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quinta-feira, 25 de maio de 2023

Guiné 61/74 - P24339: Tugas, pocos pero locos: algumas das nossas operações temerárias (2): Op Gavião (Madina / Belel, 4-6 de abril de 1968): 300 homens desbaratados pelas abelhas, armas extraviadas, um cadáver abandonado, um homem perdido, etc.


Cracá do Pel Caç Nat 52 (1966/1974), "Os Gaviões". Divisa: "Matar ou morrer"


Operação Gavião (Madina / Belel, 4-6 de Abril de 1968)  

1. Todos os anos, pela época seca, de preferência entre março e abril, o comando do batalhão sediado em Bambadinca, Sector L1, zona leste, região de Bafatá, mandava uma força de cerca de 300 homens à procura do acampamento IN do Enxalé, algures na península de Madina / Belel, mesmo já no limite do Sector, a sudeste da base de Sara.  Por aqui o IN e a população sob o seu controlo viviam com relativa tranquilidade, só sendo importunados por alguma incursão de tropas helitransportadas ou pelos bombardeamentos da FAP. A ida a Madina / Belel era quase sempre azarada: em geral as NT levavam prisioneiros que serviam de guias, e que procuravam ludibriar as NT, "perdendo-se" propositadamente ou tentando inclusive a fuga (como aconteceu, por exemplo, na Op Anda Cá, 22 e 23 de fevereiro de 1968) (*), 

Todos os anos aconteciam erros de planeamento, guias que se perdiam, itinerários mal escolhidos, PCV (antes da época do Strela...) que denunciavam a presença das NT, falhas no abastecimento de água, progressão para o objectivo a horas proibidas, confusão de (ou chegada tardia aos objetivos), flagelações do IN, tabancas abandonadas e queimadas, casos de exaustão, insolação e  desidratação, indisciplina de fogo, ataques de abelhas, debandada geral, perda de armas e muniçóes, e até de homens, regresso dramático ao Enxalé com viaturas a sair até São Belchior para transportar os mais "desgraçados", tentatativa de recuperação, no dia seguinte, do material perdidos… e, claro, relatórios por vezes fantasiosos, pouco rigorosos, etc....

Em 1968 (Op Gavião), aconteceram também estas coisas, próprias de uma guerra de contraguerrilha, num terreno inóspito para muitas das tropas portuguesas... É também caso para dizer, "tugas pocos pero locos" (**).

2.  Op Gavião: Desenrolar da acção

Iniciada no dia 4 de abril de 1968, às 18h00, com a duração de 3 dias, tinha como finalidade excutar uma acção ofensiva na mata de Belel, começando por um golpe de mão ao acampamento IN  do Enxalé. 

Forças ( c. 300 homens) que tomaram parte na operação:

(i) Cmdt: 2º cmdt BART 1904;

(ii)  Destacamento A: CART 2338 a 4 Gr Com + Pel Caç Nat 52;

(iii) Destacamento B: CART 2339, a 4 Gr Comb + Pel Caç Nat 53


Destacamento A

O Pel Caç Nat 52 deslocou-se de Missirá para a região de Aldeia do Cuorno dia 4 de abril de 1968, às 15h00, onde se instalou protegendo a cambança das restantes forças do Destacamento (CART 2338), cambança essa que foi efectuadas às 18h45 do mesmo dia.

Uma vez completo o Destacamemnto, as NT iniciaram a marcha para Missirá, tendo pernoitado um pouco antes de o atingir, pelas 22h00. 

Reiniciaram o movimento no dia 5, às 5h30, utilizando um guia natural de Missirá, ao qual foi acordado e indicado qual o serviço a desempenhar só pouco antes do início do movimento, por razões de sigilo e segurança.

Ao fim  da tarde do dia 5 atingiu um ponto cerca de 1 km atrás do local previsto onde pernoitou.

Reiniciado o movimento no dia 6, pelas 5h30, foi detectado um sentinela por volta das 7h30. Começou então a instação de 3 Gr Comb para proteger o ataque dos outros dois grupos. 

