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quarta-feira, 22 de março de 2017

Guiné 61/74 - P17168: O nosso blogue como fonte de informação e conhecimento (41): Pedido de ajuda para tese de doutoramento sobre "o papel dos negros que combateram nas tropas especiais" (Sofia da Palma Rodrigues)

1. Mensagem da nossa leitora Sofia Rodrigues, doutorando pela Universidade de Coimbra:

Data: 4 de março de 2017 às 11:47
Assunto: Ajuda para tese de doutoramento

Caro Luís Graça,

Estou neste momento a começar a pesquisa para o meu trabalho de doutoramento. A minha tese analisará o papel dos negros que combateram nas Tropas Especiais portuguesas na Guiné-Bissau.

Estarei de partida, por um ano, para a Guiné em Outubro. Antes, gostaria de fazer uma recolha o mais exaustivas possível da bibliografia e documentação existente.

Queria pedir-lhe se me pode ajudar com referências bibliográficas de que se recorde,  escritas sobre este tema. Conheço o seu blogue e já lá encontrei algumas preciosidades. Mas nunca é demais perguntar.

Muito obrigada e fico a aguardar uma resposta da sua parte.
Sofia da Palma Rodrigues

www.sofiadapalmarodrigues.wordpress.com

Telef +351 96 862 08 10


Luís Graça
2. Comentário de LG:

Sofia, obrigado pelo seu contacto. Vou estar fora do país até ao princípio de abril próximo, mas não quis deixar de publicar a sua mensagem, na esperança de que alguns dos meus/nossos camaradas, que lidaram com soldados guineenses, a possam ajudar, com bibliografia e sobretudo com documentação, escrita ou oral.

A Sofia vai ter que esclarecer, com mais precisão, o que entende "por tropas especiais portuguesas":  refere-se apenas aos paraquedistas, fuzileiros e comandos ? Se sim, ficam de fora, as milícias, os pelotões de caçadores nativos, as companhias de caçadores formadas por soldados do recrutamento local (como era a minha, a CCAÇ 12 e outras que formavam a "nova força africana"...), os pelotões de artilharia, etc. Fica de fora o "grupo especial" do Marcelino da Mata, ficam de fora muitos milhares de guineenses que colaboraram com as nossas tropas durante a guerra coloniial na antiga Guíné portuguesa...

Por outro lado, convém termos critérios claros de inclusão / exclusivão em relação aos "negros" que estavam nas nossas fileiras: são só guineenses ? são também os cabo-verdianos ? são também  alguns guineenses de origem sírio-libanesa ?

Deixo aqui os seus contactos, que podem ser úteis para receber eventualmente respostas ao seu pedido.  Mande um email ao nosso coeditor Carlos Vinhal a esclarecer a questão de lhe pus... Pode igualmente deixar aqui a sua resposta na  caixa de comentários.

Também era bom podermos saber um pouco mais sobre si,  a sua motivação para estudar este tema, a universidade por onde vai fazer o doutoramento, os seus orientadores e equipa tutorial, os contactos que eventualmente precisa na Guiné-Bissau, etc. Se não erro, vive em  Lisboa, está ligada ao Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra e tem-se interessado por  questões como cidadania global e pós-colonialismo nos países lusófonos, segundo informação da sua página no Facebook. Além disso, pelo que pesquisámos na Net, a Sofia adora histórias/estórias e tem uma paixão pela Guiné e as suas gentes,

Vamos, concerteza, poder ajudá-la, para além da informação e conhecimento que já adquiriu da leitura do nosso blogue, como de resto temos ajudado outros investigadores, nacionais e estrangeiros. Esteja à vontade para nos contactar. Boa sorte para o seu projeto académico.
_____________

Nota do editor:

Último poste da série > 13 de fevereiro de 2017 > Guiné 61/74 - P17045: O nosso blogue como fonte de informação e conhecimento (40): O jornalismo e a guerra colonial: contactos precisam-se de pessoas (civis ou militares) que tenham trabalhado na imprensa da Guiné portuguesa: O Arauro, Notícias da Guiné, Voz da Guiné... (Sílvia Torres, ex-oficial da FAP, doutoranda)

sábado, 27 de fevereiro de 2010

Guiné 63/74 - P5902: FAP (48): A guerra Páras-Fuzos, vista por um fuzileiro (Rui Ferrão)

1. Comentários ao poste P5580 (*), feitos em 7, 8 e 10 do corrente, pelo nosso leitor Rui Ferrão, que depreendemos ter estado na Marinha, possivelmente, num Destacamento de Fuzileiros Especiais (DFE), entre 1967 e 1969, sendo portanto contemporâneo dos tristes acontecimentos de Bissau, em 3 de Junho de 1968:




(i) Queria fazer um pequeno reparo àquilo que foi dito em relação aos confrontos entre Páras-Fuzos. Os Fuzos não emboscaram os Páras como aqui é referido no texto do sr. coronel Mira Vaz e noutros que já li.

