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sexta-feira, 3 de outubro de 2025

Guiné 61/74 - P27283: Agenda cultural (904): Continuação da minha visita em 21 de setembro à exposição “Venham mais cinco, o olhar estrangeiro sobre a revolução portuguesa, 1974-1975”. Para ver até 23 de Novembro de 2025, no Parque Tecnológico da Mutela, Almada (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá, Finete e Bambadinca, 1968/70), com data de 23 de Setembro de 2025:

Queridos amigos,
"Venham mais Cinco, O Olhar Estrangeiro Sobre a Revolução Portuguesa, 1974-1975", é uma exposição soberba como auxiliar da História, por nos trazer à memória eventos que acompanhámos na época, mais não seja pelos órgãos de comunicação social. Como se escreve na folha de sala, "De um dia para o outro aterraram em Lisboa fotógrafos das maiores agências internacionais, jovens e veteranos, que captaram imagens por todo o país, acompanhando a sucessão vertiginosa dos acontecimentos. Muitos vieram em missões de curta duração, outros instalaram-se vários meses para perceber e retratar o que se passava. Quase tudo era surpreendente para os estrangeiros: a situação política inédita num país europeu, o quotidiano dos portugueses, a forma como a política entrava na vida da população. Eram fotógrafos experientes. Tinham um olhar incisivo, procuravam imagens para as capas de revistas de maior tiragem, mas também revelavam empatia, encantamento e genuíno interesse antropológico. Durante cerca de um ano e meio fotografaram tudo e transmitiram ao mundo esse novo conceito: a revolução dos cravos. Após 50 anos, alguns arquivos desapareceram. Assim, em casos excecionais, quando não houve acesso a negativos nem a provas de papel, decidiu-se reproduzir fotografias publicadas em livros. À data de hoje é a única forma de partilhar imagens únicas, de um período decisivo da história e que nunca estiveram reunidas em Portugal."

Um abraço do
Mário



Continuação da minha visita em 21 de setembro à exposição “Venham mais cinco, o olhar estrangeiro sobre a revolução portuguesa, 1974-1975”.

Exposição de visita obrigatória, ajusta-se à Educação para a Cidadania, oxalá que percorra o País todo

Mário Beja Santos

A exposição decorre no Parque Tecnológico da Mutela, em frente das ruínas da Lisnave, pode ser vista até 23 de novembro. Porquê Venham mais cinco? É o título de uma canção de José Afonso, inicialmente escolhida para ser tocada na Rádio Renascença na madrugada de 25 de abril de 1974, como senha do início do golpe militar. Mas, como esta canção estava proibida na rádio, a senha acabou por ser substituída por Grândola, Vila Morena. Através deste título, os organizadores prestam homenagem a José Afonso.

Na folha de sala o curador da exposição, Sérgio Tréfaut, recorda in memoriam Margarida Medeiros, pelo seu papel essencial neste levantamento único de imagens:
“Venham mais cinco foi uma ideia que surgiu no verão de 1993, quando Margarida Medeiros e Ana Soromenho propuseram que se fizesse uma grande exposição com as imagens dos fotógrafos estrangeiros que haviam retratado o processo revolucionário português. No ano seguinte seria comemorado o vigésimo aniversário do 25 de abril. Margarida e eu rumámos a Paris e mergulhámos nos arquivos das grandes agências internacionais, vasculhando milhares de provas de contacto.
Três décadas depois, a expedição abre as suas portas. Entre o início da nossa pesquisa, no outono de 1993, em Paris, e o seu recente desaparecimento, Margarida Medeiros tinha-se transformado numa das maiores especialistas de fotografia em Portugal, autora de livros de referência, curadora de exposições e responsável pela formação de várias gerações de estudantes. Esta exposição nasceu da nossa amizade.”


Na primeira visita pus o foco nos acontecimentos ligados ao 25 de abril e às primeiras transformações sociopolíticas e económicas ocorridas no país. Senti, no entanto, que ainda havia algumas imagens a captar, seguindo depois para os acontecimentos da Reforma Agrária, as eleições do 25 de abril, as independências e o retorno de muitos, e, finalmente, o 25 de novembro, com este evento diminuiu drasticamente o interesse do olhar estrangeiro sobre a Revolução portuguesa. Vamos, pois, a este punhado de imagens que tenho o maior prazer em partilhar convosco.

Começa-se pelas secções A Festa da Liberdade e Novas Formas de Poder
Henri Bureau, Getty Images, 1º de maio 1974, Lisboa
Guy Le Querrec, Magnum Photos, julho 1974, Lisboa
Guy Le Querrec, Magnum Photos, maio 1975, Beira Alta. Campanhas de Dinamização Cultural, Veterinários do MFA vacinam suínos

Imagens representativas da Reforma Agrária e as mudanças no Alentejo:
Vojta Dukát, 1975, Aljustrel
Sebastião Salgado, 1975, Aljustrel. Trabalhadores na sede do PCP
Sebastião Salgado, julho de 1975, Alentejo. Conversas entre trabalhadores agrícolas
Sebastião Salgado, outubro 1975, Alcácer do Sal. Ocupação de um latifúndio por trabalhadores agrícolas
Guy Le Querrec, Magnum Photos, 25 de abril 1975, Baleizão. Primeiras eleições livres para a Assembleia Constituinte
Jean-Paul Paireault, 1975, Beja. Comício do PCP, Álvaro Cunhal, secretário-geral do partido, ao centro

Imagens das independências:
Jean-Claude Francolon, setembro 1974, perto de Tete, Moçambique. Imagem da reconciliação tirada a pedido do fotógrafo
Sebastião Salgado, dezembro 1975, Angola. Hospital recebe soldados feridos da Frente Nacional para a Libertação de Angola (FNLA) e civis atingidos durante a fuga
Alain Mingam, Getty Images, 11 de novembro de 1975, Luanda. Crianças-soldado durante um desfile no dia da independência
Alécio de Andrade, ADAGP, Verão de 1974, porto de Lisboa. Retornados chegam da Guiné-Bissau
Alain Keler, Agence Myop, setembro de 1975, Padrão dos Descobrimentos, Belém. Caixotes dos retornados
Sebastião Salgado, 1974, Fátima. Antigo combatente vem agradecer à Virgem Maria

Imagens de um país dividido:
Alain Mingam, Sipa Press, 12 de novembro de 1975, Lisboa. Deputados passam a noite no Palácio de São Bento, cercado pelos manifestantes
Sebastião Salgado, 7 de julho de 1975, Rio Maior. Primeiro grande ataque às sedes do PCP

Imagem do 25 de novembro:
Alain Mingam, Getty Images, 26 de novembro de 1975, Tancos. Paraquedistas rendem-se às forças vitoriosas

(Fotos editadas por CV)
_____________

Notas do editor:

Vd. post de 26 de setembro de 2025 > Guiné 61/74 - P27258: Agenda cultural (902): "Venham Mais Cinco", o olhar estrangeiro sobre a revolução portuguesa, 1974-1975, exposição fotográfica para ver até 23 de Novembro de 2025, no Parque Tecnológico da Mutela, Almada (Mário Beja Santos)

Último post da série de 30 de setembro de 2025 > Guiné 61/74 - P27270: Agenda cultural (903): Convite para a Conferência Círculo do Mar - "Dar Voz Às Guarnições" - Ultramar 1961-1974, dia 16 de Outubro de 2025, pelas 17 horas, a ter lugar na Sociedade Histórica da Independência de Portugal, Palácio da Independência, Largo de São Domingos, Lisboa (José Maria Monteiro, ex-Marinheiro Radiotelegrafista)

terça-feira, 16 de setembro de 2025

Guiné 61/74 - P27222: Felizmente ainda há verão em 2025 (34): Mata-mouros e outros apelidos e alcunhas, raros, exóticos, pícaros, brejeiros, etc. - Parte I




"Santiago, foi um dos quatro primeiros apóstolos que seguiram Jesus e seu primeiro mártir, foi mandado degolar pelo rei Herodes. Os seus restos mortais foram levados para a região galega de Compostela, tendo aí nascido o maior centro de peregrinação da Europa cristã, Santiago de Compostela. A imagem existente na igreja Matriz de Castelo Rodrigo representa um guerreiro a cavalo lutando com um mouro já dominado e debaixo das patas do cavalo, normalmente designado de Santiago “Matamouros”.

