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sábado, 9 de dezembro de 2023

Guiné 61/74 - P24935: S(C)em comentários (21): A caça nos impérios coloniais europeus... ou um certa visão etnocêntrica dos velhos "africanistas"


Congo ex-Belga (hoje República Democrática do Congo) > c. nos 20 > "Troféus de caça"... ou uma certa  visão europocêntrica de África. 

Fotos de Victor Jacobs (digitalizadas e editadas por LG.). 

Fonte: Louis Franck - Le Congo Belge, Tome I.  Bruxelles: La Renaissance du Livre.  1928. p. 152...  

Angola > c. anos 30 > "A Exma. Esposa  do Coronel Félix montada num búfalo-pacaça, que, minutos antes, ela própria abatera a tiro de rifle"  (Joaquim António da Silva Félix era ofcial do exército, coronel, industrial, agricultor e publicista, dono da fazenda Glória, colabordor do Boletim da Sociedade Luso-Africana do Rio de Janeiro, que congregava parte da "intelligentsia" do colonialismo republicano, radicada no Brasil)

Fonte: Boletim da Sociedade Luso-Africana do Rio de Janeiro, nº 8, janeiro e março de 1934, pág. 35.

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Nota do editor:

quinta-feira, 27 de agosto de 2020

Guiné 61/74 - P21297: (Ex)citações (369): A política de misceginação e o major de artilharia Dimas Lopes de Aguiar, autor do opúsculo "Guiné Portuguesa - Terra de Lenda, de martírio, de estranhas gentes, de bravos feitos e de futuro" (1946) (António Rosinha)

Congo ex-Belga [, hoje República Democrática do Congo] > c. 1920 > "Troféus de caça"...  

Foto de Victor Jacobs (digitalizada e editada por LG.). 

Fonte: Louis Franck - Le Congo Belge, Tome I. Bruxelles: La Renaissance du Livre. 1928. p. 152, [ O autor, Louis Franck (1868-1937) foi um político, belga, de origem flamenga, jurista, escritor, antigo ministro de estado e antigo ministro das colónias; interessou-se por questões como a colonização belga no Congo, o atvismo flamengo, etc.; fundou a École coloniale supérieure,em Anvers, em 1920, mais tarde, em 1923, Université coloniale de Belgique].



Guiné Portuguesa : terra de lenda, de martírio, de estranhas gentes, 
de bons feitos e de futuro : conferência feita em 25 de Maio de 1946 
na Escola do Exército / Dimas Lopes de Aguiar. - : Edições 
Infantaria, 1946. - 31 p.


1. Citando Beja Santos (*): 

"O Major Dimas [Lopes] Aguiar mostra-se muito preocupado com a pouca população, sugere uma operação para atrair os descendentes dos indígenas que fugiram durante as campanhas de ocupação, era importante trazer as famintas populações cabo-verdianas e mais brancos metropolitanos. 

"Era uma situação demográfica que precisava de terapêutica urgente, não podia haver tão poucos brancos. Pelo censo de 1940, existiam na colónia 1419 indivíduos brancos, sendo 899 do sexo masculino e somente 520 do sexo feminino. E sentenciou:  'Não se pode concluir que estejamos no caminho de evitar a condenável e aviltante procriação de mulatos, que já então se contavam por 2200 almas' ”.



António Rosinha, Pombal, 2007

2. Comentário de António Rosinha:


(i) beirão, tem mais de 120 referência no nosso blogue; (ii) é um dos nossos 'mais velhos' e continua, ativo, a participar, com maior ou menor regularidade, no nosso blogue, como autor e comentador; (iii) andou por Angola, nas décadas de 50/60/70, do século passado; (iv) fez o serviço militar em Angola, em 1959, sendo fur mil, em 1961/62; (v) diz que foi 'colon' até 1974 e continua a considerar-se um impenitente 'reacionário' (sic); (vi) 'retornado', andou por aí (, com passagem pelo Brasil, já sem ouro, nem pedras preciosas...), até ir conhecer a 'pátria de Cabral', a Guiné-Bissau, onde foi 'cooperante', tendo trabalhado largos anos (1987/93) como topógrafo da TECNIL, a empresa que abriu todas ou quase todas as estradas que conhecemos na Guiné, antes e depois da 'independência'; (vii) o seu patrão, o dono da TECNIL, era o velho africanista Ramiro Sobral; (viii) é colunista do nosso blogue com a série 'Caderno de notas de um mais velho''; (ix) pelo seu bom senso, sabedoria, sensibilidade, perspicácia, cultura e memória africanistas, é merecedor do apreço e elogio de muitos camaradas nossos, é profundamente estimado e respeitado na nossa Tabanca Grande, fazendo gala de ser 'politicamente incorreto' e de 'chamar os bois pelos cornos'; (x) ao Antº Rosinha poderá aplicar-se o provérbio africano, há tempos aqui sabiamente citado pelo Cherno Baldé, o "menino e moço de Fajonquito": "Aquilo que uma criança consegue ver de longe, empoleirado em cima de um poilão, o velho já o sabia, sentado em baixo da árvore a fumar o seu cachimbo". ]


Isto de ser contra a procriação de mulatos, penso que nem Norton de Matos ou outros africanistas tiveram tal pretensão.

Sempre andamos a copiar os outros , mas neste caso nunca seguimos os nossos vizinhos colonialistas.

É que ficava muito caro levar mulheres para acompanhar militares, funcionários, agricultores, mineiros, e comerciantes, etc.

Aprendi (ao vivo) que os belgas que fossem para o ex-Congo Belga, caso fossem casados e tivessem crianças para criar, e para evitarem de levar a família, o Governo proporcionava, caso pretendessem, o direito a uma "empregada doméstica" branca, (não li a norma, foi de ouvido).

Ou seja, tinham direito a "lavadeira branca", nos nossas "normas" coloniais desde Bartolomeu Dias.

Como comprovei isso? Quando foi da independência do Congo Belga (junho de 1960), os belgas fugiram porque começou uma guerra imediatamente que durou mais anos que a de Angola, e fizeram de Luanda um ponto de refúgio, enquanto não veio a ponte aérea.

Foram mobilizados hoteis, pensões, espaços escolares, e estranhou-se tantos casais sem filhos, e tantas mulheres dadas à paródia, e veio a explicação.

Ou seja, havia um certo apartheid natural no Congo Belga, mas aquilo já tinha uma exploração mineira que dava para ter "lavadeira importada"

Hoje, e já naquele tempo, os africanos não achavam muito mal, como se possa pensar, que os africanos estranhassem o apartheid.

Ao fim e ao cabo era a vivência natural mais semelhante à vida tribal.

Com os belgas "retornados" não vinham nem crianças nem adultos mulatos.

