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domingo, 23 de março de 2025

Guiné 61/74 - P26608: Os 50 Anos do 25 de Abril (37): Lisboa, Belém, Museu de Etnologia, até 2/11/2025: Exposição "Desconstruir o Colonialismo, Descolonizar o Imaginário. O Colonialismo Português em África: Mitos e Realidades" - Parte III


De acordo com a legenda, esta imagem é a reprodução de um postal de c. 1906 (Fonte: João Loureiro: "A Sociedade Angolana de há 100 anos", pref. António Barreto.  Lisboa: Maisimagem, 2008. pág. 94).


Painel II . "Missão Civilizadora" e "Progresso" > 3. O trabalho indígena: modalidades, violência e denúncias.


Exposição > “Desconstruir o Colonialismo, Descolonizar o Imaginário. 
O Colonialismo Português em África: 
Mitos e Realidades”

 Lisboa, Belém,
30 out 2024 / 2 nov 2025


1. Continuamos a "visita resumida"  desta exposição, que pode ser vista até 2 de novembro de 2025. (Há visitas guiadas, tem que se reservar.)

Requer "tempo, vagar e... distanciamento crítico"! ... Merece pelo menos duas visitas, para se lidar com tanta informação. 

Para já é uma oportunidade única para se conhecer uma tão vasta e rica  documentação fotográfica, que ilustra os diferentes painéis, e que é proveniente de diversos arquivos, públicos e privados, incluindo o Arquivo Histórico-Militar, o Arquivo Histórico Ultramarino e o Arquivo Nacional da Torre do Tombo. Sem esquecer a notável coleção de postais antigos do dr. João Loureiro (ou João M. Loureiro:): uma das suas obras, "Postais Antigos da Guiné", já foi aqui, oportunamente objeto de recensão em quatro postes do nosso crítico literário, Mário Beja Santos. "Uma relíquia", este trabalho, de um grande colecionador que percebeu o valor iconográfico de um simples bilhete-postal... 

De resto, desde cedo, no blogue, fizemos um esforço por recolher e salvaguardar os nossos velhos postais ilustrados (temos meia centena de referências).

Por outro lado, estamos a falar de um período da nossa história (e da história africana) mal conhecido de todos nós. antigos combatentes: grosso modo, vai do último quartel do séc. XIX até à descolonização.

Quem é que no nosso tempo de escola (incluindo o liceu), nos anos 50/60,  ouviu falar em "trabalho forçado", "imposto de palhota". "assimilados", "colonialismo",   "código do trabalho indígena", "acto colonial", "luso-tropicalismo", "nacionalismo africano", etc. ?!... 

Eu não ouvi, nem me perguntaram nada disso no exame de admissão ao liceu, em 1958... Era lá coisa para uma criança de 10 anos ter que saber!.. Perguntaram-me, isso sim, os nomes e cognomes de todos os reis de Portugal... (Felizmente, sabia-os, na ponta da língua!)

Nós já somos do tempo, em que as "colónias" passaram a "províncias"... Mas não sabíamos que só em 1962 fora"abolido legalmente o trabalho forçado", era então ministro do ultramar  o professor Adriano Moreira (1922-2022)... Tinha eu 15 anos.  

O  objetivo desta exposição pretende ser  "pedagógico e didático",  resultando da colaboração de 3 dezenas de especialistas mas não deixando de ter o cunho muito pessoal, profissional, metodológico e teórico-ideológico da sua curadora, Isabel Castro Henriques (vd. aqui a entrevista que deu à RTP África). 

A exposição é organizada pelo CEsA Centro de Estudos sobre África e Desenvolvimento (do ISEG / UL)  e pelo Museu Nacional de Etnologia, com curadoria da historiadora Isabel Castro Henriques. Integra as comemorações dos 50 anos do 25 de Abril.


2. Recorde-se que, de acordo com a folha de sala, a "narrativa da exposição" centra-se em dois  eixos:

(i) um primeiro eixo baseado  "em painéis temáticos, nos quais texto e imagem se articulam, pondo em evidência as linhas de força do colonialismo português dos séculos XIX e XX, e dando a palavra ao conhecimento histórico"; 

(ii) e um  segundo eixo que "pretende 'fazer falar' as   [139] obras de arte africanas", quase todas do espólio do Museu Nacional de Etnologia (que, acrescente-se,  não é um museu do colonialismo...)  como "evidências materiais do pensamento e da cultura africanas, evidenciando a complexidade organizativa dos sistemas sociais e culturais destas sociedades, permitindo mostrar a criatividade, a vitalidade, a sabedoria, a racionalidade, a diversidade identitária e as competências africanas e contribuindo para evidenciar e desconstruir a natureza falsificadora dos mitos coloniais portugueses."