O que aconteceu foi que o oficial de dia ao quartel Fuzo, nesse mesmo dia, já sobre a madrugada, mandou sair a ronda para verificar se as coisas já estavam mais calmas. A dita ronda ao passar junto aos edíficios em obras teria ouvido uma voz gritar Estes lerpam já todos!, e vai daí um dos elementos da ronda dirige a arma para aquela zona e dispara para o escuro, não se apercebendo de qualquer vulto... Só depois se aperceberam do lamentável acidente.

A outra morte teria sido horas antes à porta do Estádio, também em circunstâncias identicas; há um Fuzo que, ao descer do jipe da ronda, cai e deixa cair a arma, entretanto está ali por perto um Pára e pega na arma, o cabo da ronda naquela confusão (só quem lá estava é que consegue avaliar) vê o individuo com a arma nas mãos, não sei o que lhe passou pela cabeça e atirou segundo informações, para o chão, só que o tiro ressaltou e foi atingir o Pára.

Eu estava lá no início do confronto, mas depois encontrei um filho da minha terra, olhámos um para o outro e interrogámo-nos:
- O que é que nós estamos aqui a fazer? - e saímos para fora.

Foi assim que os acontecimentos me foram relatados por companheiros Fuzos, visto naquela altura estar já na companhia do filho da terra a beber uma cerveja com mais alguns Páras. Estou de acordo que houve negligência dos superiores dos dois lados, julgo que teriam evitado a morte destes dois jovens,camaradas de armas.

Também não estou a ver os Fuzos a montar uma emboscada daquela maneira tão cruel com já foi escrito nalguns locais do blogue. Como disse, essa parte não falo por aquilo que me contaram, logo após os acontecimentos. Foi lamentável e vergonhoso para as nossas tropas.

Um abraço. Sou Rui Ferrão


(ii) Ainda os confrontos entre Pára-Fuzos. Alguém comentou algures no blogue que, havia uma grande rivalidade entre Páras-Fuzos, mas não é verdade. Enquanto eu estive na Guiné (1967-69), para além dos acontecimentos que todos conhecemos, sanados que eles foram, voltou tudo á normalidade, embora tivesse havido um período em que não havia qualquer convívio entre eles, mas depois tudo voltou ao normal como já tinha citado.

Quem passou pela Guiné e teve a oportunidade de privar com a malta da Marinha, estou convicto de que deles tem uma boa impressão. Senão vejamos: Quem nunca foi a bordo de uma lancha, ou de um navio, ou do quartel Fuzo comer um ou dois jantaritos desenrascado por um filho da terra Fuzo?

Eu próprio dispensei a minha cama por diversas vezes a camaradas Páras. Caldeiradas de cabritos "comprados" aos nativos pelos Fuzos e caldeirados e comidos (no quartel Fuzo) entre Pára-Fuzos, isto tudo depois dos confrontos, será isto será rivalidade?

O pessoal da Marinha nunca teve rivalidades com ninguém, inclusive, aconteceu por vezes safar militares do exército com problemas com a PM.

Um abraço, cordialmente sou Rui Ferrão. Voltarei ao assunto.


(iii) Voltando ainda ao incidente Páras-Fusos, quereria dizer ainda o seguinte: O acontecimento criou grande consternação no seio Fuso, nas horas que se sucederam todos se interrogavam:
- Como é que foi possível acontecer uma tragédia desta dimensão?

Todos nós lamentamos. Avançamos: um certo dia andando com alguns colegas Fuzos a passear em Bissau na zona do Pilão já depois da meia noite,(era perigoso andar naquela zona aquela hora da noite) encontrámos um grupo de Páras já com uns copos a mais, onde vinha um com um golpe profundo na cabeça e a sangrar bastante, não sei o que se tinha passado, sei apenas que estava a precisar de ajuda, pedimos aos militares da PM que o levassem ao Hospital, responderam que o jipe não era nenhuma ambulância, entretanto passa a ronda dos Fuzos, apercebendo-se da situação pegaram no ferido e nos restantes camaradas e levaram-nos a Bissalanca, visto que aquela hora já não tinham transporte para lá e ainda eram cerca de 12 Km.