Fonte: Adapt de: Aldeias Históricas de Portugal > Santiago, Mata Mouros, Castelo Rodrigo | Infografia: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2025)


1. O termo ficou no léxico da língua portuguesa: "mata-mouros" (nome masculino, de dois números) é o "indivíduo que exagera os seus feitos e valentias", sinónimo de fanfarrão, ferrabrás, valentão...

E ficou também na toponímia e na antroponímia: referências históricas apontam para a existência de indivíduos com este apelido, como "Fernão Domingues Mata Mouros" e "Alberto Mata Mouros de Resende da Costa", sugerindo que, embora raro, o apelido tem raízes antigas nosso território. 

Há também relatos anedóticos da presença de famílias com este apelido na região do Algarve, uma zona de forte influência muçulmana e palco de inúmeros confrontos durante a "Reconquista".

A toponímia portuguesa também conserva a memória destes tempos, com exemplos como a "Quinta de Mata Mouros" em Silves, no Algarve, um local histórico que hoje alberga uma adega. Em Espanha, na Extremadura, Badajoz, há o município Valle de Matamoros.; e haverá maisde 3,3 mil indivíduos, com este apelido, de acordo com a Geneanet ,

Rara ou incomum, a expressão  chegou todavia aos nossos dias como apelido de família (ou sobrenome), erm Portugal. A origem deve ter sido por alcunha, e não por via patronímica (nome do pai), toponímica (nome do lugar de nascimento) ou outra.

 Encontrámos, na Net, pelo menos duas figuras públicas portuguesas com este apelido:
  • um senhor, Ministro da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas no XV Governo Constitucional (entre 2002 e 2005);
  • uma senhora, antiga  juiza conselheira  do Tribunal Constitucional, há uns atrás.
 
Fomos também encontrar na Guiné um Luís Mata-Mouros Resende Costa, colono, branco, 36 anos de idade, natural de Bissau, ligado ao comerciante Benjamin Correia em meados dos anos 50. 

O apelido "Mata-mouros", carregado de conotações históricas da "Reconquista Ibérica", revela-se de rara presença em Portugal e é praticamente inexistente nos restantes países lusófonos.  

(i) Origem e significado histórico

O termo "Mata-mouros" é uma alusão direta às batalhas travadas durante a chamada Reconquista Cristã da Península Ibérica, que se estendeu por séculos (séc. VIII- séc. XV), acabando com a conquista do reino de Granada, o último reino mouro, em 1492 (o ano da descoberta do "Novo Mundo").

A expressão  significa literalmente"aquele que mata mouros". Era frequentemente usada como epíteto,  alcunha ou cognome, atribuído a guerreiros que se destacavam pela sua bravura nos confrontos com os muçulmanos do Al-Andalus.

Esta designação está intrinsecamente ligada à figura de Santiago Maior, o apóstolo padroeiro de Espanha e de Portugal, frequentemente representado na sua faceta de "Santiago Matamoros" (ou "Mata-mouros"). 

A iconografia do santo a cavalo, brandindo uma espada sobre mouros caídos (vd. imagem acima), tornou-se um símbolo poderoso da cruzada cristã e inspirou a toponímia e, nalguns casos, a antroponímia.

Em Portugal, a palavra "mata-mouros" adquiriu também um significado figurado: por exemplo, o Dicionário Priberam  define-o como  o indivíduo fanfarrão, ferrabrás ou valentão, uma derivação curiosa que reflete a transformação de um epíteto de guerra numa expressão popular.

(ii) Presença em Portugal: um apelido raro mas notável

Apesar da sua forte carga histórica, o apelido "Mata-mouros" é pouco comum em Portugal. A sua raridade é atestada pela dificuldade em encontrar famílias com este nome em listas telefónicas e a ausência de referências em  bases de dados genealógicas.

A pesquisa da IA em bases de dados e registos "online" do Brasil, Angola, Moçambique e outros países de língua portuguesa também não revelou  a presença do apelido "Mata-mouros".  

A ausência do apelido "Mata-mouros" nos PALOP e no Brasil pode ser explicada pela sua origem muito específica e ligada a um contexto histórico-geográfico que não se transportou da mesma forma durante o período da colonização. As peregrinações a Santiago entraram em decadência acelerada já em meados do séc. XIV (com a "peste negra", a crise demográfica, as guerras, etc.). A formação da sociedade brasileira,  colonial e escravocrata, em contrapartida, vai dar-se num contexto diferente, com outras influências e dinâmicas na atribuição de apelidos.

Em suma, o apelido "Mata-mouros" é uma herança direta da chamada Reconquista em Portugal, um testemunho onomástico de um passado de conflitos e da construção de uma identidade nacional. A sua raridade contrasta com a força da sua simbologia. 


2. Felizmente ainda é verão, apesar da "rentrée" para muitos (a escola, o trabalho, as vindimas, as consultas médicas, etc.). Nós, entretanto, vamos continuando por Candoz por mais uma semana. (*)... 

E vamos blogando...Existem ainda outros apelidos portugueses igualmente raros, exóticos ou de origem curiosa que refletem episódios históricos, lendas, factos anedóticos,  toponímias ou devoções religiosas pouco comuns.


(i) Devoção religiosa e santoral:

 apelidos como "dos Anjos", "das Dores", "do Rosário", "de São João", "dos "Santos",  "de Todos os Santos", “da Anunciação” ou até... "Cara d'Anjo"!... eram usados como complemento de nome, especialmente por mulheres, religiosos ou conversos para evidenciar devoção, refúgio ou proteção sobrenatural; as nossas "Marias" têm quase todas um santo ou uma santa por detrás do nome: a minha mãe era "Maria da Graça",  uma das minhas irmãs "Maria do Rosário", há muitas "Marias de Fátima", etc. 

(ii) Toponímicos exóticos

alguns apelidos derivam de lugares muito pequenos, aldeias desaparecidas ou microtopónimos pouco conhecidos (exemplos:  “Xabregas”, “Alcaçovas”, “Mosteiro”, "Matacões',  ou “Miragaia”, usados para indicar origem rural ou urbana invulgar).

(iii) Apelidos-epíteto ou de alcunha

da Idade Média, herdaram-se apelidos derivados de alcunhas descritivas, físicas ou até jocosas, como “Espadana”, “Buzina”, “Melro”, “Passarinho”, “Queimado”, “Valente”, “Foge”, “Parvo”, “Quebra-Costas”, “Caçador”; ou outros e outras, talvez de origem mais recente,"Mata-frades", "Piça", Minorca", "Caga-tacos", "Meia-Leca", "Mata-pintos", "Fala-baixo", etc.

(iv) Apelidos de conotação guerreira ou étnica

além de "Mata-mouros", encontram-se registos raros como “Mata-cães” (às vezes associado a confrontos com populações mouriscas), “Mouro”, “Mourão”, “Mourisco”, "Judeu", "Mulato", "Cigana", "Preto",  “Cristão Novo” (para os convertidos), e ocasionalmente “Castelhano”, "Galego, "Alemão", "Francês "ou  “Inglês” para estrangeiros integrados.

