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domingo, 31 de dezembro de 2023

Guiné 61/74 - P25020: No céu não hã disto... Comes & bebes: sugestões dos 'vagomestres' da Tabanca Grande (44): Bombons de Aguardente DOC Lourinhã e Tarte D. Isabel, da marca "Doce Lourinhã"

 

A tarte Dona Isdabel, um dos ex-libris da doçaria da Lourinhã .... Neste Natal trouxemos meia-dúzia de tartes para os fãs do Norte...

Os Bombons de Aguardente DOC Lourinhã... São de "morrer e chorar por mais"...

Imagens: cortesia de  www.docelourinha.pt


1. Em matéria de "comes & bebes" (*), nada como acabar o amargo ano de 2023 com uma fatia da tarte D. Isabel e um bombom "Doce Lourinhã"... 

São duas obras-primas, confeccionadas pela nossa amiga e conterrânea, a "chef" Sílvia Baptista, que tem mãos de ouro... É também ela a dona de Pastelaria e Bombonaria "Doce Lourinhã" e da Garrafeira "O Casco"...

Passe a publicidade... Fica na Rua Dr. Francisco de Sá Carneiro, Lt 22 R/Ch Dto. 2530-108 Lourinhã

Tel.: +351 910 121 280 (pastelaria) | Tel.: +351 918 710 871  (garrafeira).

Tem página no Facebook. E aceita encomendasd "on line".

Para saber mais aqui fica o sítio da Doce Lourinhã. Lê-se no sítio:

  • Os Bombons Artesanais “Doce Lourinhã” são confecionados com produtos de excelência. Como o Chocolate “VALRHONA”, considerado o melhor chocolate do mundo,  e a “Aguardente DOC Lourinhã”, única em Portugal.
  • Tarte D. Isabel | Esta saborosa tarte é confecionada com farinha selecionada, ovos frescos, Abóbora de qualidade e uma cobertura de Pevides que lhe dá um sabor único, original e inconfundível.
 
2. A Tarte D. Isabel concorreu, em 2019, às "7 MARAVILHAS DOCES DE PORTUGAL"

Lê-se na páginma do Facebook da Doce Lourinhã, em postagfem de 19 de março de 2019

(...) A Doce Lourinhã submeteu a inscrição da TARTE D. ISABEL a mais uma edição do programa 7 Maravilhas de Portugal, promovido pela RTP, e que este ano é dedicado ao melhor que se faz na doçaria tradicional portuguesa.

Intitulado 7 Maravilhas Doces de Portugal, o programa e a sua organização destacam como factores distintivos o produto endógeno, a marca da terra, a preservação da qualidade dos ingredientes, promovendo assim a capacidade que o país tem de inovar e de se reinventar nas suas tradições. Tendo como base estes critérios, está inscrita para a concurso na categoria Doces de Inovação.

* A Tarte D. Isabel resulta na boca num estaladiço inicial dando valor justo à pevide de abóbora tostada, caramelizada obtendo várias emoções na sua consistência e sabor equilibrado. No final um suave doce adequado da sua massa areada com recheio de abóbora.

* Segundo as estatísticas das 44 mil toneladas de abóboras produzidas na Região Oeste, cerca de 74% é armazenada e comercializada por empresas localizadas no concelho da Lourinhã, sendo o concelho com maior importância nacional ao nível da produção de abóbora. Existem cerca de 1500ha de abóbora na região, cerca de mil ha estão na Lourinhã. Esta é uma das razões pela qual o desafio de utilizar a Abóbora no seu todo na confeção da Tarte D. Isabel.

Além disso o seu nome foi em homenagem a Isabel Mateus. Co-fundadora da associação que criou o Museu da Lourinhã, que em Paimogo, Lourinhã descobriu e estudou um dos maiores e mais antigos ninhos de dinossauros do mundo, com ovo e embriões, colocando assim a Lourinhã no mapa mundo da paleontologia. Autora do primeiro esboço para a construção de um novo museu que vinte anos mais tarde culminou na criação do DinoParque Lourinhã. Eleita personalidade do ano 1997 (Revista Expresso). Recebeu também um prémio de reconhecimento em 2017 (ADL- Associação Desenvolvimento Lourinhã) e medalha municipal de Honra, classe Ouro em 2018 (Câmara Municipal da Lourinhã)"

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Nota do editor:

Último poste da série > 22 de deembro de 2023 > Guiné 61/74 - P24988: No céu não há disto... Comes & bebes: sugestões dos 'vagomestres' da Tabanca Grande (43): Arroz de moiras com grelos ("Chef" Alice)

sexta-feira, 22 de dezembro de 2023

Guiné 61/74 - P24988: No céu não há disto... Comes & bebes: sugestões dos 'vagomestres' da Tabanca Grande (43): Arroz de moiras com grelos ("Chef" Alice)


Marco de Canveses > Paredes de Viadores > Candoz  > Quinta de Candoz > 21 de dezembro de 2023 >  O arroz de moiras com grelos,à moda da "Chef" Alice...

Foto (e legenda): © Luís Graça (2023). Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. A tropa e a guerra roubaram-nos pelo menos dois, três ou quatro Natais nas nossas vidas... Por isso, que os nossos leitores nos perdoem estas recordações profanas em tempo tão sagrado como esta quadra festiva em que comemoramos o nascimento, em Belém,  do deus feito homem dos cristãos... Há dois mil anos... Em que tanto a terra do Menino Jesus como a dos nossos antepassados lusitanos eram uma colónia ou província do Império Romano... (Na verdade, a gente não sabe o que eles comiam nem que língua falavam, herdámos e adaptámos a língua dos colonialistas romanos.)