Como estão a ver, meus amigos, não havia rivalidade entre estas duas Forças. Sobre a quantidade de companhias e destacamentos a prestar serviço na Guiné, citadas pelo camarada Jorge Santos, também não está correcta a quantidade nem os seus números. Havia apenas duas companhias e quatro destacamentos.

Um abraço Rui Ferrão

2. Comentário de L.G.:

Obrigado ao Rui pelos esclarecimentos. Fica convidado a ingressar na nossa Tabanca Grande. A representação da Marinha continua a ser escassa. Para não falar dos fuzileiros (**).

_____________

Notas de L.G.:

(*) 2 de Janeiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5580: FAP (44): A verdade sobre os incidentes, em Bissau, em 3 de Junho de 1967, entre páras e fuzos... (Nuno Vaz Mira, BCP 12)

(**) Encontrei, na preciosa página do nosso camarada Jorge Santos,  a indicação de uma Associação de Fuzileiros:

Rua Miguel Paes, nº 25 - 2830-356 Barreiro
Tel.: +351 212 060 079 / Fax : +351 210 884 752
Email: afuzileiros@netvisao.pt

quinta-feira, 10 de abril de 2008

Guiné 63/74 - P2742: Blogoterapia (46): Promessa de comando: vou retomar as minhas crónicas de guerra (Amílcar Mendes, 38ª CCmds)

Guiné > Zona Leste > COP7 > Margem esquerda do Rio Corubal > Gampará > 38ª Companhia de Comandos > Agosto / Dezembro de 1972 > O Comando Amílcar Mendes, cujo último relato foi o de uma operação helitransportada, no dia 13 de Setembro de 1972 (nome de código: Acção Águia Errante), na região de Lagoa de Bionrá, e em que participaram 3 Gr Comb da 38ª CCmds.

Foto: © Amilcar Mendes (2007). Direitos reservados.

1. Mensagem do Amílcar Mendes, taxi driver na praça de Lisboa, ex-1º Cabo Comando, 38ª CCmds (Guiné, 1972/74):

Assunto - As minhas crónicas de guerra

Amigo Luis Graça e camaradas da tertúlia, reconheço que estou em falta com aquilo que te prometi (1). Interrompi as minhas crónicas por vontade própria e porque aquilo que ia transmitindo foram notas tomadas durante situações de stress, algumas delas memorizadas debaixo de fogo, e em que o pensamento na altura pertencia a um jovem e arrogante gerreiro que inchava de vaidade, quando a intervalos das operações descia a cidade da Bissau e se pavoneava de orgulho, exibindo para a plateia o seu camufulado - para que saibas, eramos a única tropa autorizada a fazê-lo na cidade -, o lenço preto e a boina com fitas pretas.

Eramos já nesse tempo admirado por uns e odiado por outros. Nunca compreendi o olhar de desprezo com que alguns camaradas nos brindavam, [em Bissau]. E porquê? A maioria dos soldados que frequentavam a 5ª Rep (Café Bento), Pelicano, Zé da Amura, Ronda, Império, etc... eram militares em trânsito para regressar ao mato e que de alguma forma já tinham colado a orelha ao chão connosco em alguma picada, trilho ou destacamento. Podíamos até nem comungar dos mesmos ideais mas no perigo eramos gémeos.

Só muito mais tarde e com as mudanças da sociedade a nível político consegui decifrar o significado dos olhares que me eram dirigidos no tempo de guerra e em época posterior, já então no Regimento de Comandos da Amadora. Percebi que esses olhares vinham de algums camaradas mais esclarecidos(ou manipulados) em política e em que para eles tropas especiais era o que havia de mais desprezível no teatro de guerra. Assassinos. Comedores de criancinhas, frios e calculistas, sem ponta de emoção. Já na Amadora e com a liberdade esses ódios declararam-se e fui cuspido e chamado frontalmente de assassino.

Vem isto a propósito de quê? Quando comecei a escrever no Blogue, comecaram logo a aparecer ums vozes críticas que eu fui ignorando, direi mais, desprezando, porque realmente já 'tou farto de guerrilheiros do arame farpado e chegou ao ponto de haver aqui quem insinuasse que nós, os COMANDOS, só eramos valentes em grupo, o que quer dizer que isolado sou um cobarde.