(v) Hagiotoponímicos raros:

 existem apelidos tirados de santos ou mártires pouco comuns localmente, como “Santa Bárbara”, “Santo Amaro”, “Santo Tirso”, "Espírito Santo", ou ainda, por justaposição, “Santidade”.

Muitos destes apelidos começaram como alcunhas, marcas de devoção, ou indicações de origem, e só mais tarde se fixaram como sobrenomes de família. Os contextos de nomeação variavam amplamente, desde motivos de sobrevivência (mouros,  judeus, escravos africanos que foram obrigados a converter-se e adotar nomes cristãos), percursos de peregrinação (“Santiago”, “Compostela”, “Peregrino"), até sátira, história pessoal ou identificação local, a alcunha ("apelido", em português do Brasil) funcionando como uma verdadeira "etiqueta" que não precisa(va) de ser colada á testa.

Em resumo, "Mata-mouros" junta-se assim a lista de apelidos históricos insólitos em Portugal, muitos deles provenientes de episódios da "Reconquista", da escravatura, da perseguição aos mouros e aos judeus,  da cristianização forçada (1497), inquisição ou de eventos locais marcantes. 

3. Durante a guerra colonial na Guiné, era frequente usarmos alcunhas para melhor identificar,  "marcar" ou "etiquetar" os nossos camaradas: muita gente tinha alcunhas: 

  • desde os superiores hierárquicos (Caco Baldé,"Aponta, Bruno!,  Pimbas, Alma Negra, Gasparinho, Bagabaga, Major Elétrico, Coronel 11, Trotil...); 
  •  até aos milicianos e praças ("Tigre de Missirá", "Pato da Bolanha", "Mec-Mec", "Chico", Chicalhão", "Pastilhas", "Caga-tacos", "Meia-leca","Meia-foda",  "Mouraria", "Bolha d'Água", "Parte-punho", "Cara de Cu", "Quatrocentos", "Aguardente", "Tempo Embrulhado", etc., até ao "Se-te-vens" (corruptela do nome de uma marca de cigarros, por que era conhecida a esposa de um  camarada nosso), etc. ) (**); 
Temos vinte tal postes com referências a "alcunhas".

4. Também existem, no português europeu, apelidos e alcunhas de natureza pícara, brejeira, maliciosa, erótica ou até pornográfica, em Portugal, e  especialmente no Alentejo, onde o calão e o humor popular têm longa tradição. 

Estes apelidos são herança oral e, muitas vezes, só circulam localmente, sendo raros em documentação oficial, mas ainda estão vivos na memória coletiva (veja-se o  incontornável "Tratado das Alcunhas Alentejanas", 4ª ed., Colibri, 2002, da autoria de Francisco Martins Ramos e Carlos Alberto da Silva).

Francisco Martins Ramos (1943-2017) era antropólogo, natural da Amareleja. O Carlos Alberto da Silva é sociólogo da saúde e também antigo professor da Universidade de Évora.

Exemplos de Apelidos e Alcunhas Pícaras do Alentejo

  • Bicha/Galhofo/Maricas: termos que circulam como apelidos depreciativos devido à sexualidade ou maneiras.
  • Calhandro(a):  não tem conotação sexual, mas designa alguém "atiradiço", insinuação de promiscuidade ou pouca vergonha;
  • Galdéria: mulher de reputação duvidosa ou de vida sexual livre, às vezes usada como epíteto familiar;
  • Escalda: “Rapariga muito quente nos bailes”, apelido para mulher considerada fogosa ou promíscua;
  • Javardice/Javardo(a): usado para pessoas consideradas desleixadas ou de hábitos sexuais libertinos, pode ser alcunha direta;
  • .Joana dos Moços: mulher que teve vários filhos de diferentes pais — insinuação maliciosa sobre a sua vida íntima;
  • Lambança: conversa atrevida, mexericos de natureza sexual, também pode ser usada como apelido para quem gosta de "porcaria";
  • Langonha: sgnifica esperma (sémen), também usada em sentido jocoso;
  • Meia-Foda: muito comum, usada para designar pessoa de baiza estatura, mas também associada à situações ambíguas ou mal resolvidas em matéria sexual (igual a "meia-leca", na tropa);
  • Minete: calão direto para sexo oral (=cunilíngua),  ocasionalmente designando alguém atrevido;
  • Ó Punheta: usado como exclamação, mas também como alcunha para alguém dado à masturbação ou simplesmente irreverente (equilavente a "parte-punho", na Guiné, no calão da tropa);
  • Pai do Cu: alcunha dada a homens considerados sexualmente libertinos, mulherengos ou, segundo usos, alvo de pilhéria por algo relacionado com sexo anal ou escatologia; tornou-se célebre nas aldeias porque existiam mulheres que, sendo vítimas de violência doméstica, gritavam: “Valha-me o Pai do Cu!”.
  • Pandarilho/Pandelero/Panasca: são variantes antigas e regionais para homem afeminado ou homossexual, por vezes maliciosamente aplicadas ou sentido pejorativo;
  • Passarola: termo popular para órgãos genitais femininos (=vagina; "pito", no Norte), usado como alcunha, servindo de mote trocista ou para atribuir a alguém fama de devasso;
  • Pentelho/Pintelho: pèlo púbico,pormenor insignificante, pessoa irritante, aborrecida,importuna;
  • Pixa, Gaita, Pau, Piça, Picha d'aço: diversos calões penianos conferidos como alcunha a, por exemplo, jovens atrevidos, mulherengos ou simplesmente alvo de chacota;
  • Prenha: mulher grávida fora do casamento;
  • Tronga: mulher da vida/prostituta;
  • Zorra: prostituta ou mulher de reputação duvidosa; "filho de zorra": bastardo, filho natural, filho de padre (em Trás-os-Monres).

 

Complementarmente, consulte-se também o "Dicionário do Calão e Expressões Idiomáticas", de José João Almeida (Editora Guerra & Paz, 2019; vd também aqui, em Projeto Natura | Universidade do Minho).

Muitos destes termos da linguagem informal, da gíria ou do calão foram (e são usados ainda) como alcunhas entre amigos, conhecidos ou inimigos para marcar uma diferença, ironizar, satirizar hábitos de alguém ou, simplesmente, como herança do falar local, muitas vezes não se sabendo sequer qual a sua origem.

Existem casos de famílias que ficaram conhecidas na aldeia durante gerações por uma alcunha deste tipo, independentemente do apelido registado no cartório paroquial ou na conservatória do registo civil.

Em contextos mais fechados e tradicionais, alguns destes apelidos podem ser mais ou menos ofensivos, dependendo do contexto,  do tom ou da confiança entre os interlocutores. Nalguns casos, são "formas carinhosas de tratamento"; "ó meu Cara de Cu â Paisana!!... 

A presença, existência ou sobrevivência destes nomes evidenciam o lado irreverente, humorístico e, por vezes até, transgressor da cultura rural  alentejana, onde o dito popular, a sátira e a oralidade são ferramentas de convivência social e de criação identitária. (***)

Muitas destas alcunhas alentejanas com conotação sexual, pícara, erótica ou maliciosa fixaram-se oralmente e, por vezes, até integravam o quotidiano rural. 

De um modo geral, refletem o humor, o descaramento, a verve ou o olhar picante da cultura popular da região e estão extensamente documentadas por  sociólogos, etnógrafos e outros estudiosos dos usos e costumes, etc.
 
 Deve ainda acrescentar-se que muitas destas alcunhas surgem do contacto diário, de episódios de alcova ou de determinadas  condições sociais (do trabalho à infidelidade conjugal,  do lazer e das festas  à sexualidade).