 Mas eu pergunto-me também: será que os habitantes da cidade galaico-romana de  Tongóbriga, no Freixo, Marco de Cansveses, a escassos quilómetros da nossa Quinta de Candoz, já conheciam esta delícia da gastronomia da nossa terra, que é o arroz de moiras com grelos ? 

A resposta é não: ainda o arroz, oriundo do Extremo Oriente, não tinha chegado à Lusitània... Nem muito menos as moiras (e os mouros)...

O termo "moira" é usado aqui, na região duriense (ou do Baixo Douro) para designar uma "chouriça feita de sangue fresco e  carne de porco, temperos e vinho tinto verde"... Indispensável no cozido à portuguesa e, com mais razão, no arroz de moiras com grelos ou arroz de grelos com moiras (depende das quantidades)..Há mutas receitas na Net. É um prato típico aqui na nossa regiáo, Marco de Canaveses e Baião. Ceme-swe todo o ano, e agora é que sabe bem com o frio de rachar.

2. Em Tormes, que fica em Santa Cruz do Douro, Baião, também aqui perto de Candoz, ao alcance de um tiro de obus 10.5,  nem o Jacinto nem o seu criador, o Eça de Queiroz, alguma vez terão provado o "arroz de moiras com grelos"... 

Ou talvez, sim,  o Eça era um "gourmet"... Se tivesse comido, em vez das favas, teria feito o elogio do divinal arroz de moiras com grelos... Recorde-se aqui a antológica descrição (ou uma parte dela) da primeira refeição, no solar de Tormes,  do princípe Jacinto e do seu amigo Zé Fernandes em "A Cidade e as Serras":

(...) Uma formidável moça, de enormes peitos que lhe tremiam dentro das ramagens do lenço cruzado, ainda suada e  esbraseada  do calor da lareira, entrou esmagando o soalho, com uma terrina a fumegar. E o Melchior, que seguia erguendo a infusa do vinho, esperava que Suas Incelências lhe perdoassem porque faltara tempo para o caldinho apurar (...).

[Jacinto], desconfiado, provou o caldo, que era de galinha e rescendia. (...) Tornou a sorver uma colherada mais cheia, mais considerada. E sorriu, com espanto: 
-
−  Está bom!

Estava precioso: tinha fígado e tinha moela: o seu perfume enternecia: três vezes, fervorosamente, ataquei aquele caldo.

 − Também lá volto!   −  exclamava Jacinto com uma convicção imensa.   − É que estou com uma fome... Santo Deus! Há anos que não sinto esta fome.

Foi ele que rapou avaramente a sopeira. E já espreitava a porta, esperando a portadora dos pitéus, a rija rapariga de peitos trementes, que enfim surgiu, mais esbraseada, abalando o sobrado - e pousou sobre a mesa uma travessa a transbordar de arroz com favas. Que desconsolo! Jacinto, em Paris, sempre abominara favas!... Tentou todavia uma garfada tímida - e de novo aqueles seus olhos, que o pessimismo enevoara, luziram, procurando os meus. Outra larga garfada, concentrada, com uma lentidão de frade que se regala. Depois um brado:

 - Ótimo!... Ah, destas favas, sim! Oh que fava! Que delícia! 

E por esta santa gula louvava a serra, a arte perfeita das mulheres palreiras que em baixo remexiam as panelas, o Melchior que presidia ao bródio...

- Deste arroz com fava nem em Paris, Melchior amigo! 

O homem óptimo sorria, inteiramente desanuviado: 

- Pois é cá a comidinha dos rapaz da quinta! E cada pratada, que até Suas Incelências se riam... Mas agora, aqui, o Sr. D. Jacinto, também vai engordar e enrijar!

O bom caseiro sinceramente cria que, perdido nesses remotos Parises, o senhor de Tormes, longe da fartura de Tormes, padecia fome e mingava... E o meu Príncipe, na verdade, parecia saciar uma velhíssima fome e uma longa saudade da abundância, rompendo assim, a cada travessa, em louvores mais copiosos.  (...)

In: Excertos de: Queiroz, Eça de -  A Cidade e as Serras". Livros do Brasil, 2016, pp. 153/153 (Obras de Eça de Queiro, 8) (Fixação do tcxto e notas de Helena Cidade Moura).

sábado, 26 de agosto de 2023

Guiné 61/74 - P24591: No céu não há disto... Comes & bebes: sugestões dos 'vagomestres' da Tabanca Grande (42): Saudades da caldeirada de peixe de antigamente... Valha-me a "Chef" Alice e o "chef" Tony Levezinho




Lourinhã > "Chez Alice" > 25 de agosto de 2023 > O almocinho hoje foi caldeirada de peixe para seis, incluindo a neta, o filho, a nora e a vovó da Madeira

Foto (e legenda): © Luís Graça (2023). Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Em matéria gastronómica, havia coisas na Guiné que eram um luxo, sendo difícil ao "pobre do vagomestre" fazer, já não digo uma surpresa, mas uma gracinha na messe (também já não falo do "rancho" onde se rapava fome...).  

No mato, não havia carne decente, não havia bom peixe, muito menos marisco... Uma vez por outra, lá se arranjava um cabrito, um leitão, umas galinhas raquíticas... e alguma caça: gazela, lebre, galinholas, javali... Mas isso era só para alguns, servido como petisco "semi-clandestino", fora da messe ou do rancho... Para se comer um "bifinho com ovo a cavalo e batatas fritas"(supremo luxo de um operacional do mato!)  só em Bafatá, Bissau e pouco mais...