Será que este major estava certo? (**)

26 de agosto de 2020 às 12:06

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segunda-feira, 9 de outubro de 2017

Guiné 61/74 - P17838: Notas de leitura (1002): “A Última Viúva de África”, por Carlos Vale Ferraz; Porto Editora, 2017 (Mário Beja Santos)



1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 28 de Setembro de 2017:

Queridos amigos,
Carlos Vale Ferraz é autor de uma das obras-primas da literatura de guerra, "Nó Cego". Ao longo dos anos tem dividido a sua atividade literária pela ficção e pela historiografia contemporânea. O seu novo romance leva-nos até às sanguinárias guerras do Congo, pós-independência, a articulação nos grupos catangueses e mercenários de muitas origens com o que se passava no Leste de Angola.

A enigmática Madame X é uma minhota que chegou ao Congo nos anos 1950 e que vai avisando Luanda e os serviços de informação portugueses do que se está a passar, Miguel Barros é o português que viverá toda a trama deste período tumultuoso e que mais tarde deixará uma gravação que funciona como o fio de Ariadne no labirinto dos acontecimentos, um desfecho espantoso de um mausoléu de Madame X num templo algures no Alto Minho - dali partiu alguém para viver os dramas do império e ali regressou como último parágrafo da descolonização.

Um belo romance, sem margem para dúvida.

Um abraço do
Mário


A Última Viúva de África, por Carlos Vale Ferraz

Beja Santos

Para além de investigador de História Contemporânea de Portugal, Carlos Vale Ferraz é nome cimeiro da literatura da guerra colonial, não se pode fazer o seu estudo sem indagar esse extraordinário romance que é "Nó Cego" (primeira edição em 1983). Tem escrito diversos romances e agora volta a averbar a guerra colonial à sua ficção. “A Última Viúva de África”, Porto Editora, 2017, tem como trama a antiga colónia belga do Congo, a guerra de Angola, Madame X, uma portuguesa oriunda do Minho que trabalhava como informadora e conhecida por Kisimbi, a “mãe” pelos mercenários que combatiam em prol da secessão do Catanga, é esse o tempo pretérito porque mais próximo temos a sugestão de um filme passado no Alto Minho em torno do mausoléu que o filho multimilenário de Madame X procura erigir junto do velho templo, mas os antagonismos a tal propósito são enormes. O fio condutor vai do presente ao passado e uma gravação vai vertebrando o historial de guerras sangrentas, crimes abomináveis, cenários de loucura em que intervêm os Flechas, os mercenários do batalhão Leopardo, alguns descendentes desses protagonistas que o romancista vai progressivamente pondo em cena.

Logo a jornalista Lívia Catarino, “uma jovem magra, com movimentos felinos. Os cabelos pelos ombros, frisados, e o rosto seco, sem qualquer pintura. O tipo de mulher suburbana que tanto pode estar encostada a uma parede, na rua, à espera de clientes, como a trepar a um monumento para tirar a fotografia ao corpo despedaçado de um bombista”. Inicia-se uma viagem até Vilar, no concelho de Vieira, é aí que se pretende construir o mausoléu, por aí se faria um filme, é o propósito do produtor de cinema Miguel Barros que confia nos talentos do realizador Herberto Popovic. Fernando Oliveira, o filho de Madame X, entra em cena, conversa com Miguel Barros, que conheceu a mãe no Congo. Os protagonistas sucedem-se: Inácia Luz, Fabiola, a filha de um nome lendário do comandante do batalhão Leopardo, Jean Scrame. É um jogo de espelhos, as imagens revertem-se, vai-se ao fundo do passado e é então que uma bobine revela o que Miguel Barros tem para contar sobre todo esse processo descolonizador que meteu chacinas, torcionários, que foi palco iluminado da Guerra Fria. Porque Miguel Barros é uma dada imagem de um português que após diferentes deceções profissionais pega numa máquina fotográfica e aterra no Congo. Chegado a Leopoldville, conhece no hotel La Regina esta Madame X enquanto se ouvem tiros por toda a cidade. “Há três meses que Alice enviava mensagens para Luanda, dirigidas ao governador-geral, ao diretor da PIDE, aos administradores dos postos do lado de lá da fronteira, a informá-los de que o caos em que o Congo mergulhara se espalharia como um enxame de abelhas sobre Angola”. O romancista torna a vida mais fácil ao leitor apresentando-nos Holden Roberto, os acontecimentos angolanos de 1961, os combates no Norte de Angola e os mercenários, os catangueses, Tshombé e o Catanga. É um romance de conflitos, pigmentado de horrores e de combates cruentos, como num filme tipo Apocalypse Now. Entre os mercenários há até um português chamado Rodrigues que muitos anos mais tarde será visto como segurança num centro comercial. Os mercenários foram muitíssimos úteis numa dada fase da guerra, incómodos quando Mobutu se tornou o senhor absoluto do Congo. Em Vila Teixeira de Sousa, Miguel Barros conversa com um inspetor da PIDE Albano Martins e apercebe-se que houvera um aproveitamento tribal para formar os Flechas. Miguel Barros presenceia todos estes incêndios, a deposição de Lumumba, a bestialidade dos Muleles que praticavam a política da terra queimada.

Há momentos aterradores, como os massacres de Stanleyville, a prosa de Carlos Vale Ferraz é primorosa, é um mundo em convulsão onde os Simbas executam, rasgam corpos a seu belo prazer. Não é esquecido Che Guevara, que por aqui andou e se amargurou, apercebendo-se que tantos os revolucionários congoleses como os angolanos não possuíam nem estratégia nem inserção nas massas populares. Toda esta confidência de Miguel Barros a Inácia Luz dá circunstância ao leitor para acompanhar do princípio ao fim o caos congolês até à chegada do despotismo de Mobutu. Assistiremos ao conflito angolano como guerra civil, à partida de Madame X, dos mercenários, dos homens da PIDE. Num novo vaivém dos jogos de espelhos vamos conhecer melhor o drama desses protagonistas e dos seus familiares, e então voltamos a um Portugal quase atual em que Fernando Oliveira conseguiu o que quis para ter um mausoléu em honra de Madame X.

É um romance muito belo, onde se mesclam fugas permanentes, dissimulações, segredos guardados até ao limite, cenários de hecatombe, mitos africanos, a amargura pelos paraísos perdidos e, subliminarmente, a queixa inerente à incompetência dos políticos que não souberam encontrar respostas para obstar todo aquele atoleiro africano que deixou feridas abertas até ao presente. E não é por acaso que a última viúva de África veio finalmente descansar num dado ponto do Minho, de onde partira, para fugir à fome, aí pelos anos 1950 do século passado.