A atribuição era (e é) frequentemente pública e marcava para sempre um indivíduo ou família na pequena comunidade rural, fechada como, por exemplo, Aldeia Nova de São Bento (***).

Há grande criatividade, ironia e até  intencionalidade social: reforçar a moralidade coletiva pela sátira, pela provocação ou pelo controle do comportamento sexual.

Estas alcunhas testemunham a riqueza, a ousadia, a espontaneidade e a criatividade o falar popular alentejano, fazendo parte de uma tradição de oralidade onde o erótico e o pornográfico convivem com o burlesco, o pícaro, o brejeiro e o satírico.

(Continua)

(Pesquisa: LG  + Assistente de IA /Gemini, ChatGPT)

(Revisão / fixação de texto, negritos: LG)

___________________

Notas do editor LG:

(*) Último poste da série > 13 de setembro de 2025  > Guiné 61/74 - P27216: Felizmente ainda há verão em 2025 (33): A natureza tem horror ao vazio... Reflexões, mais ou menos melancólicas, no dia seguinte à primeira vindima de Candoz

(**) Vd. poste de:

5 de março de 2020 > Guiné 61/74 - P20706: Memórias ao acaso (Miguel Rocha, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 2367/BCAÇ 2845) (4): Alcunhas

28 de maio de 2016 > Guiné 63/74 - P16141: In Memoriam (258): Soldado Ilídio Fidalgo Rodrigues, o "Esgota Pipas" da CCAÇ 2382, morto por um estilhaço de um projéctil IN (Manuel Traquina, ex-Fur Mil)

6 de setembro de 2012 > Guiné 63/74 - P10342: Histórias e memórias de Belmiro Tavares (25): "O Aguardente"

segunda-feira, 25 de agosto de 2025

Guiné 61/74 - P27150: Contos com mural ao fundo (Luís Graça) (43): Oficial e cavalheiro


Contos com mural ao fundo (43) > Oficial e cavalheiro


por Luís Graça


Nada como não pensar em nada. Em fim de tarde. No pico do verão. O céu de chumbo. O ar carregado de eletricidade.

Vai trovejar, pensaste tu. Vem aí uma carga de água... Ou antes viesse. Um dilúvio. Daqueles que costumam desabar sobre o incauto turista em meados de setembro.   Limpavas a merda toda. A alma. A culpa. A dúvida. O nojo. O carro que acabava de atravessar meio Alentejo. O trigo já ceifado. A terra ressequida, crestada como a tua pele. Os chaparros sob stress térmico. Torturados.

Limpavas a tua cabeça cheia de ideias negras. O teu corpo ainda dorido das picadas dos mosquitos. A merda toda da Guiné. Que a água ferrosa, pegajosa, salobra, não lavava.  

Ainda mal sabias verdadeiramente o que era a chuva. Tropical. No tempo dela. A noite inteira. Tu,  todo ensopado até aos ossos. Um fantasma enterrado no poncho camuflado. Em bicha de pirilau. Mal descortinando o homem da frente. O trilho iluminado pelos relâmpagos.

Não pensar em nada... Confiar no homem da frente. Que maquinalmente abria o caminho. Na noite de breu. A catana numa mão. A pica noutra. A G3 a tiracolo. Não, não era milícia nem militar. Apenas um civil, antigo caçador, contratado pela tropa. Para a difícil função de guia e picador. Tinha faro de cão para as minas, o sacana. Franzino,  seco de carnes, de baixa estatura. Como convinha a um "rafeiro", como ele. 

As imagens do mato perseguiam-te. Mesmo de férias. A milhares de quilómetros de distância... "Há quanto tempo, Malan ?".. Nem ele sabia. Desde que havia guerra. Sempre houvera guerra no seu "chão".  A Guiné não existia. Era um mosaico de "chãos". Fula, balanta,nalu, mandinga, biafada, manjaco, papel...

Ouviu, ainda, aos homens grandes da sua tabanca, falar do "capitão-diabo". O lendário Teixeira Pinto, que incendiou o Oio em 1913/15. Já o pai do pai do pai do Malan trabalhara para os "tugas".

Desde 1895, pelas tuas contas. Quatro gerações. Mercenários ? "Manga de patacão, Malan ?!"... "Não, alfero, cá misti patacon"... Era apenas uma questão de estar no lugar certo. Ao lado dos mais fortes.  Dos "tugas".

"Certo ou errado, Malan" ? 

Para o Malan, o lado certo era sempre o dos mais fortes. Como tu, afinal. Desde que Alá criara o mundo. E o bicho homem. Mas não dava para falar no mato. À noite, em bicha de pirilau. "Chiu, silêncio" !...A chuva a cântaros. Sim, no regresso ao quartel, na tabanca, sob o velho poilão. "Sim, alfero, Malan já pode falar". 

Ou mais discretamente na messe e bar de oficiais. Gostavas de conversar com ele e manter a sua amizade. Ou, antes, cumplicidade. Muçulmano, crente, guinéu, biafada. Bebia a sua laranjina C com evidente volúpia e prazer. Gostava da garrafa bojuda do refrigerante. "Granada de mão, alfero. Suma mama firme de bajuda". E ria-se.

O capitão não gostava muito destas intimidades. "Promiscuidades", rosnava ele.  Mas a verdade é que  eras tu quem andava com o Malan no mato. Ele conhecia como a palma das suas mãos todo o difícil território do subsetor que fora atribuído à companhia.

Mas sabias que no passado  eram os mandingas, e só depois os fulas e a seguir os "tugas", os donos do chão. E amanhã seriam  outros,  que a história é o soma-e-segue -come-e-cala-te. Ele era um obscuro biafada. Um "cão rafeiro". Sabia lá o que era a história.  E estava longe de suspeitar sequer que em 1974 os novos senhores da guerra iriam pôr a sua cabeça a prémio. No novo faroeste que em que se transformaria depois aquela terra. Com caça aos "cães  dos colonialistas" e julgamentos populares...

Recuas no tempo. Julho de 1970. Fazes um esforço danado para reconstituir, de memória, essas já tão longínquas quanto dececionantes  férias de verão. Há um apagão na tua memória que persiste. As primeiras férias a que tiveste direito pagas pelo Estado- patrão.  Passadas a 4 mil quilómetros de distância do teu local de trabalho. Esses dias (trinta e cinco) evaporaram-se. E deixaram-te um gosto amargo na memória. Ainda hoje. Não foram as férias que tanto idealizaste.

Dizes bem, local de trabalho. O teatro de operações. Lá onde era a guerra. Na província portuguesa da Guiné. Em guerra, há sete ou mais anos. Nem sabias desde quando, ao certo. Muito menos porquê. Até te pagavam para defender a Pátria. Nunca contestaste. Ensinaram-te a cumprir ordens. "Para já safas o pêlo. O teu e o dos teus homens".

Tinhas chegado há menos de nove meses. O tempo que levaste a ser parido. Acabavas de fazer 23 anos. Aprendeste a fazer contas. A trabalhar com números. A fazer cálculos.  Querias ser contabilista. O teu pai, preocupado com o teu futuro, achava que podias  vir a trabalhar nos estaleiros. Como apontador de obra,  para começar. Nos estaleiros de construção e reparação naval.  E depois nos escritórios. Envidraçados. Com ar condicionado. O teu pai não passava de um simples estivador. Com 50 anos estava "velho, arrumado, acabado".  Não querias a vida dele. Nem ele queria a vida dele para ti.

Não, não te ensinaram a pensar. Na Escola Industrial e Comercial de Setúbal. De preferência não penses em nada. Só em coisas boas. Frívolas. Banais. "O que é o tacho na messe quando regressares ao quartel ?"... Ou: "quantas semanas faltavam para as férias ?"... Gajas não havia. "Sim, meu capitão.  Compreendido, meu capitão. O meu capitão é que sabe"... Ou ainda: "Vamos a eles, rapazes!"