Esses tempos de fomeca (houve gente que passou dois anos a comer arroz ou espargute com conservas...) vêm a propósito da carestia de vida hoje em dia: o preço do peixe disparou (e o melhor do peixe português vai para Paris, Roma, Madrid, Londres, Bruxelas...),  o polvo, os moluscos, o marisco, etc. que eram comida dos pobres e servidos nas tabernas do meu tempo de infância e adolescència, tornou-.se proibitivo para a maior parte das bolsas portuguesas.

Ainda me lembro, no anos 50/princípios dos anos 60,  da lagosta vendida na lota, em Porto das Barcas, Porto Dinheiro ou Paimogo a sete e quinhentos (escudos) o quilo (!), enquanto o tamboril se deitava fora, por ser muito feio, e por não ter valor comercial  nem gastronómico... A sapateira, a santola, a navalheira, o polvo, os ouriços do mar, as lapas, os mexilhões, os percebes, as enguias, etc. não íam à mesa dos ricos...

Tudo isto para dizer que é difícil, hoje em dia, comer uma boa caldeirada de peixe, num bom restaurante à beira mar, com cheirinho a maresia, a não ser pagando uma boa nota preta... 

Por isso eu prefiro ir ao "Chez Alice": com très ou quatro qualidades de peixe (raia, safio da barriga, cação, etc.), mais uns camarões, umas navalheiras e umas amêijoas para pôr no  fundo do tacho  e "não deixar torrar", faz-se uma caldeirada de cinco estrelas, mesmo assim relativamente económica e de fazer criar água na boca... 

Claro, a batata tem que ser boa, e a Lourinhã, nessa matéria,  é umas das melhores terras não só de Portugal como da Europa para produzir batata (de diversas qualidades)... Caldeirada com batata de puré é uma desgraça!... O resto é o gémio culinário do/a nosso/a chef(s)... Neste caso, a Alice (que aprendeu com a minha mãe a cozinha estremenha).

E, por favor, não estraguem a caldeirada adicionando-lhe umas sardinhas... gordas!... É um desastre culinário... Adoro a sardinha (que é também do mar do Cerro, Lourinhã, e desembarcada em Peniche), mas só grelhada, com uma batatinha e pimentos ou até  só com uma boa fatia de pão caseiro, comida de preferència na Tabanca do Atira-te ao Mar...

Bom apetite!

PS1 - Estou à espera da caldeirada  do Tony Levezinho, que tem ganho prémios nas festas dos pescadores em Sagres!... Ele prometeu vir aqui um dia à Lourinhã mostrar os seus dotes culinários (que de resto já tinham alguma fama em Bambadinca e que nós temos mostrado no blogue)...

PS2 - Com os restos da caldeirada (a "auguinha") faz-se uma sopa de peixc divinal para se comer à noite!... De massinhas. Picantezinha, como convém...

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domingo, 20 de agosto de 2023

Guiné 61/74 - P24571: No céu não há disto... Comes & bebes: sugestões dos 'vagomestres' da Tabanca Grande (41): "Frutos do mar" de Narvik, Noruega e... bifinho de novilho de alce de Kiruna...(Mas tenho inveja das nossas muito especiais amêijoas...) (José Belo, Suécia)


Suécia > Lapónia > Agosto de 2023 > "Os alces vitelos que vêm comer maçãs junto às arrecadações nas traseiras da minha casa"

Foto (e legenda): © José Belo (2023). Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Mensagem do nosso (ou "semi-nosso"), luso-sueco,  Joseph Belo (tem mais de  250 referências no nosso blogue, é membro da Tabanca Grande desde 8 de março de 2009); foi alf mil inf da CCAÇ 2381, "Os Maiorais", Ingoré, Buba, Aldeia Formosa, Mampatá e Empada, 1968/70; é capitão do exército português reformado; é jurista e empresário, vivendo atualmente entre a Suécia e os EUA):

Data - 20 ago 2023 2:23
Assunto . Petiscos e…inveja!... Principalmente inveja das amêijoas!



Inveja...  Principalmente inveja das amêijoas!

Tenho a cidade costeira norueguesa de Narvik a umas centenas de quilómetros da minha casa. [De Kiruna a Narvik, sáo cerca de 180 km, duas horas e meia a conduzir.]

É lá que compro bacalhau (fresco!) e marisco a preços muito baixos em relação aos portugueses actuais e, na Noruega, não são propriamente….pobrezinhos!

A lagosta, os lagostins e o camarão do Mar do Norte são fantásticos, não lhes ficando atrás o enorme mexilhão.

Tudo comprado em mercado no próprio cais.

Infelizmente fazem falta as nossas muito especiais amêijoas.

Quanto à carne fresca (!) uma imagem vale mais que mil palavras: os alces vitelos vêm comer maçãs junto às arrecadações nas traseiras da minha casa.


Um grande abraço, JBelo

2. Comentário do editor LG:

Zé, fico feliz por saber que, em matéria de comes & bebes, não te falta nada... (faltam-te as "small female Portuguese clams", mas , bolas!|, não se pode ter tudo, ou melhor, não sejas "abelhudo", não se deve ter tudo; para a próxima vens cá comè-las "chex Alice")...

Sem querer puxar a brasa à minha sardinha (a sardinha de Pemiche é pescada aqui em frente, no Mar do Cerro), temos na Lourinhã uma tradição, já antiga, de pesca, armazdenagem e distribuição de marisco ("frutos do mar)... Dizem que era negócio de judeus (leia-se: cristãos novos)... Os viveiros começaram por ser construídos nas rochas (Porto das Bracas, Porto Dinheiro, Paiomogp...).