Entretanto a sentinela detectou as NT e fugiu. Passados poucos minutos o IN emboscou as NT com LGFog e armas automáticas
Zacarias Saiegh, mais tarde,
na 1ª CCmds Africanos,
como  tenente graduado
'comando'

Com o Pel Caç Nat 52 à frente, impulsionado pelo seu comandante, o fur mil Zacarias Saiegh, que demonstrou um sangue frio, decisão e temeridade  dignos de serem apontados, reagiu à emboscada,  perseguindo o IN durante cerca de 1,5 km. 

Deparou nessa altura com a tabanca de Belel que imediatamente atacou e destruiu totalmente, tabanca essa que tinha sido abandonada recentememnte, e que tinha 25 palhotas. Foram destruídos ainda um tanque de água e uma horta grande.

Aquando da  destruição da tabanca pelo fogo, foram ouvidos uns rebentamentos muito fortes, o que levou a concluir tratar-se de um pequeno paiol.

Entretanto, o PCV infornou o Destacamento A que o objetivo destruído era o objectivo do Dest B e deu ordens para reiniciar o regresso para o local previsto onde se devia emboscar durante a acção do Dest B, o que foi cumprido,

Ao chegar ao local previsto, encontrou-se com o outro Dest, que já tinha destruído o objetivo deste Dest (B), e acabava de sofrer um ataque de abelhas que tinha provocado uma grande desorganziação. 

Tendo então recebido ordem do PCV para iniciar o regresso da operação, acordou com o Dest B que seguisse este na frente por já conhecer o caminho. Entretanto, ao iniciar o movimenmto depois da preparação das macas improvisadas para o transporte dos elementos mais atingidos pelo ataque das abelhas, o que demorou um certo tempo, foram emboscados novamente por forças do IN, tendo sido pedido então apoio aéreo, o que foi recusado pelo PCV.

Foi reiniciado o movimento com algumas paragens motivadas por flagelações do IN, com armas automáticas, e mais dois ataques de abelhas na margem do Rio Gandurandim, o que provocou nova desorganização nos Destacamentos. 

Por fim foi atingida a estrada Finete-Enxalé, sendo o Destacamemto recolhido em viaturas em São Belchior, atingindo o Enxalé no dia 6, às 18h30.

Aí, mais tarde, foi constatado o desaparecimento de uma praça metropolitana pelo que o cmdt do Destacamento A resolveu  na madrugada seguinte ir à sua procura, não tendo sido necessário por a praça ter aparecido no Enxalé no dia 7, às 6h00.

Iniciou-se a cambança do Rio Geba para o Xime, e daí, em viaturas, iniciou-se o movimento para Fá que foi atingida no dia 8, às 15h00.

Constatou-se que, durante o ataque de abelhas, duas praças perderam as armas, pelo que o Cmdt do BART ordenou a ida de 1 Gr Comb deste Dest, e um do Dest B no dia seguinte, 8, às 5h00 ao local,  a fim de recuperar as referidas armas, o que foi conseguido. A força regerssou ao quartel em 8, às 20h00.

Destacamento B

A CART 2339 iniciou o seu movimento, em meios auto, no dia 5, às 15h00, de Fá para o Xime onde agregou o Pel Caç Nat 53. Iniciou a cambança do Rio Geba pelas 18h00, recebeu no Enxalé dois guias e iniciou a marcha pelo itinerário previsto, tendo atingido o local a norte de Madina onde se devia instalar, no dia 6, às 7h00, após alguma hesitações ("exitações", no originnal) dos guias,

Cerca das 9h00, o PCV informou que o Dest A tinha já destruído a tabanca de Belel e ordenou que se iniciasse o movimento pelo trilho Mandina-Belel, a fim de iniciar a batida à zona a sul do referido trilho.

Durante o deslocamento foi detectado o acampamento de Enxalé. que imediatamente foi atacado e destruído, sem resistência, verificando-se que tinha sido abandonado há pouco tempo. O objectivo tinha 8 palhotas, e forma capturadas 1 espingarda Mauser, 2 marmitas, 1 granada de RPG, e alguns documentos.

Aquando da destruição pelo fogo, foram ouvidos rebentamentos de munições de armas ligeiras e granadas de RPG.

Entretanto, os elementos do Dest instalados, quando se procedia ao assalto, foram atacados pela abelhas, o que provocou uma desorganiozaçáo grande, e pôs 2 homens em estado grave, que não permitiu que se deslocassem pelos seus meios.  