Ainda não visitámos a exposição toda que, se não erramos, tem oito painéis (sendo o último dedicado à descolonização e o legado colonial).



3. O segundo painel  (*) tem como subtemas os seguintes (pelo menos, os que eu registei na minha máquina fotográfica), e que são profusamente ilustrados com imagens da época (mais de Angola, Moçambique e São Tomé, e muito menos da Guiné, que não era uma "colónia de povoamento"):

(i) a criação do "indígena" e o "grémio da civilização";

(ii) a obra civilizadora da Igreja: evangelização e instrução:

(iii) o trabalho indígena: modalidades, violência e denúncias;

(iv) o imposto indígena: caracterização e significado histórico.

Seguem-se alguns conteúdos (reproduzidos aqui com a devida vénia, e a pensar sobretudo nos nossos leitores fora de Lisboa que dificilmente terão oportunidade de se deslocar ao Museu Nacional de Etnologia, no Restelo, de entrada gratuita para os antigos combatentes)... 

A exposição é muito rica do ponto de vista documental, com se pode aferir pela pequena amostra que apresentamos (seleção de c. de 220 imagens que fiz de metade dos painéis):



























"Sacralização da vida: objetos e rituais" (Uma das diversas vitrines com objetos de arte africana , na sua maioria espólio do Museu Nacional de Etonologia)






















(Imagens obtidas da exposição "in situ",  sem flash, com a devida vénia, e aqui reproduzidas com propósito meramente informativo...)


(Fotos, seleção, edição: LG)

(Continua)

______________

Nota do editor:

(*) Vd. postes anteriores:


15 de fevereiro de 2025 > Guiné 61/74 - P26499: Os 50 Anos do 25 de Abril (36): Lisboa, Belém, Museu de Etnologia, até 2/11/2025: Exposição "Desconstruir o Colonialismo, Descolonizar o Imaginário. O Colonialismo Português em África: Mitos e Realidades" - Parte II

8 comentários:

Anónimo disse...

Não é que esteja interessado em ver.
Mas porque não fazem a exposição uns diazitos para a malta de segunda e terceira classe possa ir ver.
Com certeza que metade da população está metade no norte.
Chateia me esta discriminação de pobres e ricos.
Ou do poder e do não poder, da força do poder.
Tenho que ir viver os últimos tempos da minha vida para a capital do antigo Império para me cultivar um pouco mais.
Afinal nós trabalhamos no norte, criamos riqueza e os lucros e benefícios são todos para Lisboa!
Essa parte dó país vive à custa dos outros, mais parolos.
Tem de acabar.
Virgílio Teixeira

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Faço minhas as palavras de Beja Santos a propósito da coleção de postais antigos do "ultramar português", de João Loureiro, uma espantosíssima coleção de 10 mil postais ilustrados:

(...) O Dr. João Loureiro goza de uma situação particularíssima no nosso país: dispõe, por iniciativa própria, do maior acervo de bilhetes-postais das antigas províncias ultramarinas. Em 2015, numa edição do Arquivo Histórico de Macau, ficou-se com uma ideia do valor histórico desta coleção iconográfica de postais fotográficos. O autor explica as suas motivações na introdução deste precioso álbum:

“Se excluir algumas dezenas de postais ilustrados que adquiri em diversas viagens aos antigos territórios ultramarinos, e sobretudo nas minhas colocações profissionais em Malange e no Uíge nos primórdios dos anos 70 do século XX, posso considerar como ponto de partida de uma recolha sistemática o Verão de 1992, imediatamente após o regresso de uma visita a Macau. Apercebi-me – e rapidamente o confirmei com pessoas altamente credenciadas nestas matérias – que eram muito escassas as fontes iconográficas sobre os territórios de África e do Oriente marcados pelo presença humana e cultural portuguesa, designadamente em bibliotecas, arquivo históricos e instituições similares”.

Pesquisou e apurou que as coleções de bilhetes-postais das antigas províncias africanas eram modestíssimas tanto no Arquivo Histórico Ultramarino como na Biblioteca Nacional de Lisboa. Mais adiante recorda-nos que o período de lançamento e expansão do bilhete-postal ilustrado – finais do século XIX a primeiros três ou quatro decénios do século XX – coincide precisamente com a fase da ocupação e colonização efetiva de África e de uma maior atenção e interesse dedicados pelos governos da monarquia liberal e das duas primeiras repúblicas às causas ultramarinas.

