1. Mensagem de Juvenal Amado com data de 1 de Agosto de 2008:
Caros camaradas Carlos Luis Virgilio e restante Tabanca.
Recebi este e-mail deste camarada que me deixou muito feliz, como é de prever.
Ele pede-me contactos de malta do BCAÇ 2912, eu penso que nada melhor que o blogue para os encontrar.
Um abraço para todos
Juvenal Amado
2. Mensagem de Vasco Joaquim de 31 Julho de 2008, dirigida a Juvenal Amado e reenviada por este nosso camarada ao Blogue:
Caro amigo Amado,
Permite que te trate por tú, pois fomos companheiros de armas, ou antes... tive o privilégio de ser substituído por alguém que preencheu uma vaga no mato, para que eu regressase à Metrópole. Pois bem, certamente que contactámos naquele espaço de tempo em que a CCS do 3872 rendeu a CCS do 2912 sita em Galomaro, já lá vão 36 anos.
Eu era na altura o 1.º Cabo Escriturário, Vasco de Jesus Joaquim com o NM 08190469, fazendo parte do BCAÇ 2912, formado em Abrantes (RI2), IAO em Santa Margarida e embarcado para a Guiné em 24 de Abril de 1970, no célebre "iate" CARVALHO ARAÚJO.
Ao analisar a tua corrida pelos locais que percorreste pelas terras da Guiné, dos quais a maioria conheço, agradeço o facto de me teres recordado através das fotos os locais por onde passei, tantas e tantas horas de solidão e saudade (pois na altura já era casado).
Reconheci o Restaurante Morte Lenta, os abrigos, a metralhadora destruída que infelizmente estava ao meu cuidado (embora fosse Amanuense), o morteiro 81 onde também tive instrução, o "Estádio", onde tantas caneladas apanhei, pois jogava pelos Sapadores.
A Cantina, onde tantas "81 e 60" emborcava... enfim o local que me servia de trabalho, pois era eu que fazia a Ordem de Serviço do Batalhão. Bons tempos.
Tristezas? Algumas.
Mortos em emboscada nas Duas Fontes (1) às 3 da madrugada, o Mecânico Auto Laranjina, o Sapador Barreto, o homem do rádio, Oliveira, e mais dois camaradas adidos, o Bolinhas e o Monteiro, bem como o meu amigo Milícia, Iderissa Candé.
Enfim... recordações que só são avaliadas por aqueles que palmilharam por aqueles locais.
Quanto aos castigos, eu também tive alguns (56 reforços à "benfica") e não sei quantas patrulhas nocturnas - e tudo por faltar às formaturas da refeição - e o capitão que era alentejano - que não me gramava, aplicava-me logo o "código ", só que quanto aos "reforços" fazia alguns porque o camarada Escriturário que fazia a Escala retirava alguns, pois dormiamos no mesmo abrigo.
Gostei de ver a foto do Filipe com a lavadeira, que também "era a minha", suponho que era fula ou balanta e que se chamava Binta?... não tenho a certeza... mas que me levava 50 pesos por mês lembro-me muito bem.
Quanto ao "Regala", conheci-o bem. Até lhe dediquei uns versos numa prosa que fiz do qual me recordo este:
Junto da nossa unidade
O Regala bem regalado
Pois não tem piedade
De tão caro vender ao soldado
A foto do Filipe com Esofe está boa. Gostei. Eu também tenho com ele, pois ele era funcionário do Regala e servia no bar/restaurante que eles tinham lá em baixo ao fundo.
Pois meu amigo, daqui a uns tempitos já cá não anda ninguém, daqueles que deram o coiro em terras desconhecidas para nós, mas que tivemos orgulho em cumprir a nossa missão.
Eu pelo meu lado, já estou reformado, traballhei na CP, como Chefe de Estação durante 32 anos, findos os quais me reformei aos 55 anos (já lá vão quase 5). Resido em Ovar onde trabalhei imensos anos, embora a minha naturalidade seja perto de Lamego.
Pronto meu amigo e camarada, obrigado por teres despertado em mim um pouco daquilo que eu já julgava ter esquecido, mas que num instante recordei com saudade, ao ponto de dizer aos meus filhos já casados:
-Olha por aqui andei eu.
Bem hajas e obrigado.
Um grande abraço e manda notícias.
PS. Se souberes de algum endereço da CCS do BCAÇ 2912, agradeço.
3. Mensagem enviada ao Vasco Joaquim em 8 de Agosto de 2008, com conhecimento a Juvenal Amado:
Caro Vasco Joaquim
O nosso camarada Juvenal Amado, elemento activo do nosso Blogue para o qual ficas desde já convidado a aderir, reenviou-nos a tua mensagem.
Sobre a CCS do BCAÇ 2912, à qual pertencias, não temos nada, mas temos alguns tertulianos das outras Companhias do teu Batalhão. Por exemplo o Fernando Barata da 2700, Tony Tavares e Manuel Melo da 2701.
No nosso Blogue podes encontrar muito sobre o teu Batalhão, basta escreveres na janela de pesquisa bcaç 2912 e aparecerá muita coisa para leres.
Entretanto fui à Página do nosso camarada Jorge Santos e no seu Ponto de Encontro encontrei camaradas teus a pedir contactos. São eles:
da CCAÇ 2699 - Adelino Fernandes (*)
da 2700 - Timóteo (*)
da 2701 - Manuel Melo, Tony Tavares e Lourenço (*)
Ficamos à espera de notícias tuas sobre os contactos que possas vir a concretizar.
Um abraço do camarada
Carlos Vinhal
Co-editor do Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné
(*) - Retirados, na edição, os números de telefone e endereços
_____________
Notas de CV:
(1) - Vd. poste de 12 de Fevereiro de 2008 > Guiné 63/74 - P2529: PAIGC: Emboscada a forças do BCAÇ 2912, na estrada Galomaro-Bangacia (Duas Fontes), em 1 de Outubro de 1970 (Luís Graça)
(2) - Vd. postes sobre BCAÇ 2912 de:
4 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1494: Tertúlia: Apresenta-se o ex-Alf Mil Fernando Barata, CCAÇ 2700 / BCAÇ 2912
22 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1541: História da CCAÇ 2700 (Dulombi, 1970/72) (Fernando Barata) (1): Introdução: a 'nossa Guiné'
26 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1550: História da CCAÇ 2700 (Dulombi, 1970/72) (Fernando Barata) (2): A nossa gente
15 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1595: História da CCAÇ 2700 (Dulombi, 1970/72) (Fernando Barata) (3): minas, tornados, emboscadas, flagelações e acção... psicossocial
11 de Abril de 2007 > Guiné 63/74 - P1651: História da CCAÇ 2700 (Dulombi, 1970/72) (Fernando Barata) (4): Historietas
30 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1795: Convívios (12): 16.º Encontro da CCAÇ 2700 / BCAÇ 2912 (Dulombi, 1970/72), Braga, 10 de Junho de 2007 (Fernando Barata)
Guiné 63/74 - P1796: História da CCAÇ 2700 (Dulombi, 1970/72) (Fernando Barata) (5): A(s) alegria(s) do(s) reencontro(s)
12 de Novembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2260: Álbum das Glórias (33): Inauguração da exposição de fotografia do Américo Estanqueiro, hoje, na Fundação Mário Soares
10 de Abril de 2008 > Guiné 63/74 - P2743: Convívios (50): Convívio da CCAÇ 2700/BCAÇ 2912, em Fátima, no dia 26 de Abril de 2008 (Fernando Barata)
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
sábado, 9 de agosto de 2008
Guiné 63/74 - P3123: Ser solidário (17): ONG AD - Relatório de actividades de 2007 - Parte IV (Final): Parcerias e apoios
Cópia da capa de três publicaçõe recentes da AD, em colaboração com o Instituto Marquês Valle Flor e com o apoio da Comissão Europeia: (i) Estudo de Mercado sobre a Comercialização de Produtos Locais no Sector de S.Domingos; (ii) Observatório da Educação no Sector de S.Domingos; (iii) Estudo das Potencialidades e dos Constrangimentos do Ecoturismo na Região de Tombali. O Instituto Marquês Valle Flor é o principal parceiro português da AD.
Guiné-Bissau > AD - Acção para o Desenvolvimento > Foto da Semana > 3 de Fevereiro de 2008 > O Professor, belga, Hubert Lelotte "continua, com a sua competência e entusiasmo, a formar os primeiros guias ecoturisticos de Cantanhez, após vários anos de colaboração na criação das Escolas de Verificação Ambiental no país"... Na foto, um grupo de jovens "guias prepara-se para identificar um itinerário turístico, recolhendo todas as informações de carácter ambiental, fluvial e logístico, que irão permitir aos nacionais e estrangeiros que demandam esta zona sul, poder escolher o que pretendem conhecer e visitar".
Fotos: Cortesia de: © AD- Acção para o Desenvolvimento (2008). Direitos reservados.
Quarta (e última) parte do relatório de actividades de 2007, da ONG AD - Acção para o Desenvolvimento, que temos vindo a reproduzir no nosso blogue. Com esta ONG guineense, que tem sede em Bissau, antemos desde finais de 2005 uma relação, franca, aberta, privilegiada, de cooperação, tendo como pretexto inicial o Projecto Guileje que deu origem, entre outras iniciativas que tiveram o nosso apoio, à realização do Simpósio Internacional de Guileje (Bissau, 1 a 7 de Março de 2008), e que abriu portas a outras iniciativas mais recentes, como por exemplo a recolha de sementes.
AD -Acção para o Desenvolvimento: Relatório de actividades de 2007 > Parte IV
Revisão e fixação de texto: L.G. (Não se reproduzem, por razões técnicas e de economia de meios, as fotos do relatório original, divulgado em formato pdf, no sítio da AD).
D. PARCEIROS DA AD
Embora o ano de 2007 tenha registado um aumento do volume financeiro de apoio aos projectos da AD, interessa lançar para discussão alguns sinais de mudança que se poderão vir a reflectir com muita preocupação a médio prazo no relacionamento entre a nossa organização e alguns dos nossos parceiros.
A primeira e mais importante refere-se à mudança gradual de atitude de algumas ONG parceiras da AD desde a primeira hora e que parecem abandonar a antiga cumplicidade existente entre nós na defesa de políticas progressistas de luta das populações mais excluídas, no combate político por uma sociedade mais justa, progressiva e solidária, para se deslumbrarem e deixar seduzir pelos modelos de organização e prioridades administrativo-financeiras de tipo neo-liberal.
Se anteriormente o acompanhamento da execução dos projectos tinha obrigatoriamente por pano de fundo as opções políticas, os métodos de responsabilização das comunidades e a criação de dinâmicas inovadoras, agora, esta reflexão deu lugar a exigências mais ou menos explícitas para o funcionamento burocrático das nossas ONG serem feitas à imagem e semelhança das deles, sempre consideradas como modelos exemplares e de reprodução local necessária.
Tem-se a ideia de que certas ONG do norte se perderam no caminho, deixaram de crer nas suas vocações e docilizaram-se perante as suas fontes de financiamento, assumindo um mero papel de executores, bons e baratos, das suas políticas governamentais. Para digerir o purgante, algumas passam anos a reestruturam-se em termos de finalidades e formas organizativas,
alimentando o espírito com supostos desafios novos em que os seus funcionários não se revêem e até por vezes nem percebem.
Acabamos por ter a sensação que, para essas ONG, o que é preciso é que as nossas organizações funcionem administrativamente bem, produzam relatórios atempados que eles acabam por não ler (várias vezes o pudemos constatar), cumpram os preceitos internacionais da boa contabilidade, em vez de privilegiar as acções nas tabancas e a obtenção de resultados mobilizadores para outras comunidades. O voluntarismo e a entrega ao trabalho não devem ser confundidas com amadorismo, falta de rigor e irresponsabilidade.
Fica-se sem saber quem afinal está a ver o filme ao contrário. Eles ou nós?
Outra das preocupações a ter em conta e assinaladas em relatórios anteriores, é o do perigo de concentrar as nossas parcerias num só ou num número muito reduzido de organizações financiadoras. As múltiplas parcerias embora tenham o inconveniente de exigirem muito mais trabalho da AD (relatórios, notas verbais, respostas a questões) garantem uma autonomia de discussão e decisão em relação às nossas opções e escolhas.
Não é independente quem quer, mas sim quem pode. Por isso impõe-se que a AD procure noutros azimutes novas parcerias que a façam conservar a capacidade de execução dos programas que ela própria definiu e não as que outros julgam, pela lei do dinheiro, deverem ser as nossas.
Finalmente, interessa à AD empenhar-se mais na vida da PLACON-GB, a atravessar um dos períodos mais delicados da sua existência a necessitar de rever funções, formas de representatividade, procedimentos e compromissos políticos.
A PLACON-GB deve promover a cooperação e solidariedade entre as ONG e não comportar-se também ela como uma ONG, apoiando umas e penalizando outras. Deve ser o rosto das posições de luta pela unidade nacional e desenvolvimento, combatendo de forma firme e intransigente a corrupção, o narcotráfico e o tribalismo, pautando as suas posições pelos interesses exclusivos das comunidades locais e não das dos partidos políticos e promovendo a democracia, justiça social e desenvolvimento solidário, nunca se esquecendo que quem reclama a democracia aos outros deve praticá-la primeiramente em casa.
Segundo os países, a situação das parcerias da AD em 2007 apresentaram-se da seguinte forma:
a) HOLANDA
A ICCO iniciou um processo de descentralização, devendo criar uma delegação na África Ocidental que ninguém sabe como funcionará na prática e que será ela no futuro a aprovar os projectos. Custa-nos a compreender como é que uma comissão constituída por 9 elementos provenientes de outros tantos países que dominam o francês e o inglês e só 1 o português, poderão avaliar a pertinência e interesse de projectos apresentados por ONG guineenses. Parece ser a fórmula mais inteligente de excluir a Guiné-Bissau de futuras parcerias, isto para quem já tanto tentou por outras formas sair do nosso país.
O projecto de 3 anos, no valor de 360.000 euros concluir-se-á no final de 2008 não se sabendo quais os mecanismos a accionar para a sua continuidade.
Com a NOVIB Iniciou-se em Abril deste ano um projecto que se prolongará até Dezembro de 2009, no valor de 277.000 euros. Trata-se de desenvolver o processo de implantação de rádios comunitárias em todo o país, a criação das primeiras televisões comunitárias e o funcionamento de uma Rede de órgãos de comunicação comunitária que promova a cooperação entre eles e a sua afirmação nacional.
b) PORTUGAL
Com o Instituto Marquês Valle Flor (IMVF) prosseguiu a parceria materializada nos seguintes projectos:
- o Projecto Kasumai no valor global de 775.000 euros, concluiu-se em Abril de 2007, depois de 4 anos de excelentes resultados, o que levou o Ministro dos Recursos Naturais a solicitar à Comissão Europeia, cofinanciadora desta iniciativa, a continuação do apoio a este tipo de actividades. Contou com a parceria da ACEP.
- o Projecto Uanam, financiado pela União Europeia por 4 anos, atingiu o seu meio-percurso no final deste ano. Orçado no valor de 748.618 euros, o seu final será em Dezembro de 2009. As acções centram-se à volta do ecoturismo e da infraestruturação de apoio a este programa que está a ter muito impacto nas comunidades locais e inclui iniciativas nas áreas da agricultura, comercialização, saúde e ensino ambiental.
- o Projecto Konkobai cofinanciado pela União Europeia no quadro dos programas de segurança alimentar, no valor de 496.918 euros, vai entrar no seu último ano de intervenção (Dezembro de 2008). O maior sucesso foi o da recuperação de bolanhas salgadas na zona de Barro, a distribuição de sementes e pequeno material agrícola, a introdução de carroças de burro, descascadoras de arroz, prensas de óleo e construção de poços.
- o Projecto Woncame cofinanciado pela União Europeia no quadro dos programas de segurança alimentar para Cubucaré e Quitafine, no valor de 547.439 euros, tem a duração de 3 anos e começou em Janeiro de 2007.
O reaproveitamento das bolanhas salgadas, o uso dos bas-fonds para a produção alimentar diversificada e a introdução de unidades de produção de farinha de mandioca foram os aspectos mais marcantes.
- a nossa ONG vai colaborar em 2008 com os projectos apoiados à COAJOQ em Cacheu e à capacitação de ONG nacionais, geridos pelo IMVF.
O Ministério do Trabalho e Segurança Social (MTSS) prosseguiu o apoio à Escola de Artes e Ofícios de Quelele, no domínio da criação de um Curso de Artes Domésticas e Hotelaria (63.000 euros), concluiu-se em 2007 o programa de formação de auxiliares de educadoras de infância (17.000 euros) e do observatório de emprego e apoio à inserção socioprofissional (12.500 euros). A Mutualidade de Crédito de Quelele foi apoiada com um financiamento de 9.876 euros desbloqueados em finais de 2007.
A Escola Superior de Educação de Leiria apoiou a realização de um curso de energia solar em S. Domingos, contribuiu para a reflexão sobre os objectivos e funcionamento do futuro Centro de Aprendizagem Rural de Guiledje e apoiou o site da AD e criação do site do Simpósio de Guiledje.
Com o CIATE (Centro Integral de Adestramento Tecno-Electrónico), prosseguiu o apoio conceptual e de formulação dos currículos dos cursos de electricidade e electrónica, em particular a reformulação do programa e das instalações das aulas práticas do curso de electricidade.