Carlos Vale Ferraz voltou a África com uma prosa intensa que incendeia o drama congolês e o pesadelo angolano, estruturou com enorme talento uma figuração entre o passado e o presente, entre a sobrevivência no tumulto dos acontecimentos e a pesada crítica aos europeus que também falharam o encontro com a História.
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Nota do editor CV:

Último poste da série de 6 de Outubro de 2017 > Guiné 61/74 - P17828: Notas de leitura (1001): Os Cronistas Desconhecidos do Canal do Geba: O BNU da Guiné (3) (Mário Beja Santos)

quinta-feira, 21 de julho de 2016

Guiné 63/74 - P16322: As minhas crónicas do tempo da Diamang, Lunda, Angola (1972-1974) (José Manuel Matos Dinis) - Parte VII: a cultura da "responsabilidade social"...


Fonte: Companhia de Diamantes de Angola : breve notícia sobre a sua actividade em Angola (Diamang). Lisboa : Companhia de Diamantes de Angola  (Diamang), 1963.


1. Mensagem do José Manuel Matos Dinis:

Foto à esquerda:

José Manuel Matos Diniz, 

(i)  ex-fur mil at inf, CCAÇ 2679,Bajocunda, 1970/71;

(ii) nosso grã-tabanqueiro e adjunto do régulo  da Magnífica Tabanca da Linha, Jorge Rosales;

(iii) depois do seu regresso a casa, a Cascais, em janeiro de 1972, vindo da Guiné, rumou até Angola, em maio de 1972;

(iv) vai viver e trabalhar na Lunda, na melhor empresa angolana na época, a famosa Diamang - Companhia de Diamantes de Angola, com sede no Lundo;

(v) aqui casou (por procuração), aqui nasceu o seu primeiro filho:

(vi) desafiado por nós justamente a falar da sua experiência angolana em meia dúzia de crónicas memorialísticas,  aceitou galhardamente o desafio e já foi além, do prometido (*).


Data: 12 de julho de 2016 às 22:11

Assunto: As minhas memórias do tempo da Diamang, Lunda, Angola - parte VII

Caros amigos Luís e Carlos,

Aqui vai a parte VII das memórias, agora com uma divulgação sobre métodos aplicados naqueles azimutes, que já revelavam alguma modernidade de gestão. Infelizmente, até o pessoal mais qualificado podia não intuir o alcance de algumas orientações, mas que existiam... lá isso existiam, e tinham como preocupação o primado do ser humano.

Enquanto não me mandarem parar, e tiver alguma coisa para contar, levam comigo.

Abraços fraternos
JD


2. As minhas crónicas do tempo da Diamang, Lunda, Angola (1972-1974) (José Manuel Matos Dinis) - Parte VII: uma cultura de "responsabilidade social"

Quando um empregado chegava à Lunda, recebia tapetes, tecidos para cortinados, lençóis... e uma grossa pasta-arquivo com inúmeras ordens de serviço, onde, em princípio, poderiam ser encontradas as diferentes orientações do ponto de vista técnico e social. Também recebi, mas não li mais do que uma dúzia, pelo que muitas das matérias ali tratadas nem tive conhecimento delas, e algumas, em leituras posteriores, constatei que teriam muito interesse para a melhoria da condição de vida dos trabalhadores e familiares.

Esta culpa de que me retrato, tem a ver com a enormidade da pasta, e com a escassez de tempo para além do horário normal de trabalho, mas, principalmente, porque a Companhia não se interessou pela criação de programas de aferição, difusão, melhoria e tratamento das matérias ali expostas.

A dar conta desse género de preocupação social, leia-se com alguma delícia uma passagem:
Com os trabalhos da Companhia «a tenebrosa Lunda abriu-se como flor exótica, e os benefícios da civilização e da cultura entraram nela como bênção do céu. À riqueza diamantífera que ela oferecia, riqueza do adorno e de coisas sumptuárias, como de indústria e ciência, respondia a Diamang com riqueza de princípios de desbravamento, de elevação humana... Por muito estranho que possa parecer aos detractores (e das obras insignificantes não os há) ou aos ignorante (e de todas as obras os há), a Companhia deixa, praticamente, tudo o que tira na própria Província».

De algumas coisas  tão evidentes e de tanta grandeza e importância, a par de outras de mero sentido lúdico, já dei parcial conta e significado da vitalidade para a região e para a província, mas não posso subscrever a parte relativa ao investimento local, bem como aos empréstimos financeiros ao Estado, na medida em que não tenho elementos de consulta sobre valores de produção e vendas, nem dos valores relativos a encomendas, investimentos, importações e outras despesas.

É do conhecimento geral que a Companhia beneficiava de sérias isenções sobre importações, mas também é verdade que fazia empréstimos ao Estado mediante juros simbólicos e insignificantes. Este extracto tem apenas uma intenção, a de mostrar como sob a forma de relatórios, também pode ser possível fazer expandir mensagens de carácter social com vista à inclusão das classes, que todos sabemos, não acontece com a velocidade de um clique. Ali havia aquela preocupação, e aos diferentes quadros é que poderia imputar-se a responsabilidade sobre o desleixo de delas não tomarem conhecimento nem fazê-las aplicar.

«Nunca impôs superioridades raciais, mas bateu-se e bate-se pela fraternidade humana e pela igualdade perante a lei, embora partindo da 'igualdade de méritos', como é próprio das sociedades progressivas».

Não foi, seguramente, sempre assim, mas é consolador que houvesse preocupações dessa índole.

«Estabeleceu, assim, nas tais terras tenebrosas, o nervo criador e trepidante da 'civilização adequada', que se estendeu desde a 'humanização do clima' até à 'humanização do silvícola', desde a plantação da mandioca e da citrina até à protecção às grávidas e à infância».

Em 4 de Dezembro de 1920 celebrou-se um contrato com o Alto-Comissário que fixava uma grande região de "claims", e em contrapartida, a Diamang obrigava-se:

a) a intensificar os trabalhos de pesquisa e exploração de diamantes nas áreas concedidas, de forma a aproveitar, o mais possível, as concessões;

b) a dar à Província, em acções inteiramente liberadas, 5% de todo o capital já emitido ou que o viesse a ser;

c) a entregar à Província, anualmente, 40% dos lucros líquidos;

d) e, ainda, a emprestar à dita Província 400.000 libras, em duas prestações iguais...

"Presentemente, nos termos dos contratos celebrados em... e 10 de Fevereiro de 1955... tem a Província direito a 50% dos lucros da Companhia, o que representa para as finanças de Angola uma participação verdadeiramente notável».

O distrito da Lunda, como, aliás, grande parte do território angolano até aos anos sessenta, representava uma fase embrionária de desenvolvimento social, fortemente influenciado pelas tradições tribais, na medida em que a presença dos brancos que levaram os primeiros métodos e instrumentos de trabalho e organização, circunscrevia-se às regiões urbanas e arredores. Deve ter-se em conta o imenso território da província, e a escassez de população, apresentando baixíssimo índice de habitante por quilómetro quadrado.