Devido ainda a esse ataque de abelhas, no seu movimento desordenado o Dest encontrou-se com o Dest A instalado no local previsto.

Nessa altura e como havia uma linha de água perto, 3 elementoso do Pel Caç Nat 53, sem autorização, deslocaram-se para se reabastecerem de água. Foram atacados pelo IN tendo sido abatido o soldado milícia 60/64, Tura Jau, e tendo o IN capaturado a sua arma, espingarda G3 nº 035786.

Acorrendo imediatamente ao local, repeliu-se o IN e recuperou-se o corpo  do referido mílicia.

Como o PCV informara que ía Bissau abastecer, foi pedido pela rede de operação a evacuação dos elementos feridos e do morto. Entretanto, ao chegar o PCV, foi pedida novamente a evacuação, tendo o mesmo  determinado que não houvesse evacuações, após se ter inteirado que os feridos picados pelas anelhas estavam a recuperar, e ter decidido o regresso ao quartéis em face dos objectivos previstos terem sido destruídos, o terreno a sul da picada onde nos encontrávamos estar queimado e não havendo possibilidade de se esconderem instalações do IN e ainda pelo facto do Dest GAMA (BCAÇ 1912) não se ter instalado no local previsto para proteger a acção deste Dest.

Por lapso que se explica pelas circunstâncias de momento, o PCV não foi informado que já tinha sido pedida a evacuação pela rede de operações, o que provocou a vinda do héli a Bambadinca, não sendo contudo utilizado.

Depois de uma certa demora, com o Pel Caç Nat 52 e 53 à frente, iniciou-se o regresso, tendo as NT sofrido 3 flagelações sem consequèncias, e tendo o IN sofrido 5 mortos confirmados.

Já junto da estrada Finete-Enxalé as NT sofreram mais 2 ataques de abelhas, provocando o desmaio de alguns elementos que tiveram de ser transportados às costas.

Continuando a progressão atingiu-se São Belchioronde se foi recolhido por viaturas para Enxalé, que foi atingo cerca das 18h00.

Verificou-se que o morto tinha ficado na zona d0 último ataque de abelhas pelo que foi decidido o Pel Caç Nat 53 ficar em Enxalé, a fim de ir de madrugada no dia seguinte recuperar o corpo, o que foi feito.

A CART 2339 inicou a travessia do Rio Geba, e deslocou-se em viaturas para Fá, que atingiu no dia 7 às 3h00.

Ao conferir o material foi constatada a falta de 2 espingardas G3 e alguns cantis e bornais ("burnais", no original), o que foi comunidacado ao Cmdt do BART que ordenou a ida no dia seguinte à zona do último ataque das abelhas juntamente com 1 Gr Comb da CART 2338, o que foi feito e conseguido recuperar parte do material perdido. As NT regressaram  a Fá, que atingiram no dia 8, às 20h00.

Fonte: Excerto das  páginas 43, 44 e 45 da História da Unidade: Batalhão de Artilharia nº 1904, 1966/68. Relatório da Op Gavião, iniciada em 4 de Abril de 1968: com a duração de três dias, e destinada a executar um golpe de mão contra o acampamento do Enxalé, do PAIGC, na mata de Belel, teve a participação da CART 2338, a 4 Gr Comb, mais o Pel Caç Nat 52 (Destacamento A), bem como da CART 2339, a 4 Gr Comb, mais o Pel Caç Nat 53 (Destacamento B). Foi comandada pelo 2º Comandante do BART 1904.


Documento digitalizado: © Armando Fernandes (2008). Direitos reservadas.


3. O Armando Fernandes, ex-alf mil cav, cmdt do  Pel Rec  Info,  CCS / BART 1904, Bissau e Bambadinca, 1966/68), mandou-nos em 8 de maio de 2008 fotocópias das páginas 43, 44 e 45 da história da unidade, com base nas quais transcrevemos o texto acima (com algumas adaptações, devido ao facto de estar mal redigido e ter alguns erros de ortografia).

Na altura, o nosso camarada escreveu o seguinte:

Professor Luís Graça:

Chamo-me Armando Fernandes, fui alf mil cav, comandei o Pel Rec do BART 1904 que esteve sedeado em Bambadinca, de Janeiro a Setembro de 1968. Durante todo o ano de 1967 o Batalhão esteve sedeado em Santa Luzia, Bissau, onde rendeu, em Janeiro de 67, o BCAÇ 1876.