Com a Câmara Municipal do Montijo decorreu uma breve cooperação através de 4 jovens que estiveram na sede do PAN durante 6 meses colaborando com o Cenfor, a Ludoteca, o jornal comunitário e a animação cultural. Este tipo de colaboração, para ter sucesso, exige que sejam atempadamente definidas os termos de referência de cada voluntário, as regras e modalidades da sua integração nas estruturas da AD, a produção de relatórios e propostas de actividades e as responsabilidades hierárquicas a observar.
A parceria iniciada com a TESE através do projecto ambiental de “Promoção do acesso a fontes de energia moderna na Guiné-Bissau” que visava o uso do gás em substituição da lenha e carvão, aprovado pela Comissão Europeia no valor de 1.678.974 euros acabou por ser anulado pela AD pelas fundadas divergências com a GALP, um dos parceiros do projecto, associadas a uma falta de confiança profissional.
c) ESPANHA
O Ayuntamiento de Elx continuou pelo oitavo ano a sua colaboração a nível de S. Domingos, tendo em 2007 sido recebidos 6.200 euros para a realização de cursos no CENFOR, para o funcionamento da Ludoteca e para o inicio do programa de alfabetização.
Com o IEPALA concluiu-se em Fevereiro o projecto de 3 anos, no valor de 58.974 Euros, que se saldou por resultados muito positivos na diversificação agrícola no sector de S.Domingos. Iniciou-se com esta ONG a formulação de um projecto de criação de uma Rede das Escolas de Verificação Ambiental que poderá eventualmente ser aprovado ainda em 2008.
d) BÉLGICA
Com a Solidarité Socialiste, o projecto de Reforço do Movimento Associativo Rural do Norte, entrou no seu quinto e último ano (conclusão em Abril de 2008) com um financiamento para 2007 de 38.940 Euros. A fileira óleo de palma está lançada e a metodologia para a legalização da Rádio Kasumai poderá servir de referência para as outras Rádios Comunitárias.
Iniciou-se a reflexão para a elaboração de um novo projecto de 3 anos no sul do país de apoio às associações de base, em colaboração com 3 outras ONG guineenses (AIFA, ADIM e NIMBA) e integrada numa rede subregional de parcerias com outras ONG dos países vizinhos.
e) ITÁLIA
Com a ONG AIN (Associazione Interpreti Naturalistici) iniciou-se em 2007 a execução do projecto “ECO-GUINÉ”, no valor de 4.455 Euros, que tem uma componente de formação de guias de ecoturismo e gestores de unidades locais de prestação de serviços, assim como a identificação de percursos naturais. A zona de intervenção é Cantanhez e Dulombi, esta última com a ONG guineense APRODEL.
f) Organizações estrangeiras sedeadas em Bissau
A parceria com o Fundo Canadiano de Iniciativas Locais (FCIL) traduziu-se no financiamento da construção das novas instalações da Rádio Balafon em Ingoré, com uma contribuição de 20.837 euros.
g) Organizações Internacionais
A União Europeia é o maior parceiro da AD, cofinanciando grande parte dos nossos projectos e dispondo de há 2 anos a esta parte interlocutores que acompanham os projectos e que mostram uma grande disponibilidade na prestação de informações e serviços às ONG. Este ano a União Europeia cofinanciou cinco projectos: Kasumai, PISAC, Uanam, Konkobai e a Doação Global com o IEPALA.
A UICN tem continuado a desempenhar um papel notável nas pontes que proporciona com outras instituições nacionais e estrangeiras, governo, ONG, institutos, financiadores e agencias ambientais, o que facilita e desbloqueia grande número de casos que ocorrem nas nossas zonas de intervenção e propícia à AD uma melhor procura de financiamentos para projectos de desenvolvimento-ambiente.
O PAM foi um parceiro activo e pontual no apoio aos projectos de “comida contra trabalho” em especial no aproveitamento dos pequenos vales interiores do sector de Cubucaré para a produção de batata-doce, mandioca e feijão mancanha e na recuperação de bolanhas para a orizicultura.
h) Individualidades
Para a nossa ONG a colaboração voluntária de pessoas que o fazem a título individual, tem um profundo significado solidário que inculca em todos quantos trabalham na AD valores de referência e comportamento.
Este ano gostaríamos de destacar:
- o sociólogo Luís Graça, coordenador do Blogue Luís Graça e Camaradas da Guiné, que tem trazido para o seio da AD muitos camaradas que para além de se interessarem pela recuperação da memória histórica antes da independência, se propõem colaborar com as iniciativas de hoje. O seu envolvimento na promoção do Simpósio de Guiledje é decisivo para o seu êxito.
- O professor belga Hubert Lelotte, grande entusiasta do ensino ambiental e que está na origem das Escolas de Verificação Ambiental e das Reservas Educativas prosseguiu o seu apoio à AD numa segunda formação dos guias ecoturísticos de Cantanhez e produzindo o jornal mensal de ligação entre ele e os guias, intitulado “Partilha” e do qual foram publicados até Dezembro de 2007, 39 números.
- Os médicos cubanos sedeados em S. Domingos, Doutores Alexandro e José, deram uma contribuição notável no Centro Materno- Infantil de Djufunco, consultando para além das mulheres grávidas cerca de 350 doentes por mês, emprestando a sua competência e dedicação para a melhoria das condições de saúde numa zona do país que nunca tinha tido acesso a um médico.
- o realizador Adrezej Kowalski, pioneiro das televisões comunitárias na Guiné-Bissau (TVK e TVB), formou jovens do sul do país para dominarem as técnicas de filmagem e montagem dos programas da primeira televisão comunitária africana que começou a emitir através de ondas hertzianas em Novembro de 2007.
- o jornalista Assimo Baldé contribuiu igualmente para que a TV Massar de Iemberém fosse uma realidade, formando os jovens jornalistas nas técnicas de preparação de notícias, condução de entrevistas e direcção de debates.
- o historiador Leopoldo Amado colaborou de forma marcante na concepção temática do Simpósio Internacional de Guiledje, contribuindo para a sua qualidade e impacto académico.
- como sempre o professor Filipe Santos, da Escola Superior de Leiria, mantém uma colaboração no site da AD e na criação do site de Guiledje.
Para todos eles, a certeza que a AD os tem como referência moral e bebe no seu exemplo para encontrar a coragem e capacidade de ir em frente.
Bissau, Junho de 2008
__________
Nota de L.G.:
(*) Vd. postes anteriores:
7 de Agosto de 2008 > Guiné 63/74 - P3118: Ser solidário (14): ONG AD: Relatório de actividades de 2007 - Parte I: A segurança alimentar
8 de Agosto de 2008 > Guiné 63/74 - P3121: Ser solidário (15): ONG AD - Relatório de actividades de 2007 - Parte II: Luta contra a fome, ecoturismo e TV comunitárias
8 de Agosto de 2008 > Guiné 63/74 - P3122: Ser solidário (16): ONG AD - Parte III: Trabalho feito, com destaque para a realização do Simpósio Internacional de Guileje
sexta-feira, 8 de agosto de 2008
Guiné 63/74 - P3122: Ser solidário (16): ONG AD - Parte III: Trabalho feito, com destaque para a realização do Simpósio Internacional de Guileje
Guiné-Bissau > Região de Tombali > Iemberém > Visita dos participantes do Simpósio Internacional de Guileje > 2 de Março de 2008 > As instalações da televisão comunitária Massar. Na foto, a Maria Alice, esposa do editor do nosso blogue, Luís Graça. Massar, em dialecto nalu, quer dizer estrela. Do logótipo da TV Massar faz parte o mítico Nhinte-Camatchol.
Foto: © Luís Graça (2008). Direitos reservados.
A televisão TVMassar está a emitir em ondas hertzianas, desde Novembro de 2007, para todo o sector de Cubucaré.
Com um forte envolvimento da comunidade local que confeccionou adobes, forneceu material local (areia, pedra e cascalho, cibes para a cobertura) e mão-de-obra (pedreiros e carpinteiros), construiu-se este edifício onde uma equipa de oito jovens prepara os programas diários que podem ser vistos nas tabancas do sector.
A uma rede de 7 televisores instalados em outras tantas Escolas de Verificação Ambiental, assim como alguns televisores privados, permitem a visão colectiva das emissões da TVM.
Foto: © Luís Graça (2008). Direitos reservados.
A televisão TVMassar está a emitir em ondas hertzianas, desde Novembro de 2007, para todo o sector de Cubucaré.
Com um forte envolvimento da comunidade local que confeccionou adobes, forneceu material local (areia, pedra e cascalho, cibes para a cobertura) e mão-de-obra (pedreiros e carpinteiros), construiu-se este edifício onde uma equipa de oito jovens prepara os programas diários que podem ser vistos nas tabancas do sector.
A uma rede de 7 televisores instalados em outras tantas Escolas de Verificação Ambiental, assim como alguns televisores privados, permitem a visão colectiva das emissões da TVM.
Guiné-Bissau > AD- Acção para o Desenvolvimento > Foto da Semana > 27 de Janeiro de 2008
Dentro de um ano e meio a zona norte do país vai passar a beneficiar da Ponte de S.Vicente, sobre o rio Cacheu, o que encurtará a distância entre Bissau e Ziguinchor, segunda cidade do Senegal.
Tudo indica que a cidade de S. Domingos cresça rapidamente e possa assumir-se como a segunda cidade do país, especialmente como entreposto de produtos nesta subregião africana. Os mercados da Gambia e Senegal são excelentes oportunidades de negócio para os nossos operadores comerciais.
Daí que o Centro de Formação Rural (CENFOR) de S.Domingos esteja a incrementar um importante programa de formação profissional (serralharia, marcenaria, informática, etc.) para permitir aos jovens aceder ao mercado de trabalho especializado.
Guiné-Bissau > AD - ACção para o Desenvolvimento > Foto da Semana > 24 de Fevereiro de 2008
Jovens balantas de Cafine participam na festa da cerimónia de entrada no fanado, isto é, o acto de iniciação para a vida adulta.
Na zona de Cantanhez, várias etnias convivem amigável e solidariamente, gerindo os recursos naturais, cooperando a nível de diversas associações de agricultores, de jovens, de mulheres e de pescadores, bem como apreciando as culturas de cada uma delas.
Para além dos chamados “donos do chão”, os nalús, conhecidos pela sua escultura de rara beleza, estão presentes os balantas, notáveis orizicultores de bolanha salgada, os fulas, mestres na arte da palavra, os djacancas, profundos conhecedores da religião muçulmana, os tandas, minoria proveniente da Guiné-Conakry, os sossos, especialistas na fruticultura e agricultores de outras etnias.
Guiné-Bissau > AD - Acção para o Desenvolvimento > Foto da Semana > 30 de Março de 2008
Numa das zonas mais isoladas da Guiné-Bissau, no litoral norte, na baía de Varela, onde a terra acaba e o mar começa, foi construída por iniciativa da comunidade local a Escola de Verificação Ambiental de Djufunco.
A funcionar desde Outubro de 2007, esta escola acolhe uma centena de alunos da primeira à quarta classe, que para além de se defrontarem com o isolamento geográfico (nenhuma estrada digna desse nome existe para lá chegar), não tem acesso a material escolar elementar.
Graças ao apoio da Câmara Municipal de Coimbra, um lote de material de excelente qualidade foi oferecido às crianças, pela Caravana que este mês veio de carro até à Guiné-Bissau, alguns deles para participar também no Simpósio Internacional de Guiledje.
Fotos e legendas: Cortesia de: © AD- Acção para o Desenvolvimento (2008). Direitos reservados.
Continuação publicação do relatório de actividades de 2007, da ONG AD - Acção para o Desenvolvimento, com quem mantemos desde finais de 2005 uma relação, franca, aberta, privilegiada, de cooperação, tendo como pretexto inicial o Projecto Guileje que deu origem, entre outras iniciativas que tiveram o nosso apoio, à realização do Simpósio Internacional de Guileje (Bissau, 1 a 7 de Março de 2008), e que abriu portas a outras iniciativas mais recentes, como por exemplo a recolha de sementes.
AD -Acção para o Desenvolvimento: Relatório de actividades de 2007 > Parte III
Revisão e fixação de texto: L.G. (Não se reproduzem, por razões técnicas e de economia de meios, as fotos do relatório original, divulgado em formato pdf, no sítio da AD).
C. Os Programas Regionais da AD
Em 2007, a AD regressou ao seu “formato” original desenvolvendo programas nas suas 3 zonas de intervenção, sendo duas rurais (Cubucaré-Quitafine e S.Domingos-Bigene) e uma urbana (bairro de Quelele).
1 - Programa de Apoio aos Agrupamentos do Norte (PAN)
As acções mais importantes neste ano foram as seguintes:
a) Conhecimento dos Circuitos Comerciais
O incremento da produção agrícola tanto a comercial como a destinada ao autoconsumo, impõe a existência de uma rede comercial de mercados que equilibrem a procura local de alimentos e dinamizem a venda exterior dos excedentes. A importância dos circuitos comerciais é tanto maior quanto próxima dos países vizinhos, potenciais compradores de todos os produtos agrícolas que lhes faltam. O Senegal e a Gâmbia estão neste caso, se tivermos em conta as suas condições edafoclimáticas que as fazem aproximar-se muito do deserto.
Em 2007, um trabalho dirigido por Ba Mody, aprofundou o conhecimento dos mercados locais, do volume de negócios, do tipo de procura senegalesa, da importância do mercado subregional de Djaobé, no Senegal, assim como os constrangimentos à comercialização nos sectores de S. Domingos e Bigene.
Foram estudados os lumus de Bigene, com um número médio de actores de 800 pessoas durante a época seca, contra 350 na época das chuvas; o lumu de Ingoré varia de 300 a 500, enquanto o de Sedengal de 600 a 400. O lumu de S. Domingos é o maior de todos com uma média de 3.000 pessoas.
Para se ter uma ideia do volume médio dos negócios realizados num dia nestes lumus por um retalhista ele situa-se entre 2.000 a 4.000 Cfa em produtos agrícolas alimentares (arroz, milho, feijão, batata-doce), 4.000 a 8.000 Cfa em géneros alimentícios (açúcar, óleo, sal) e 10.000 a 30.000 Cfa em produtos manufacturados (tecidos, utensílios). Como a maioria das retalhistas vendem produtos agrícolas, com fraco volume de negócios, as margens de lucro são muito pequenas, situando-se à volta de 500 a 1.000 Cfa por dia.
Assiste-se a uma forte procura senegalesa de produtos brutos guineenses, praticando preços compensadores, mas dominando eles todos os circuitos comerciais (operadores, transporte, clientes e conivências aduaneiras, fiscais e policiais). Por vezes, como em Varela, essencialmente um mercado de peixe, são maioritariamente os pescadores senegaleses, cerca de 150 para 50 canoas diárias, que dominam a actividade, abastecendo de peixe fresco a zona turística de Cap Skiring.
O fluxo de produtos para o Senegal comporta dois circuitos: um que vai do local de produção directamente para o Senegal, caso do peixe fresco e fumado, e outro circuito que passa por S. Domingos (óleo de palma, vinho de palma, frutos silvestres, vassouras) sendo que este último constitui o principal motor de transacções do sector.
Já o fluxo de produtos do sector de S. Domingos para Bissau e Bula, centra-se no mango fora-de-estação (Setembro-Outubro), carvão, sal e peixe fumado, muito menos intenso que para o Senegal, uma vez que os preços praticados naqueles mercados são menos atraentes e a distância é muito maior, tanto mais que tem uma jangada de funcionamento imprevisível.
Já no sentido inverso, os produtos provenientes do Senegal, Gâmbia e Guiné-Conakry são manufacturados, registando-se uma excepção em relação ao mercado grossista de Bigene que recebe uma média semanal de 50 porcos.
Outro produto que vem de fora é o sal. De registar que os lumus do lado da Guiné-Bissau são generalistas, embora o de Cassolol se especialize mais em
vinho de palma e o de Bigene em porcos.
Se tivermos em conta os produtos agrícolas e florestais, o cenário apresenta-se da seguinte forma:
- óleo de palma: é começado a vender de Outubro a Fevereiro, época baixa, com volumes variando entre os 5.000 e os 7.000 litros mensais. Entre Março e Julho o valor situa-se nos 15.000 litros por mês;
- fole: entre Julho e Setembro a oferta situa-se entre as 150 e 225 toneladas mensais;
- vinho de palma: entre Agosto e Novembro, época alta, a média mensal de exportação para o Senegal é de 50.000 litros;
- cabaceira: é um produto de fraca oferta em que, de Dezembro a Fevereiro, a oferta se situa entre as 2,5 a 5 toneladas por mês;
- vassouras: não se tendo conseguido registar a quantidade exportada, ela incide sobretudo nos meses de Outubro a Junho.