Com um jeitinho do 1º sargento (um homem velhaco e temido) e do capitão, talvez conseguisses ainda, em 1971,  obter uma segunda licença de férias. A comissão de serviço terminava em fim de agosto. Se tudo corresse bem. Se lá chegasses. Bem rezava a tua avó. Que fora operária da indústria conserveira. E a tua mãe, que era doméstica. Rezavam a Nossa Senhora de Fátima para regressares são e salvo. O teu mano, esse, já não rezava. Já cumprira a parte dele em Angola. Em 1964. E safara-se, como tu haverias de safar-te. 

Tu nunca foras lá muito de rezar. Mas  imaginavas que a Santa também estivesse muito ocupada. Sobretudo aos dias 13. De maio a outubro. Com tantas peregrinações, súplicas, preces, cunhas... Sobretudo naquela altura em que o país estava em guerra. Com tantas promessas. Os santos só eram precisos nas dores e aflições. No parto e na morte.

País em guerra ? Quando chegaste  ao aeroporto de Lisboa, no início de julho de 1970, pareceu-te que estava tudo tranquilo. Mais tranquilo do que quando partiras do Cais da Rocha Conde d'Óbidos, em outubro do ano anterior. Nunca tinhas visto tanto "patacão". Nunca se construira tanta casa (e também tanta barraca à volta e dentro de Lisboa e Setúbal).

O teu mano tinha ido,  pela primeira vez, passar férias ao Algarve. À Quarteira.   A mulher, professora primária e a filhota. Um privilegiado. Já com o seu Fiat 127. Pago em notas de conto. Novo, no stand. Sessenta e tal  notas, escreveu-te ele num dos primeiros aerogramas.

E os teus soldados, esses, também já não rezavam. Já não iam a missa. O capelão visitava esporadicamente o aquartelamento. Quando havia coluna. Muito do pessoal era do sul. Alguns nem batizados seriam. Mas rezavam debaixo dos lençóis. À noite ouvia-os a cochichar. Outros a tocar à punheta. Quando fazias ronda aos abrigos, e em especial ao do teu pelotão. E tinham fios de ouro ou prata, com crucifixos e medalhinhas de Nossa Senhora de Fátima. Os africanos das milícias também usavam amuletos. Não vias diferenças. "Quem tem cu, tem medo", resmungava o teu pai. Sem grande jeito para te animar. 

À despedida para Lisboa onde foste embarcar, ele não compareceu. Tinha de ganhar a vida. Só o teu irmão. Que trabalhava num transitário, ali perto no Cais do Sodré. Foi um abraço rápido. A partida de tropas para África tornara-se uma coisa banal. Ele já tinha passado por isso. Como de resto o teu pai, que tinha estado na Ilha do Sal, na II Guerra Mundial. 

Tu também não rezavas. Mas "tinhas fé". À tua maneira. Nunca andaste na catequese. Foste menino de rua. Mas a tua mãe ensinou-te o "Pai Nosso" e a "Avé Maria". Dizias aos teus homens: "A fé move montanhas". Não eras lá muito bom a fazer discursos. A levantar o moral. Bastava-te o exemplo, seguias à frente dos teus homens. Eras de poucas falas. Não tinhas a lábia do teu mano. Um gajo com sorte com as miúdas. Tu, não. Nem sorte ao jogo nem  aos amores.  Ias tendo sorte na guerra, vá lá . Repetias as frases feitas, "a sorte protege os audazes", "a Pátria vos contempla", "mais vale perder um minuto na vida do que a vida num minuto"...Ah, e "um homem não chora". Frases estafadas.  Nisso, eras um tosco. 

No curso de "ranger", em Lamego, não te quiseram nos "comandos". Ficaste  sempre a remoer essa sacanice. Porquê? Só porque tinhas vindo do CSM  ?  Foste para o COM por mérito.  E a comandar homens no mato eras melhor do que o "caixa d'óculos", ou o "padreco".  O único, dos alferes da companhia, que te podia pedir meças, era o do 3º pelotão. Era bancário. Um gajo teso. E disciplinador. Infelizmente acabava de ir para uma companhia africana. Tal como dois furriéis e vários praças.

Acabaste, miseravelmente, por ir parar a uma companhia de "tropa- fandanga". Tu que sempre te bateste ao crachá de "comando". Era a melhor alegria que podias dar ao teu velho. Nunca soubeste quem te tramou.

Segundo azar o teu: nem sequer todos os gajos da companhia eram de cavalaria. Havia ali filhos de muitas mães.   E depois não entendias a política de gestão de pessoal. Como é que o nosso general Spínola queria ganhar a guerra? A manta era curta. Para se pôr num lado (equipas de reordenamentos, graduados para as companhias africanas, etc.), tinha-se de tirar ao outro lado.

Nunca ousaste comentar estas contradições da política "Por a Guiné Melhor", com o teu capitão. Que era assumidamente spinolista. Aliás, um incondicional do general. E ambos da arma de cavalaria. Não, não era um homem de trato fácil. Cultivava a distância e a frontalidade. Tratava toda a gente por tu. E pouco se sabia dele. Tinha o seu arranjinho com a lavadeira. "Um homem não era de pau". Toda a gente sabia mas ninguém comentava. 

Férias, disseste tu ?!...    

Na Guiné sentias-te encurralado. Tinhas claustrofobia. Não suportavas viver dentro do arame farpado. Preferias andar no mato, apesar dos riscos acrescidos. Eras o alferes com mais saídas para o mato.

Dizes bem... A tropa e a guerra. Durante três anos e tal. Eras pago para fazer a guerra. Tinhas direito a um mês de férias na metrópole. Nada mau... Se te portasses bem. Leia-se, se não apanhasses uma porrada. Estava tudo previsto no Regulamento de Disciplina Militar. O famoso RDM. Por exemplo, ao fim de oito dias de ausência não autorizada eras dado como desertor. Nada mais desonroso para um militar do que ser dado como desertor. E pior ainda, ser preso e punido num tribunal de guerra.  Com o Spínola a esbofetear-te em público, na parada, e arrancar-te os galões. Estás a imaginar a  cena.

Tinhas um mês para decidir se voltavas. Será que querias voltar ? Admites hoje (mas nunca falaste disso a ninguém) que nessa época chegaste a ponderar essa hipótese, a de desertar. Ou melhor, não voltar. O que ia dar ao mesmo.   Vagamente. Sem grande convicção. Eras demasiado "atado" para te meteres numa embrulhada dessas, censurava-te o teu pai. Ele bem poderia, se quisesse,  ter-te escondido  no porão de um navio que zarpasse para a Europa. Com alguma cumplicidade da tripulação, e do pessoal da estiva do porto de Setúbal. Mas sempre recusaste essa ideia. Afinal, eras um "ranger". Afinal, eras um oficial do Exército português. Sempre tiveste orgulho na tua farda.

 Contavam-se pelos dedos, os desertores e os prisioneiros. Se a guerra fosse impopular, teria havido muito mais refratários e desertores. E as cadeias estariam cheias. Mas, não, a malta da tua geração aguentou a canga em cima do pescoço. Tal como os bois do teu avô materno, que era um pequeno seareiro do Montijo.

Claro que a guerra era impopular. Não havia guerras populares. Argélia, Vietname... ?  Sabias pouco, mas tinha havido ou havia mais contestação. Em França. Na América. Um pouco por todo o lado. 

Quem vai à guerra, está sujeito a lá ficar. Pelo menos sem um braço ou uma perna. Mas não era assim tão odiada a guerra da Guiné. Como queriam fazer crer alguns. Que eram do contra. E que eram poucos no teu tempo.

