição apresentada no Museu de Boulogne-sur-Mer, que revelou detalhes até agora desconhecidos do percurso artístico de Veloso Salgado. A exposição do MNAC foca-se sobre os estudos e a carreira artística de Veloso Salgado em França enquanto bolseiro, entre 1888 e 1895, nela se expõe obras inéditas desse período. Segundo a documentação que o MNAC distribui, a exposição acolhe 70 obras, põe enfoque no seu itinerário francês (Paris, Bretanha e Wissant), desvela a ligação de uma amizade com os artistas Virginie Demont-Breton e Adrien Demont e a Escola de Wissant. É a primeira vez que se dá a público este diálogo de Veloso Salgado com os seus pares franceses.
Da exposição deu-se referência em dois textos anteriores, faz-se agora exclusiva menção de um quadro intitulado “Terra prometida” de um desses amigos franceses de Veloso Salgado, que também teve em exposição em 2022 no Museu Boulogne-sur-Mer.

“A terra prometida”, Adrien Demont, 1895

Decorreu até 20 de abril uma exposição intitulada “A literacia faz bem à saúde”, organizada pela Sociedade Portuguesa de Literacia em Saúde. O desafio foi “numa perspetiva construtiva de solução, sob o ponto de vista do artista, trabalhar temas subjacentes à literacia em saúde que se focam na comunicação terapêutica, no desenvolvimento de competências, na relação em saúde, na compreensão e na falta dela, na união de esforços e parcerias”.
Cada artista explorou individualmente possibilidades criativas e interpretativas que, no seu conjunto, permitem repensar as fronteiras entre profissionais, doentes e artistas de um modo simultaneamente íntimo, pessoal e coletivo e afirmar o poder da expressão artística no diálogo e no envolvimento das instituições, dos criadores e das pessoas em geral.

Fui imediatamente atraído por esta obra, tê-la-ei conhecido na década de 1980, quando fui designado pelo Ministério do Ambiente como representante no Conselho de Prevenção do Tabagismo, poderei estar enganado, mas esta peça fazia parte das exposições itinerantes sobre prevenção tabágica do Instituto Nacional de Cardiologia Preventiva, então dirigido pelo professor Fernando Pádua, circulou por inúmeros estabelecimentos de ensino, é uma peça didaticamente forte, tem poder chocante, não podemos desviar o olhar, não passa de modo algum despercebido o nefasto poder do fumo nos pulmões e nas vias respiratórias, o fumo é um dos fautores do cancros do pulmão.
No verso, imagens poderosas dos tempos em que fumar se inseria em todos os protocolos da vida social, era normal publicitar o tabaco, até o ator canastrão e futuro presidente dos EUA, Ronald Reagan parecia feliz da vida em enviar aos amigos cigarros Chesterfield. Hoje sorrimos e perguntamos como foi possível ter vivido séculos a fio nesta normalidade social tabágica. Parece que foi necessário ter de esperar pelos estudos dos cancerólogos para saber que a adição tabágica é o mal mais evitável que há.
Medicamentos do passado, quase um quadro de botica, advertências de que havia remédio multiusos para a fraqueza orgânica, convalescenças, neurastenia e anemia… Sou do tempo destes fortificantes e lembro-me perfeitamente destes frascos de dimensões enormes com ofídios em formol, também apareciam nas aulas de Ciências Naturais.
Obra de Diogo Gomes, “Lancem ideias àqueles que criticam ou a literacia na era da pós-verdade”, técnica mista, 2022.

Diogo Gomes recorre à pintura e à assemblage para convocar a discussão sobre o questionamento da clarividência científica e sobre a formação de uma ideia de pós-verdade, determinada pela proliferação de desinformação, pelo imediatismo e pela apropriação destas narrativas por parte dos populismos ideológicos neototalitários.
Nikias Skapinakis, “Retrato de Natália Correia”, 1959
Nikias Skapinakis, “Mulher leopardo”, 1968

Entre a exposição Veloso Salgado e a “Literacia faz bem à saúde”, na chamada Sala dos Fornos no Museu do Chiado expõem-se obras de Nikias Skapinakis, falecido em 2020, admiro muito o seu talento, guardo memória dos seus quintais e das suas divagações de Pop Art, que o visitante do Museu do Chiado não perca a oportunidade de conhecer as sucessivas fases de experimentação deste grande pintor.
Cabeça de preto, Soares dos Reis (1873)

Estou de saída, é sempre impressionante descer a escadaria do Museu do Chiado, ter tempo para conversar com esculturas que adornam estes espaços de passagem e o átrio. Esta “Cabeça de preto” é impressionante no equilíbrio das formas. Quem cuida da decoração do MNAC não esquece mestres do naturalismo à atualidade, é possível ver em diálogo Rodin e Alberto Carneiro, já pronto a sair olho para o alto e despeço-me deste esplêndido gesso de Canto da Maia intitulado “Desespero da dúvida”, vem bem a propósito, não propriamente desespero, mas esta salutar dúvida que qualquer obra de arte nos levanta, faz parte integrante do nosso olhar sobre a vida e sobre o mundo.
Mais uma razão para vir até ao Museu do Chiado.

“Desespero da dúvida”, Canto da Maia, 1915
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Nota do editor

Último poste da série de 29 DE ABRIL DE 2023 > Guiné 61/74 - P24266: Os nossos seres, saberes e lazeres (570): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (100): Veloso Salgado no MNAC – Museu do Chiado: O maravilhamento de obras desconhecidas de amigos franceses (2) (Mário Beja Santos)