O incremento da produção agrícola nesta zona fronteiriça passa pela:
- criação de infraestruturas de comercialização (tradicionais e modernas), tais como os lumus que a AD vem promovendo em Elia, Cassolol e Suzana, assim como os mercados comunitários de Ingoré (concluído em 2007) e S. Domingos (previsto para o final de 2008);
- maior integração no mercado subregional de Diaobé, no Senegal, maior entroncamento comercial da costa ocidental africana;
- limitação dos constrangimentos à comercialização nestes dois sectores geográficos, em especial na luta contra a falta de cultura comercial e de estratégia de comercialização, a fraca capacidade de produção e consequente dificuldade em controlar a oferta, no desencravamento dos lumus, nos abusos de que os comerciantes são vítimas pelas taxações dos serviços florestais guineenses e senegaleses.
b) Dinamização da Produção Agrícola
Várias actividades foram incrementadas durante este ano, sendo de realçar:
- o programa de reaproveitamento das bolanhas salgadas do sector de Bigene, que haviam sido abandonadas há muitos anos atrás, tendo sido beneficiadas 8 tabancas que irão permitir dentro de poucos anos a cultura de arroz numa área estimada em cerca de 1.000 ha;
- perto de Barro foram apoiadas acções em 3 tabancas para a melhoria da gestão de água em bolanhas de “bas-fonds”, representando uma área de 80 ha para a produção imediata de arroz;
- foram distribuídas 7 toneladas de sementes de arroz das variedades Cablak e Banimalu, impondo-se urgentemente a criação de uma rede local de agricultores-multiplicadores de semente para assegurar uma maior segurança local de produção. Acresce o fornecimento de 100 Kg de feijão mancanha, na forma de minikits, e de estacas de mandioca a 19 tabancas;
- apoiaram-se 42 tabancas (30 em Bigene e 12 em S. Domingos) para a produção hortícola e fruticultores de 10 tabancas, com sementes, propágulos e pequeno material hortícola e frutícola.
- foram instaladas 2 descascadoras de arroz, uma moageira de milho, 23 prensas de óleo de palma, 10 carroças de tracção animal.
c) Outras Actividades
- construção de 3 Escolas de Verificação Ambiental (EVA) em Nhambalan, Djufunco e Elala;
- 11 poços de água em outras tantas tabancas do sector de Bigene;
- alargamento das instalações de carpintaria do Centro de Formação Rural de S. Domingos (CENFOR) e reforço dos programas de formação profissionalizante (serralharia, carpintaria e informática) e comunitária (descascadoras de arroz, fabrico de sabão, tinturaria);
- construção do edifício da Rádio Comunitária Balafon de Ingoré, com afectação de melhores meios de trabalho, cuja conclusão está prevista para o final do primeiro trimestre de 2008;
- apoio à equipa médica de oftalmologia da ONG ANAWIN que em Setembro realizou numerosas operações às cataratas e tracomas;
- dinamização da assistência médica ao Centro Materno-Infantil de Djufunco, assegurada pela colaboração voluntária da equipa médica cubana
sedeada em S. Domingos;
- apoio à Associação dos Afilhados de Elx e à sua ludoteca;
- assistência para a elaboração dos estatutos e legalização da Rádio Kasumai.
2 – Desenvolvimento Urbano de Quelele
As acções mais importantes em 2007 no bairro de Quelele centraram-se na Escola de Artes e Ofícios sendo de assinalar:
3.1. Melhoria de funcionamento dos cursos: adequação de planos curriculares e dos sistemas de avaliação
a) Educadores de Infância: foram introduzidas 2 novas disciplinas (linguagem e iniciação à Matemática), com o objectivo de facilitar a identificação e selecção de jogos e materiais para melhorar o desenvolvimento linguístico e cognitivo de crianças. Foi implementado um sistema de estágio organizado e acompanhado, com a duração de 160 horas repartido em 2 meses, destinado a promover o contacto com os potenciais empregadores, alargar possibilidades de emprego e atribuir uma ligação entre as vertentes teórico-práticas do curso;
b) Electrónica: na disciplina de gestão de pequenos negócios, foram introduzidas as componentes de “técnicas de elaboração de orçamentos” e “apresentação de um diagnóstico de avaria”.
Alterou-se o sistema avaliativo com o objectivo de valorizar os trabalhos práticos realizados em laboratório, assim como os testes escritos passaram a ter um peso de 70% na avaliação, contra os 100% dos anos anteriores. Introduziu-se um sistema de estágio com a empresa Areeba, tendo estagiado 5 formandos dos quais 1 conseguiu emprego.
3.2. Contribuição da EAO na melhoria de funcionamento de outras Instituições
A Escola Popular Aruna Embalo, pela primeira vez, introduziu no seu sistema educativo o nível de educação pré-escolar, contando com a participação de 5 formandas da EAO na área de educadoras de infância, apoiando ainda no programa de educação infantil.
3.3. Cursos realizados
a) Cursos Profissionalizantes
- Electrónica: foram organizados 2 cursos (de 30 alunos cada, todos do sexo masculino). Registou-se uma redução da taxa de desistência de 55% para 39% entre 2006 e 2007, a que correspondeu um aumento do número de finalistas de 13 para 20 alunos (45% e 61% respectivamente);
- Auxiliares de Educadores de Infância: foi organizado 1 curso de 3 turmas com 69 formandas, todas do sexo feminino, tendo desistido apenas 3, equivalente a 6%. O novo formato do curso, com mais aulas práticas do que teóricas e um sistema de estágios acompanhados, permitiu a redução de desistências em 10% de 2006 para 2007;
- Instalações Eléctricas: iniciaram-se cursos em novos moldes e novo formato. Se anteriormente os cursos comportavam 340 horas repartidas em 5 meses, agora passaram a ser ministrados em 3,5 meses com uma carga horária de 134 horas. Os materiais e equipamentos para as aulas práticas foram alterados e adaptados, isto é, cada aluno passou a ter uma bancada individual ao invés de bancadas e quadros colectivos. Foram organizados 3 cursos, dos quais 2 já terminaram, tendo-se inscrito 27 alunos todos do sexo masculino e chegado ao fim, devido a viagem ao estrangeiro;
- Informática: os cursos passaram de 4 em 2006 para 4,5 em 2007, tendo havido um acréscimo de 11% de alunos inscritos, isto é passaram de 488 em 2006 para 495 alunos, sendo 275 rapazes e 220 raparigas.
Concluíram os cursos este ano 84% dos inscritos contra 95% em 2006, sendo que as razões apontadas estão a falta de pagamento, deslocações e viagens para o exterior e oportunidades de emprego entretanto surgidas. Para 2008 vaise implementar o sistema de pagamento único logo na inscrição.
- Painéis Solares: em colaboração com o CENFOR, realizaram-se 2 cursos de instalação e reparação de painéis solares, com o objectivo de
dispor de técnicos qualificados que garantam a difusão deste tipo de energia alternativa. Foram formados 11 técnicos.
b) Cursos Comunitários: foram realizados 2 cursos de tinturaria para 18 jovens raparigas, com a duração de 45 horas (1 mês e meio).
3.4. Construção da Escola de Artes Domésticas e Hotelaria
Em Dezembro de 2007, foi iniciado o processo de legalização do terreno junto da EAO e construção da nova Escola de Artes Domésticas e Hotelaria, destinada a formar jovens quadros capazes de se integrarem no processo de crescimento do turismo na Guiné-Bissau e satisfazer as ambições de outros de melhoria da qualidade de vida familiar.
3 - Programa Integrado de Cubucaré (PIC)
As acções mais importantes neste ano foram as seguintes:
a) Preparação do Simpósio Internacional de Guiledje
A organização deste Simpósio teve início dois anos antes da sua efectivação, factor determinante para que a sua preparação tenha sido preparada em todos os seus pormenores e detalhes. Ocupou a preocupação central de todos os quadros do PIC que fizeram um excelente trabalho logístico para a recepção aos participantes, de animação e enquadramento dos diversos grupos locais e comunidades que se envolveram nos programas de reabilitação dos antigos quartéis de Guiledje e Gandembel, na preparação dos programas culturais e na finalização da construção das infraestruturas de acolhimento.
Por outro lado, um trabalho lento e gradual de sensibilização de todos os participantes do exterior, portugueses, cubanos, caboverdianos e de outros países europeus, foi desenvolvido, levando especialmente os antigos militares portugueses que estiveram na Guiné e intelectuais e professores universitários a irem-se interessando cada vez mais pelo Simpósio e a considerarem-no como também seu.
O site de Guiledje gerido pela AD foi um momento alto dessa comunicação com os participantes, sendo de realçar a participação notável e determinante do Blogue “Luís Graça e os Camaradas da Guiné”, que promoveu o Simpósio como ninguém, chegando ao ponto de se antecipar ao site de Guiledje na publicação de informações frescas. Igualmente a participação activa da Fundação Mário Soares, através do Arquivo Amílcar Cabral, foi decisiva para a qualidade do conteúdo do evento.
Curiosamente que foi a nível interno, de Bissau, que o envolvimento dos participantes teve flutuações mais significativas, assistindo-se a uma adesão espontânea e interessada, logo de início dos intelectuais e quadros técnicos guineenses, seguido mais tarde pelos combatentes da liberdade da pátria e só por último das autoridades governativas.
Em termos de financiadores há a destacar o apoio da União Europeia, do Governos português e guineense e do IMVF, obtidos atempadamente e que quase cobriram o orçamento estimado. De notar o envolvimento activo do Ministério dos Negócios Estrangeiros da Guiné-Bissau que foi assegurando apoios fundamentais para o bom sucesso deste encontro.
Um dos pontos mais altos dos preparativos do Simpósio foi o do registo em DVD dos testemunhos dos combatentes guineenses, dos comandantes caboverdianos que participaram em Guiledje e as dos militares portugueses que contribuíram com uma significativa entrega de documentos históricos pessoais e de instituições oficiais. Durante este período foi-se conseguindo obter um arquivo de qualidade que irá enriquecer o futuro Museu de Guiledje com fotografias, filmes de 8mm, objectos de recordações e livros de unidade.
b) Dinamização agrícola
Em 2007 foram dinamizadas as seguintes acções de apoio aos pequenos agricultores dos sectores de Cubucaré e de Quitafine:
- apoiaram-se 7 tabancas para a reabilitação de bolanhas salgadas abandonadas ou destruídas pela força das marés e subida do nível médio das águas do mar, através do fornecimento de tubos de drenagem e reconstrução de diques atingidos, o que representa o aproveitamento de cerca de 500 ha potenciais para a cultura do arroz;
- 8 tabancas beneficiaram de apoio para o aproveitamento dos pequenos vales interiores para a cultura de arroz na época das chuvas e de batata-doce e legumes na época seca;
- para a diversificação de culturas foram distribuídas sementes de feijão mancanha (168 kg) e propágulos de batata-doce e mandioca;
- foram distribuídos 40 kg de sementes de legumes diversificados a 28 tabancas de ambos os sectores;
- apoiaram-se agrupamentos e fruticultores na criação de 10 viveiros de espécies frutícolas, fornecendo-se apoio técnico e pequeno material de trabalho (catanas, enxadas, sachos e pás);
- introduziram-se 2 descascadoras de arroz, 2 unidades de fabrico de farinha de mandioca, com um sucesso extraordinário, 10 prensas de óleo de palma e 2 unidades manuais para farinhar peixe.
c) Outras actividades
- concluiu-se a construção das Escolas de Verificação Ambiental de Sintchur Caramba e de Cafine;
- construiu-se e inaugurou-se o lumu de Gandembel que teve um começo excelente na troca de mercadorias com a Guiné-Conakry, mas que foi decaindo ao longo do ano fruto da instabilidade política registada naquele país;
- apoiaram-se duas mulheres na construção de 2 casas de restauração, uma em Faro Sadjuma e outra no porto de Canamina, para servirem refeições aos turistas;
- avançou-se bastante na construção dos 3 bungalows na área turística de Iemberém.
_________
Nota de L.G.:
(*) Vd. postes anteriores desta série:
7 de Agosto de 2008 > Guiné 63/74 - P3118: Ser solidário (14): ONG AD: Relatório de actividades de 2007 - Parte I: A segurança alimentar
Dentro de um ano e meio a zona norte do país vai passar a beneficiar da Ponte de S.Vicente, sobre o rio Cacheu, o que encurtará a distância entre Bissau e Ziguinchor, segunda cidade do Senegal.
Tudo indica que a cidade de S. Domingos cresça rapidamente e possa assumir-se como a segunda cidade do país, especialmente como entreposto de produtos nesta subregião africana. Os mercados da Gambia e Senegal são excelentes oportunidades de negócio para os nossos operadores comerciais.
Daí que o Centro de Formação Rural (CENFOR) de S.Domingos esteja a incrementar um importante programa de formação profissional (serralharia, marcenaria, informática, etc.) para permitir aos jovens aceder ao mercado de trabalho especializado.
Guiné-Bissau > AD - ACção para o Desenvolvimento > Foto da Semana > 24 de Fevereiro de 2008
Jovens balantas de Cafine participam na festa da cerimónia de entrada no fanado, isto é, o acto de iniciação para a vida adulta.
Na zona de Cantanhez, várias etnias convivem amigável e solidariamente, gerindo os recursos naturais, cooperando a nível de diversas associações de agricultores, de jovens, de mulheres e de pescadores, bem como apreciando as culturas de cada uma delas.
Para além dos chamados “donos do chão”, os nalús, conhecidos pela sua escultura de rara beleza, estão presentes os balantas, notáveis orizicultores de bolanha salgada, os fulas, mestres na arte da palavra, os djacancas, profundos conhecedores da religião muçulmana, os tandas, minoria proveniente da Guiné-Conakry, os sossos, especialistas na fruticultura e agricultores de outras etnias.
Guiné-Bissau > AD - Acção para o Desenvolvimento > Foto da Semana > 30 de Março de 2008
Numa das zonas mais isoladas da Guiné-Bissau, no litoral norte, na baía de Varela, onde a terra acaba e o mar começa, foi construída por iniciativa da comunidade local a Escola de Verificação Ambiental de Djufunco.
A funcionar desde Outubro de 2007, esta escola acolhe uma centena de alunos da primeira à quarta classe, que para além de se defrontarem com o isolamento geográfico (nenhuma estrada digna desse nome existe para lá chegar), não tem acesso a material escolar elementar.
Graças ao apoio da Câmara Municipal de Coimbra, um lote de material de excelente qualidade foi oferecido às crianças, pela Caravana que este mês veio de carro até à Guiné-Bissau, alguns deles para participar também no Simpósio Internacional de Guiledje.
Fotos e legendas: Cortesia de: © AD- Acção para o Desenvolvimento (2008). Direitos reservados.
Continuação publicação do relatório de actividades de 2007, da ONG AD - Acção para o Desenvolvimento, com quem mantemos desde finais de 2005 uma relação, franca, aberta, privilegiada, de cooperação, tendo como pretexto inicial o Projecto Guileje que deu origem, entre outras iniciativas que tiveram o nosso apoio, à realização do Simpósio Internacional de Guileje (Bissau, 1 a 7 de Março de 2008), e que abriu portas a outras iniciativas mais recentes, como por exemplo a recolha de sementes.
AD -Acção para o Desenvolvimento: Relatório de actividades de 2007 > Parte III
Revisão e fixação de texto: L.G. (Não se reproduzem, por razões técnicas e de economia de meios, as fotos do relatório original, divulgado em formato pdf, no sítio da AD).
C. Os Programas Regionais da AD
Em 2007, a AD regressou ao seu “formato” original desenvolvendo programas nas suas 3 zonas de intervenção, sendo duas rurais (Cubucaré-Quitafine e S.Domingos-Bigene) e uma urbana (bairro de Quelele).
1 - Programa de Apoio aos Agrupamentos do Norte (PAN)
As acções mais importantes neste ano foram as seguintes:
a) Conhecimento dos Circuitos Comerciais
O incremento da produção agrícola tanto a comercial como a destinada ao autoconsumo, impõe a existência de uma rede comercial de mercados que equilibrem a procura local de alimentos e dinamizem a venda exterior dos excedentes. A importância dos circuitos comerciais é tanto maior quanto próxima dos países vizinhos, potenciais compradores de todos os produtos agrícolas que lhes faltam. O Senegal e a Gâmbia estão neste caso, se tivermos em conta as suas condições edafoclimáticas que as fazem aproximar-se muito do deserto.
Em 2007, um trabalho dirigido por Ba Mody, aprofundou o conhecimento dos mercados locais, do volume de negócios, do tipo de procura senegalesa, da importância do mercado subregional de Djaobé, no Senegal, assim como os constrangimentos à comercialização nos sectores de S. Domingos e Bigene.
Foram estudados os lumus de Bigene, com um número médio de actores de 800 pessoas durante a época seca, contra 350 na época das chuvas; o lumu de Ingoré varia de 300 a 500, enquanto o de Sedengal de 600 a 400. O lumu de S. Domingos é o maior de todos com uma média de 3.000 pessoas.
Para se ter uma ideia do volume médio dos negócios realizados num dia nestes lumus por um retalhista ele situa-se entre 2.000 a 4.000 Cfa em produtos agrícolas alimentares (arroz, milho, feijão, batata-doce), 4.000 a 8.000 Cfa em géneros alimentícios (açúcar, óleo, sal) e 10.000 a 30.000 Cfa em produtos manufacturados (tecidos, utensílios). Como a maioria das retalhistas vendem produtos agrícolas, com fraco volume de negócios, as margens de lucro são muito pequenas, situando-se à volta de 500 a 1.000 Cfa por dia.
Assiste-se a uma forte procura senegalesa de produtos brutos guineenses, praticando preços compensadores, mas dominando eles todos os circuitos comerciais (operadores, transporte, clientes e conivências aduaneiras, fiscais e policiais). Por vezes, como em Varela, essencialmente um mercado de peixe, são maioritariamente os pescadores senegaleses, cerca de 150 para 50 canoas diárias, que dominam a actividade, abastecendo de peixe fresco a zona turística de Cap Skiring.