Conheço pelo menos très grandes empresas, familiares,  que abastsecem as melhores marisqueiras do país, importam e exportam e tèm modernos "viveiros" aqui, no concelho da Lourinhá... Duas tèm inclusive restaurantes e loja de venda ao pública de marisco vivo... Passe a publicidade, aqui ficam os endereços, da mais  antiga para  a mais recente:


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Nota do editor:

Guiné 61/74 - P24569: No céu não há disto... Comes & bebes: sugestões dos 'vagomestres' da Tabanca Grande (40): Comidinhas de verão: amêijoas, atum fresco e salada... ("E quando os coentros no Norte sabiam a "fedelho" e não iam à mesa do rei?!")



Lourinhã > "Chez Alice" >  15 de agosto de 2023 > Amêijoas com um molhinho de coentros picados, atum fresco de cebolada e salada de alface e cebola... 

Fotos (e legenda): © Luís Graça (2023). Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. De que é que um cristão precisa mais cá na terra, em pleno verão, no nosso outrora querido mês de agosto? Amêijoas, de entrada, atum fresco de cebolada com uma batatinha com pele, uma saladinha, um copo de branco fresco...

A sugestão é da "chef" Alice que, infelizmente, eu não apanhei na Guiné, em 1969/71, como "vagomestre". Nessa altura eu não fazia a mínima ideia onde era Candoz, onde ela nasceu, em 1945, a cerca de 320 km a norte da minha terra, Lourinhã... 

Conheci-a aqui, quando ela veio para cá trabalhar, em 1973, para a equipa da "Junta de Colonização Interna" (sic). Vinha do Parque Nacional da Peneda-Gerês que ajudou a criar...

Há encontros felizes...

Fica aqui mais a sugestão gastronómica de verão do nosso "vagomestre de serviço", mesmo que os ingredientes  estejam mais caros do que no ano passado (o atum, as amêijoas, até a batata e a cebola). Mas já que falamos de batata, tenho que deixar aqui o sítio de um homem da minha terra, o Raul Reis, do Sobral, Lourinhã,  que fala "de cátedra" sobre a(s)  batata(s) do nosso contentamento (era um luxo na Guiné, no nosso tempo).  Batata Ratte, batata olho de perdiz, batata raiz-de-cana, batata Asterix... Tudo produtos "gourmets"...

Amigos e camaradas, boa continuação do verão, bebam água, protejam-se do sol (que também faz bem aos ossos), cuidado com as insolações e o cancro de pele... e sobretudo com as minas & armadilhas espalhadas ao longo do troço da picada que nos falta palmilhar neste terço da vida.

Continuamos,  entretanto,  à espera que os outros nossos 'vagomestres' nos mandem ao menos as fotos dos seus "petiscos de verão"... Comam bem o que bem vos apetecer (e se puderem...),  mas não se esqueçam de partilhar as vossas fotos... gastronómicas (LG).

PS - Costumo contar, com algumna graça, que fui eu e Alice que introduzimos os "coentros" (e as "amêijoas") na culinária da Quinta de Candoz... No nosso casório, realizado em 7 de agosto de 1976, lá na Quinta de Candoz, levámos marisco (camarões e sapateiras), e amêijoas com fartura... Aquela gente do Norte nunca tinha cheirado nem muito menos mastigado o raio da erva da terra dos mouros (Coentro, Coriandrum sativum, do grego κορίαννον) ... 

"Sabe a fedelho, carago|!", diziam os mais novos... (A língua portuguesa é tramada.)

Primeiro estranhava-se,  cuspia-se e... despois entranhava-se como todas as novidades boas...  E os ceontros vieram para ficar, lá em Candoz... Hoje cultivam-se na quinta... E toda  gente é fã das amêijoas à Bulhão Pato. Agora temos que tentar... a sopa de beldroegas (a tal erva daninha onde os cães e os gatos mijam).

Quando eu ia ao estrangeiro, em trabalho, ou recebia colegas estrangeiros em Portugal, sempre fiz propaganda das nossas amêijoas à Bulhão Pato: "the small femnale Portuguese clams with olive oil and coriander"... No passado era comidinha dos pobres, que não ia à mesa do rei... "Coentros e rabanetes não vão à mesa do rei", diz a letra do fado de Jorge Atayde, interpretado por Rodrigo.
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fedelho|â|ou|ê|
(fe·de·lho)



Regionalismo |  Entomologia

Inseto hemíptero (Nezara viridula), de cor verde, que liberta um cheiro desagradável quando se sente ameaçado.

nome masculino

1. Criança que ainda cheira a cueiros.

2. Jovem muito novo.

3. Criança traquinas ou impertinente. = Badameco

4. [Regionalismo] [Entomologia] Inseto hemíptero (Nezara viridula), de cor verde, que liberta um cheiro desagradável quando se sente ameaçado. = Percevejo-do-Monte, Percevejo-Verde

"fedelho", in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2023, https://dicionario.priberam.org/fedelho.
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Nota do editor:

Último poste da série >: 19 de agosto de 2023 > Guiné 61/74 - P24568: No céu não há disto... Comes & bebes: sugestões dos 'vagomestres' da Tabanca Grande (39): Lagoa de Óbidos, Bom Sucesso: Enguias fritas no "Covão dos Musaranhos"

sábado, 19 de agosto de 2023

Guiné 61/74 - P24568: No céu não há disto... Comes & bebes: sugestões dos 'vagomestres' da Tabanca Grande (39): Lagoa de Óbidos, Bom Sucesso: Enguias fritas no "Covão dos Musaranhos"



Lagoa de Óbidoa > Bom Sucesso > Restaurante, bar e esplanada Covão dos Musaranhos : 19 de agosto de 2023 > Uma dose de enguias fritas, com alho e molho especial... Só comidas com pãozinho, e acompanhadas com um copo de branco.