Entrei ontem, pela 1ª vez, no seu blogue e chamou-me a atenção o nome de uma operação referido em P2817 (***), Operação Gavião.

Sobre essa operação consta da história do BART 1904, pags. 43/45 (edição não canónica em meu poder) que o fur mil Zacarias Saiegh nela participou, o que está em desacordo com uma resposta do doutor Beja Santos registada em P2817. Parece, também, que relativamente à entrada em Belel há discrepância entre o registado na história do BART e o afirmado no mesmo poste. Onde estará a verdade?

Em anexo envio cópia das páginas que referi.

Apresento os meus cumprimentos, Armando Fernandes

4. Comentário do editor L.G.:

Na altura agradeci ao camarada Armando Fernandes, dizendo-lhe que ia divulgar a sua versão (que era a versão do BART 1904)  (****) e dar conhecimentos aos camaradas que tinham escrito sobre a Op Gavião (Mário Beja Santos, do Pel Caç Nat 52, e Torcato Mendonça e Carlos Marques dos Santos, da CART 2339, estes dois últimos participantes da Op Gavião) (*****). 

Escrevi então: 

"A nós interessa-nos a verdade e só a verdade... Em muitos casos, há discrepâncias factuais entre os nossos relatórios de operações e os depoimentos pessoais. É normal. O Mário Beja Santos, que comandou o Pel Caç Nat 52 (a partir de agosto de 1968), não poderia obviamente ter participado nesta Operação Gavião (abril de 1968). Socorre-se da memória dos seus antigos soldados, alguns dos quais felizmente ainda estão vivos e vivem em Portugal."

O ex-alf mil Torcato Mendonça e o ex-fur mil Carlos Marques dos Santos, da CART 2339 (Mansambo, 1968/69), esses,  infelizmente, já náo estão entre nós...

Na altura também convidei o Armando Ferreira  a ingressar na nossa Tabanca Grande.  Infelizmente nunca mais nos contactou, pelo que nem ele nem mais ninguém representa o BART 1904 no nosso blogue.

De qualquer modo, ficou claro na altura que  o fur mil Zacarias Saiegh, a comandar interinamente  o Pel Caç Nat 52, tinha particiapdo na Op Gavião, e que recebera do comandante da operação, rasgados elogios, como se depreende deste excerto do relatório:

(...) "Com o Pel Caç Nat 52 à frente, impulsionado pelo seu comandante, o fur mil Zacarias Saiegh, que demonstrou um sangue frio, decisão e temeridade  dignos de serem apontados, reagiu à emboscada,  perseguindo o IN durante cerca de 1,5 km. " (...)
__________

Notas de L. G.:

(*) Vd. poste de 23 de fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1542: Operação Macaréu à Vista (Beja Santos) (34): Uma desastrada e desaosa operação a Madina/Belel

(**) Último poste da série > 21 de maio de 2023 > Guiné 61/74 - P24330: Tugas, pocos pero locos: algumas das nossas operações temerárias (1): Op Tigre Vadio, 30 de março a 1 de abril de 1970, sector L1, Península de Madina / Belel, zona leste, sector L1 (Bambadinca)

(***) Vd. poste de 7 de Maio de 2008 > Guiné 63/74 - P2817: Blogoterapia (51): O Alentejo do Casadinho e do Cascalheira, o Tura Baldé, a Op Gavião... (Torcato Mendonça / Beja Santos)
(****) Vd. poste de 11 de maio de 2008 > Guiné 63/74: P2833: Op Gavião (Belel, 4-6 de Abril de 1968) (Armando Fernandes, Pel Rec CCS / BART 1904, Bissau e Bambadinca, 1966/68)

(*****) Vd. ppostes de:

9 de maio de 2008 > Guiné 63/74 - P2823: Dando a mão à palmatória (11): Operação Gavião, 5 de Abril de 1968, com as CART 2338 e 2339 (Torcato Mendonça / Beja Santos)