O fluxo de produtos para o Senegal comporta dois circuitos: um que vai do local de produção directamente para o Senegal, caso do peixe fresco e fumado, e outro circuito que passa por S. Domingos (óleo de palma, vinho de palma, frutos silvestres, vassouras) sendo que este último constitui o principal motor de transacções do sector.
Já o fluxo de produtos do sector de S. Domingos para Bissau e Bula, centra-se no mango fora-de-estação (Setembro-Outubro), carvão, sal e peixe fumado, muito menos intenso que para o Senegal, uma vez que os preços praticados naqueles mercados são menos atraentes e a distância é muito maior, tanto mais que tem uma jangada de funcionamento imprevisível.
Já no sentido inverso, os produtos provenientes do Senegal, Gâmbia e Guiné-Conakry são manufacturados, registando-se uma excepção em relação ao mercado grossista de Bigene que recebe uma média semanal de 50 porcos.
Outro produto que vem de fora é o sal. De registar que os lumus do lado da Guiné-Bissau são generalistas, embora o de Cassolol se especialize mais em
vinho de palma e o de Bigene em porcos.
Se tivermos em conta os produtos agrícolas e florestais, o cenário apresenta-se da seguinte forma:
- óleo de palma: é começado a vender de Outubro a Fevereiro, época baixa, com volumes variando entre os 5.000 e os 7.000 litros mensais. Entre Março e Julho o valor situa-se nos 15.000 litros por mês;
- fole: entre Julho e Setembro a oferta situa-se entre as 150 e 225 toneladas mensais;
- vinho de palma: entre Agosto e Novembro, época alta, a média mensal de exportação para o Senegal é de 50.000 litros;
- cabaceira: é um produto de fraca oferta em que, de Dezembro a Fevereiro, a oferta se situa entre as 2,5 a 5 toneladas por mês;
- vassouras: não se tendo conseguido registar a quantidade exportada, ela incide sobretudo nos meses de Outubro a Junho.
O incremento da produção agrícola nesta zona fronteiriça passa pela:
- criação de infraestruturas de comercialização (tradicionais e modernas), tais como os lumus que a AD vem promovendo em Elia, Cassolol e Suzana, assim como os mercados comunitários de Ingoré (concluído em 2007) e S. Domingos (previsto para o final de 2008);
- maior integração no mercado subregional de Diaobé, no Senegal, maior entroncamento comercial da costa ocidental africana;
- limitação dos constrangimentos à comercialização nestes dois sectores geográficos, em especial na luta contra a falta de cultura comercial e de estratégia de comercialização, a fraca capacidade de produção e consequente dificuldade em controlar a oferta, no desencravamento dos lumus, nos abusos de que os comerciantes são vítimas pelas taxações dos serviços florestais guineenses e senegaleses.
b) Dinamização da Produção Agrícola
Várias actividades foram incrementadas durante este ano, sendo de realçar:
- o programa de reaproveitamento das bolanhas salgadas do sector de Bigene, que haviam sido abandonadas há muitos anos atrás, tendo sido beneficiadas 8 tabancas que irão permitir dentro de poucos anos a cultura de arroz numa área estimada em cerca de 1.000 ha;
- perto de Barro foram apoiadas acções em 3 tabancas para a melhoria da gestão de água em bolanhas de “bas-fonds”, representando uma área de 80 ha para a produção imediata de arroz;
- foram distribuídas 7 toneladas de sementes de arroz das variedades Cablak e Banimalu, impondo-se urgentemente a criação de uma rede local de agricultores-multiplicadores de semente para assegurar uma maior segurança local de produção. Acresce o fornecimento de 100 Kg de feijão mancanha, na forma de minikits, e de estacas de mandioca a 19 tabancas;
- apoiaram-se 42 tabancas (30 em Bigene e 12 em S. Domingos) para a produção hortícola e fruticultores de 10 tabancas, com sementes, propágulos e pequeno material hortícola e frutícola.
- foram instaladas 2 descascadoras de arroz, uma moageira de milho, 23 prensas de óleo de palma, 10 carroças de tracção animal.
c) Outras Actividades
- construção de 3 Escolas de Verificação Ambiental (EVA) em Nhambalan, Djufunco e Elala;
- 11 poços de água em outras tantas tabancas do sector de Bigene;
- alargamento das instalações de carpintaria do Centro de Formação Rural de S. Domingos (CENFOR) e reforço dos programas de formação profissionalizante (serralharia, carpintaria e informática) e comunitária (descascadoras de arroz, fabrico de sabão, tinturaria);
- construção do edifício da Rádio Comunitária Balafon de Ingoré, com afectação de melhores meios de trabalho, cuja conclusão está prevista para o final do primeiro trimestre de 2008;
- apoio à equipa médica de oftalmologia da ONG ANAWIN que em Setembro realizou numerosas operações às cataratas e tracomas;
- dinamização da assistência médica ao Centro Materno-Infantil de Djufunco, assegurada pela colaboração voluntária da equipa médica cubana
sedeada em S. Domingos;
- apoio à Associação dos Afilhados de Elx e à sua ludoteca;
- assistência para a elaboração dos estatutos e legalização da Rádio Kasumai.
2 – Desenvolvimento Urbano de Quelele
As acções mais importantes em 2007 no bairro de Quelele centraram-se na Escola de Artes e Ofícios sendo de assinalar:
3.1. Melhoria de funcionamento dos cursos: adequação de planos curriculares e dos sistemas de avaliação
a) Educadores de Infância: foram introduzidas 2 novas disciplinas (linguagem e iniciação à Matemática), com o objectivo de facilitar a identificação e selecção de jogos e materiais para melhorar o desenvolvimento linguístico e cognitivo de crianças. Foi implementado um sistema de estágio organizado e acompanhado, com a duração de 160 horas repartido em 2 meses, destinado a promover o contacto com os potenciais empregadores, alargar possibilidades de emprego e atribuir uma ligação entre as vertentes teórico-práticas do curso;
b) Electrónica: na disciplina de gestão de pequenos negócios, foram introduzidas as componentes de “técnicas de elaboração de orçamentos” e “apresentação de um diagnóstico de avaria”.
Alterou-se o sistema avaliativo com o objectivo de valorizar os trabalhos práticos realizados em laboratório, assim como os testes escritos passaram a ter um peso de 70% na avaliação, contra os 100% dos anos anteriores. Introduziu-se um sistema de estágio com a empresa Areeba, tendo estagiado 5 formandos dos quais 1 conseguiu emprego.
3.2. Contribuição da EAO na melhoria de funcionamento de outras Instituições
A Escola Popular Aruna Embalo, pela primeira vez, introduziu no seu sistema educativo o nível de educação pré-escolar, contando com a participação de 5 formandas da EAO na área de educadoras de infância, apoiando ainda no programa de educação infantil.
3.3. Cursos realizados
a) Cursos Profissionalizantes
- Electrónica: foram organizados 2 cursos (de 30 alunos cada, todos do sexo masculino). Registou-se uma redução da taxa de desistência de 55% para 39% entre 2006 e 2007, a que correspondeu um aumento do número de finalistas de 13 para 20 alunos (45% e 61% respectivamente);
- Auxiliares de Educadores de Infância: foi organizado 1 curso de 3 turmas com 69 formandas, todas do sexo feminino, tendo desistido apenas 3, equivalente a 6%. O novo formato do curso, com mais aulas práticas do que teóricas e um sistema de estágios acompanhados, permitiu a redução de desistências em 10% de 2006 para 2007;
- Instalações Eléctricas: iniciaram-se cursos em novos moldes e novo formato. Se anteriormente os cursos comportavam 340 horas repartidas em 5 meses, agora passaram a ser ministrados em 3,5 meses com uma carga horária de 134 horas. Os materiais e equipamentos para as aulas práticas foram alterados e adaptados, isto é, cada aluno passou a ter uma bancada individual ao invés de bancadas e quadros colectivos. Foram organizados 3 cursos, dos quais 2 já terminaram, tendo-se inscrito 27 alunos todos do sexo masculino e chegado ao fim, devido a viagem ao estrangeiro;
- Informática: os cursos passaram de 4 em 2006 para 4,5 em 2007, tendo havido um acréscimo de 11% de alunos inscritos, isto é passaram de 488 em 2006 para 495 alunos, sendo 275 rapazes e 220 raparigas.
Concluíram os cursos este ano 84% dos inscritos contra 95% em 2006, sendo que as razões apontadas estão a falta de pagamento, deslocações e viagens para o exterior e oportunidades de emprego entretanto surgidas. Para 2008 vaise implementar o sistema de pagamento único logo na inscrição.
- Painéis Solares: em colaboração com o CENFOR, realizaram-se 2 cursos de instalação e reparação de painéis solares, com o objectivo de
dispor de técnicos qualificados que garantam a difusão deste tipo de energia alternativa. Foram formados 11 técnicos.
b) Cursos Comunitários: foram realizados 2 cursos de tinturaria para 18 jovens raparigas, com a duração de 45 horas (1 mês e meio).
3.4. Construção da Escola de Artes Domésticas e Hotelaria
Em Dezembro de 2007, foi iniciado o processo de legalização do terreno junto da EAO e construção da nova Escola de Artes Domésticas e Hotelaria, destinada a formar jovens quadros capazes de se integrarem no processo de crescimento do turismo na Guiné-Bissau e satisfazer as ambições de outros de melhoria da qualidade de vida familiar.
3 - Programa Integrado de Cubucaré (PIC)
As acções mais importantes neste ano foram as seguintes:
a) Preparação do Simpósio Internacional de Guiledje
A organização deste Simpósio teve início dois anos antes da sua efectivação, factor determinante para que a sua preparação tenha sido preparada em todos os seus pormenores e detalhes. Ocupou a preocupação central de todos os quadros do PIC que fizeram um excelente trabalho logístico para a recepção aos participantes, de animação e enquadramento dos diversos grupos locais e comunidades que se envolveram nos programas de reabilitação dos antigos quartéis de Guiledje e Gandembel, na preparação dos programas culturais e na finalização da construção das infraestruturas de acolhimento.
Por outro lado, um trabalho lento e gradual de sensibilização de todos os participantes do exterior, portugueses, cubanos, caboverdianos e de outros países europeus, foi desenvolvido, levando especialmente os antigos militares portugueses que estiveram na Guiné e intelectuais e professores universitários a irem-se interessando cada vez mais pelo Simpósio e a considerarem-no como também seu.
O site de Guiledje gerido pela AD foi um momento alto dessa comunicação com os participantes, sendo de realçar a participação notável e determinante do Blogue “Luís Graça e os Camaradas da Guiné”, que promoveu o Simpósio como ninguém, chegando ao ponto de se antecipar ao site de Guiledje na publicação de informações frescas. Igualmente a participação activa da Fundação Mário Soares, através do Arquivo Amílcar Cabral, foi decisiva para a qualidade do conteúdo do evento.
Curiosamente que foi a nível interno, de Bissau, que o envolvimento dos participantes teve flutuações mais significativas, assistindo-se a uma adesão espontânea e interessada, logo de início dos intelectuais e quadros técnicos guineenses, seguido mais tarde pelos combatentes da liberdade da pátria e só por último das autoridades governativas.
Em termos de financiadores há a destacar o apoio da União Europeia, do Governos português e guineense e do IMVF, obtidos atempadamente e que quase cobriram o orçamento estimado. De notar o envolvimento activo do Ministério dos Negócios Estrangeiros da Guiné-Bissau que foi assegurando apoios fundamentais para o bom sucesso deste encontro.
Um dos pontos mais altos dos preparativos do Simpósio foi o do registo em DVD dos testemunhos dos combatentes guineenses, dos comandantes caboverdianos que participaram em Guiledje e as dos militares portugueses que contribuíram com uma significativa entrega de documentos históricos pessoais e de instituições oficiais. Durante este período foi-se conseguindo obter um arquivo de qualidade que irá enriquecer o futuro Museu de Guiledje com fotografias, filmes de 8mm, objectos de recordações e livros de unidade.
b) Dinamização agrícola
Em 2007 foram dinamizadas as seguintes acções de apoio aos pequenos agricultores dos sectores de Cubucaré e de Quitafine:
- apoiaram-se 7 tabancas para a reabilitação de bolanhas salgadas abandonadas ou destruídas pela força das marés e subida do nível médio das águas do mar, através do fornecimento de tubos de drenagem e reconstrução de diques atingidos, o que representa o aproveitamento de cerca de 500 ha potenciais para a cultura do arroz;
- 8 tabancas beneficiaram de apoio para o aproveitamento dos pequenos vales interiores para a cultura de arroz na época das chuvas e de batata-doce e legumes na época seca;
- para a diversificação de culturas foram distribuídas sementes de feijão mancanha (168 kg) e propágulos de batata-doce e mandioca;
- foram distribuídos 40 kg de sementes de legumes diversificados a 28 tabancas de ambos os sectores;
- apoiaram-se agrupamentos e fruticultores na criação de 10 viveiros de espécies frutícolas, fornecendo-se apoio técnico e pequeno material de trabalho (catanas, enxadas, sachos e pás);
- introduziram-se 2 descascadoras de arroz, 2 unidades de fabrico de farinha de mandioca, com um sucesso extraordinário, 10 prensas de óleo de palma e 2 unidades manuais para farinhar peixe.
c) Outras actividades
- concluiu-se a construção das Escolas de Verificação Ambiental de Sintchur Caramba e de Cafine;
- construiu-se e inaugurou-se o lumu de Gandembel que teve um começo excelente na troca de mercadorias com a Guiné-Conakry, mas que foi decaindo ao longo do ano fruto da instabilidade política registada naquele país;
- apoiaram-se duas mulheres na construção de 2 casas de restauração, uma em Faro Sadjuma e outra no porto de Canamina, para servirem refeições aos turistas;
- avançou-se bastante na construção dos 3 bungalows na área turística de Iemberém.
_________
Nota de L.G.:
(*) Vd. postes anteriores desta série:
7 de Agosto de 2008 > Guiné 63/74 - P3118: Ser solidário (14): ONG AD: Relatório de actividades de 2007 - Parte I: A segurança alimentar
8 de Agosto de 2008 > Guiné 63/74 - P3121: Ser solidário (15): ONG AD - Relatório de actividades de 2007 - Parte II: Luta contra a fome, ecoturismo e TV comunitárias
Guiné 63/74 - P3121: Ser solidário (15): ONG AD - Relatório de actividades de 2007 - Parte II: Luta contra a fome, ecoturismo e TV comunitárias
São Martinho do Porto > Estrada do Facho > 7 de Agosto de 2008 > Casa de verão de Carla Schwarz da Silva, mãe do nosso amigo Carlos Schwarz (Pepito). Em cima, uma vista fabulosa da baía de São Martinho do Porto, a partir da janela do quarto do Pepito e da Isabel. A meio, o Pepito e a mãe. Em baixo, o editor do blogue, Luís Graça, e a Isabel Levy Ribeiro, esposa do Pepito. A casa, cuja construção remonta ao ínício dos anos 30, é uma das mais antigas daquela fantástica estância de veraneio, pertencente ao concelho de Alcobaça. O pai do Pepito exerceu advocacia em Alcobaça e Porto de Mós, nos anos 40, antes de ir para a Guiné, com a família, em 1949.
Fotos: © Luís Graça (2008). Todos os direitos reservados.
São Martinho do Porto > Estrada do Facho > Casa de Clara Schwarz da Silva, 93 anos, viúva de Artur Augusto da Silva (1912-1983), e mãe de Carlos, Henrique e João Schwarz. O Carlos (Pepito), que vive em Bissau, e é membro da nossa Tabanca Grande, é o mais novo dos filhos. Neste vídeo, o João Graça toca, no seu violino, uma peça (nova) de música klezmer. A velha senhora, filha de pai polaco, engenheiro de minas, e de um russa, pianista, teve uma esmerada educação, que passou pelo Curso de Direito (onde conheceu o pai do Pepito) e o curso de violino do Conversatório Nacional de Música, de Lisboa.
A mãe do Pepito ficou muito sensibilizada com o gesto do João que fez questão de a conhecer pessoalmente e tocar para ela e para o resto da família Schwarz algumas peças da música klezmer, incluindo o Bulgar de Odessa, cidade onde os seus pais se casaram antes da revolução russa de 1917.
A mãe do Pepito ficou muito sensibilizada com o gesto do João que fez questão de a conhecer pessoalmente e tocar para ela e para o resto da família Schwarz algumas peças da música klezmer, incluindo o Bulgar de Odessa, cidade onde os seus pais se casaram antes da revolução russa de 1917.
Foi um privilégio, para mim, para o João e para a Alice, usufruir da hospitalidade dos Schwarz e conhecer, pessoalmente, a matriarca da família, senhora que atravessou um século e tem uma memória, uma cultura e uma vitalidade prodigiosas... Dos presentes no almoço (e neste simpatiquíssimo convívio que se prolongou até tarde ao fim da tarde), há ainda a registar a mãe da Isabel, além do Ivan e da esposa (que têm um lindo bebé de 2 meses) e do Mário, amigo comum.
Vídeo (1' 42'') : © Luís Graça (2008). Direitos reservados. Vídeo alojados em: You Tube >Nhabijoes.