Fotos (e legenda): © Luís Graça (2023). Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís Graça


1. O verão puxa aos petiscos. E de preferência com sabores a mar. Ainda hoje descobri aqui um sítio convidativo ao convívio e ao petisco, o restaurante, bar e esplanada sobranceiro à lagoa de Óbidos, no Bom Sucesso, Vau, Óbidos, o  "Covão dos Musaranhos"... 


Tem página no Facebook. Contacto: 927 661 657 / 262 969 930. A apreciação dos clientes não é unânime, vai do fantástico ao horrível (nomeadamente o serviço). O cardápio também não é muito variado. É o único local onde se come... naquele sítio... que é paradisíaco, e muito procurado pelos aumentos de "paddle".

Eu há anos que não comia enguias fritas E aqui comi, hoje. Com alho e um molhinho que não descobri exatamente o que era.  Garantiram-me que era da lagoa... Foi o meu almoço.  Não toquei em mais nada do que estva na mesa: salada de polvo, amêijoas à Bulhão Pato, sardinhas assadas... Queria ficar só com o gostinho das enguias fritas... (Amêijoas da lagoa de Óbidos arranjo com facilidade no mercado da Lourinhã.)

Também fazem ensopado de enguias (2 pessoas: 40 aéreos, passe a publicidade... Como adoro enguias, tenho que lá voltar para provar o ensopado... Se me souber como as enguias à moda da Ria de Aveiro,  que costumava comer na Costa Nova, Ílhavo, com o meu saudoso amigo Zé António Paradela (1937-2023), ficarei feliz da vida. (E será a minha maneira, minha e da Alice, de  também homenagear a memória deste grande ilhavense que foi um dos nossos grandes amigos.)

Fica aqui a sugestão do nosso "vagomestre de serviço". 

Amigos e camaradas, b0m verão, e que Deus Nosso Senhor não vos tire o apetite... 

Continuamos à espera que os nossos 'vagomestres' nos mandem ao menos as fotos dos seus "petiscos de verão"... Comam bem (o que não quer dizer muito...) e partilhem ao menos a vossa fotogaleria... gastronómica. (LG).

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Nota do editor:

Último poste da série > 21 de julho de 2023 > Guiné 61/74 - P24492: No céu não há disto... Comes & bebes: sugestões dos 'vagomestres' da Tabanca Grande (38): O arroz de lingueirão à moda de Candoz

sexta-feira, 21 de julho de 2023

Guiné 61/74 - P24492: No céu não há disto... Comes & bebes: sugestões dos 'vagomestres' da Tabanca Grande (38): O arroz de lingueirão à moda de Candoz







Marco de Canaveses > Paredes de Viadorees > Candoz > Tabanca de Candoz > 15 de julho de 2023 > Aqui também chegam os sabores do mar...


Fotos (e legenda): © Luís Graça (2023). Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].


1.  Dez dias de "férias & trabalho" na nossa Quinta .de Csndoz, longe da Lourinhã, da fisioterapia e do ginásio,... e do blogue (já que o acesso à Net é reduzido),  não nos impedem, a mim e à Alice, de manter a tradição do petisco... com sabor a mar. 

Ontem foi uma sardinhada, à moda antiga, para 15 pessoas. A Alice juntou cá os manos vivos.  O  Zé Carneiro  trouxe as sardinhas da lota de Matosinhos, e foram as melhores que comemos este ano, assadas em lenha de videira (que é a melhor)... Como se diz aqui, "souberam-nos pela vida"..., independentemente da sua origem (parece que foram pescadas no mar de Sesimbra). E lembraram-se os tempos da "sardinha para très"...

Há dias a "chef" Alice fez um arrozinho de lingueirão (ou navalha)... É um prato simples e delicioso, com arroz de tomate e coentrinhos.  (Podia levar pimentos, mas não  levou para estragar o gostinho a maresia do molúsculo...). 

 O "segredo" é lavar bem o lingueirão (ou navalha). libertando-o de toda e qualquer impureza , em particular a areia (que é extremamente desagradável para os nossos dentinhos e língua). Aproveita-se a "auguinha" onde se coze o molúsculo... 

Quanto ao resto, há para aí muitas receitas na Net, que o leitor pode consultar. Como sempre, estava um arrozinho de comer e chorar por mais...Esta gente aqui é especialista a cozinhar o arroz (de mil e uma maneiras)...

Amigos e camaradas, b0m verão,  e que Deus Nosso Senhor não  vos tire o apetite... Continuamos à espera que os nossos 'vagomestres'  nos mandem ao menos as fotos dos seus "petiscos de verão"... Comam bem (o que não quer dizer muito...)  e partilhem ao menos a vossa fotogaleria... gastronómica.  (LG)

II. Lingueirão, segundo o Dicionário Priberam da Língua Portuguesa:

lingueirão |güei|
(lin·guei·rão)

nome masculino

1. Língua grande.

2. [Zoologia] Molusco acéfalo bivalve, com concha retangular estreita e longa. = Canivete, Ligueirão,Lingueirão-de-Canudo,Longueirão, Navalha, Navalheira.  

Origem etimológica: língua + -eirão.

"lingueirão", in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2023, https://dicionario.priberam.org/lingueir%C3%A3o#google_vignette.

quarta-feira, 5 de julho de 2023

Guiné 61/74 - P24451: No céu não há disto... Comes & bebes: sugestões dos 'vagomestres' da Tabanca Grande (37): A batatada de peixe seco... da Marquiteira, Lourinhã


Foto nº 1


Foto nº 2


Foto nº 3


Foto nº 4

  

 Vídeo (0' 46''). Alojado em You Tube > Luís Graça

Lourinhã > Marquiteira > Festa em Honra do Senhor Bom Jesus do Carvalhal  > 3 de julho de 2023 > A tradicional batatada que já atrai muitos forasteiros, além dos habitantes locais... É um prato como a lampreia: ou se adora ou se odeia...