Nunca, amigo Luis Graça, isso me imcomodou, até ao dia em que as mensagems aónimas começaram a chegar. Aí parei.Mas não foi por medo. Foi por achar que tais pessoas (?) não mereciam partilhar daquilo que me é muito íntimo. O que me pode afectar são acontecimentos e não pessoas. Sou um cota simpático, tentando alegrar os dias que vão passando e em que muita coisa já me passa ao lado e não percebo como ainda existe gente que, decorridas quase quatro décadas, ainda vive ressentida por aquilo que outros fizeram já tão longe.

Bem, amigo Luis, longe já vai este mail e o que te queria dizer é que te vou cumprir o que prometi e vou-te mandar mais apontamentos do meu diário de guerra e isso porque, se há quem não goste, há muito mais quem goste.

AMILCAR MENDES
1º Cabo Comando
38ª Companhia de Comandos (Guiné, 1972/74)
AUDACES FORTUNA JUVATE
[em latim, A Sorte Protege os Audazes]

2. Comentário de L.G.:

Camarada e amigo Amílcar:

Como já te oportunidade de te dizer (e agira passo a partillhar com o o resto dos camaradas e amigos da nossa Tabanca Grande), fico feliz pela tua decisão, sensata e generosa.

Abertamente, no nosso blogue, nunca ninguém te tratou mal... Que eu saiba, ou que me lembre, pelo menos... De qualquer modo, a malta foi aprendendo, nestes últimos 3 anos, a conviver uns com os outros e a respeitar-se, como camaradas, independentemente da arma a que cada um pertencia, do ano em que foi mobilizado, do sítio onde esteve, das ideias e valores que defendia (ou defende), etc. São mais as coisas que nos unem do que as que nos separam... O hífen, o traço de união tem sido a nossa terra, a nossa pátria, Portugal, e a Guiné, país-irmão, a que nos ligam, para além da história e da língua, afectos, emoções, memórias, vivências, amizades...

Por outro lado, e como sabes, é regra de outro, entre nós, não fazer juizos de valor sobre o comportamento militar de cada de um nós enquanto esteve no TO da Guiné... Não somos juízes e muito menos carrascos de ninguém. Agora, já não posso impedir que te mandem, cobardemente, emails anónimos... A única hipótese é ocultar (ou não divulgar mais) o teu endereço de correio electrónico... Mas não adianta. Tu não tens que ter vergonha do que escreves, pelo contrário: fostes um homem e um português do teu/nosso tempo, e que te portaste à altura, e queres dar testemunha disso... aos teus camaradas, aos teus amigos, aos teus filhos e netos, aos teus concidadãos, às gerações do futuro... Ninguém te pode roubar esse direito de contar a tua história de vida... Quem sabe até se não poderás (ou não poderemos), um dia, reunir em livro os teus escritos...

Que fique bem claro: tu e os teus camaradas, comandos, serão sempre bem vindos. Este blogue é teu, é nosso... Não fazemos distinção entre tropas especiais e tropa-macaca, a não a ser às vezes na brincadeira... Também nunca puxa dos galões, nem se rama em herói... E tu já deste mais contributos para este trabalho (colectivo) de preservação, defesa e divulgação da nossa memória de guerra, da memória da nossa geração, do que a grande maioria dos que estão cá estão inscritos, como tu, na tertúlia...

Vá, manda-me os teus textos, as tuas notas (e, se possível fotos), que tens pelo menos em mim um leitor interessado e fiel... Não te esqueças que ficaste em Gampará, f... e esfomeado, lá para o mês de Setembro ou Outubro de 1972... Aqui tens os teus dois últimos postes... Podes clicar e ver o conteúdo (2)...

Vá, recebe um Alfa Bravo do tamanho do Corubal, onde há dias estive, no Saltinho, e entre o Saltinho e o Xitole, na margem direita, em Cusselinta...

Luís Graça
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Notas de L.G.:

(1) Vd. poste de 4 de Abril de 2008 > Guiné 63/74 - P2719: Guidaje, Maio de 1973: Só na bolanha de Cufeu, contámos 15 cadáveres de camaradas nossos (Amílcar Mendes)

(2) Vd. postes de:

7 de Julho de 2007 > Guiné 63/74 - P1930: Diários de um Comando: Gampará (Ago-Dez 1972) (A. Mendes) (1): Um sítio desolador

16 de Julho de 2007 > Guiné 63/74 - P1956: Diários de um Comando: Gampará (Ago-Dez 1972) (A. Mendes) (2): Passa-se fome, muita fome