2 de janeiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9303: Memórias do Carlos Marques dos Santos (Mansambo, CART 2339, 1968/69) (1): Op Gavião: Abril de 1968, antes o fogo do IN que o ataque das abelhas

domingo, 11 de maio de 2008

Guiné 63/74: P2833: Op Gavião (Belel, 4-6 de Abril de 1968) (Armando Fernandes, Pel Rec CCS / BART 1904, Bissau e Bambadinca, 1966/68)
















Cópias das páginas 43, 44 e 45 da História da Unidade: Batalhão de Artilharia nº 1904, 1966/68. Relatório da Op Gavião, iniciada em 4 de Abril de 1968: com a duração de três dias, e destinada a executar um golpe de mão contra o acampamento do Enxalé, do PAIGC, na mata de Belel, teve a participação da CART 2338, a 4 Gr Comb, mais o Pel Caç Nat 52 (Destacamento A), bem como da CART 2339, a 4 Gr Comb, mais o Pel Caç Nat 53 (Destacamento B). Foi comandada pelo 2º Comandante do BART 1904.


Documento digitalizado: © Armando Fernandes (2008). Direitos reservadas

1. Mensagem de Armando Fernandes, com data de 8 de Maio:

Professor Luís Graça:

Chamo-me Armando Fernandes, fui Alf Mil Cav, comandei o Pel Rec do BART 1904 que esteve sedeado em Bambadinca, de Janeiro a Setembro de 1968. Durante todo o ano de 1967 o Batalhão esteve sedeado em Santa Luzia, Bissau, onde rendeu, em Janeiro de 67, o BCAÇ 1876.

Entrei ontem, pela 1ª vez, no seu blogue e chamou-me a atenção o nome de uma operação referido em P2817 (1), Operação Gavião.

Sobre essa operação consta da história do BART 1904, pags.43/45 (edição não canónica em meu poder) que o Fur Mil Zacarias Saiegh nela participou,o que está em desacordo com uma resposta do Doutor Beja Santos registada em P2817. Parece, também, que relativamente à entrada em Belel há discrepância ente o registado na história do BART e o afirmado no mesmo post. Onde estará a verdade?

Em anexo envio cópia das páginas que referi.

Apresento os meus cumprimentos

Armando Fernandes

2. Comentário de L.G.:

Obrigado, camarada Armando. É-nos muito útil essa informação. Vou dar conhecimento aos camaradas que têm escrito sobre a Op Gavião. A nós interessa-nos a verdade e só a verdade... Em muitos casos, há discrepâncias factuais entre os nossos relatórios de operações e os depoimentos pessoais. É normal.

O Mário Beja Santos , que comandou o Pel Caç Nat 52 (a partir de Agosto de 1968), não poderia obviamente ter participado nesta Operação Gavião (Abril de 1968). Socorre-se da memória dos seus antigos soldados, alguns dos quais felizmente ainda estão vivos e vivem em Portugal.

O ex-Alf Mil Torcato Mendonça e o ex-Fur Mil Carlos Marques dos Santos, da CART 2339 (Mansambo, 1968/69), esses, sim, participaram nessa Op, e estão aqui entre nós... Também vou ler, com atenção, os documentos que tiveste a gentileza de nos mandar.

Ficas, desde já, convidado a ingressar na nossa tertúlia ou Tabanca Grande. No caso de aceitares, julgo que serias o primeiro do teu batalhão (que eu já não conheci: cheguei a Bambadinca no dia 2 de Junho de 1969...). Um Alfa Bravo. Luís Graça

PS - Já agora, uma curiosidadade: foi no teu tempo que houve grave acidente em Bambadinca, originando o incêndio do paiol ? Alguém me contou essa história, julgo até que foi um camarada teu, alferes, que encontrei há uns três anos ou mais anos, na casa de uma amiga, numa festa... Infelizmente, não fiquei com o contacto dele... Mas falámos muito de Bambadinca.

Há aqui um hiato nas nossas memórias sobre Bambadinca: falta-nos saber coisas do teu batalhão e dos anteriores (por ex., BCAÇ 1888, que estava em Bambadinca em 1966)... Seguramente nos pode ajudar a colmatar essa lacuna... 

A malta de Bambadinca de 1968/71 (BCAÇ 2852 e unidades adidas) tem por hábito encontrar-se todos os anos. Deves conhecer malta da CCS do BCAÇ 2852. O Comandante do Pel Rec Info era o Alf Mil João Alfredo T. Rocha... Deste batalhão faziam parte as CCAÇ 2404, 2405 e 2406... Eu pertenci à CCAÇ 12, africana, no período que vai de junho de 1969 a marçod e 1971.