Fotos (e legenda): © Luís Graça (2023). Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].


1. Não, não é nenhum batalha campal. Há terras que fazem festas mais aguerridas, coloridas e concorridas, com a tomatada... Toneladas de tomate são destruídos, por pura diversão, nas ruas de Buñol, na província de Valência, na Comunidade Valenciana, na vizinha Espanha. É a célebre "tomatina".

Aqui, não, o povo é mais pacífico, ninguém anda a guerrear-se com tomates nem muito menos com batatas... Aqui dá-se ao dente... A batatada (de peixe seco) é um prato tradicional, rústico, pantagruélico, primitivo, dos povos da beira-mar do concelho da Lourinhã, muito apreciado ainda hoje em terras como Atalaia, Marquiteira, Ribamar, Ventosa... Era comida do inverno, quando faltava o peixe fresco. Mas também se cozia e servia no "campo",  quando os trabalhos agrícolae exigiam mais mão  de obra.  É  pena que ainda não haja, na Lourinhã, uma confraria da batatada de peixe seco (*). 

A Marquiteira (sede da freguesia de Santa Bárbara, com pouco mais de 2 mil habitantes) celebra  a sua festa anual no primeiro fim de semana do mês de julho (Fotos nº  1 e 2). O santo da devoção dos fregueses de Santa Bárbara é o Senhor Jesus do Carvalhal.  Um dos pontos altos da festa é o círio da Marquiteira ao Santuário do Senhor Jersus do Carvalhal, no Carvalhal, Bombarral (cerca de 25 km). Não faltam os comes & bebes, os gaiteiros e os fogueteiros.  Que o círio é devoção e folguedo. E que a vida são dois dias e a festa são três. ..

O outro ponto alto foi,  anteontem, segunda feira, dia 3, a tradicional batatada de peixe seco: batata cozida (Ãgria), cebola inteira e peixe seco, muito peixe a transbordar da travessa (raia, sapata, cação, safio, etc.) (Fotos nº 3 e 4). A comezaina juntou centenas de comensais, que a batatada da Marquiteira tem fama e tradição, sendo inclusive considerada a melhor do concelho, rivalizando com a da Ventosa...

Fui lá com a Alice, com um grupo de amigos e um camarada, o Jaime Silva, ex-alf mil paraquedista, BCP 21 (Angola, 1970/72). A jantarada (devia ser almoçarada, por causa dos problemas de digestão...) foi abundante e animada, com gaiteiros e tudo... 

Confesso que já tinha saudades, que a pandemia de Covid-19 privou-nos destas coisas boas que não há no céu... e sobretudo do convívio que proporciona a batatada da Marquiteira (bem como a da Ventosa). Já não ia lá há uns anos... (**)



Bombarral > Carvalhal > Recinto do Santuário do Senhor Jesus do Carvalhal > 29 de junho de 2021 > O 1º "círio" da Tabanca do Atira-te ao Mar... e Não Tenhas Medo (Porto das Barcas, Lourinhã) >  Altar campal no sítio das antigas cocheiras > Painel  da Marquiteira (Lourinhã), Adão Lobo (Cadaval), Campelos (Torres Vedras), Cabeça Gorda (Lourinhã e Torres Vedras)
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(**) Último poste da série > 7 de junho de 2023 > 7 de junho de 2023 > Guiné 61/74 - 24376: No céu não há disto... Comes & bebes: sugestões dos 'vagomestres' da Tabanca Grande (36): As ostras do nosso (des)contentamento (Hélder Sousa / Luís Graça / José João Domingos / Valdemar Queiroz)

sexta-feira, 12 de maio de 2023

Guiné 61/74 - P24310: No céu não há disto... Comes & bebes: sugestões dos 'vagomestres' da Tabanca Grande (35): chegou a primavera (mesmo sem "abril, águas mil"), que vai bem com (diz a 'Chef' Alice): (i) favas com casca, suadas, à moda alentejana; (ii) carapauzinhos fritos com arroz de tomate; e (iii) favas suadas à moda da Maria da Graça... Sem esquecer: (iv) o festival literário "Livros a Oeste (11ª edição, Lourinhã, 9-13 mai 2023); e ainda (v) a 14ª quinzena gastronómica do polvo (Lourinhã, 17-31 mai 2023)...


Lourinhã > Chez Chef Alice > 12 de maio de 2023 >  "Favas com casca... suadas, à moda alentejana"


Lourinhã > Chez Chef Alice > 10 de maio de 2023 >  "Carapauzinhos fritos com arroz de tomate"


Lourinhã > Chez Chef Alice > 24 de abril de 2022 >  "Favas suadas à moda da Maria da Graça"

Fotos (e legendas): © Luís Graça (2023). Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Já passou o Abril, mas não vieram as águas mil... Estamos em plena primavera do nosso (des)contentamento... Veio a seca, para ficar, cada vez mais cíclica... E,  se água "cá tem" nas nossas hortas, deixamos de poder jogar aos feijões e, pior ainda, de poder fazer as favas suadas ou o arroz de tomate com peixe frito... Em contrapartida, teremos, pelos santos populares, a boa (?) sardinha assada no pão... Já se vende na praça, aqui, a cinco euros (já vai o tempo em que, perdulários, dizíamos: "ao preço da chuva"...)

Como sugestões dos nossos 'vagomestres', para estes dias em que a fava ainda aparece nos nossos mercados locais, aqui vão dois pratinhos, de resto já divulgados, da nossa 'chef' Alice: as costumeiras favas suadas (à moda da senhora minha mãe, Maria da Graça, que Deus já lá tem), e as favas com casca (colhidas ainda jovens, tenrinhas)... 