Distintas personalidades do mundo científico aplaudem o acervo organizado pelo Dr. João Loureiro. Francisco Bettencourt, do King’s College de Londres e então diretor do Centro Cultural da Fundação Gulbenkian em Paris, considera que se trata de “… uma coleção única cuja consulta João Loureiro tem tido a generosidade de facultar aos investigadores. Na nossa opinião é impossível trabalhar sobre as antigas colónias portuguesas dos séculos XIX e XX sem utilizar este acervo de imagens”.

René Pélissier, um dos maiores especialistas sobre a história da África de expressão portuguesa, declarou esta coleção como “monumento único”. António Barreto escreveu: “… ao tornar pública e acessível a sua coleção, João Loureiro presta um serviço ao seu país e aos novos Estados africanos, assim como contribui para o conhecimento da sua história”. (...)

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Virgílio, à parte a tua ironia (eu gosto das duas cidades...), devo dizer-te que o Museu Nacional de Etnologia foi pensado e fundado por um homem do Norte,Jorge Dias (Porto, 1907 – Lisboa, 1973), o nosso maior etnólogo... E foi no Norte que teve a sua primeira imersão na cultura profunda da nossa gente (Serra de Montemuro e Trás-os-Montes)...

Licenciou-se em Filologia Germânica na Universidade de Coimbra, doutorou-se em Etnologia em Munique, Alemanha, em pleno regime nazi, e em 1947 criou o Centro de Estudos de Etnologia na Universidade do Porto...

Foi diretor da secção de Etnografia do Centro de Estudos de Etnologia Peninsular e um dos mais importantes impulsionadores do Atlas Etnográfico de Portugal.

Neste centro, e mais tarde no Centro de Estudos de Antropologia Cultural e no Museu de Etnologia do Ultramar, que ajudou a criar em 1965 (hoje Museu Nacional de Etnologia), Jorge Dias criou e lideroir e dinamizou uma equipa de investigadores que tiveram um papel decisivo no desenvolvimento da Etnologia no nosso país. Foi ainda professor nas Faculdades de Letras de Coimbra, Porto e Lisboa e fez parte do corpo redatorial da Revista Ethnologica Europea.

Publicou mais de uma centena e meia de artigos e obras sobre Etnologia e Antropologia. Entre elas, "Os arados portugueses e as suas prováveis origens " (1948), "Vilarinho da Furna, Uma Aldeia comunitária" (1948), "Rio de Onor - Comunitarismo Agropastoril" (1953), "Os Macondes de Moçambique" (3 vol.) (1964-70)...

Quanto à exposição, sei que está prevista, no "programa paralelo a desenvolver entre 2024 e 2025 no âmbito deste projeto" (...) "a realização de exposição itinerante, de caráter exclusivamente documental, que circulará por escolas e centros culturais em Portugal, assim como em diversos espaços de língua portuguesa, em África e no Brasil"...

Espero que chegue também ao Porto (que fica aqui a 300 km, na foz do Rio Douro, que eu também considero um bocadinho meu, e é um dos mais belos do mundo)...

Um abraço sulista (mas não elitista) do Luís.

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Virgílio, espero ao menos que tenhas dado uma "vista de olhos" por este poste que me deu uma trabalheira...O que importa é partilharmos informação e conhecimento sobre a história comum do nosso país e dos países lusófonos (Guiné, Cabo Verde, São Tomé, Angola, Moçambique, Macaiu, Timor...) a que nos ligam tantos laços, incluindo afetivos... Temos amigos, o teu pai e o teu mano passaram pela Índia, o meu "velho" esteve em Cabo Verde...). Temos uma "história comum", bons momentos e menos bons...Claro que os historiadores não dão muita importância aos "afetos", aos "amores", às "amizades", às "camaradagens"...A História com H grande "esmaga" a pequena história, que é afinal a nossa... É também o defeito destas exposições que querem pôr o Rossio na rua da Betesga...

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Peço desculpa de usar uma expressão "idiomática" alfacinha... "Pôr o Rossio na Betesga"... Os "tripeiros" não têm que a saber... Mas o "robô" da Google Gemini IA que não é "alfacinha" nem "tripeiro". logo responsivo, claro, conciso e preciso:

A expressão "pôr o Rossio na Betesga" é uma expressão idiomática portuguesa que significa realizar algo impossível ou tentar colocar algo grande num espaço muito pequeno.