__________


Nota de L. G.:

(1) Vd. poste de 7 de Maio de 2008 > Guiné 63/74 - P2817: Blogoterapia (51): O Alentejo do Casadinho e do Cascalheira, o Tura Baldé, a Op Gavião... (Torcato Mendonça / Beja Santos)

(...) "(iii) Tempos depois a Operação Gavião, em Abril de 1968. Participaram a companhia do Enxalé (capitão Pires, Zagalo Matos e outros), a tua companhia [, a CART 2339,] e os Pel Caç Nat 52 e 53. Inicialmente, estava destinado a ser uma operação de 5 dias, ficou-se em menos de três. Vocês saíram do Enxalé, numa lala perto de Madina, Tura Baldé, um milícia de Demba Taco, ao beber água numa fonte encontrou-se com um soldado do PAIGC que lhe deu um tiro, desacasos da fortuna. Na operação Gavião, o guia era Quebá Soncó, o filho primogénito do régulo Malã, que foi atingido por um tiro numa rótula, foi-lhe amputada a perna.

"Não ia o Saiegh mas os furriéis Vaz, Altino e Monteiro (o Saiegh chegou em finais de Maio de 1968, o alferes Azevedo já estava em Bissau, eu só cheguei em 4 de Agosto). Falas em que "partiram" Madina, Belel e Sinchã Camisa, para Queta Baldé e Cherno Suane, não foi bem assim. Com o tiroteio para tentar liquidar o executor de Tura Baldé, Madina esvaziou-se, o que vocês encontraram foi milho, roupas, esteiras, pilões e coisas parecidas. Para os meus informadores, não havia rasto de gente ferida ou morta.

"Quanto a Belel, a única vez que se lá entrou pelas picadas e com tropa do Exército foi no Tigre Vadio, em finais de Março de 1970 (3). Podes perguntar ao Luís Graça como tivemos sorte e como foi muito doloroso. Despeço-me com a esperança de te ver em Monte Real, tenho um projecto para debater contigo, para aproveitarmos as tuas belíssimas fotografias. E vê lá se acabas com essa conversa mórbida em que andas a dizer que não se recomenda que não estejas vivo, precisamos do teu azedume, da tua indignação, da tua heterodoxia.

"Um abração de estima, Mário" (...).

sexta-feira, 9 de maio de 2008

Guiné 63/74 - P2823: Dando a mão à palmatória (11): Operação Gavião, 5 de Abril de 1968, com as CART 2338 e 2339 (Torcato Mendonça / Beja Santos)

1. Mensagem, com data de 7 de Maio, do Torcato Mendonça, algo enigmática, procurando esclarecer (?) alguns pontos (obscuros...) da actuação das NT no decurso da Op Gavião (Sector L1, Bambadinca, Abril de 1968, ao tempo do BART 1904, 1966/68):

Meu estimadíssimo Tigre:

Falamos… em Monte Real… O Cascalheira corresponde. Era amigo do Zé Almodôvar, etc. O Guia não foi no joelho [que foi ferido, foi morto] … Estás a imaginar a cervical... Pensa numa faca balanta (*)… O Saiegh seguia, no regresso, à frente com o grupo dele e eu, com o meu, à esquerda… A tua segunda memória não diz tudo. Não se escreve, fala-se… Falaremos.

O Tura morreu nos meus braços. Foi o primeiro e paro… Por que é o cheiro da morte, com sangue, doce ou adocicado ? Entranha-se e nunca sai.

Obrigado pelo texto sobre o Jacques Attali e outros. Manda sempore… Eu mando-te um abraço forte, extensível a quem nos ler. Quero estar a abraçar-vos breve, brevemente. O nosso caríssimo amigo Luís Graça tem as fotos. São de todos, se assim o entenderem.