Neste último caso, são feitas ´"à moda alentejana", e aproveita-se tudo, a casca e a fava... (Não confundir com as ervilhas de quebrar, que também são de comer & chorar por mais: este, sim, um prato duriense, das gentes da Tabanca de Candoz...

As favas com casca (com entrecostro, ou só enchidos, com destaque para o "chourico preto"...) não são prato que se encontre nos restaurantes aqui à volta, contrariamente aos   carapauzinhos fritos com arroz de tomate... (Não se diz "jaquinzinhos", que a ASAE não deixa.)

Bom proveito... E mandem-nos também as vossas sugestões, enquanto a gente ainda puder andar por qui, pela Terra da Alegria... A prazo, claro, estamos a  prazo.Mas esta semana, também há cá o festival literário "Livros a Oeste"... Porque, na terra dos dinossauros, nem só de favas vive o homem... Amanhã, 13, é o último dia... LG



Cartaz do festival literário "Livros a Oeste", Lourinhá, 9-13 de maio de 2023... Este ano subordinado ao mote  "Entre nós... e as palavras" (verso do poeta Mário Cesariny, que faria 100 anos)...  Vai já na 11ª edição, realizado pela CML desde  2012. Programador cultural: João Morales.... 

E para a semana, começa  a 14ª quinzena gastronómica do polvo (Lourinhá, 17 a 31 de maio de 2023). 
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Nota do editor:

quarta-feira, 5 de abril de 2023

Guiné 61/74 - P24198: No céu não há disto... Comes & bebes: sugestões dos 'vagomestres' da Tabanca Grande (34): papas de sarrabulho à moda de Candoz

Tabanca de Candoz > 12 de Outubro de 2006 > Na matança do porco (*), faziam-se as papas de sarrabulho... à moda de Candoz.

Video (3' 47''): Luís Graça (2006). (**)

1. A "Tia Nitas" (como eu tratava carinhosamente a minha "mana", e que  "Deus já lá tem",  como diz aqui o povo) sabia explicar tudo direitinho... com a sabedoria, o amor e a paciência que ela punha em tudo o que fazia na Terra da Alegria...  Era uma excelente cozinheira e  "dona de casa" tal como foi uma grande profissional no laboratório de tecnologia química do ISEP.

Já não se mata mais o porco, lá em casa,  como antigamente, nem se farão mais as papas de sarrabulho (a não ser comprando os ingredienets no Talho, mas já não teria a mesma graça...).  A matéria prima    é  (era) o sangue de porco  e os miúdos da carne de porco (coração, fígado,  etc.) .

Fomos desencantar este vídeo (mais do que amador...) no blogue "A Nossa Quinta de Candoz"... E voltamos a reproduzi-lo aqui. É uma pequena homenagem à nossa Nitas (Candoz, 1947 - Porto, 2023), nesta quadra festiva, a Páscoa,  de que ela gostava tanto ou mais do que o Natal.

Vamos reunir a família em Candoz, este fim de semana,  (Riosunbga mas não vamos abrir a porta ao compasso pascal, este ano. (A visita em Candoz era sempre à  segunda-feira,  o compasso levava dois dias a  percorrer a feguesia.) Estamos de luto, como manda a tradição e o coração. 

No vídeo, que é de 2006,  aparecem as três manas da familia, a Rosa (Rosinha, a mais velha das três), a Chita (Alice) e a Nitas (Ana), guardadoras dos segredos e dos sabores culinários da família Ferreira Carneiro... Na altura eram também elas as  sócias da Quinta de Candoz (falta aqui o mais novo, o mano Zé para completar o quarteto dos sócios da Sociedade Agrícola da Quinta de Candoz...).

 2. O modo de fazer este prato segue a tradição minhota, comum à região do Douro Litoral (a que pertence Candoz, já no limite do distrito do Porto) (***). A receita pode ser vista aqui, na página Cozinha Tradicional:

(...) As papas de sarrabulho fazem parte das receitas tradicionais da cozinha portuguesa, sendo oriundas do Minho, no norte de Portugal. 

Os ingredientes principais destas papas são: sangue de porco (que dá origem ao termo 'sarrabulho' ), carne de galinha, carne de porco, cominhos e pão ou farinha de milho. São servidas como sopa ou como acompanhamento de pratos como os Rojões à moda do Minho.

As papas de sarrabulho são tradicionalmente feitas no Inverno, quando se realiza a matança do porco. Além disso, fazem um prato forte, que apetece sobretudo saborear no tempo frio.

 É comum encontrar este prato tradicional nos restaurantes do norte de Portugal, sendo raro encontrá-las nas regiões centro e sul do país. (...).

3. E ainda a propósito da quadra festiva da Páscoa, lembro aqui também o que eu gostava de escrever, por esta altura,  no blogue de "A Nossa Quinta de Candoz", quando ainda erámos todos vivos e respirávamos saúde e havia alegria para poder receber o compasso pascal:

(...) Qualquer que seja o significado que a Páscoa possa ter para cada um de nós, há nela uma mensagem de sentido universal e intemporal: a travessia da 'picada' [estrada ruim, trilho]  da vida, com todos os seus riscos, medos, minas e armadilhas, é bem mais fácil, se for feita em conjunto, de maneira solidária, partilhada... Mesmo sabendo todos nós, que o nascer e o morrer são os atos mais intrinsecamente solitários da vida humana. (...).