A Diamang carecia de grande número de pessoal indiferenciado, que a Lunda não podia proporcionar, pelo que também recorreu ao regime dos contratados, trabalhadores que eram deslocados desde grandes distâncias. O processo não se pode classificar de dignificante, pelo contrário, pois havia angariadores que ofereciam prendas a certos sobas, que designavam as pessoas a transferir. Só uma minoria se fazia acompanhar das famílias, pois a grande maioria eram jovens robustos e solteiros, que, geralmente, acabavam por cruzar laços de sangue com mulheres locais.

Inicialmente viviam em casas de construção tradicional, e as aldeias não dispunham de quaisquer infra-estruturas. Com o decorrer dos tempos e a prosperidade da Companhia, que também se reflectia nos salários de milhares de trabalhadores, o que aumentava a massa de capital circulante, houve nítida evolução, quer do modelo das casas da população que não beneficiava de habitação fornecida, quer nas infra-estruturas das aldeias, que incluíam latrinas, pontos de água, e por vezes banhos públicos e tanques de lavagem.

"Em matéria de trabalho houve o reconhecimento de que as populações africanas, pela sua debilidade económica e correspondente pouco desenvolvida divisão do trabalho, não estavam em condições de eficazmente, defender os seus direitos e interesses dentro de um sistema caracterizado pelo salário. Por isso, o Estado, cumprindo o assumido dever de protecção, criou em benefício delas o regime do indigenato, de características que o especializaram em face de outras formas de intervenção estadual, também usadas em favor das classes economicamente débeis. Estes regimes caracterizavam-se por uma regulamentação protectora, particularmente apertada e paternalista».

Aqui estamos em presença de um discurso com base no pensamento oficial que foi tão severamente criticado pelos opositores ao regime. Peço, por isso, a vossa diligência para o criticarem com liberdade e fundamento, não esquecendo a particularidade da época (1963), e os regimes congéneres nas países anglófonos e francófonos dali vizinhos.

O processo de evolução social estava em marcha acentuada. Segundo a Companhia, «não se trata de fornecer ao trabalhador alimento suficiente e racional, habitação higiénica e confortável, salário justo e equacionado com as possibilidades das empresas e as necessidades familiares do trabalhador, mas, e muito principalmente, de acompanhar de perto a evolução psicológica correspondente à alteração do sistema tradicional de vida, inevitável quando o salário vem substituir os recursos angariados segundo as formas próprias das economias de subsistência». 

Por essa altura também foi dada atenção às condições do trabalho feminino, embora só um reduzido número de mulheres trabalhasse para a Companhia.

A Diamang teve ainda a preocupação de em África estabelecer a progressiva valorização e ligação das raças brancas e de cor. Melhorar as condições de vida dos nativos, zelar pelo seu bem-estar, elevando-os na escala dos valores sociais e económicos (com o contributo da escola e da igreja), eram objectivos que estavam na base de toda a organização. Para isso houve que considerar os trabalhadores africanos segundo os conceitos de:
a) grau de educação social;
b) grau de evolução profissional;
c) modalidade contratual.

A primeira qualificação revela a ponderação sobre o trabalhador desde o mínimo da evolução, até à situação de cidadania adquirida e em que o seu regime é equiparado ao do trabalhador europeu.

(Continua)


3. Comentário do editor:

Zé:  Qual a fonte? A referência bibliográfica? As fotos não são tuas... No nosso blogue, temos que pôr estas coisas, como manda a lei...

Ouras coisa: dizem que o acionista belga da Diamang  é que influenciava as decisões e a cultura da empresa: caso da criação do Museu, por exemplo... A colonização e a "pacificação" do Congo, transformada em "couto privado" do Leopoldo II, da Bélgica, são das páginas mais negras da história do colonialismo em África... Acho que fomos uns "meninos de coro" ao lado deste gajo, hoje acusado de genocídio... O que sabes dos "belgas"?

Um abraço.
Luís



Congo ex-Belga > c. 1920 > "Troféus de caça"...  Uma visão europocêntrica (imperial, pedradora, paternalista,,,) de África. Fotos de Victor Jacobs (digitalizadas e editadas por LG.). 

Fonte: Louis Franck - Le Congo Belge, Tome I. Bruxelles: La Renaissance du Livre. 1928. p. 152, [Exemplar, raro, gentilmente disponibilizado pelo meu amigo e vizinho de Alfragide, eng. agrº Francisco Freitas, nascido no antigo Congo Belga, hoje República Democrática do Congo.  O autor, Louis Franck (1868-1937) foi um político, belga, de origem flamenga, jurista, escritor, antigo ministro de estado e antigo ministro das colónias; interessou-se por questões como a colonização belga no Congo, o atvismo flamengo, etc.;  fundou a École coloniale supérieure,em  Anvers, em 1920, mais tarde, em 1923, Université coloniale de Belgique].


4. Resposta do José Manuel Matos Dinis, com data de 13 do corrente:

Olá, Luís, tens razão.

A fonte é uma publicação da Diamang, datada de 1963, sob o título Companhia de Diamantes de Angola: Breve notícia sobre a sua actividade em Angola. Não faz referência a restrições sobre publicações. É uma edição própria. 

No meu tempo não havia belgas, apesar de uma participação no capital que a Forminiére detinha. Mas foram os belgas que intuíram da existência de diamantes em Angola, tendo em conta a proximidade geográfica das jazidas, e a continuidade das condições morfológicas e geológicas do território. 

Também foram eles a dar impulso à prospecção e a entenderem-se com o Governo para o inicio das explorações. Isso está na Net. 

Meninos de coro? Claro que sim, apesar de termos tido exemplares dados à exploração do preto considerado subproduto da humanidade. Norton de Matos, que pretendeu dignificar o tratamento dado aos nativos, foi corrido depois de o Parlamento o ter desancado com o argumento de bon-vivant, mas só fazia um trabalho encomendado, que incomodaria o Norton. A A.N. desconsiderou-o tanto, que o senhor foi demitido por duas vezes, e durante esse período o regime foi de difícil explicação, entre o liberal e o esclavagista.

O curioso, é que foi o desencadear da guerra, que permitiu um fluxo importante de colonos, mais apetrechados, que ajudaram à mais brilhante expansão sócio-económica da iniciativa dos portugueses.  Se o Brasil foi em tempos o orgulho de país irmão, não sei se Angola quereria romper os laços, mas seria, certamente, uma sociedade moderna e exemplar, porque todo o crescimento era equilibrado e reflexo dos níveis de progresso atingidos.

Um abraço,
JD


5. Resposta de LG, no mesmo dia:

Obrigado, Zé, confirmo, encontrei a referência na Porbase - Base Nacional de Dados Bibliográficos:

Companhia de diamantes de Angola : breve notícia sobre a sua actividade em Angola (Diamang). Lisboa : Companhia de Diamantes de Angola(Diamang), 1963.

É suficiente.