Abraços do
Torcato Mendonça


2. Mensagem do Beja Santos, com data de 8 de Maio:


Mendonçal e Torcatal figura, camaradas: 

Uma rectificação em prol da verdade. Entraram-me à noite em casa numa gritaria crioula o Queta e o Cherno, as minhas duas memórias de conselho permanente. Durante a tarde, habituado que estou a conversar com os vivos e os mortos neste romagem a 40 anos atrás, dei comigo a conversar com o Saiegh, ele falava-me entusiasmado com a Operação Gavião, eu sabia que ele lá tinha estado, até porque o Pel Caç Nat 52 se chamava os Gaviões, certamente homenagem do Saiegh a esta operação.

A meio da tarde, ciente de que tinha conversado com o Saiegh, ciente que o furriel Vaz não podia ter ido na operação, tinha sido punido e deslocado para a zona de Geba de onde foi levado por forças do PAIGC, pedi aos meus conselheiros que viessem clarificar tudo. 

Quebá Soncó foi mesmo ferido, a entrada em Madina foi suave, vocês mandaram canhonadas (entenda-se morteiradas) sobre Belel. Lamento a falta de precisão e dou comigo a pensar porque é que não registamos os depoimentos de todos os Chernos e Quetas, a História vai perder a riqueza destes testemunhos. Seria interessante publicar-se o relatório da operação.

Um abraço para todos,

Mário Beja Santos

3. Mensagem do editor, L.G., enviada atraés da tertúlia:


Caríssimos, Mário e Torcato (c/c Henrique Matos e Carlos Marques dos Santos):

Vou rectificar, até por que também meti os pés pelas mãos, ao sugerir que o TM já estava xoné (ou, em alentejano, alzheimariado…) ao trocar a CART 2339 (que era a dele) pela CART 2338 (irmã gémea)… Ora, estas duas unidades participaram na Op Gavião (5 de Abril de 1968) bem como noutras operações, conjuntas, no Sector L1 (Bambadinca), embora a CART 2338 estivesse sediada em Nova Lamego… Mea culpa… Isto dá direito a palmatória… Um Alfa Bravo. Luís


PS – Vou ver se alguém tem o relatório da Op Gavião, que deve constar da história do BART 1904 (que anteceu o BCAÇ 2852, em Bambadinca) bem como da história da CART 2338 e/ou da CART 2339. 

Já em tempos publiquei um poste do Carlos Marques Santos, ex- Fur Mil da CART 2339, onde há um relato pormenorizado da Op Gavião (era sempre dramático andar pelo Cuor, até Belel, quanto mais a Madina…). Vou republicar este texto (memorialístico)… 

O CMS foi um activíssimo e precioso colaborador da 1ª Série do nosso blogue (que já fez três anos, em abril passado…), que por razões de saúde tem andado um pouco mais afastado das lides bloguísticas (mas vamos ter oportunidade de lhe dar um grande Alfa Bravo, em Monte Real). Foi ele que pescou o TM para a nossa tertúlia.

30 de Março de 2006 > Guiné 63/74 - DCLXIII: Diário do CMS (CART 2339)(1): Um homem ficou para trás e não há voluntários para o ir buscar...


PS - Já agora, Mário [Beja Santos] e Henrique [Matos], digam-se se houve mortos vossos, sepultados in loco, em Missirá, no Enxalé, em Porto Gole… Sei que houve, no meu tempo e do Mário, um soldado do Pel Caç Nat 52 que desapareceu no Rio Geba… Os vossos mortos guineenses onde foram sepultados ? Em Bambadinca ? Nas terras natais ? Vd. lista do A. Marques Lopes que foi acabada de publicar e donde não constam… os portugueses guineenses… LG
__________

Nota dos editores:

(*) Vd. poste de 7 de Maio de 2008 >
Guiné 63/74 - P2817: Blogoterapia (51): O Alentejo do Casadinho e do Cascalheira, o Tura Baldé, a Op Gavião... (Torcato Mendonça / Beja Santos)

(...) Resposta do Beja Santos (ex-Alf Mil, Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70):

(...) Tempos depois a Operação Gavião, em Abril de 1968. Participaram a companhia do Enxalé (capitão Pires, Zagalo Matos e outros), a tua companhia [a CART 2339] e os Pel Caç Nat 52 e 53. Inicialmente, estava destinado a ser uma operação de 5 dias, ficou-se em menos de três.