Guiné-Bissau > AD - Acção para o Desenvolvimento > Foto da semana > 8 de Junho de 2008
A criação de infraestruturas rurais de apoio à comercialização de produtos agrícolas pode contribuir de forma importante para a segurança alimentar local, equilibrando a procura e oferta entre as comunidades das diferentes zonas do sector de S.Domingos. Daí que a construção do novo Mercado Comunitário de S.Domingos se enquadre na anterior criação dos lumus (mercados semanais) de Elia, Cassolol, Suzana e Varela, que provaram ser centros de dinamização da produção de batata-doce e óleo de palma. Armindo Sanha, Pedro Cuma, Mamadu Seidi, Ensu da Costa, Luís Djedjú e Quintino Bidan, são alunos da Faculdade de Medicina da Guiné-Bissau a estudar na cidade de S.Domingos e que decidiram contribuir com uma jornada de trabalho voluntário para a construção deste Mercado.
Vídeo (1' 42'') : © Luís Graça (2008). Direitos reservados. Vídeo alojados em: You Tube >Nhabijoes.
Guiné-Bissau > AD - Acção para o Desenvolvimento > Foto da semana > 8 de Junho de 2008
A criação de infraestruturas rurais de apoio à comercialização de produtos agrícolas pode contribuir de forma importante para a segurança alimentar local, equilibrando a procura e oferta entre as comunidades das diferentes zonas do sector de S.Domingos. Daí que a construção do novo Mercado Comunitário de S.Domingos se enquadre na anterior criação dos lumus (mercados semanais) de Elia, Cassolol, Suzana e Varela, que provaram ser centros de dinamização da produção de batata-doce e óleo de palma. Armindo Sanha, Pedro Cuma, Mamadu Seidi, Ensu da Costa, Luís Djedjú e Quintino Bidan, são alunos da Faculdade de Medicina da Guiné-Bissau a estudar na cidade de S.Domingos e que decidiram contribuir com uma jornada de trabalho voluntário para a construção deste Mercado.
Guiné-Bissau > AD -Acção para o Desenvolvimento > Foto da semana > 25 de Maio de 2008
No dia 20 de Maio de 2008 foi inaugurado o Parque Nacional de Cantanhez pelo Presidente da Republica da Guiné-Bissau, João Bernardo Vieira, na presença do Director Geral do Instituto da Biodiversidade e Áreas Protegidas (IBAP), Alfredo Simão da Silva, e de representantes do poder tradicional da zona do Parque.
Estiveram também presentes vários membros do Governo, Embaixadores sedeados no país, guardas florestais comunitários, guias ecoturísticos, membros dos Comités de Regulados encarregados de coordenar as acções de conservação e desenvolvimento no Parque.
A criação do Parque é um dos momentos altos de uma longa caminhada de mais de 30 anos onde pontificaram organizações nacionais como o DEPA e a AD.
Guiné-Bissau > AD - Acção para o Desenvolvimento > Foto da semana > 18 de Maio de 2008
Na zona de Barro, na margem direita do rio Cacheu, 11 tabancas, entre as quais Bucaur, Sanu, Buborin, Ponta Nova, Apidju, Saiam, Lanqué e Barro, deitaram mãos à obra e iniciaram desde há 2 anos a recuperação de extensas áreas de bolanha abandonada, para voltar a cultivar o arroz.
É um esforço notável que homens e mulheres estão a fazer para construir diques que impeçam a entrada de água salgada nos arrozais e ao mesmo tempo sirvam de estradas para comunicar entre localidades até agora isoladas.
Ao apoio da União Europeia e do Instituto Marquês Valle Flor, veio juntar-se recentemente o do Programa Alimentar Mundial, na modalidade de fornecimento de comida para trabalho.
Guiné-Bissau > AD - ACção para o Desenvolvimento > Foto da semana > 20 de Abril de 2008
O Secretário de Estado da Cooperação Internacional de Portugal, João Gomes Cravinho, é acolhido pelo Director da Escola de Artes e Ofícios de Quelele, Jorge Handem, aquando da sua recente visita a este importante centro de formação profissional.
O Ministério do Trabalho e Segurança Social tem sido um parceiro exemplar para o crescimento desta escola que tem cursos nas áreas da electricidade, electrónica, informática, auxiliares de educação infantil e mais recentemente em hotelaria.
Está precisamente na sua fase final a construção de novas instalações para o curso de artes domésticas que vem responder a inúmeras solicitações de jovens à procura de auto-emprego ou de integração nas unidades hoteleiras do país.
Fotos e legendas: Cortesia de: © AD- Acção para o Desenvolvimento (2008). Direitos reservados.
Continuação publicação do relatório de actividades de 2007, da ONG AD - Acção para o Desenvolvimento, com quem mantemos desde finais de 2005 uma relação, franca, aberta, privilegiada, de cooperação, tendo como pretexto inicial o Projecto Guileje que deu origem, entre outras iniciativas que tiveram o nosso apoio, à realização do Simpósio Internacional de Guileje (Bissau, 1 a 7 de Março de 2008), e que abriu portas a outras iniciativas mais recentes, como por exemplo a recolha de sementes.
Deixem-me dizer-vos que, por lapo, não apareceu no poste anterior (*) a belíssima citação de Pablo Neruda que antecede o corpo do relatório em apreço:
"Podem cortar todas as flores / Que nunca serão donos da Primavera" (Pablo Neruda, Canto Geral).
2. AD -Acção para o Desenvolvimento: Relatório de actividades de 2007 > Parte II
Revisão e fixação de texto: L.G. (Não se reproduzem, por razões técnicas e de economia de meios, as fotos do relatório original, divulgado em formato pdf, no sítio da AD).
B. ASPECTOS MAIS RELEVANTES DE 2007
O ano de 2007 ficou marcado essencialmente por três aspectos relevantes:
1. Luta contra o défice alimentar no Norte do país
Independentemente das modas passageiras de ocasião, fossem elas planeamento familiar, conservação ambiental, boa governação, gestão durável dos recursos naturais, objectivos do milénio, etc., a AD manteve coerentemente ao longo dos seus 16 anos, a sua grande prioridade na luta contra a fome e na contribuição para a criação de condições de uma soberania alimentar na Guiné-Bissau, baseada em:
- Influenciar a política agrícola nacional, em especial na sua vertente de segurança alimentar, intervindo a nível de redes e plataformas de ONG, associações locais intervindo neste domínio e junto das delegações locais do Ministério de Agricultura nas zonas de intervenção da AD, contribuindo desta forma para as decisões politicas;
- Criar sinergias com outras ONG nacionais e estrangeiras para o combate às politicas que defendam a livre entrada de alimentos nos países do terceiro mundo, protagonizada principalmente pela OMC e que põem em causa a soberania alimentar na Guiné-Bissau;
- Promover uma concertação sub regional com ONG dos países vizinhos e associações de base, para a defesa da soberania alimentar e a apresentação de propostas concretas alternativas ao actual estado da situação alimentar, que inclua o estabelecimento de acordos comerciais entre associações e comunidades dos diferentes países e a promoção de lumus, entre outras;
- Contribuir para a definição, a nível de cada sector geográfico de intervenção, dos produtos estratégicos que servirão de motor e dinamizarão os processos locais de desenvolvimento social, cultural e económico, em que a AD será chamada a desempenhar uma acção de pesquisa, concepção, execução e assistência técnica para a segurança alimentar local.
- Promover a diversificação de culturas agrícolas, como a resposta às irregularidades climáticas e à preponderância da cultura de arroz, em função das condições edafo-climáticas, hábitos alimentares e carências nutricionais prevalecentes, incluindo a criação e reforço de uma rede de agricultores produtores de sementes, plantas e propágulos.
- Apostar na criação de iniciativas geradores de receitas a nível da comunidade, das associações e individuais que permitam melhorar as condições financeiras das unidades familiares e do seu acesso a bens alimentares, assim como a promoção da introdução de novas tecnologias de transformação (mandioca, arroz, milho, óleo de palma, peixe e sal) que facilitem o trabalho das mulheres assegurando melhores rendimentos;
- Promover a utilização racional e correcta dos recursos naturais florestais e haliêuticos por forma a beneficiarem as comunidades locais e reforçarem os sistemas tradicionais de protecção e conservação da natureza.
Em termos de acções concretas, há duas estratégias de luta contra a fome que a AD implantou nos sectores de S. Domingos e Bigene.
No sector de Bigene (eixo Barro-Ingoré) a prioridade vai para o reaproveitamento de antigas bolanhas de água salgada que foram abandonadas há muitos anos, mas que dispõem de um potencial de produção interessante. O fecho dos rios e a construção de grandes diques de cintura que servem simultaneamente para impedir a entrada de água salgada e de vias de acesso e comunicação entre tabancas, sendo um trabalho de grande exigência física, obriga a uma entreajuda entre todos os membros das comunidades beneficiadas.
Centenas de homens e mulheres participam nesta actividade, organizando-se em grupos de trabalho diferenciados, dividindo entre si as tarefas de corte e transporte de tarrafe para fechar os rios, a movimentação de solo (argila) para a compactação das barragens e feitura de diques, assim como a preparação de refeições colectivas durante o trabalho.
Ainda no eixo Barro-Ingoré, o aproveitamento dos pequenos vales interiores para a orizicultura de água doce, faz-se através da regulação e controlo da água das chuvas, especialmente com a construção de pequenas barragens de água e o aproveitamento de sistemas de drenagem que evitam que as bolanhas acumulem água em demasia e torne impossível o seu cultivo.
Se durante a época das chuvas é cultivado o arroz, na época seca são a batata-doce e os legumes.
No litoral norte (eixo Sucudjaque-Djufunco) a aposta incide na orizicultura de bolanha de solos arenosos (fraca capacidade para a retenção de água) com o uso de variedades de ciclo mais curto, logo seguida, em final da época das chuvas de uma campanha complementar de batata doce e hortícolas, sendo que nas zonas mais altas de planalto, o cultivo da mandioca.
2. Incremento do Ecoturismo em Cantanhez
A percepção do papel da AD no desenvolvimento do ecoturismo no Parque Nacional de Cantanhez e o tipo de actividades que se impõe à nossa organização fazer, mereceu uma profunda reflexão interna, alicerçada em iniciativas de grande impacte.
Definiram-se os tipos de turismo ecológico a incrementar, desde o turismo ambiental baseado na contemplação de paisagens nas 14 matas, na observação de animais (macacos, chimpanzés, elefantes e búfalos), aves (pelicanos e aves migratórias na foz do rio Cacine), passeios fluviais no rio Cacine e afluentes, itinerários pedestres ou de bicicleta de 1 a 2 horas, visita à ilha dos Pássaros, ilhéu de Melo, Ilha de Nuno Tristão ou ao Parque Natural Marinho de João Vieira e Poilão, bem como a miradouros de bebedouros de animais.
Também o turismo histórico onde se valoriza o facto de Cantanhez ter sido o berço da nacionalidade guineense e onde ainda estão presentes alguns vestígios luta de libertação nacional, tendo como grupo-alvo os quadros guineenses sentimentalmente ligados à história recente da Guiné-Bissau.
O turismo da saudade tendo como grupo-alvo os antigos militares portugueses que fizeram a guerra naquela zona, em especial em Guiledje, Gandembel, Cacine, Gadamael-Porto, Bedanda, Iemberém, Cafine, Cadique, Caboxanque, etc.
O Turismo Cultural com formas de percepção e de estar da vida das diferentes etnias locais (nalús, tandas, balantas, fulas, djacancas, sossos), danças e música de cada uma das etnias, história e estórias, lendas, religiões e crenças, modos de vida, formas de vestir, instrumentos de trabalho (agricultura e colecta) e organização social das tabancas e regulados.
O “Turismo” Científico com a procura do conhecimento da geografia física, do estudo dos diferentes biótipos da região (bolanhas, florestas, palmar, mangal), identificação da exploração da fauna e flora pelo homem (alimentos, construção, medicamentos, energia, canoas) e dinâmicas da fauna (chimpanzés e babuínos) e flora.
Para que o ecoturismo tenha uma verdadeira apropriação comunitária, definiram-se as seguintes regras de ouro:
- o maior número possível de tabancas devem sentir-se envolvidas no processo, beneficiando, por pouco que seja, das actividades promovidas. Isto evitará a tendência natural para a auto-exclusão e rejeição das que não forem incluídas.
- envolver todos os grupos sociais e etários (horticultoras, pescadores, fruticultores, jovens, mulheres, adultos, etc.), procurando responder ao que verdadeiramente os interessa e são as suas prioridades.
- ter a consciência clara de que “ninguém luta pelas ideias que estão na cabeça dos outros”, mas só naquilo em que acredita. Daí que os promotores do ecoturismo devam sempre fazer o exercício de se colocarem no lugar da comunidade para cada iniciativa que pretendam implementar e nunca impor a sua agenda de prioridades.
- a preservação e boa gestão dos recursos naturais tem de andar a par com a melhoria real (e sempre que possível rápida) das condições de vida e trabalho das comunidades.
- não se esquecer que o ambiente, cultura, associativismo, pesca, agricultura, desporto, etc. são actividades interdependentes no dia a dia das populações locais e querer resumir tudo a uma delas é o primeiro passo para o insucesso do programa.
Em 2007 desenvolveram-se actividades com jovens, enquanto artesãos, guias ecoturísticos e guardas comunitários, com mulheres, nos domínios de restauração, alojamento, artesanato, compotas, tinturaria de panos, horticultura e extracção de óleo de palma, assim como com os homens na produção frutícola e de venda de plantas medicinais.
Com as tabancas apoiou-se a construção de Escolas de Verificação Ambiental (EVA), a instalação de meios de comunicação comunitária (Rádio e Televisão), poços e a introdução de moageiras de farinha de mandioca e prensas de óleo.
O desafios de curto prazo que se apresentam ao ecoturismo são o de:
- promover uma imagem da Guiné-Bissau enquanto país de história, cultura e pioneira em certos processos de gestão ambiental, capaz de mobilizar turistas preocupados com valores nobres e progressistas;
- desenvolver uma visão que não seja geograficamente restrita, isto é, que não tome apenas Cantanhez como única área de intervenção. O ecoturismo só será viável se incluir de forma coerente e em conjunto outras zonas: Parque Marinho de João Vieira e Poilão, Ilhas de Melo e Tristão, Dulombi, Saltinho, Parque transfronteiriço de Guiledje-Boé e Xitole (macaréu);
- encontrar para cada tabanca, pelo menos um motivo de oferta turística capaz de fazer deslocar os potenciais ecoturistas mobilizando simultaneamente o interesse da comunidade;
- criar uma cultura de exigência em termos de higiene e remoção tratamento de lixo;
- favorecer a identificação e formação de operadores e trabalhadores turísticos locais, tais como gerentes de unidades de alojamento e restauração, empregados de mesa, de bar e de quartos;
- ir encontrando formas e soluções que sintonizem uma boa gestão dos recursos ambientais com as necessidades pressionantes das comunidades.
3. Inauguração da Televisão Comunitária Massar
Depois do grande impacte conseguido com as rádios comunitárias que vieram revolucionar o panorama da comunicação social guineense, a implantação das televisões comunitárias em Quelélé, S.Domingos e em Novembro de 2007 em Iemberém, é um marco notável da vida da nossa ONG.
A Televisão Comunitária de Cantanhez, TVMassar, que na língua nalú quer dizer TV Estrela, representa um passo significativo em frente em relação às duas anteriores, a TVKlélé e a TVBagunda, uma vez que as suas emissões se processam através de ondas hertzianas, na frequência de 210 mhz da banda ii.
Tem como objectivo a emissão de programas de agricultura, telescola, formação profissional, alfabetização, cultura tradicional, história, ambiente e ecoturismo, promovendo o acesso directo da população a um orgão de comunicação, resgatando valores culturais das diferentes etnias, permitindo o conhecimento de informações e programas relevantes de desenvolvimento local, enfim contribuindo para o assumir de uma cidadania efectiva e consequente por parte da população e das organizações locais. Através dela serão difundidos programas de formação de jovens poceiros, técnicos de energia solar, carpinteiros, pedreiros e outras profissões o que permitirá reduzir o êxodo rural que está a desertificar o interior do país, assim como promover a conservação da natural do Parque Nacional de Cantanhez.
Pensa-se igualmente utilizar esta televisão para a reciclagem dos professores das escolas oficiais e comunitárias nos domínios da matemática e do português, disciplinas identificadas como as de maior necessidade.
Pararlelamente, a divulgação de programas agrícolas com vista à melhoria das técnicas de cultura das principais produções (fruteiras, legumes, raízes, tubérculos e leguminosas), da sua protecção vegetal natural, do uso de fertilizantes orgânicos, da introdução de novas espécies de interesse económico e nutritivo e de técnicas de conservação e transformação em compotas, farinhas, óleos, etc. será um dos desafios desta televisão. A TV Massar enquanto televisão sem fins lucrativos, de promoção da cultura local e do desenvolvimento, gerida por jovens da comunidade, é uma iniciativa pioneira no continente africano, o que representa para todos quantos se abalançaram nesta inovação uma responsabilidade que ultrapassa a sua área de cobertura para se situar a um nível nacional e africano.
Numa fase inicial as suas emissões duram cerca de 2 horas diárias, com um único programa por semana que será repetido nos restantes dias da semana. À medida que forem surgindo nas diferentes tabancas do sector, mais recursos humanos capacitados, o número de programas semanais irá aumentando.
Prevê-se a redifusão em directo do Telejornal das 21horas da Televisão Nacional da Guiné-Bissau para permitir a toda a população ter acesso às notícias de âmbito nacional e internacional.