"Vais para o Ultramar ?!"... Era uma fatalidade. A malta encolhia os ombros. Toda gente vai, lá terá que ser. E, afinal, por que razão é que terias de desertar ? Com sorte haverias de escapar. Em cem morria um. E se desses o "salto", irias fazer o quê ? Lavar pratos, limpar o cu a meninos, alombar com baldes de cimento e tijolos ? 

"Agora deixa-te estar quieto, já que chegaste até aqui. As velhas rezam por ti", segredava-te o teu velho ao ouvido, quando lhe foste dar um abraço à chegada, de férias. 

Foras incumbido de levar parte do espólio de um dos teus soldados, morto por acidente com arma de fogo. Pouca coisa. Um gajo morto cabia numa caixa de sapatos: objetos pessoais como o fio de ouro, o relógio, uma medalha com a foto da mulher e do filho, documentos  de identidade, fotografias, cartas e aerogramas, um porta-moedas, algum dinheiro...

O resto (a mala com a roupa, etc.) já tinha seguido, pelas vias normais, para o Depósito Geral de Adidos, na Ajuda.

O capitão não era um militar de usar "paninhos quentes" nem "falinhas mansas". Era tropa, e bastava.  E para mais de cavalaria.  Falava feio e grosso. Foi direito ao assunto. Tratava-te por tu e por "ranger".  

− Ó "ranger", vais de férias, vais ter que levar uma carta a Garcia...

Parece que adivinhaste, mesmo não conhecendo a expressão:

 − ... à família do A... ? Ser o mensageiro da morte ? Mas agora para dizer o quê ?

− Cala-te, o mais duro está feito: o nosso cabo está morto e enterrado. A família já fez o luto. Já se passaram três meses.

− Mas..., qual é então a minha missão ?

 − Levar a caixa com os seus objetos mais pessoais, pouca coisa. E relatar sucintamente as circunstâncias da morte. Claro,  apresentas as minhas condolências pessoais à viúva e aos pais, os votos de pesar de todos os seus camaradas.

O capitão sabia-a toda. Afinal tu eras o seu "homem de confiança".  Eras o comandante do A... Fizeras o auto de averiguações. E eras um "ranger"... Foras treinado segunda a divisa: "Ninguém fica para trás. Nenhum camarada. Vivo, ferido ou morto".

O A... viera num caixão de chumbo. Já a expensas do Estado. Mas não sabias  como irias encontrar a família, no Baixo Alentejo. E tinhas uma vaga ideia, pelos teus contactos em Setúbal, com a malta alentejana, que o luto podia durar um ano. As pessoas vestiam-se de preto. E durante esse período abstinham-se de ir a festas e a bailes. Até mesmo de entrar na taberna.

Podias recusar-te ou pedir escusa da missão ? Afinal, a tropa tinha os seus próprios canais burocráticos para realizar este tipo de missão, cuja delicadeza não era suficientemente valorizada pelo capitão. E depois, na prática, eram dois dias perdidos das tuas preciosas férias.

Ainda hesitaste:

− Porque não o capelão do batalhão, meu capitão ? Vai de férias, a seguir a mim, segundo me confidenciou.  Como sabe, chegámos a dormir no mesmo quarto quando estivemos juntos com a CCS, na sede do batalhão... Ficámos amigos. E depois, ele que é padre, saberá encontrar as palavras certas para consolar a viúva e os pais do A...

− Nem penses nisso !... Sabes bem que eu não tenho confiança nele!... − disparou o capitão, visivelmente irritado contigo.

E prosseguiu:

 − Nem tenho a certeza se ele quer voltar de férias. Andamos de olho nele. Se não voltar, também não faz cá falta nenhuma. É menos uma boca a comer e menos uma esponja a beber. Mas estará metido num sarilho: terá o bispo, a tropa e a Pide à perna.

Não tiveste coragem de  discordar do teu superior hierárquico. Ele não estava irritado, estava "piurso"!... A alusão ao capelão tinha sido extremamente infeliz da tua parte. 

 Eles não morriam de amores um pelo outro. Tudo começara  com a viagem no "Uíge". E por causa de uma homilia, dita no convés , que não caira bem no comando do batalhão. O capitão deixou de lhe falar. 

Mas tu tinhas que ser coerente e cumprir o teu dever . Mesmo que a missão fosse desagradável. Afinal, eras um oficial. Mas não de relações públicas. Eras um operacional. O comandante do A..., mais do que isso,  o segundo comandante, o comandante de 150 homens na ausência do capitão. Não eras nenhum merdas. Eras um "ranger". O teu pai tinha orgulho em ti. Ele tinha servido na ilha do Sal como expedicionário durante a II Guerra Mundial". Fora mobilizado pelo RI 11, de Setúbal. Muita sede e fome lá passou, coitado do velho.

Pensando bem, até então não tinhas sido nada na "puta da vida" (a expressão era do teu pai de quem não dizias a ninguém que era estivador, e que falava mal como um carroceiro). Agora, sim, "eras gente". Mas ir de Setúbal até ao Baixo Alentejo, ao monte onde vivia a viúva do A..., com os sogros,  era um esticão de carro. E ninguém te pagava a gasolina. Nem ajudas de custo. As estradas em 1970 não eram as que são hoje. Tinhas um Mini Austin, comprado em segunda mão ao teu mano (que era mais velho), com o primeiro patacão que ganhaste na tropa e na guerra.  

Tinhas tirado a carta em Bissau. E a pouca prática de condução que tinhas, era com o jipe da companhia.  Em estradas de terra batida. Era também um desafio ir de Setúbal até lá baixo, já nas faldas da Serra do Caldeirão. Sítios aonde nunca tinhas ido antes.

Pior que tudo seria enfrentar a pobre viúva que acabara também por perder o filho com três meses.  Para não falar já dos pais do A... Não sabias se ele tinha irmãos. Aliás, era um rapaz de poucas falas. Metido consigo mesmo. Pouco sociável. Chamavam-lhe o "Chaparro". Soubeste da perda do filho por ele. Pensas que nunca superou o desgosto. Mal o conheceu, é certo. Mas tinha muito orgulho na mulher e no filho.

O que lhes irias dizer, à viúva e aos pais  ? A verdade nua e crua ?... Que o A ...tinha morrido num estúpido acidente com arma de fogo ?!... Isso eles já deveriam saber pelo telegrama que terão recebido na altura... Não sabiam eram os pormenores macabros.

Felizmente, tinhas conseguido, em resultado do auto que tu próprio elaboraras, que o acidente tivesse sido considerado em serviço. A viúva iria ter direito a uma pensão de preço de sangue. O que era uma ajuda para recomeçar a vida. E isto enquanto não se voltasse a casar. Ias-lhe dar a novidade. Não sabias de quanto seria a pensão. Talvez de uns 400 a 500 escudos, naquela época.  "Porca miséria!", pensas tu hoje. Septuagenário.

Só te deste conta dos espinhos da missão quando já vinhas a caminho, no avião da TAP. Era tarde de mais para te recusares.  O capitão estava incontactável. Na época não havia telemóveis.  Os dados estavam lançados.

Indiferente ao teu pequeno drama pessoal (ir ou não ir levar a "carta a Garcia"), um grupo de gajos (à civil, mas seguramente militares em gozo de licença de férias) não paravam de chamar as "boazonas" das hospedeiras... Para mais uma rodada de uísque!

Era uma ordem do teu capitão, mesmo que não fosse por escrito. E, mesmo de férias, tu continuavas a ser um militar. A comunicação na tropa era clara, concisa e precisa. Às vezes até demais. Telegráfica. Burocrática. Impessoal. E, no limite, desumana. 