Ab.
LG
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Nota do editor:

Último poste da série > 4 de julho de  2016 > Guiné 63/74 - P16265: As minhas crónicas do tempo da Diamang, Lunda, Angola (1972-1974) (José Manuel Matos Dinis) - Parte VI: singela homenagem ao etnólogo e antigo diretor do Museu do Dundo, João Vicente Martins (n. 1917)

quarta-feira, 29 de janeiro de 2014

Guiné 63/74 - P12652: O nosso blogue como fonte de informação e conhecimento (18): "A caça no império português", de Henrique Galvão e outros (1943) (Miguel Alves P. Joaquim / Mário Beja Santos)


Congo ex-Belga > c. 1920 > "Troféus de caça".. ou uma certa visão europocêntrica de África. Fotos de Victor Jacobs (digitalizadas e editadas por LG.). 
Fonte: Louis Franck - Le Congo Belge, Tome I. Bruxelles: La Renaissance du Livre. 1928. p. 152... (Exemplar, raro, gentilmente disponibilizado pelo meu amigo e vizinho de Alfragide, Eng. Agrº Francisco Freitas, nascido no antigo Congo Belga, hoje República Democrática do Congo..  (L.G.).

1. Mensagem do nosso leitor Miguel Alves Pereira Joaquim

Data: 3 de Janeiro de 2014 às 02:19
Assunto: Fascículo, citado no blogue, de "A caça no Império Português"


Ex.mos Senhores

.Os meus cumprimentos.
Tendo eu uma coleção incompleta dos fascículos da obra "A caça no Imperio Português", apenas me faltando a fascículo nº 18 e tendo lido no vosso blogue que encontraram um fascículo avulso na feira da ladra, decorria o ano de 2012, venho solicitar-lhes se me poderiam facultar alguma informação mais detalhada sobre o localização/vendedor onde se encontrava esse achado, na esperança de me ser possível indagar se o mesmo terá porventura o fascículo em falta.

Muito lhes ficaria agradecido por qualquer informação sobre o assunto.

Melhores cumprimentos

Miguel Alves Pereira Joaquim




Guiné Portuguesa > c. 1940 > Fauna: distribuição das principais espécies: elefante, leão, búfalo, chimpanzé (Fonte: Galvão et al, 1943).
2. Resposta, com data de 27 do corrente, do nosso colaborador Mário Beja Santos que fez a recensão ao citado livro ("A Caça no Império Português") (*), e a quem solicitámos a gentileza de responder ao nosso leitor:
Prezado Sr. Miguel Joaquim, Lamento só hoje responder-lhe. A compra que fiz de um fascículo desta obra, e sobre a qual falei da caça na Guiné, foi um bambúrrio da sorte, havia naquela ocasião um punhado de fascículos, interessou-me a caça da Guiné e comprei-o.

Como frequento muitos alfarrabistas, e na presunção de que vive em Lisboa ou perto, recordo-lhe que muitos deles têm sites e são passiveis de ser contactados, não se esqueça que quem procura acaba por achar. 

Cordiais cumprimentos, Mário Beja Santos. (**)

___________

Notas do editor:

(*) 20 de julho de 2012> Guiné 63/74 - P10174: Notas de leitura (382): A Caça no Império Português, de Henrique Galvão, Freitas Cruz e António Montês (Mário Beja Santos)

(...) “A Caça no Império Português” da autoria de Henrique Galvão, Freitas Cruz e António Montês, foi editada pelo jornal “O Primeiro de Janeiro”, em 1943 e depois editado em dois volumes, com uma belíssima apresentação. Os bibliófilos disputam a obra que se vende por importâncias que se aproximam dos 500 euros, dada a sua raridade. O fascículo nº 6 está sobretudo centrado na Guiné portuguesa. 


Para os autores, a Guiné de então não podia ser apontada ainda como um paraíso de caçadores, mas as espécies cinegéticas interessantes são dignas de ser tomadas em atenção: antílopes, búfalos, leopardos, símios e hienas, hipopótamos, jacarés… Sendo das colónias menos estudadas por naturalistas, avançam os autores, dão, sob todas as reservas, a classificação científica dos animais que constituem a lista de espécies cinegéticas da Guiné. Queixam-se que falta uma lei de caça para a colónia e por isso estão desaparecendo ou escasseando algumas espécies cinegéticas. 

Começando pelos grandes mamíferos, informam que o elefante é raro na Guiné e põem mesmo em dúvida se existe. O seu habitat situar-se-ia nas margens do Corubal e poderia ter ido até Buba e Fulacunda. Quanto ao hipopótamo ou cavalo-marinho reconhecia-se ser muito abundante na colónia.

Quanto aos bovinos referem o búfalo, abundante em S. Domingos e Susana e entre S. Domingos e Barro; no Leste, na região do Boé, em Quinara, em Fulacunda, em Enxalé e Xitole e no Sul em Cacine e na região de Tomabali.

O leão era já dado como raro embora houvesse relatos da sua existência em Xitole e Farim. O leopardo (impropriamente designado por onça e pantera), só era conhecido através de uma espécie. Os autores falam também na hiena, no mabeco, cão do mato e chacal.
Passando para os pequenos carnívoros põem em dúvida a existência do lince africano e dizem existir por toda a colónia o gato bravo e o gato tigre. Consideram que proliferam os manguços ou genetas, as lontras e algumas espécies de doninhas. No que toca aos grandes antílopes, põem reservas sobre a sua existência na Guiné e escrevem mesmo: “A existir, como alguns caçadores asseguram, é muito raro.  Apareceria, ocasionalmente, na região do alto Geba e nas nascentes do Cacheu”. 

Boca branca é o nome que na Guiné se dá à palanca de Angola e afirmam estar espalhada no interior tal como o Bubal. Quanto a médios e pequenos antílopes registam a gazela de lala, o sim-sim, a gazela pintada, as cabras e cabritos de mato e põem em dúvida a existência do cabrito aquático. Escrevem que os javalis se encontram nas grandes florestas e elencam vários tipos de macacos: galago do Senegal, chimpanzé, macaco fidalgo, macaco sera, macaco verde, macaco de nariz branco, macaco fula e macaco cão. No que toca a outros mamíferos dão com existência comprovada o porco-espinho, a lebre ou porcos formigueiros. (...)


(**) Último poste da série > 31 de dezembro de 2013 > Guiné 63/74 - P12528: O nosso blogue como fonte de informação e conhecimento (17): Doença do sono: investigação sobre conhecimentos, atitudes e comportamentos (Luís Costa, Universidade de Coimbra)

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Guiné 63/74 - P7112: Caderno de notas de um Mais Velho (Antº Rosinha) (7): As descolonizações exemplares. Visto em 1960-1980-2010

Vaticano numa tabanca na Costa do Marfim


Caderno de notas de um Mais Velho -7

António Rosinha*

As (des)colonizações exemplares, portuguesas, belgas, francesas e inglesas. (A França tem bons arquitectos)

Visto em 1960-1980-2010

Não  ter motivo pessoal, nem nacional, nem moral, nem ideologia, nem espírito de aventura para ir para uma guerra numa terra estranha, mesmo que só por dois anos e por obrigação, é meia guerra que não se ganha.
Mas aquela guerra fez-se mesmo para ser ganha por alguém?