Vocês saíram do Enxalé, numa lala perto de Madina, Tura Baldé, um milícia de Demba Taco, ao beber água numa fonte encontrou-se com um soldado do PAIGC que lhe deu um tiro, desacasos da fortuna. Na operação Gavião, o guia era Quebá Soncó, o filho primogénito do régulo Malã, que foi atingido por um tiro numa rótula, foi-lhe amputada a perna" (...).

sexta-feira, 31 de março de 2006

Guiné 63/74 - P644: Diário do CMS (CART 2339) (1): Um homem ficou para trás e não há voluntários para o ir buscar... (Carlos Marques Santos)

Felizmente que há mais vida, para além da blogosfera... É o que eu deduzo da última mensagem do nosso CMS (Carlos Marques Santos), ex-furriel mil, CART 2339, Fá Mandinga e Mansambo, 1968/69...

A esta hora, o CMS já terá partido, de manhã cedo, para França (região de Biarritz ) em viagem de uma semana em autocaravana. (Que os bons irãs das florestas do Corubal o acompanhem e o tragam de volta, são e salvo!).

Pede-nos desculpa por nos últimos tempos não ter dito nada no blogue, pois tem ocupado o seu tempo noutras andanças, "apesar de todos os dias vêr o que há de novo"...

Promete organizar qualquer coisa depois de vir de França". Mesmo assim mandou-nos umas notas do seu diário, com a seguinte legenda: "dois meses de Guiné e muita experiência".


Notas do Diário do CMS

5 de Abril de 1968


Às 15h, saída de Fá Mandinga para mais uma operação (Op Gavião). Desta vez para a zona do Enxalé, via Xime.

O [Rio] Geba foi atravessado de lancha. Do Enxalé saímos cerca da meia-noite iniciando mais um passo para o desconhecido. Dois meses de mato e já tínhamos tido a nossa dose. Andámos a corta mato até às 3.30h.

O guia turra capturado, como sempre, perdeu-se. Descanso até às 5.00h, seguindo as NT depois em progressão normal.


Guiné > Zona Leste > Sector L1 >Brasão da CART 2339 (Fá Mandinga e Mansambo, 1968/69)

© Carlos Marques Santos (2005)


Perto do objectivo vimos, na mata, dois nativos. Fugiram e nós continuámos. A CART 2338, nossa companheira de andanças, está a atacar o objectivo. A Companhia de Mansoa também.

Cerca do meio-dia sofremos um ataque de abelhas. Desespero em muitos de nós. Eu também fui completamente picado. Há camaradas inchados. Disformes. Há 2 camaradas desmaiados. Faz-se uma maca. Soam tiros...

- EMBOSCADA!

Um nativo do Pel Caç Nat 53 é atingido e morto. O ataque IN continua. Regressamos.

Sofremos 5 emboscadas, mas apesar de tudo correu sem grandes azares. O IN tem baixas. Fogem. Seguimos para o Enxalé. Mais 2 ataques de abelhas. CHOROS. Desespero. Há que fugir. Desorientação total. Armas abandonadas.

Compreendo agora - pois noutra ocasião e lá para a frente no tempo de comissão, estive debaixo de fogo - o que estar nestas mesmas circunstâncias. 45 minutos intermináveis. Antes o fogo do IN.

Chegámos ao Enxalé cerca das 18.00h. Soube-se depois que tinha ficado um homem da Cart 2338 desmaiado no local dos acontecimentos.

Quem vai procurá-lo? Ninguém. Não há voluntários.

Triste vida a da GUERRA e da sobrevivência. Mas nem sempre foi assim!

Passamos para o Xime e chegámos a Fá Mandinga às 03.00h da manhã do dia de 7 de Abril de 1968.

Estou exausto. Estamos todos exaustos.

Boas notícias: o nosso homem desmaiado, soube-se, apareceu por ele no Enxalé! Já li uma estória semelhante nesta tertúlia. Ou será o mesmo protagonista?

No dia seguinte, 8 de Abril de 1968, voltamos ao Enxalé procurar as armas perdidas. Na progressão ouvimos rebentamentos. Será Mato Cão?

Recuperámos 2 armas. Regressámos a Fá Mandinga sem incidentes.


10 de Abril de 1968

Há emboscada na estrada Xime-Bambadinca. Não houve incidentes, são as notícias que nos chegam.


14 de Abril de 1968

Dia de Páscoa, aqui, igual aos outros.

© Carlos Marques dos Santos (2006)