A TV Massar funciona com um Comité de Gestão constituído por 10 representantes da comunidade, sendo os 4 régulos, 4 das associações locais mais activas e 2 das ONG que, intervindo nesta zona, se mostrem interessadas e activas no funcionamento deste meio de comunicação. Este Comité escolhe uma Direcção Técnica de 4 elementos. A construção das suas instalações foi protagonizada pela associação AJAI, a qual mobilizou mão-de-obra da comunidade local, fabrico de adobes e colecta de inertes.
A formação dos quadros e técnicos da TV Massar, todos eles filhos de Cantanhez, contribui para fazer cair uma ideia antiga de que a produção de programas e o funcionamento de uma televisão só podia ser obra de especialistas e requeria verbas avultadas. Afinal, esta tecnologia moderna está ao alcance das comunidades e pode representar um poderoso instrumento para a sua afirmação local e nacional.
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Nota de L.G.:
(*) Vd. poste de 7 de Agosto de 2008 > Guiné 63/74 - P3118: Ser solidário (14): ONG AD: Relatório de actividades de 2007 - Parte I: A segurança alimentar
No dia 20 de Maio de 2008 foi inaugurado o Parque Nacional de Cantanhez pelo Presidente da Republica da Guiné-Bissau, João Bernardo Vieira, na presença do Director Geral do Instituto da Biodiversidade e Áreas Protegidas (IBAP), Alfredo Simão da Silva, e de representantes do poder tradicional da zona do Parque.
Estiveram também presentes vários membros do Governo, Embaixadores sedeados no país, guardas florestais comunitários, guias ecoturísticos, membros dos Comités de Regulados encarregados de coordenar as acções de conservação e desenvolvimento no Parque.
A criação do Parque é um dos momentos altos de uma longa caminhada de mais de 30 anos onde pontificaram organizações nacionais como o DEPA e a AD.
Guiné-Bissau > AD - Acção para o Desenvolvimento > Foto da semana > 18 de Maio de 2008
Na zona de Barro, na margem direita do rio Cacheu, 11 tabancas, entre as quais Bucaur, Sanu, Buborin, Ponta Nova, Apidju, Saiam, Lanqué e Barro, deitaram mãos à obra e iniciaram desde há 2 anos a recuperação de extensas áreas de bolanha abandonada, para voltar a cultivar o arroz.
É um esforço notável que homens e mulheres estão a fazer para construir diques que impeçam a entrada de água salgada nos arrozais e ao mesmo tempo sirvam de estradas para comunicar entre localidades até agora isoladas.
Ao apoio da União Europeia e do Instituto Marquês Valle Flor, veio juntar-se recentemente o do Programa Alimentar Mundial, na modalidade de fornecimento de comida para trabalho.
Guiné-Bissau > AD - ACção para o Desenvolvimento > Foto da semana > 20 de Abril de 2008
O Secretário de Estado da Cooperação Internacional de Portugal, João Gomes Cravinho, é acolhido pelo Director da Escola de Artes e Ofícios de Quelele, Jorge Handem, aquando da sua recente visita a este importante centro de formação profissional.
O Ministério do Trabalho e Segurança Social tem sido um parceiro exemplar para o crescimento desta escola que tem cursos nas áreas da electricidade, electrónica, informática, auxiliares de educação infantil e mais recentemente em hotelaria.
Está precisamente na sua fase final a construção de novas instalações para o curso de artes domésticas que vem responder a inúmeras solicitações de jovens à procura de auto-emprego ou de integração nas unidades hoteleiras do país.
Fotos e legendas: Cortesia de: © AD- Acção para o Desenvolvimento (2008). Direitos reservados.
Continuação publicação do relatório de actividades de 2007, da ONG AD - Acção para o Desenvolvimento, com quem mantemos desde finais de 2005 uma relação, franca, aberta, privilegiada, de cooperação, tendo como pretexto inicial o Projecto Guileje que deu origem, entre outras iniciativas que tiveram o nosso apoio, à realização do Simpósio Internacional de Guileje (Bissau, 1 a 7 de Março de 2008), e que abriu portas a outras iniciativas mais recentes, como por exemplo a recolha de sementes.
Deixem-me dizer-vos que, por lapo, não apareceu no poste anterior (*) a belíssima citação de Pablo Neruda que antecede o corpo do relatório em apreço:
"Podem cortar todas as flores / Que nunca serão donos da Primavera" (Pablo Neruda, Canto Geral).
2. AD -Acção para o Desenvolvimento: Relatório de actividades de 2007 > Parte II
Revisão e fixação de texto: L.G. (Não se reproduzem, por razões técnicas e de economia de meios, as fotos do relatório original, divulgado em formato pdf, no sítio da AD).
B. ASPECTOS MAIS RELEVANTES DE 2007
O ano de 2007 ficou marcado essencialmente por três aspectos relevantes:
1. Luta contra o défice alimentar no Norte do país
Independentemente das modas passageiras de ocasião, fossem elas planeamento familiar, conservação ambiental, boa governação, gestão durável dos recursos naturais, objectivos do milénio, etc., a AD manteve coerentemente ao longo dos seus 16 anos, a sua grande prioridade na luta contra a fome e na contribuição para a criação de condições de uma soberania alimentar na Guiné-Bissau, baseada em:
- Influenciar a política agrícola nacional, em especial na sua vertente de segurança alimentar, intervindo a nível de redes e plataformas de ONG, associações locais intervindo neste domínio e junto das delegações locais do Ministério de Agricultura nas zonas de intervenção da AD, contribuindo desta forma para as decisões politicas;
- Criar sinergias com outras ONG nacionais e estrangeiras para o combate às politicas que defendam a livre entrada de alimentos nos países do terceiro mundo, protagonizada principalmente pela OMC e que põem em causa a soberania alimentar na Guiné-Bissau;
- Promover uma concertação sub regional com ONG dos países vizinhos e associações de base, para a defesa da soberania alimentar e a apresentação de propostas concretas alternativas ao actual estado da situação alimentar, que inclua o estabelecimento de acordos comerciais entre associações e comunidades dos diferentes países e a promoção de lumus, entre outras;
- Contribuir para a definição, a nível de cada sector geográfico de intervenção, dos produtos estratégicos que servirão de motor e dinamizarão os processos locais de desenvolvimento social, cultural e económico, em que a AD será chamada a desempenhar uma acção de pesquisa, concepção, execução e assistência técnica para a segurança alimentar local.
- Promover a diversificação de culturas agrícolas, como a resposta às irregularidades climáticas e à preponderância da cultura de arroz, em função das condições edafo-climáticas, hábitos alimentares e carências nutricionais prevalecentes, incluindo a criação e reforço de uma rede de agricultores produtores de sementes, plantas e propágulos.
- Apostar na criação de iniciativas geradores de receitas a nível da comunidade, das associações e individuais que permitam melhorar as condições financeiras das unidades familiares e do seu acesso a bens alimentares, assim como a promoção da introdução de novas tecnologias de transformação (mandioca, arroz, milho, óleo de palma, peixe e sal) que facilitem o trabalho das mulheres assegurando melhores rendimentos;
- Promover a utilização racional e correcta dos recursos naturais florestais e haliêuticos por forma a beneficiarem as comunidades locais e reforçarem os sistemas tradicionais de protecção e conservação da natureza.
Em termos de acções concretas, há duas estratégias de luta contra a fome que a AD implantou nos sectores de S. Domingos e Bigene.
No sector de Bigene (eixo Barro-Ingoré) a prioridade vai para o reaproveitamento de antigas bolanhas de água salgada que foram abandonadas há muitos anos, mas que dispõem de um potencial de produção interessante. O fecho dos rios e a construção de grandes diques de cintura que servem simultaneamente para impedir a entrada de água salgada e de vias de acesso e comunicação entre tabancas, sendo um trabalho de grande exigência física, obriga a uma entreajuda entre todos os membros das comunidades beneficiadas.
Centenas de homens e mulheres participam nesta actividade, organizando-se em grupos de trabalho diferenciados, dividindo entre si as tarefas de corte e transporte de tarrafe para fechar os rios, a movimentação de solo (argila) para a compactação das barragens e feitura de diques, assim como a preparação de refeições colectivas durante o trabalho.
Ainda no eixo Barro-Ingoré, o aproveitamento dos pequenos vales interiores para a orizicultura de água doce, faz-se através da regulação e controlo da água das chuvas, especialmente com a construção de pequenas barragens de água e o aproveitamento de sistemas de drenagem que evitam que as bolanhas acumulem água em demasia e torne impossível o seu cultivo.
Se durante a época das chuvas é cultivado o arroz, na época seca são a batata-doce e os legumes.
No litoral norte (eixo Sucudjaque-Djufunco) a aposta incide na orizicultura de bolanha de solos arenosos (fraca capacidade para a retenção de água) com o uso de variedades de ciclo mais curto, logo seguida, em final da época das chuvas de uma campanha complementar de batata doce e hortícolas, sendo que nas zonas mais altas de planalto, o cultivo da mandioca.
2. Incremento do Ecoturismo em Cantanhez
A percepção do papel da AD no desenvolvimento do ecoturismo no Parque Nacional de Cantanhez e o tipo de actividades que se impõe à nossa organização fazer, mereceu uma profunda reflexão interna, alicerçada em iniciativas de grande impacte.
Definiram-se os tipos de turismo ecológico a incrementar, desde o turismo ambiental baseado na contemplação de paisagens nas 14 matas, na observação de animais (macacos, chimpanzés, elefantes e búfalos), aves (pelicanos e aves migratórias na foz do rio Cacine), passeios fluviais no rio Cacine e afluentes, itinerários pedestres ou de bicicleta de 1 a 2 horas, visita à ilha dos Pássaros, ilhéu de Melo, Ilha de Nuno Tristão ou ao Parque Natural Marinho de João Vieira e Poilão, bem como a miradouros de bebedouros de animais.
Também o turismo histórico onde se valoriza o facto de Cantanhez ter sido o berço da nacionalidade guineense e onde ainda estão presentes alguns vestígios luta de libertação nacional, tendo como grupo-alvo os quadros guineenses sentimentalmente ligados à história recente da Guiné-Bissau.
O turismo da saudade tendo como grupo-alvo os antigos militares portugueses que fizeram a guerra naquela zona, em especial em Guiledje, Gandembel, Cacine, Gadamael-Porto, Bedanda, Iemberém, Cafine, Cadique, Caboxanque, etc.
O Turismo Cultural com formas de percepção e de estar da vida das diferentes etnias locais (nalús, tandas, balantas, fulas, djacancas, sossos), danças e música de cada uma das etnias, história e estórias, lendas, religiões e crenças, modos de vida, formas de vestir, instrumentos de trabalho (agricultura e colecta) e organização social das tabancas e regulados.
O “Turismo” Científico com a procura do conhecimento da geografia física, do estudo dos diferentes biótipos da região (bolanhas, florestas, palmar, mangal), identificação da exploração da fauna e flora pelo homem (alimentos, construção, medicamentos, energia, canoas) e dinâmicas da fauna (chimpanzés e babuínos) e flora.
Para que o ecoturismo tenha uma verdadeira apropriação comunitária, definiram-se as seguintes regras de ouro:
- o maior número possível de tabancas devem sentir-se envolvidas no processo, beneficiando, por pouco que seja, das actividades promovidas. Isto evitará a tendência natural para a auto-exclusão e rejeição das que não forem incluídas.
- envolver todos os grupos sociais e etários (horticultoras, pescadores, fruticultores, jovens, mulheres, adultos, etc.), procurando responder ao que verdadeiramente os interessa e são as suas prioridades.
- ter a consciência clara de que “ninguém luta pelas ideias que estão na cabeça dos outros”, mas só naquilo em que acredita. Daí que os promotores do ecoturismo devam sempre fazer o exercício de se colocarem no lugar da comunidade para cada iniciativa que pretendam implementar e nunca impor a sua agenda de prioridades.
- a preservação e boa gestão dos recursos naturais tem de andar a par com a melhoria real (e sempre que possível rápida) das condições de vida e trabalho das comunidades.
- não se esquecer que o ambiente, cultura, associativismo, pesca, agricultura, desporto, etc. são actividades interdependentes no dia a dia das populações locais e querer resumir tudo a uma delas é o primeiro passo para o insucesso do programa.
Em 2007 desenvolveram-se actividades com jovens, enquanto artesãos, guias ecoturísticos e guardas comunitários, com mulheres, nos domínios de restauração, alojamento, artesanato, compotas, tinturaria de panos, horticultura e extracção de óleo de palma, assim como com os homens na produção frutícola e de venda de plantas medicinais.
Com as tabancas apoiou-se a construção de Escolas de Verificação Ambiental (EVA), a instalação de meios de comunicação comunitária (Rádio e Televisão), poços e a introdução de moageiras de farinha de mandioca e prensas de óleo.
O desafios de curto prazo que se apresentam ao ecoturismo são o de:
- promover uma imagem da Guiné-Bissau enquanto país de história, cultura e pioneira em certos processos de gestão ambiental, capaz de mobilizar turistas preocupados com valores nobres e progressistas;
- desenvolver uma visão que não seja geograficamente restrita, isto é, que não tome apenas Cantanhez como única área de intervenção. O ecoturismo só será viável se incluir de forma coerente e em conjunto outras zonas: Parque Marinho de João Vieira e Poilão, Ilhas de Melo e Tristão, Dulombi, Saltinho, Parque transfronteiriço de Guiledje-Boé e Xitole (macaréu);
- encontrar para cada tabanca, pelo menos um motivo de oferta turística capaz de fazer deslocar os potenciais ecoturistas mobilizando simultaneamente o interesse da comunidade;
- criar uma cultura de exigência em termos de higiene e remoção tratamento de lixo;
- favorecer a identificação e formação de operadores e trabalhadores turísticos locais, tais como gerentes de unidades de alojamento e restauração, empregados de mesa, de bar e de quartos;
- ir encontrando formas e soluções que sintonizem uma boa gestão dos recursos ambientais com as necessidades pressionantes das comunidades.
3. Inauguração da Televisão Comunitária Massar
Depois do grande impacte conseguido com as rádios comunitárias que vieram revolucionar o panorama da comunicação social guineense, a implantação das televisões comunitárias em Quelélé, S.Domingos e em Novembro de 2007 em Iemberém, é um marco notável da vida da nossa ONG.
A Televisão Comunitária de Cantanhez, TVMassar, que na língua nalú quer dizer TV Estrela, representa um passo significativo em frente em relação às duas anteriores, a TVKlélé e a TVBagunda, uma vez que as suas emissões se processam através de ondas hertzianas, na frequência de 210 mhz da banda ii.
Tem como objectivo a emissão de programas de agricultura, telescola, formação profissional, alfabetização, cultura tradicional, história, ambiente e ecoturismo, promovendo o acesso directo da população a um orgão de comunicação, resgatando valores culturais das diferentes etnias, permitindo o conhecimento de informações e programas relevantes de desenvolvimento local, enfim contribuindo para o assumir de uma cidadania efectiva e consequente por parte da população e das organizações locais. Através dela serão difundidos programas de formação de jovens poceiros, técnicos de energia solar, carpinteiros, pedreiros e outras profissões o que permitirá reduzir o êxodo rural que está a desertificar o interior do país, assim como promover a conservação da natural do Parque Nacional de Cantanhez.
Pensa-se igualmente utilizar esta televisão para a reciclagem dos professores das escolas oficiais e comunitárias nos domínios da matemática e do português, disciplinas identificadas como as de maior necessidade.
Pararlelamente, a divulgação de programas agrícolas com vista à melhoria das técnicas de cultura das principais produções (fruteiras, legumes, raízes, tubérculos e leguminosas), da sua protecção vegetal natural, do uso de fertilizantes orgânicos, da introdução de novas espécies de interesse económico e nutritivo e de técnicas de conservação e transformação em compotas, farinhas, óleos, etc. será um dos desafios desta televisão. A TV Massar enquanto televisão sem fins lucrativos, de promoção da cultura local e do desenvolvimento, gerida por jovens da comunidade, é uma iniciativa pioneira no continente africano, o que representa para todos quantos se abalançaram nesta inovação uma responsabilidade que ultrapassa a sua área de cobertura para se situar a um nível nacional e africano.
Numa fase inicial as suas emissões duram cerca de 2 horas diárias, com um único programa por semana que será repetido nos restantes dias da semana. À medida que forem surgindo nas diferentes tabancas do sector, mais recursos humanos capacitados, o número de programas semanais irá aumentando.
Prevê-se a redifusão em directo do Telejornal das 21horas da Televisão Nacional da Guiné-Bissau para permitir a toda a população ter acesso às notícias de âmbito nacional e internacional.
A TV Massar funciona com um Comité de Gestão constituído por 10 representantes da comunidade, sendo os 4 régulos, 4 das associações locais mais activas e 2 das ONG que, intervindo nesta zona, se mostrem interessadas e activas no funcionamento deste meio de comunicação. Este Comité escolhe uma Direcção Técnica de 4 elementos. A construção das suas instalações foi protagonizada pela associação AJAI, a qual mobilizou mão-de-obra da comunidade local, fabrico de adobes e colecta de inertes.