Tive um colega em Luanda, oriundo da região da Bairrada, que quando a rádio tocava o hino Angola é Nossa à uma da tarde, enquanto se tomava a bica da ordem da hora de almoço, invariavelmente largava esta:
- Troco a parte de Angola que me toca, por um café.

Esta frase saía-lhe instintivamente sempre que se ouvia aquele hino e entre a tertúlia desse colega, praticamente generalizou-se, e a muitos de nós já saía automaticamente igualmente essa boca.

E era chato dizer isso, porque no meio da malta havia muitos colegas que eram angolanos e outros não o sendo estavam já tão ligados a Angola, quer por laços de família, quer porque eram naturais de lá e nem tinham ligações com outra terra, ou mesmo tendo ido para lá de crianças, tinham assumido aquela terra como deles, e muitos já tinham casa própria e filhos já nascidos lá.

E muitos eram angolanos de pai e de mãe e até poderiam ter eventualmente familiares no MPLA ou outros movimentos. Mas tenho a dizer que, aquele meu colega que trocava a parte dele por um café, ele gostava mesmo muito de café! E nunca passava sem o vício do café, portanto Angola já poderia também equivaler a um vício para ele, e um vício não se larga facilmente.

Como o meu ponto de vista sobre a guerra do ultramar, é muito diferente da maioria dos elementos desta tertúlia, com raras excepções, digo que vivi os treze anos de guerra em Angola, em todas as fronteiras, desertos, planaltos, praias e cidades, excepto no enclave de Cabinda, sempre acompanhado por angolanos.

Para mim e milhões em Angola, ninguém reconheceria quem quer que fosse com idoneidade nem responsabilidade para assumir a governação daquela província, assim como das colónias em volta dela.
E seria um genocídio os franceses e belgas darem a independência às suas colónias.

E, assim aconteceu, e não falo com demagogia nem com Salazarismos, nem socialismos, nem colonialismos. Sabe-se na literatura e na história o que foi o genocídio de 4 anos da II Grande Guerra, mas ainda não está publicado em literatura o genocídio de 50 anos bem perto da fronteira de Angola, onde se fala francês e algum inglês.

Também na Guiné após a independência, ajudei a tapar buracos nas estradas em vários pontos do país, provocados por minas durante a guerra e pela chuva, senti explodir armadilhas (explodiam como uma granada de mão ofensiva) sob uma máquina própria, nas bermas da estrada Quebo-Buba durante uma reconstrução, vi esqueletos de berliets(?) no caminho para Madina do Boé, vi explodir armadilhas na cinta de segurança à volta do aeroporto de Bissau, onde até já inadvertidamente tinha andado a pé.

E ouvi imensos guineenses perguntarem-me se conhecia um soldado de Viseu, outro de Viana, outro de Moncorvo e e de outras terras, e de terras que eu nem conhecia, e se os visse um dia que lhe dissesse que o pai ou irmão ou o tio dos comandos tinha sido fuzilado.

Mas antes desta nossa guerra, vi uma outra que me marcou, que foi ao lado de Angola no ex-Congo Belga, era eu Cabo Miliciano em 1960, e que me esclareceu um pouco o que se estava a passar em África sob o ponto de vista africano e internacional, e principalmente o meu próprio ponto de vista de português.

Vi os Belgas fugirem (retornarem), e os únicos brancos que lá ficaram foram os emigrantes portugueses que lá havia, que eram muitos milhares..

Estava eu na fronteira com a cidade de Matadi, no rio Zaire em Noqui, e todos os sábados começava o tiroteio, e lá vinham os portugueses daquela cidade para o lado de Angola passar o fim de semana, porque o tiroteio só parava Domingo bem tarde.

Teimosos, segunda-feira regressavam, e alguns lá iam fazendo amizades com as facções de militares, e lá se entendiam e parece que até se governavam.

Entretanto começaram a aparecer militares da ONU, marroquinos, indianos, (para aumentar a confusão como hoje a NATO no Afeganistão) e também vinham ao nosso lado, abastecer-se pois lá estava já tudo descontrolado.e a saque.

Quem já lá estava, eram cooperantes suecos e suecas e outras nacionalidades, tal como passados 19 anos fui encontrar na Guiné. Também vinham de vez em quando a Noqui beber cerveja ou dar uns mergulhos numa piscina que existia em Noqui. Tal como na Guiné se iam abastecer de combustíveis e mantimentos a Dakar. Mas sempre olhando para nós portugueses, como seres usurpadores de uma terra que eles vinham libertar e preparar para a vida.

Na Guiné tinham também o sentimento que fomos uns nazis, e chegavam a dizê-lo na nossa cara em tertúlias de café.

Sei que na Guiné, chegaram a interromper com a cooperação, no ex-Congo Belga ainda andam por lá algumas ONG, pelo que leio em blogs.

Normalmente todos aqui ouviram falar em genocídios no Congo, mas para quem não tenha dado importância a este caso, lembro que está decorrendo uma tentativa para julgar internacionalmente os culpados, tal a quantidade de gente dizimada nas fronteiras do Congo, Ruanda e Burundi. Quem testemunhou e testemunha (como mirones) esses massacres, há 50 anos, são essas cooperações nórdicas.

E, eu vi a irresponsabilidade do início dessa desgraça congolesa que continua neste momento, e que os únicos "colonos" que durante muitos anos não abandonaram aquele território foram uns numerosos portugueses caracteristicamente teimosos tal como os comerciantes que ficaram em Bissau e que como estes, abriam religiosamente as suas lojas às oito da manhã para mostrar as prateleiras vazias.
Hoje não sei como está a presença desses comerciantes, tanto em Bissau como no ex-Congo Belga (RDC).

Recentemente, Kabila (filho),  actual presidente da RDC,  propôs-se perante o governo português indemnizar aqueles portugueses que foram espoliados de comércios ou industrias que tinham lá.

Mas também vi, alem dos cooperantes suecos, alguns mercenários de Bob Denard, na fronteira leste de Angola, por onde fugiram a uns apertos no Katanga. Com estes, desarmados, até viajei num Nord Atlas da Força Aérea para Luanda, estava eu a passar à disponibilidade em Janeiro de 1960.

Verifica-se que as ex-colónias belgas e portuguesas foram vítimas da fraqueza de Portugal e da Bélgica como potências internacionais militarmente e politicamente, para as proteger dos facínoras da guerra fria e dos venenosos ingleses e franceses, que todos chegaram a ter projectos próprios para aqueles territórios.


(Ainda hoje, os franceses estão examinando um avião derrubado há muitos anos nas matas africanas, para provar que não foram eles que o derrubaram. Vinham nesse avião o presidente do Ruanda e o presidente do Burundi, constava na altura do derrube, que eram demasiado anglófonos. Como os Belgas não actuavam...!)