(...) "A origem da expressão remonta à cidade de Lisboa, onde o Rossio é uma praça ampla e a Rua da Betesga é uma rua muito estreita. A impossibilidade de colocar a praça do Rossio na Rua da Betesga é óbvia, o que torna a expressão uma metáfora perfeita para descrever uma tarefa impossível." (...)

O mesmo se passa com a divertida expressão tripeira: "Mais vale uma rua do Porto qu'a Gaia toda"... Reflete muitio do orgulho que a gente da Invicta sente pela sua nobre e bela cidade...

Anónimo disse...

E já esperava isto, foi uma provocação minha, não a ti, mas a essa malta que faz tudo em Lisboa.
A maioria dos chamados Lisboetas, ou ardinas, são de origem do Porto, tripeiros como eu, e Norte, mas que se mudaram para a capital porque é chique e há mais probabilidades de ter um bom tacho, Isto para não falar noutras vidas mais obscenas
O essencial está visto, deixei o meu repto para quem quiser contrariar esta verdade.
Eu nem posso falar muito, pois os meus netos foram para Lisboa estudar e, agora em Milão a completar. Os pais também dizem que há outras oportunidades.
O tempo dirá, oxalá assim seja, só mão queria ver os nomes deles e da familia, por aí nesta INcomunicação social INverdadeira.
Já li muita coisa d Poste mas tenho de ler tudo, é interessante, mas não me interessa muito.
Sou verdadeiro, não vale aqui aldrabar os outros só para ser simpático e CULTO.
Não fala nada da Guiné que é uma coisa esquecida, não tinha minerais raros...
Um abraço e saude da boa (Valdemar, sic)

VT.


Antº Rosinha disse...

"Desconstruir o colonialismo", para quem visite a exposição sem ter passado por África, este termo não seria desconstruir, antes Reconstruir...ai como era no antes!.

Mas do que gostei de rever é aquela foto de um "Negro português acaba de assinar o contrato para servir nas minas do Rand".

Talvez muita gente deste blog, (24 meses na guiné), e o resto na metrópole, não saberá que as minas da África do Sul absorviam e absorvem ainda hoje, 2025, milhões de operários mineiros oriundos de todos os paises em redor, se bem que hoje como emigrantes desordenados, isto é, não contratados e sabemos como será lá comparando com o que se passa cá, com emigrantes e o que muitos passam.

Aquela foto do contratado, devidamente calçado com botas, de calção talvez caqui, e de casaco e um chapéu na mão, aquilo é uma um contratado das minas sim, das maiores minas de ouro mundiais, Joanesburgo, mas já no fim do contrato e regressado, e não acabado de assinar o contrato, como diz na descrição.

Nunca estive em Moçambique, mas muitos angolanos do sul de Angola iam por iniciativa própria para Joanesburgo e regressavam à terra com aquela farda e botas e chapéu todos vaidosos para junto da familia que continuavam descalços e de tanga.

Aquilo era um uniforme de passeio dos mineiros que trabalhavam para os boers.

Mas como a foto é do álbum de Fragoso Oscar Carmona...Será que estou a Reconstruir mal?

Mas aquele ouro de Joanesburgo veio muito através desses contratados moçambicanos para os cofres do nosso império.

Era assim, não sei se era obra da diplomacia do Estado Novo, ou anterior, mas sabia-se que os salários devidos, uma parte era paga em ouro vivo ao governo e convertido em escudos para a família do contratado no regresso deste.

Enquanto os outros contratavam milhões de africanos para explorar ouro e diamantes, atravez de enormes empresários, nós nem empresários tinhamos que o Salazar não gostava deles.

Mas não era por isso que nós não tinhamos e cada vez temos menos empresários,

Eramos uns exploradores agrícolas e pouco mais, alguma pesca, até os estudantes do império se queixavam, (antes de 1961) que lhe entregássemos aquilo que eles faziam melhor.

Enfim, deixamos as colónias quase intactas, ninguem pode ter muita razão de queixa.

E quando se houve por exemplo que algum baiano de São Salvador que foi a África à procura das raizes, e não encontra, que se queixe dos brasileiros que não faziam registo dos "passageiros" que embarcavam em Luanda e desembarcavam lá.

Cumprimentos





Fernando Ribeiro disse...

A propósito dos trabalhadores moçambicanos nas minas de ouro da África do Sul, quero chamar a atenção para um poema de Noémia de Sousa, que foi uma das vozes mais importantes da poesia de Moçambique. O poema chama-se "Magaíça" e pode ser lido aqui:

https://abemdanacao.blogs.sapo.pt/magaica-1388774