A formação dos quadros e técnicos da TV Massar, todos eles filhos de Cantanhez, contribui para fazer cair uma ideia antiga de que a produção de programas e o funcionamento de uma televisão só podia ser obra de especialistas e requeria verbas avultadas. Afinal, esta tecnologia moderna está ao alcance das comunidades e pode representar um poderoso instrumento para a sua afirmação local e nacional.
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Nota de L.G.:
(*) Vd. poste de 7 de Agosto de 2008 > Guiné 63/74 - P3118: Ser solidário (14): ONG AD: Relatório de actividades de 2007 - Parte I: A segurança alimentar
Guiné 63/74 - P3120: Operação Macaréu à Vista - II Parte (Beja Santos) (41): Um mês nos Nhabijões
Operação Macaréu à vista
Episódio XLI
UM MÊS NOS NHABIJÕES
Beja Santos
O BCaç 2852 parte, o BArt 2917 chega
A primeira semana de Junho é vivida na efervescência da sobreposição. Entre os dias 29 e 31 de Maio, presencio os preparativos e a organização azafamada de sacos, malas e pacotes de quem junta os trastes, os identifica com letra garrafais, vão todos seguir em embarcações que rumam do Xime para Bissau e daqui seguirão para o porto de Lisboa. São dias em que se misturam centenas e centenas de baús e outros haveres com os de quem acaba de chegar. Os novos militares vêm vestidos com fardamento a cheirar a goma, é o aprumo de quem chega ao teatro da guerra e não aceita displicências, a roupa vem vincada. Os que chegam vêm sorridentes mas retraídos, os que querem partir estão exuberantes, falam ainda mais alto, querem entregar tudo, ter os documentos da transição assinados, era o que faltava partir hoje e num amanhã não longínquo ser molestado porque se extraviou uma tesoura corta-arame, um capacete ou um lençol, nos intermináveis materiais à carga. É um período com muito pouca guerra, houve umas minas detectadas e que felizmente não fizeram vítimas, até as tabancas em auto-defesa foram poupadas. A CCaç 12 e o Pel Caç Nat 52 estão informados de que se conta com eles para a iniciação do novo batalhão: emboscadas, patrulhas, segurança ao transporte de vacas, colunas de reabastecimento ao Xitole e Saltinho, são estas as forças de intervenção que irão trabalhar conjuntamente com as forças do BArt 2917, reconhecendo as imediações dos três importantes aquartelamentos do Xime, Mansambo e Xitole. Com esta cooperação, novas amizades.
Prestes a findar a sua presença em Bambadinca, sou chamado ao comando e recebo instruções do major Herberto Sampaio: "Pá, temos informações feias sobre os Nhabijões, Mero e Santa Helena e até sobre Fá. A malta de Madina e do Buruntoni vai querer intimidar, aliás como já se viu com raptos e canhoadas sobre os Nhabijões, vão querer atacar Fá e os Comandos africanos. O reordenamento dos Nhabijões depende do comando-chefe que pressiona para tudo estar pronto o mais breve possível. Temos lá a engenharia, o trabalho não pode parar e não pode haver medo, temos que impedir as intimidações. Parta para lá imediatamente, vai em piquete durante todo o mês, vigia os movimentos de quem chega, patrulha as zonas de cambança, com as milícias de Amedalai percorre todos os dias a antiga tabanca de Samba Silate. Estes piquetes não podem prejudicar a segurança na ponte de Udunduma nem as emboscadas na missão do sono no Bambadincazinho nem as tarefas de apoio às populações em Badora e Cossé. É um tempo de desenrascanço, felizmente que o IN está pouco activo. Aguente-se, são mais dois ou três meses de trabalho que você tem pela frente".
E, nessa tarde, os Unimog seguiram com colchões, mantas, caixas de munições, tudo para um acampamento improvisado no reordenamento dos Nhabijões. À semelhança do que se passava na ponte de Udunduma, um burrinho trazia os tachos de comida da gente arranchada e os potes com a bianda dos caçadores nativos, um deles vinha diariamente tratar da mafé. Foi mais um tempo de nomadização, uma secção ia de manhã ao correio ou buscar os frescos ao Dakota, em Bafatá, outra secção vigiava o trabalho da equipa de engenharia e dos civis, a outra secção ia buscar doentes a Sansacuta, Candamã ou Afiá. E, quando necessário, seguíamos para o Xitole, para as acções conjuntas com as novas companhias, picava-se até Amedalai. Era a continuação da rotina da guerra, dava-se confiança aos periquitos, estava-se atento à hipótese de dias piores.
O reordenamento dos Nhabijões
Os Nhabijões eram um dos motivos de orgulho dos criadores da política "Por uma Guiné melhor". Samba Silate fora, até ao início da luta armada, uma das mais florescentes tabancas do Leste da Guiné. Com o aparecimento das guerrilhas, as populações dividiram-se, umas partiram para a luta, outras entraram em diáspora em Bambadinca e diferentes regulados. Os seis Nhabijões (Nhabijão Bulobate, Nhabijão Mancanha, Nhabijão Mandinga, Nhabijão Imbume, Nhabijão Bedinca e Nhabijão Cau) viviam o desarrazoado de todas as fugas e partidas para o exílio, era por aqui que as gentes de Madina e do Buruntoni vinham abastecer-se, intimidar ou conquistar adesões, obter informações, até descansar. O plano do reordenamento era juntar os diferentes Nhabijões, tornar mais difícil o aliciamento pelo PAIGC, oferecer às populações alguns equipamentos sociais, enfim, permitir o cultivo tranquilo da fecunda bolanha que circunda de Samba Silate até Bambadinca. Extintas as antigas tabancas, escolhera-se uma posição estratégica junto de Samba Silate, com uma impressionante panorâmica sobre o Geba.
Era um empreendimento de vulto, havia um plano com os desenhos das casas, arruamentos, mesquita, escola, fontanários, tudo estava a ser desmatado à volta, as casas familiares assentavam em quatro pilares de cibe, as paredes eram feitas com blocos de adobe, fazia-se uma trama com rachas de cibe mais finas para o telhado, onde se pregavam chapas de zinco. Tudo cheirava permanentemente a fresco: o fresco do adobe em blocos, as reluzentes chapas, os pregos, até as caixas em madeira em que se preparavam os blocos. A todo o momento chegavam os camiões dos fornecedores, ouvia-se o ruído ensurdecedor dos caterpillar D7 e de algumas máquinas de rodas. A engenharia esteva sempre presente, respondia por todo o traçado da obra, eram eles quem marcavam os eixos do ordenamento, a qualquer momento chegava um dos majores responsáveis (creio que eram os majores Matos Guerra e Carlos Azeredo) que supervisavam, intimidavam, davam sinais de satisfação. Nós cirandávamos, mas, para dizer a verdade, totalmente incapazes de reconhecer forasteiros ao reordenamento. Estávamos há dois dias neste piquete quando num patrulhamento junto à bolanha de Samba Silate, em frente a São Belchior, encontrámos três canoas novinhas em folha enterradas nas lamas do tarrafe.
Sem lembrança do sucedido, pedi a Cherno Suane que me avivasse a memória. Marcou-me encontro na Pérola de São Paulo, no coração do Cais do Sodré.
Os acasos da fortuna na Pérola de São Paulo
Ainda há pessoas a almoçar no espaço das refeições ligeiras, quando me sento a uma mesa a beber uma bica, na companhia de Cherno. Primeira surpresa: Cherno extrai de um bolso do casaco uma folha larga onde arrumou os nomes de todos os militares do Pel Caç Nat 52 de acordo com o seu "chão" de origem. Leio: formação em Bolama, oito meses, chegou o Henrique Matos Francisco, o primeiro alferes, tudo em 1966. Seguem para Porto Gole, está-se no aceso da guerra em frente ao Morés, há emboscadas, flagelações, destruições, a estrada de Porto Gole para o Jugudul fica praticamente interdita. De Porto Gole vai-se para o Enxalé, colabora-se com uma companhia madeirense, Cherno escreveu: "Zagalo era o nosso herói". Missirá é praticamente riscada do mapa, o Pel Caç Nat 52 substitui o Pel Caç Nat 54, a estrada entre Enxalé e Missirá aos poucos vai abandonada. A folha de Cherno traz nomes de furriéis, cabos, soldados, nome de mortos e feridos, e até evacuados. Comove-me este cuidado do Cherno ao estabelecer os dados da sua memória. Lá o consegui apanhar em falta com dois ou três nomes omitidos, ele respondeu-me com o seu sorriso doce: "desculpa".
Quando o Cherno regressou da Guiné, há escassos meses, depois de cerca de 2 anos de ausência, pedi-lhe ajuda por razões fundamentadas. Ele acompanhou-me de perto durante toda a comissão, assumiu ser guarda-costas a tempo inteiro, ouviu conversas, viu a guerra ao meu lado, comunicava-me quem queria falar comigo, era a minha agenda ambulante. Quando me entregou esta folha no café «A Pérola de S.Paulo», no centro da má fama do Cais do Sodré, senti uma irrepremível onda de ternura pelo mais indefectível dos amigos: sabe-se lá com sacrifício ele garatujou as suas recordações, alinhou a tropa por «chão» de nascimento, procurou não se esquecer de ninguém, balbuciou quando lhe disse que o morto era Sadjo Baldé e não Sadjo Seidi, este um rabujento que uma vez até quis andar à porrada comigo... Era inevitável que eu passasse esta prova de muita estima para todos os camaradas da Guiné. Tive a felicidade de fazer amizades inquebrantáveis, assim dá gosto viver. (BS)
Falávamos em voz alta dos Nhabijões, de Chicri, de Mato de Cão, de Malandim e até de Finete. Estou a tomar nota das recordações daquele patrulhamento em que detectámos e destruímos três canoas das cambanças de Madina, quando fomos interpelados.
- Desculpem, estão a falar de Enxalé, Nhabijões e Mato de Cão. Não é possível haver mais coincidência, são nomes de locais da Guiné onde combati entre 1971 e 1973. Vocês estiveram lá nessa altura? É que não me lembro de vos ter visto.
É um homem magro, de estatura média, cabelo esbranquiçado, olhos atentos, perscrutadores. Tem modos calmos mas revela assombro pelo que ouviu, curiosidade sincera pelo que quer saber. Apresento-nos, conto-lhe o que estamos a fazer, ele entusiasma-se e fala da sua comissão.
- Fui alferes da CCaç 12, comandei o 4º pelotão, substitui o Rodrigues que já faleceu. Quando vos comecei a ouvir a curiosidade dominou-me, era coincidência a mais, vocês falavam como veteranos da guerra. Fomos nós que fizemos o destacamento de Mato de Cão, íamos ao Enxalé, fizemos todas essas colunas e patrulhamentos que referiram. Só não fui a Missirá.
À nossa volta pararam as conversas, é inusitado uma conversa destas, gente que combateu há cerca de quarenta anos, juntos por feliz acaso. A conversa prossegue, calorosa, e recebo um cartão-de-visita no termo destas recordações, ele tem de partir e eu estou impaciente por registar as recordações de Cherno. Ele chama-se Jaime Pereira, é engenheiro e trabalha numa empresa de nome histórico, ali na Av. 24 de Julho.
Aquelas três canoas, lembrava-se Cherno, não enganavam ninguém, a época das chuvas não podia encobrir os sinais de passagem de quem atravessava a extensa bolanha por carreiros que discretamente se elevavam naqueles antigos arrozais férteis, era madeira nova, notava-se ainda o talhe das ferramentas. Foram destruídas à bala, mas antes pediu-se a presença de dois chefes de tabanca, que garantiram peremptoriamente nada saber, muito provavelmente, justificaram, era gente que vinha de Madina e ia em direcção da foz do Corubal… Nessa altura, eu ainda engolia estas explicações e não havia reacção possível. Era a força do sangue dos povos divididos que eu desconhecia.
Partem amigos muito queridos, tenho leituras anglo-saxónicas
Transportamos em coluna o primeiro contingente do BCaç 2852 até ao Xime. Vão ali o tenente Pinheiro, o alferes Reis, uma parte importante dos pelotões de morteiros, sapadores, básicos, cozinheiros. O Vacas de Carvalho segue à frente com uma Daimler, grita para o primeiro Unimog onde vai o tenente Pinheiro, assusta-o com os locais de possíveis emboscadas. Na véspera, agradeci-lhes todas as ajudas recebidas, o Reis ainda tentou uma questiúncula, não lhe dei troco. Dentro de dias, haverá coluna semelhante para o resto do batalhão.
Escrevi um poema falhado, "25º Aniversário". Citei Apollinaire, o poeta combatente das trincheiras, autor de «Caligramas»: "L'amour a remué ma vie comme on remue la terre / dans la zone des armées. / J'atteignais l'âge mûr quand la guerre arriva / Les mois ne sont pas longs ni le jours ni les nuits / C'est la guerre qui est longue / Je salue la chemise rouge".
Falo na "abicagem da galáxia numa cabana", em "palmeira ao desbarato" e também em "ano versado, na parede brota o palavrão: guerra. / amor mudado, altar, elegia. / uma mulher chegou, reconheceu". Definitivamente, poesia mais frustre não há. Condicionado pelo tempo (tenho que devolver o livro com urgência a D. Violete), leio e tiro notas do assombroso relatório do administrador da circunscrição de Geba, Vasco Calvet Magalhães. A ver se para a semana tenho o trabalho completo, depois dou-vos conta do entusiasmo que ele imprime às descrições, os registos ingénuos sobre os povos que habitam o Geba, as lutas, a religião, a língua e a cultura. O que pasma é a autenticidade e a informalidade, ele é cáustico com a corrupção e com a exploração dos indígenas, com a impreparação dos funcionários. Nunca li nada até agora tão verosímil, com tanta vontade de informar mesmo com míngua de informações, ingenuidade e omissões culturais.
Li "O Homem que era Quinta-Feira", de Chesterton, de quem só conhecia os ensaios de carácter religioso. É apresentado como uma obra de humor, mas a classificação parece-me errada. É um mundo às avessas, um grupo de anarquistas que afinal não o são, a bondade subitamente transforma-se em maldade, o que parece ser caos logo é apresentado como harmonia, os anarquistas são polícias e até filósofos, o temível chefe dos anarquistas, Domingo, tido como um tipo feroz, um carniceiro, afinal vive obcecado com o sofrimento dos outros. É uma paródia moralista em que o leitor é convidado a reflectir sobre a transitoriedade dos conceitos e os juízos apressados que fazemos dos outros.
Tradução de Domingos Arouca, capa de Tóssan, Portugal Editora, 1960, Biblioteca dos Humuristas. Chesterton adorava o mundo às avessas, cheio de desconcertos, de verdades que se tornavam imediatamente mentira, de saltos bruscos que alteravam profundamente a estabilidade do leitor e sua confiança no escritor. Lucian Gregory apresenta-se como revolucionário e anarquista. Aliás para ele um anarquista é um artista. O seu amigo Syme mostra-se profundamente céptico mas acaba por entrar na direcção do temível grupo anarquista, como Quinta-Feira em que o chefe é Domingo. Os criminosos são polícias, os anarquistas são bondosos, o mundo está longe de ser mau, entre no plano de Deus. Esta obra-prima de Chesterton não é uma paródia, é uma fábula, a vida é tensão, é este axaltante concílio dos dias, é esta constante descida aos infernos, onde somos livres da redenção ou da ignomínia. (BS)
Também não foi fácil nem muito estimulante a leitura de "O Insuspeito" de Charlotte Armstrong, uma conceituada escritora policial norte-americana. Ela parte de uma ideia poderosa, um caçador de fortunas, homem de prestígio cultural, acima de qualquer suspeita, educa meninas casadoiras que fazem testamento a seu favor. Há estranhas mortes, o noivo de uma das vítimas investiga e descobre o plano maquiavélico. Aí a obra perde o nervo, o suspense anda à deriva, o desfecho é fantasioso, a arquitectura da obra desigual. Paciência, não se pode acertar sempre, há decepções em todos os géneros literários.
N.º 66 da Colecção Vampiro, tradução de Elisa Lopes Ribeiro e capa de Cândido Costa Pinto. Charlotte Armstrong parte de uma ideia brilhante mas deu-lhe um desenvolvimento tosco. Um caçador de fortunas, disfarçado de mestre e pai espiritual de ricas casadouras, desfaz-se das suas vítimas depois destas terem feito testamento a seu favor. O noivo de uma das vítimas introduz-se neste círculo restrito e descobre as maningâncias do insuspeito. Quando tudo parece perdido para a denúncia do miserável, o insuspeito consegue o seu sequestro. É uma das futuras vítimas que encontra o local do sequestro e o monstro acaba por morrer. Bem escrito mas com pouco nervo, com muitos altos e baixos no suspense. (BS)
Mesmo no Pel Caç Nat 52 partem e chegam soldados. Gosto da personalidade do novo comandante, Domingues Magalhães Filipe. A rotina prossegue, passei a dar aulas, fazemos colunas ao Xitole, Mamadu Soncó, um dos filhos de Quebá, pede-me para vir comigo para Lisboa, irrompeu brutalmente a época das chuvas. Tenho consciência que é um tempo de transição, faço de estafeta, de polícia, inclusive andámos a varrer à vassoura a missão do sono no Bambadincazinho. É um tempo bom para leituras, vou escrever à família e aos amigos, agarro-me à ideia de recomeçar os meus estudos muito em breve. Discretamente, o meu espírito começa a partir para Lisboa.´
Fotos (e legendas): © Beja Santos (2008). Direitos reservados.