Pediste também uma bebida. Um gin tónico. Tinhas uma secura danada na garganta. A verdade é que o A... não morrera em combate. Como um herói. Não morrera pela Pátria. Fora morto estupidamente numa zaragata de caserna. Numa altercação de bêbedos. (Não escreveste isso no auto:  com o A... a defender a honra da mulher que, pelos vistos, era um rapariga alegre e vistosa. Algarvia do Barrocal.)

As testemunhas-chave foram o B... e o C... Engalfinharam-se os dois, o A... e o B... Caíram a rebolar no chão, com o A... empunhando a G3 e o B..., por baixo dele, a tentar desarmá-lo.

O A... era um dos teus melhores operacionais. Com ele, a HK 21 nunca encravava... Tinha um bom municiador, é certo, mas era muito cuidadoso com a sua "algarvia", como ele chamava à metralhadora ligeira de fita que lhe estava distribuída.

O B..., que era do 4º pelotão, o do "padreco", não foi dado por culpado, embora tivesse sido ele a insinuar que a mulher do A... teria sido vista a dançar com outros, "feita galdéria" ( sic), numa festa da vila... O que era de todo inverosímil. Ela estava de luto, pela perda do filho. E tinha o homem no ultramar.

Brincadeira de mau gosto ? Piada de caserna ? Ciumeiras antigas ? Cio e luta de machos ?

O B... era de uma freguesia vizinha do A... Os dois eram conterrâneos. E já se conheciam quando foram formar companhia em Estremoz. O B... jurou-te a chorar, que nem uma Madalena, que era amigo do peito do A...:

 − Éramos como irmãos!... Como é que eu podia querer-lhe mal ?... Enrolámo-nos à porrada por causa da estúpida da guerra!... Andamos todos almareados... Ele andava completamente transtornado da cabeça, desde que o filhinho lhe morrera... Juro, meu alferes, que não tive culpa nenhuma!... Tentei apenas arrancar-lhe a G3 para ele não cometer nenhuma asneira.

A verdade é que acabou tudo em tragédia. Conhecendo o A..., ficaste na dúvida se ele não terá querido mesmo fazer justiça por suas próprias mãos. Mas os depoimentos de quem viu a cena, na caserna, a uma razoável distância da cama do A..., eram inconclusivos. Na dúvida, optaste por inocentar os dois contendores.

E acabaste, em 1970, na tua vinda à metrópole por assumir, "por piedade e, vá lá, por camaradagem", a ingrata missão de levar o espólio (ou a parte mais íntima do espólio)  do A... à família. Mais uma carta do capitão.

Desconhecias o conteúdo da carta do comandante da companhia. Ficaste "entalado", quando deste com o envelope fechado. E se as duas versões, a tua e a do capitão, não batessem certo ? O capitão certamente por lapso não te chegou a falar sobre o que devias dizer à família e, em especial, à viúva.

O que iriam pensar aquelas pobres criaturas ? Ficaria a dúvida, a suspeição, quiçá o ódio contra a tropa, ainda a latejar  no coração daquela pobre gente que há três meses acabara de receber um telegrama seco, desumano, a dar a notícia  da morte do seu ente querido, lá longe, na Guiné ?!... Que eles nem sabiam onde ficava.

Tiveste que abrir, com muitas cautelas, o envelope  e inteirar-te do conteúdo da carta. Afinal, o que o capitão escrevera, era lacónico, banal e sobretudo impessoal. Era apenas o elogio do "homem íntegro", do "militar brioso" e do "grande português", não respondendo a eventuais e legítimas dúvidas dos familiares sobre as trágicas circunstâncias do acidente. 

Por certo que a jovem viúva iria querer saber como tinha morrido o marido. E onde, e quando, e porquê. E mais: queria saber se tinha murmurado o seu nome e o do seu filho, antes de dar o último suspiro. E se tinha sofrido muito antes de morrer... Enfim, tinhas que estar preparado para todas as possíveis perguntas da viúva e dos pais. Iriam perguntar pela certidão de óbito, de que tu não trazias cópia nem estavas autorizado a dar pormenores. Iriam inundar-te de perguntas sobre o comportamento dele naqueles escassos seis meses de permanência na Guiné. Se estava magro ou gordo, se passava mal ou comia bem, se andava triste ou alegre...

Embora fosse gente pouco letrada (os pais do A... nem sequer sabiam ler nem escrever), a viúva pelo menos teria a 4ª classe e  achar-se-ia no direito de saber tudo sobre a morte do marido. 

Estavas com receio de não estar à altura de  desempenhar esta delicada tarefa... Reconhecias que o Exército era "parco" na comunicação com os familiares, em casos de morte ou ferimento grave de um militar. "Parco" ? Avarento nas palavras, frio nos gestos.

E depois tu não sabias se, eventualmente, por intermédio de amigos, conhecidos ou conterrâneos, eles não estariam  já de posse de mais pormenores sobre o acidente... As más notícias chegavam sempre depressa. Farias figura de parvo. Tinhas que estar preparado para todas as hipóteses, perguntas, cenários...

No final da carta, o capitão depois de reforçar os seus "sentidos pêsames pessoais", transmitia também os do exército, do comandante do batalhão e até do próprio general António Spínola, "governador e comandante-chefe do CTIG", isto é, da Guiné. 

No último parágrafo, manifestava a sua intenção de louvar o 1º cabo A..., a título póstumo, por feitos em combate na Operação X...

Não deixaste a "ingrata tarefa" para o fim das tuas férias. O "berbicacho", como disseste lá em casa aos teus pais, intrigados com a tua agitação.

Logo no primeiro fim de semana, a seguir à tua chegada, decidiste levar a "carta a Garcia".  A morada era a que constava no processo do A... Não era muito precisa, estaria incompleta. Tiveste que passar, sábado, ainda de manhã, pelos correios da vila. O carteiro fez-te um croqui do monte onde a família do A... vivia. Não era longe, mas a estrada era péssima e poeirenta. Era terra batida, como nas picadas da Guiné. Não foi bom para a suspensão do teu pobre Mini.

Bateste à porta. Mas já os cães haviam dado conta da presença do intruso. Sempre odiaste cães. Felizmente não andavam à solta. Alguém, de súbito, espreitou  pelas cortinas da portinhola. Dois olhos negros e grandes como tições, fotografaram-te. Uma jovem mulher, vestida de preto, entreabriu a porta. Tinha traços típicos das mulheres do povo da região. Olheiras fundas. Pareceu-te curiosa e assustada ao mesmo tempo. 

Vinhas... fardado!... O boné com pala. Os óculos escuros,  Ray-Ban, devem tê-la intimidada!... Claro, era a viúva. Só podia ser. E tu eras o "mensageiro da morte"... Ela percebeu logo que era alguém da tropa. Que vinha por causa do marido. Abriu a porta devagar, cautelosa...

Casa rural. Modesta. Limpa. Um centenário pinheiro manso dava-lhe sombra. E era uma das referências que te dera o carteiro...
 
Oficial e cavalheiro, estendeste-lhe a mão depois de, estupidamente, lhe teres batido a pala. Não correspondeu ao teu gesto. Mais por timidez do que por descortesia. Mandou-te sentar numa cadeira de verga. Só havia uma. E ela mesmo sentou-se numa banqueta, junto à  lareira, a dois metros de distância. Recatada. E ligeiramente ofegante. Reparaste que era bonita.

Sem grande palavras, deste-lhe a pequena caixa de cartão com os objetos pessoais do defunto. Os de mais valor... Entre eles  um aerograma que o A... não chegara a ter tempo  de pôr no correio. (E que tu devias ter lido antes de lho entregar, mas achaste que não tinhas esse de direito; nem sequer constava do auto.)