Até Che Guevara tentou a sua sorte por estas bandas.


(Entre os muitos livros que a Caminho publicava e enviava para Bissau nos anos 70/80, havia uma literatura sobre a actividade soviética em África, e havia um livro chamado em português «A Varanda de África», que descrevia as tentativas de infiltramento da União Soviética na ex-colónia inglesa Quénia.


Mais tarde este livro ajudou-me a compreender o que eram os ingleses quando se responsabilizaram pela vida de Salman Rushdie, quando avançaram sobre as Malvinas, e quando avançaram ao lado dos americanos recentemente para salvar o Afeganistão e para o "petróleo" do Kuwait e Iraque.


Não quer dizer, que não houvesse Biafras, metropolitano de Londres e outros casos, mas até os eltons jones os têem no sítio, e só contam e discutem os mortos no parlamento e no fim da guerra).

Mas uma certa ingenuidade daquelas cooperações nórdicas ajudaram a provocar perspectivas tão falsas naqueles povos, que foram em certos casos tão prejudiciais como as armas dos mercenários, porque o alvoroço provocado com tanta "alvura repentina e contrastante" desestabilizava e distorcia completamente a realidade daquelas sociedades tradicionais.

Sem falar que muitas das cooperações não passavam de funcionários da ONU e das ONG, que faziam daquela actividade modo de vida, e tal como aventureiros, tanto se davam com o povo, como com os seus governantes menos honestos (para não chamar outros nomes), e provocavam e provocam uma inibição completa na actuação das chefias e hierarquias tradicionais que não se refazem mais após a saída dessa gente, ficando o vazio.

Eu vi esse retrato no Congo em 1960/63 e em Bissau em 1980 e seguintes. Também poderei ter feito esse papel de aventureiro, não sei bem, mas um dia posso explicar se não escandalizar de mais.

O primeiro militar da República do Congo que vi na minha frente em 1960, era um Sargento-Major, que foi a Noqui com as suas mulheres beber cerveja, trazendo atrás o ordenança, bem fardado e calçado, com o par de botas do sargento, penduradas ao pescoço pelos atacadores.

Um outro sargento chamado Mobuto tomou conta daquele território imenso e governou perto de 30 anos com residência habitual na Suíça.

Ver o que se passava ao lado, seria lógico transferir o mesmo para Angola?

Claro que isto foi em 1960, e o Salazar escondia-nos que o Kennedy já financiava a UPA, que em 1961 provocaria aquele massacre no Norte de Angola. Também não sabia o que se preparava em Conacri.

Há uns meses ouvi na Gulbenkian a um ex-desertor, historiador açoriano, que havia uma solução fácil para nós, que, mais ou menos (resumindo), confiar no Kennedy, que ficava o problema resolvido.

Sinceramente, sabendo hoje o que os americanos fizeram desde a Hiroxima, passando pela Coreia com o paralelo 38, com o Vietname Norte e Sul, sem falar no Afeganistão nem no Iraque, e sabendo que já estavam em Angola a criar com o apoio à UPA, um paralelo bem definido e bem tribalizado... sinceramente, Medeiros Ferreira, que conte a história, sim, mas que apresentasse os americanos como solução do problema, é uma desilusão.

Entendido que as análises que faço hoje, não as fazia da mesma maneira com 22 anos.

Mas ainda hoje, penso que os ventos da história sopraram cedo demais, e nós portugueses e guineenses sofremos com isso, e os angolanos e moçambicanos prolongaram a luta por mais umas dezenas de anos.

A paciência, a sabedoria e a prudência de um povo sofrido, deu e continua a dar uma lição a muita gente: São os cabo-verdianos. Eles sabiam que os inimigos e o perigo não era Portugal.

Mandela também sabia que os maiores inimigos não eram os Boers. Mas aí já não havia guerra fria.

Eu também gostava imenso de café

Um abraço
Antº Rosinha
__________

Notas de CV:

(*) António Rosinha, ex-Fur Mil em Angola, 1961; topógrafo na TECNIL, na Guiné-Bissau, entre 1979 e 1993

Vd. último poste da série de 19 de Setembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7006: Caderno de notas de um Mais Velho (Antº Rosinha) (5): Portugal nem explorava nem desenvolvia, colonizava pouco e mal

quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Guiné 63/74 - P6988: O nosso blogue em números (6): 2 milhões de visualizações (26% a partir do estrangeiro), c. 2800 visualizações por dia, c. 450 membros, c. 7000 postes, c. 35 comentários diários... Um pequeno ronco!



Congo ex-Belga > Anos 20 > "Troféus de caça".. ou uma certa  visão europocêntrica de África. Fotos de Victor Jacobs (digitalizadas e editadas por LG.). Fonte: Louis Franck - Le Congo Belge, Tome I.  Bruxelles: La Renaissance du  Livre.  1928. p. 152...  (Exemplar, raro,  gentilmente disponibilizado pelo meu amigo e vizinho de Alfragide, Eng. Agrº Francisco Freitas, nascido no antigo Congo Belga, hoje República Democrática do Congo.. Claro que qualquer semelhança entre o conteúdo deste poste e estas ilustrações é pura coincidência... Estamos a falar de "roncos" diferentes... Os do bogue são os da amizade, fraternidade, camaradagem e solidariedade) (L.G.).


1. Texto do editor L.G.:

Amigos e camaradas:

Devemos atingir hoje a cifra (algo mágica…) dos 2 milhões de páginas visitadas (ou visualizações), o quer dizer 700 mil desde o início do ano, uma média de 85 mil por mês / 2800 por dia (75 mil por mês / 2500 por dia de Janeiro a Abril de 2010) (*).

É de referir que a evolução deste indicador tem sido favorável, com um crescimento sustentado ao longo do tempo: partimos das 22,5 mil visitas... em finais de Maio de 2006 (fim da I Série, e abertura do actual blogue, ou II Série), para atingir as 400 mil em Outubro de 2007, as 800 mil em Outubro de 2008, o milhão em Fevereiro de 2009, o 1,4 milhões em Dezembro de 2009 e os 1,7 milhões em Maio de 2010, quando pusemos o contador Bravenet.

Recorde-se que em 23 de Abril passado, perfizemos seis anos o que na blogosfera já é uma vetusta idade.

No final da I Série, em Maio de 2006, o número de tertulianos (como então designávamos os membros da nossa Tabanca Grande, antes, Tertúlia, termo porventura um pouco pretensioso...) era cerca de 110.  Em final de 2009, éramos 390, em Maio andávamos pelos 410 e hoje estamos a caminhos dos 450.

É possível alcançar, no fim do ano, a meta (ambicionada) do meio milhar de membros...