Texto do Beja Santos (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70) (1), enviado em 2 de Maio de 2008
___________
Nota de CV
(1) - Vd. poste de 24 de Julho de 2008 > Guiné 63/74 - P3091: Operação Macaréu à Vista - II Parte (Beja Santos) (40): Operação Beringela Doce: Da cabeça não me sai aquela mulher morta...
Episódio XLI
UM MÊS NOS NHABIJÕES
Beja Santos
O BCaç 2852 parte, o BArt 2917 chega
A primeira semana de Junho é vivida na efervescência da sobreposição. Entre os dias 29 e 31 de Maio, presencio os preparativos e a organização azafamada de sacos, malas e pacotes de quem junta os trastes, os identifica com letra garrafais, vão todos seguir em embarcações que rumam do Xime para Bissau e daqui seguirão para o porto de Lisboa. São dias em que se misturam centenas e centenas de baús e outros haveres com os de quem acaba de chegar. Os novos militares vêm vestidos com fardamento a cheirar a goma, é o aprumo de quem chega ao teatro da guerra e não aceita displicências, a roupa vem vincada. Os que chegam vêm sorridentes mas retraídos, os que querem partir estão exuberantes, falam ainda mais alto, querem entregar tudo, ter os documentos da transição assinados, era o que faltava partir hoje e num amanhã não longínquo ser molestado porque se extraviou uma tesoura corta-arame, um capacete ou um lençol, nos intermináveis materiais à carga. É um período com muito pouca guerra, houve umas minas detectadas e que felizmente não fizeram vítimas, até as tabancas em auto-defesa foram poupadas. A CCaç 12 e o Pel Caç Nat 52 estão informados de que se conta com eles para a iniciação do novo batalhão: emboscadas, patrulhas, segurança ao transporte de vacas, colunas de reabastecimento ao Xitole e Saltinho, são estas as forças de intervenção que irão trabalhar conjuntamente com as forças do BArt 2917, reconhecendo as imediações dos três importantes aquartelamentos do Xime, Mansambo e Xitole. Com esta cooperação, novas amizades.
Prestes a findar a sua presença em Bambadinca, sou chamado ao comando e recebo instruções do major Herberto Sampaio: "Pá, temos informações feias sobre os Nhabijões, Mero e Santa Helena e até sobre Fá. A malta de Madina e do Buruntoni vai querer intimidar, aliás como já se viu com raptos e canhoadas sobre os Nhabijões, vão querer atacar Fá e os Comandos africanos. O reordenamento dos Nhabijões depende do comando-chefe que pressiona para tudo estar pronto o mais breve possível. Temos lá a engenharia, o trabalho não pode parar e não pode haver medo, temos que impedir as intimidações. Parta para lá imediatamente, vai em piquete durante todo o mês, vigia os movimentos de quem chega, patrulha as zonas de cambança, com as milícias de Amedalai percorre todos os dias a antiga tabanca de Samba Silate. Estes piquetes não podem prejudicar a segurança na ponte de Udunduma nem as emboscadas na missão do sono no Bambadincazinho nem as tarefas de apoio às populações em Badora e Cossé. É um tempo de desenrascanço, felizmente que o IN está pouco activo. Aguente-se, são mais dois ou três meses de trabalho que você tem pela frente".
E, nessa tarde, os Unimog seguiram com colchões, mantas, caixas de munições, tudo para um acampamento improvisado no reordenamento dos Nhabijões. À semelhança do que se passava na ponte de Udunduma, um burrinho trazia os tachos de comida da gente arranchada e os potes com a bianda dos caçadores nativos, um deles vinha diariamente tratar da mafé. Foi mais um tempo de nomadização, uma secção ia de manhã ao correio ou buscar os frescos ao Dakota, em Bafatá, outra secção vigiava o trabalho da equipa de engenharia e dos civis, a outra secção ia buscar doentes a Sansacuta, Candamã ou Afiá. E, quando necessário, seguíamos para o Xitole, para as acções conjuntas com as novas companhias, picava-se até Amedalai. Era a continuação da rotina da guerra, dava-se confiança aos periquitos, estava-se atento à hipótese de dias piores.
O reordenamento dos Nhabijões
Os Nhabijões eram um dos motivos de orgulho dos criadores da política "Por uma Guiné melhor". Samba Silate fora, até ao início da luta armada, uma das mais florescentes tabancas do Leste da Guiné. Com o aparecimento das guerrilhas, as populações dividiram-se, umas partiram para a luta, outras entraram em diáspora em Bambadinca e diferentes regulados. Os seis Nhabijões (Nhabijão Bulobate, Nhabijão Mancanha, Nhabijão Mandinga, Nhabijão Imbume, Nhabijão Bedinca e Nhabijão Cau) viviam o desarrazoado de todas as fugas e partidas para o exílio, era por aqui que as gentes de Madina e do Buruntoni vinham abastecer-se, intimidar ou conquistar adesões, obter informações, até descansar. O plano do reordenamento era juntar os diferentes Nhabijões, tornar mais difícil o aliciamento pelo PAIGC, oferecer às populações alguns equipamentos sociais, enfim, permitir o cultivo tranquilo da fecunda bolanha que circunda de Samba Silate até Bambadinca. Extintas as antigas tabancas, escolhera-se uma posição estratégica junto de Samba Silate, com uma impressionante panorâmica sobre o Geba.
Era um empreendimento de vulto, havia um plano com os desenhos das casas, arruamentos, mesquita, escola, fontanários, tudo estava a ser desmatado à volta, as casas familiares assentavam em quatro pilares de cibe, as paredes eram feitas com blocos de adobe, fazia-se uma trama com rachas de cibe mais finas para o telhado, onde se pregavam chapas de zinco. Tudo cheirava permanentemente a fresco: o fresco do adobe em blocos, as reluzentes chapas, os pregos, até as caixas em madeira em que se preparavam os blocos. A todo o momento chegavam os camiões dos fornecedores, ouvia-se o ruído ensurdecedor dos caterpillar D7 e de algumas máquinas de rodas. A engenharia esteva sempre presente, respondia por todo o traçado da obra, eram eles quem marcavam os eixos do ordenamento, a qualquer momento chegava um dos majores responsáveis (creio que eram os majores Matos Guerra e Carlos Azeredo) que supervisavam, intimidavam, davam sinais de satisfação. Nós cirandávamos, mas, para dizer a verdade, totalmente incapazes de reconhecer forasteiros ao reordenamento. Estávamos há dois dias neste piquete quando num patrulhamento junto à bolanha de Samba Silate, em frente a São Belchior, encontrámos três canoas novinhas em folha enterradas nas lamas do tarrafe.
Sem lembrança do sucedido, pedi a Cherno Suane que me avivasse a memória. Marcou-me encontro na Pérola de São Paulo, no coração do Cais do Sodré.
Os acasos da fortuna na Pérola de São Paulo
Ainda há pessoas a almoçar no espaço das refeições ligeiras, quando me sento a uma mesa a beber uma bica, na companhia de Cherno. Primeira surpresa: Cherno extrai de um bolso do casaco uma folha larga onde arrumou os nomes de todos os militares do Pel Caç Nat 52 de acordo com o seu "chão" de origem. Leio: formação em Bolama, oito meses, chegou o Henrique Matos Francisco, o primeiro alferes, tudo em 1966. Seguem para Porto Gole, está-se no aceso da guerra em frente ao Morés, há emboscadas, flagelações, destruições, a estrada de Porto Gole para o Jugudul fica praticamente interdita. De Porto Gole vai-se para o Enxalé, colabora-se com uma companhia madeirense, Cherno escreveu: "Zagalo era o nosso herói". Missirá é praticamente riscada do mapa, o Pel Caç Nat 52 substitui o Pel Caç Nat 54, a estrada entre Enxalé e Missirá aos poucos vai abandonada. A folha de Cherno traz nomes de furriéis, cabos, soldados, nome de mortos e feridos, e até evacuados. Comove-me este cuidado do Cherno ao estabelecer os dados da sua memória. Lá o consegui apanhar em falta com dois ou três nomes omitidos, ele respondeu-me com o seu sorriso doce: "desculpa".
Quando o Cherno regressou da Guiné, há escassos meses, depois de cerca de 2 anos de ausência, pedi-lhe ajuda por razões fundamentadas. Ele acompanhou-me de perto durante toda a comissão, assumiu ser guarda-costas a tempo inteiro, ouviu conversas, viu a guerra ao meu lado, comunicava-me quem queria falar comigo, era a minha agenda ambulante. Quando me entregou esta folha no café «A Pérola de S.Paulo», no centro da má fama do Cais do Sodré, senti uma irrepremível onda de ternura pelo mais indefectível dos amigos: sabe-se lá com sacrifício ele garatujou as suas recordações, alinhou a tropa por «chão» de nascimento, procurou não se esquecer de ninguém, balbuciou quando lhe disse que o morto era Sadjo Baldé e não Sadjo Seidi, este um rabujento que uma vez até quis andar à porrada comigo... Era inevitável que eu passasse esta prova de muita estima para todos os camaradas da Guiné. Tive a felicidade de fazer amizades inquebrantáveis, assim dá gosto viver. (BS)
Falávamos em voz alta dos Nhabijões, de Chicri, de Mato de Cão, de Malandim e até de Finete. Estou a tomar nota das recordações daquele patrulhamento em que detectámos e destruímos três canoas das cambanças de Madina, quando fomos interpelados.
- Desculpem, estão a falar de Enxalé, Nhabijões e Mato de Cão. Não é possível haver mais coincidência, são nomes de locais da Guiné onde combati entre 1971 e 1973. Vocês estiveram lá nessa altura? É que não me lembro de vos ter visto.
É um homem magro, de estatura média, cabelo esbranquiçado, olhos atentos, perscrutadores. Tem modos calmos mas revela assombro pelo que ouviu, curiosidade sincera pelo que quer saber. Apresento-nos, conto-lhe o que estamos a fazer, ele entusiasma-se e fala da sua comissão.
- Fui alferes da CCaç 12, comandei o 4º pelotão, substitui o Rodrigues que já faleceu. Quando vos comecei a ouvir a curiosidade dominou-me, era coincidência a mais, vocês falavam como veteranos da guerra. Fomos nós que fizemos o destacamento de Mato de Cão, íamos ao Enxalé, fizemos todas essas colunas e patrulhamentos que referiram. Só não fui a Missirá.
À nossa volta pararam as conversas, é inusitado uma conversa destas, gente que combateu há cerca de quarenta anos, juntos por feliz acaso. A conversa prossegue, calorosa, e recebo um cartão-de-visita no termo destas recordações, ele tem de partir e eu estou impaciente por registar as recordações de Cherno. Ele chama-se Jaime Pereira, é engenheiro e trabalha numa empresa de nome histórico, ali na Av. 24 de Julho.
Aquelas três canoas, lembrava-se Cherno, não enganavam ninguém, a época das chuvas não podia encobrir os sinais de passagem de quem atravessava a extensa bolanha por carreiros que discretamente se elevavam naqueles antigos arrozais férteis, era madeira nova, notava-se ainda o talhe das ferramentas. Foram destruídas à bala, mas antes pediu-se a presença de dois chefes de tabanca, que garantiram peremptoriamente nada saber, muito provavelmente, justificaram, era gente que vinha de Madina e ia em direcção da foz do Corubal… Nessa altura, eu ainda engolia estas explicações e não havia reacção possível. Era a força do sangue dos povos divididos que eu desconhecia.
Partem amigos muito queridos, tenho leituras anglo-saxónicas
Transportamos em coluna o primeiro contingente do BCaç 2852 até ao Xime. Vão ali o tenente Pinheiro, o alferes Reis, uma parte importante dos pelotões de morteiros, sapadores, básicos, cozinheiros. O Vacas de Carvalho segue à frente com uma Daimler, grita para o primeiro Unimog onde vai o tenente Pinheiro, assusta-o com os locais de possíveis emboscadas. Na véspera, agradeci-lhes todas as ajudas recebidas, o Reis ainda tentou uma questiúncula, não lhe dei troco. Dentro de dias, haverá coluna semelhante para o resto do batalhão.
Escrevi um poema falhado, "25º Aniversário". Citei Apollinaire, o poeta combatente das trincheiras, autor de «Caligramas»: "L'amour a remué ma vie comme on remue la terre / dans la zone des armées. / J'atteignais l'âge mûr quand la guerre arriva / Les mois ne sont pas longs ni le jours ni les nuits / C'est la guerre qui est longue / Je salue la chemise rouge".
Falo na "abicagem da galáxia numa cabana", em "palmeira ao desbarato" e também em "ano versado, na parede brota o palavrão: guerra. / amor mudado, altar, elegia. / uma mulher chegou, reconheceu". Definitivamente, poesia mais frustre não há. Condicionado pelo tempo (tenho que devolver o livro com urgência a D. Violete), leio e tiro notas do assombroso relatório do administrador da circunscrição de Geba, Vasco Calvet Magalhães. A ver se para a semana tenho o trabalho completo, depois dou-vos conta do entusiasmo que ele imprime às descrições, os registos ingénuos sobre os povos que habitam o Geba, as lutas, a religião, a língua e a cultura. O que pasma é a autenticidade e a informalidade, ele é cáustico com a corrupção e com a exploração dos indígenas, com a impreparação dos funcionários. Nunca li nada até agora tão verosímil, com tanta vontade de informar mesmo com míngua de informações, ingenuidade e omissões culturais.
Li "O Homem que era Quinta-Feira", de Chesterton, de quem só conhecia os ensaios de carácter religioso. É apresentado como uma obra de humor, mas a classificação parece-me errada. É um mundo às avessas, um grupo de anarquistas que afinal não o são, a bondade subitamente transforma-se em maldade, o que parece ser caos logo é apresentado como harmonia, os anarquistas são polícias e até filósofos, o temível chefe dos anarquistas, Domingo, tido como um tipo feroz, um carniceiro, afinal vive obcecado com o sofrimento dos outros. É uma paródia moralista em que o leitor é convidado a reflectir sobre a transitoriedade dos conceitos e os juízos apressados que fazemos dos outros.
Tradução de Domingos Arouca, capa de Tóssan, Portugal Editora, 1960, Biblioteca dos Humuristas. Chesterton adorava o mundo às avessas, cheio de desconcertos, de verdades que se tornavam imediatamente mentira, de saltos bruscos que alteravam profundamente a estabilidade do leitor e sua confiança no escritor. Lucian Gregory apresenta-se como revolucionário e anarquista. Aliás para ele um anarquista é um artista. O seu amigo Syme mostra-se profundamente céptico mas acaba por entrar na direcção do temível grupo anarquista, como Quinta-Feira em que o chefe é Domingo. Os criminosos são polícias, os anarquistas são bondosos, o mundo está longe de ser mau, entre no plano de Deus. Esta obra-prima de Chesterton não é uma paródia, é uma fábula, a vida é tensão, é este axaltante concílio dos dias, é esta constante descida aos infernos, onde somos livres da redenção ou da ignomínia. (BS)
Também não foi fácil nem muito estimulante a leitura de "O Insuspeito" de Charlotte Armstrong, uma conceituada escritora policial norte-americana. Ela parte de uma ideia poderosa, um caçador de fortunas, homem de prestígio cultural, acima de qualquer suspeita, educa meninas casadoiras que fazem testamento a seu favor. Há estranhas mortes, o noivo de uma das vítimas investiga e descobre o plano maquiavélico. Aí a obra perde o nervo, o suspense anda à deriva, o desfecho é fantasioso, a arquitectura da obra desigual. Paciência, não se pode acertar sempre, há decepções em todos os géneros literários.
N.º 66 da Colecção Vampiro, tradução de Elisa Lopes Ribeiro e capa de Cândido Costa Pinto. Charlotte Armstrong parte de uma ideia brilhante mas deu-lhe um desenvolvimento tosco. Um caçador de fortunas, disfarçado de mestre e pai espiritual de ricas casadouras, desfaz-se das suas vítimas depois destas terem feito testamento a seu favor. O noivo de uma das vítimas introduz-se neste círculo restrito e descobre as maningâncias do insuspeito. Quando tudo parece perdido para a denúncia do miserável, o insuspeito consegue o seu sequestro. É uma das futuras vítimas que encontra o local do sequestro e o monstro acaba por morrer. Bem escrito mas com pouco nervo, com muitos altos e baixos no suspense. (BS)
Mesmo no Pel Caç Nat 52 partem e chegam soldados. Gosto da personalidade do novo comandante, Domingues Magalhães Filipe. A rotina prossegue, passei a dar aulas, fazemos colunas ao Xitole, Mamadu Soncó, um dos filhos de Quebá, pede-me para vir comigo para Lisboa, irrompeu brutalmente a época das chuvas. Tenho consciência que é um tempo de transição, faço de estafeta, de polícia, inclusive andámos a varrer à vassoura a missão do sono no Bambadincazinho. É um tempo bom para leituras, vou escrever à família e aos amigos, agarro-me à ideia de recomeçar os meus estudos muito em breve. Discretamente, o meu espírito começa a partir para Lisboa.´
Fotos (e legendas): © Beja Santos (2008). Direitos reservados.
Texto do Beja Santos (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70) (1), enviado em 2 de Maio de 2008
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Nota de CV
(1) - Vd. poste de 24 de Julho de 2008 > Guiné 63/74 - P3091: Operação Macaréu à Vista - II Parte (Beja Santos) (40): Operação Beringela Doce: Da cabeça não me sai aquela mulher morta...
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