Leste a carta, seca, do capitão... O rosto dela, impassível. Nem uma lágrima. O silêncio estava, porém, a tornar-se pesado e intolerável. Não havia mais ningém na casa. Os sogros estavam fora, voltavam na segunda feira seguinte. 

A desgraçada não conseguiu acabar de ler o rascunho do aerograma do marido. Deu um grito lancinante de dor. Começou a chorar, sufocada. Acabou num pranto, arranhando a cara e puxando os cabelos.

Ficaste sem pinga de sangue. Não sabias como agir. Pegaste no aerograma que ela deixara cair no chão.  Num ápice deste conta que o A... tinha sido  cruel e injusto, no que escrevera... O marido, numa crise de ciúme patológico, declarava, preto no branco, que ela lhe era infiel. E acusava-a da morte do filho. 

De repente pareceu-te que ela ia desfalecer Fizeste um gesto para a amparar. Foi então que ela se agarrou a ti como uma lapa à rocha, na iminência da tempestade.

 − Cabrão...ão...ão...!!!... Eu aqui que nem uma monja à espera dele!...  E ele a dar ouvidos àquela gente bera, que só nos queria mal!

Tiraste um lenço do bolso para lhe enxugar as lágrimas... Não sem algum esforço, conseguiste sentá-la na cadeira de verga. Desapertaste-lhe a blusa de flanela no colarinho. Correste à cozinha para lhe arranjar um copo de água.  Havia uma pequena bilha de barro com cocharro em cortiça. Amparaste-a sob as tuas pernas.  Deste-lhe de beber. 

 − Por favor, agarre-me, abrace-me, beije-me...que eu vou morrer!... 

Puxou-te com toda a força bruta de uma jovem mulher, viúva de vinte anos. As unhas cravadas nos teus braços. Procurava  desesperadamemte os teus lábios.  Era de pequena estatura, só te chegava ao peito. 

 ... O resto tens pudor em contar. Porque se calhar não terá sido  inteiramente digno de um oficial e cavalheiro. De alguém que estava ali a representar o Exército português. Numa missão humanitária. 

Esta história nunca mais te saiu da cabeça. Nem muito menos quando foste para Moçambique, já como capitão, em 1973, a comandar uma companhia. Para o Niassa. Embarcaste no avião. Tentando não pensar em nada. Numa noite de verão. Tinhas 26 anos. E terias tido a benção do teu pai, se ele ainda fosse vivo.

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Nota do editor:

terça-feira, 22 de julho de 2025

Guiné 61/74 - P27043: Notas de leitura (1822): 2ª edição do livro do nosso José Saúde, "Aldeia Nova de São Bento" (Lisboa, Edições Colibri, 2021, 299 pp.)



Foto nº 1 > Aldeia Nova de São Bento, concelho de Serpa,  anos 30 > O Poço do Lobo  (1)... Hoje fica na Rua do Poço do Lobo. A povovoação, cuja origem remonta à guerra da restauração (Séc. XVII) foi elevada à categoria de vila em 1988.


Fotos nºs 2 > Aldeia Nova de São Bento, concelho de Serpa, anos 30 > O Poço do Lobo  (2)


Foto nº 3 > Aldeia Nova de Sáo Bento, concelho de Serpa > s/d > Rapariga com "enfusa" à cabeça


Foto nº 4 >  Aldeia Nova de Sáo Bento > Serpa   > José saúde, o autor quando jovem... Aos 9 meses, em 1951...Vê-se o braço da mãe, que o ampara...

José Saúde > Página do Facebook > Fotos do seu álbum (Com a devida vénia...). Presume-se que as fotos nºs 1,2 e 3 sejam do domínio público. (LG)


Fotos (e legendas): © José Saúde (2025). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. O nosso José Saúde,  jornalista e escritor, ex-fur mil OE/Ranger, CCS/BART 6523 (Nova Lamego, 1973/74), antigo desportista, "aldeano", hoje a viver emn Bejam membro da nossa Tabanca Grande, com 255 referências no nosso blogue, publicou em 2021 o seu decimo livro;

José Saúde - "Aldeia Nova de São Bento – Memórias, Estórias e Gentes" 2.ª ed. Lisboa: Edições, 2021, 299 (Prefácio de David Monge da Silva) (Preço de capa atual: 14,40 €).

Apraz-nos registar que a obra foi muito bem aceite pelos seus conterrâneos, pelo que já saiu uma 2ª edição. Vão daqui as nossas palmas para ele e os demais "aldeanos".

Aproveiutamos para publicar, editadas, algumas fotos do seu álbum, disponíveis na sua página do Facebook.


Sinopse

Recanto de imensas conversas, a bica, onde o pessoal da nossa aldeia recorria para encher mais uma “enfusa” de água ou para atestar mais uma pipa instalada num carro de animais que se protegiam debaixo de um enorme chorão ali existente, era um local deveras enternecedor.

(…) Mulheres trajando com os xailes pretos, assim como outras com lenços atados à cabeça, outras com “enfusas” já cheias e transportadas irrepreensivelmente sobre a nuca, outras esperando, gentilmente, que chegasse a sua vez para chegarem às bicas de água, que eram duas, uma menina de pé descalço, um burro que bebia na pia localizada a meio. Enfim, pedaços de histórias que ficam aqui retratadas e que visam trazer à opinião pública um passado que merece um inexcedível respeito.

***

(...) "Ao ler estas deliciosas crónicas regresso de imediato à minha infância e adolescência, a um tempo de felicidade em que todos os nossos familiares e amigos estavam connosco para nos ajudar a crescer e descobrir, sem sobressaltos, o mundo e a vida.

(...) Tudo hoje é diferente. O passado apenas subsiste na minha memória, nas minhas recordações. Somos as nossas memórias. Somos quem fomos. É a nossa história que nos caracteriza e define.

(...) Eu e o Zé Saúde vivemos a nossa infância e juventude nas décadas de 50 e 60, conhecemos a nossa aldeia com a sua população máxima, e acompanhámos o seu progressivo decréscimo.

(...) As memórias que nos são trazidas nesta obra situam-se, sobretudo, nestas duas décadas, trazem-nos personagens, profissões, modos de vida, relações sociais e formas de convívio que não voltarão mais. Há que ler atentamente para que os mais idosos recordem as suas vivências e os mais novos conheçam um pouco do que foi a vida dos seus pais e avós. Este livro é serviço público." (...)


David Monge da Silva | Fonte. Edições Colibri, página do Facebook, 19de dezembro de 2021 


Sobre o autor, José Saúde:

(i) nasceu em Aldeia Nova de São Bento no dia 23 de novembro de 1950, todavia, o seu registo oficial de nascimento reporta-se a 23 de janeiro de 1951;

(ii) desportivamente, iniciou a sua carreira futebolística no Despertar Sporting Clube e aos 16 anos ingressou no Sporting Clube de Portugal;

(iii) como jogador sénior representou o Desportivo de Beja, o FC Serpa e em 1974 foi um dos grandes impulsionadores do futebol de competição na Aldeia Nova de São Bento ao reativar a atividade no Clube Atlético Aldenovense;

(iv) tem colaborado ativamente na Imprensa Regional e Nacional como comentador desportivo.e como cronista do que foi a vida dos seus pais e avós;

(v) tem uma dezena de livros publicados, sobre a sua história de vida,  incluindo  a sua experiència omo militar na Guiné, durante a guerra colonial.


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Nota do editor LG:

Último poste da série > 18 de julho de 202 > Guiné 61/74 - P27030: Notas de leitura (1820): Para melhor entender o início da presença portuguesa na Senegâmbia (século XV) - 3 (Mário Beja Santos)