O ano transacto foi o mais produtivo em número de postes publicados: cerca de 1900, mais 600 do que em relação ao ano anterior (2008). Mas este ano já atingimos 1400, o que dá em média 180 por mês / 6 por dia (ligeiramente mais baixa nos meses de Julho e de Agosto, coincidindo com as férias de verão). É, portanto, previsível que cheguemos aos 2000/2100 no final do ano…

Quanto aos comentários, tenho que os contar manualmente, o que é uma maçada: de qualquer modo, a avaliar pelas duas primeiras semanas de Setembro, estamos com uma média diária  de 35 a 40. Mantém-se, portanto, e de maneira sustentada, o bom nível de participação dos nossos leitores (além da qualidade, originalidade, criatividade e pertinência  de muitas intervenções). Se bem que muitos camaradas pudéssem e devessem escrever comentários (um forma, afinal, fácil, directa, expedita, de participar na vida do blogue).

Outras estatísticas possam a estar disponíveis para divulgação quer do nosso contador Bravenet (a partir de Maio de 2010) quer do próprio Blogger (a partir de Julho de 2010). Por exemplo, de acordo com uma amostra destes dois últimos meses e picos (Julho, Agosto e Setembro, que são, aliás, atípicos) (n=170 mil visualizações), apurámos o seguinte (fonte: Blogger):

(i) Por navegador, o Internet Explorer, com 74% das visualizações, destaca-se de todos os demais:

(ii) O sistema operativo mais usado (96%) é... o Windows;

(iii)  Cerca de 74% das visualizações são oriundas de Portugal, seguido do Brasil (14%) e dos Estados Unidos (3%)... Até na Lapónia somos vistos!

Das estatísticas produzidas por Bravenet (o nosso contador a partir de 9 de Maio de 2010), há algumas curiosidades a assinalar:

(i) Os dias de semana de maior tráfego (ou seja, com mais visitantes e visualizações) é a 2ª e a 3ª feira (com cerca de 32,4% do total), em contraste com o sábado e o domingo, que são os piores dias (25%  do total);

(ii) As horas do dia mais movimentadas são as que se seguem ao almoço: das 14h às 16h o blogue recebe 16.5% dos seus visitantes diários; em contrapartida, as horas mais fracas, são as depois do jantar, das 21h à 24h (cerca de 1,9% do total do dia) (o que sugere que porventura somos mais vistos nos locais de trabalho do que em casa);

(iii) 95% dos visitantes visualizam mais do que uma vez, por dia, o blogue.

Mais uma vez, quero expressar aqui os meus votos de parabéns e de agradecimento a todos que fazem todos os dias o blogue, a começar pelos meus queridos, magníficos, dedicados e competentes co-editores (Carlos Vinhal, Eduardo Magalhães Rodrigues e Virgínio Briote), sem esquecer colaboradores permanentes como o Miguel Pessoa e o José Martins e o nosso cartógrafo-mor que tem direito a honrarias vitalícias: o Humberto Reis...

Devo mencionar ainda os nomes dos camaradas Hélder Sousa, Joaquim Mexias Alves e José Manuel Matos Dinis que, juntamente com os editores, o Miguel Pessoa e o José Martins, constituem uma espécie de embrião de conselho editorial ainda não formalizado, e a quem são  enviados automaticamente, por correio electrónico, todos os comentários publicados no nosso blogue. Todos eles, muitas vezes na sombra, têm sido importantes conselheiros, ajudando-nos a levar a bom porto este barco (cuja navegação nem sempre é fácil e que tem falta de pessoal na sua equipagem)...

Muito obrigado aos novos e velhos membros da Tabanca Grande,  independentemente dos sinais de vida que dão (uns, e outros não)... Obrigado aos que escrevem, comentam, mandam fotos e outros documentos... Obrigado aos que nos lêem e comentam (uns, e outros não...).  Obrigado aos que nos divulgam. Obrigado aos que, mesmo sem darem a cara, têm um carinho especial ou um apreço, maior ou menor, por este blogue...

Um pensamento de saudade vai também para os camaradas, membros da nossa Tabanca Grande, que travaram este ano o seu último combate e que da lei da morte se libertaram: o Humberto Duarte, o Joaquim Cardoso Veríssimo e o Victor Condeço.

Esperemos poder continuar por aqui, eu e todos vocês, mais os periquitos que hão-de chegar ao longo deste ano (até aos 500, pelo menos!) , enquanto nos aprouver e nos sentirmos bem, úteis, activos, confortáveis, produtivos, saudáveis, vivos, entre amigos e camaradas da Guiné, entre portugueses, guineenses e outros homens (e mulheres) de boa vontade, novos e velhos, de diferentes gerações e de todas as cores do arco-íris...

Até lá, renovo o meu pedido de Maio passado (*): precisamos de recrutar novos editores, para já mais um, de preferência um membro  sénior da nossa Tabanca Grande, para substituir o Virgínio Briote (que já me manifestou, por diversas vezes, o seu desejo de entrar na idade de oiro, depois de feitas as pazes com a guerra e com a Guiné...). Em suma, mais voluntários, precisam-se para dar continuidade àquela que já é a maior comunidade virtual de veteranos de guerra (ou melhor, de ex-combatentes de uma guerra, de um TO específico)... Seguramente, a da Guiné (1963/74).  

É altura, entretanto, de chegarem até nós, a pretexto destes números, e dos nossos altos e baixos, misérias e grandezas, euforias e depressões, as vossas opiniões, sugestões, críticas e comentários sobre o que foi, é e deverá ser o nosso blogue... O próximo a ser publicado é um poste do Belarmino Sardinha, que face ao actual panorama do blogue, vem dizer-nos  que se quer remeter ao silêncio por uns tempos... Por nós, iremos continuar... Afinal, ainda estamos a meio da guerra: seis anos e meio...

Mantenhas a todo o pessoal da Tabanca Grande. Aqui fica um chicoração a todos/as os/as amigos/as e camaradas da Guiné. Sem distinção...

Luís Graça

PS - O Belarmino acaba de me pedir para não publicar o citado texto, por perda de oportunidade editorial. Assim o farei. Mas falarei com ele, e com muito gosto,  sobre alguns aspectos de organização e funcionamento do blogue, apreciados por ele, e  que nos ajudarão a sermos ainda muito melhores... Hoje, é também um bom pretexto para os nossos amigos e camaradas nos mandarem, para a caixa de reclamações, queixas por textos e outros materiais eventualmente não publicados até agora, sem aparente justificação dos editores... Nos casos em que isso possa acontecer, resultará eventualmente de "falha humana e/ou técnica", as duas razões do mundo a que a gente recorre para explicar o inexplicável sempre que há um "acidente"... E aí sou a "dar a mão à palmatória": sei  que temos, por exemplo,  de melhorar a gestão das nossas caixas de correio... LG

Estatísticas do Blogue > Descrição geral (movimento desde 1 Julho de 2010 até ontem)



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