sexta-feira, 31 de março de 2023

Guiné 61/74 - P24180: Notas de leitura (1568): Arroios à Mesa não esqueceu as especialidades guineenses (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá, Finete e Bambadinca, 1968/70), com data de 14 de Julho de 2020:

Queridos amigos,
Não há vida multiétnica em Portugal como nesta freguesia de Arroios, um oásis de tolerância e de respeito, com uma diversidade de estabelecimentos abertos a toda a gente, comércio de vários continentes, igrejas e mesquitas, a festa chinesa que atravessa a Avenida Almirante Reis é acontecimento retumbante, mesmo uma biblioteca histórica como São Lázaro acolhe acervos do Médio Oriente, pode-se fazer turismo interno para ver gente de 92 procedências, com os seus falares próprios. E a sua gastronomia, também o seu modo de viver, nos permite ir a Arroios para degustar receitas multiculturais que o chefe Fábio Bernardino organizou para gente interessada, desde a comida portuguesa à de outros dois continentes e também ao Leste europeu. Veja se é assunto que lhe interessa, Arroios à Mesa é um manual de receitas que se pode pedir à Junta de Freguesia de Arroios. Nas coisas da cozinha, e de acordo com o que aqui se pode comer na freguesia de Arroios, votos dos melhores sucessos.

Um abraço do
Mário



Arroios à Mesa não esqueceu as especialidades guineenses

Mário Beja Santos

Temos aqui uma singular iniciativa editorial da Junta de Freguesia de Arroios, a mais multiétnica do nosso país, aqui vivem representantes de 92 nacionalidades, aqui é possível comer um borscht, pyrizhki, sarapatel, chacuti, cabrito com inhame, mufete de peixe, frango com mandioca, moussaka, não faltando a representação portuguesa a grande nível: broa de sardinha e pimentos, caldeirada de peixe, massada de peixe, feijoada de chocos à 31 de Janeiro, arroz de bacalhau com grelos, berbigão à Mercado de Arroios e arroz doce. Tudo organizado pelo chefe Fábio Bernardino, edição de 2021 da Junta de Freguesia de Arroios, a quem o leitor se deve dirigir para procurar adquirir este precioso manual, ou para experimentar em cozinha própria ou para se lançar em restaurantes e casas de pasto da freguesia. Há dados muito curiosos que acompanham o receituário: a comunidade chinesa na freguesia era a terceira maior só ultrapassada pela brasileira e a angolana (dados do censo de 2011); a comunidade indiana nesta freguesia era a segunda maior de um país originário da Ásia, logo a seguir à chinesa; os cabo-verdianos são a segunda maior de um país africano, logo a seguir à angolana; Angola era a segunda maior logo a seguir à brasileira e a maior de um país africano.

E assim chegamos à Guiné-Bissau cujas comidas são marcadas pela presença de frutos-do-mar e arroz, comunidade que era a quarta maior de um país africano, a seguir a Angola, Cabo Verde e Moçambique. A escolha de menus é de estalo. Logo a sopa de peixe e amendoim, segue-se o Sigá com todos os seus ingredientes (quiabos, cebola, beringela, camarões, vinho branco, coentros picados, óleo de palma, azeite, alho, malagueta e sumo de limão – é quase obrigatório acompanhar de arroz). A sobremesa para mim é uma inteira novidade, arroz doce de amendoim torrado, junta-se a receita, ou para experimentar em casa ou para andar à procura em estabelecimento de Arroios.

Depois do belo receituário de Moçambique, uma palavra ao Leste europeu onde além da mussaka temos Draniki com cebola e baclava, com todos os seus ingredientes (nozes, massa filó, uvas passas, amêndoas, pistachios, mel, azeite, raspas e sumos de laranjas, vagem de baunilha) e sobre Portugal estamos conversados. Para gastrónomos e gastrófilos, este manual é uma tentação. O meu não sai cá de casa, os interessados que se dirijam à Junta de Freguesia de Arroios, serão seguramente bem-sucedidos.

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Nota do editor

Último poste da série de 27 DE MARÇO DE 2023 > Guiné 61/74 - P24172: Notas de leitura (1567): "Guinéus", por Alexandre Barbosa, um dos últimos grandes títulos da literatura colonial (Mário Beja Santos)

domingo, 5 de fevereiro de 2023

Guiné 61/74 - P24038: Blogues da nossa blogosfera (177): A matança do porco de antigamente... e a alegria da festa que não se compra nos hipermercados (Augusto Pinto Soares, coeditor de "A Nossa Quinta de Candoz")


Marco de Canaveses > Paredes de Viadores > Parque de merenda de Nossa  Senhora do Socorro > 31 de agosto de 2019 > 6º encontro da família Ferreira > O nosso "Gusto", natural  do orto, casado com uma Ferreira Carneiro, nascida em Candoz... Ele é o homem dos sete ofícios, podador, enxertador, tractorista, contabilista, etc., incluindo acordeonista...  E de há quatro anos a esta parte, um grande cuidador, que sabe lidar como poucos com a doença crónica da sua Ana (que tem sido uma heroína)...

Mas a vida não é só dor, sofrimento, doença, tristeza... Na festa da família Ferreira não podem faltar todos os elementos da festa da vida... o pão, o vinho, os salpicões, o anho assado com o arroz de forno, os pastelinhos de bacalhau,  a doçaria,  a alegria, a música, a reinação, as cantigas à desgarrada, os cantaréus, a dança, a "canalha" (as crianças, os adolescentes), os jovens, os graúdos, os pais. os avós e os bisavós...

Cada "família" trouxe o seu pestisco, que foi partilhado nas  mesas de granito do parque das merendas, sob a benção da Nossa Senhora do Socorro... Era já noitinha quando cada família  arrumou a trouxa e voltou às suas casas, uns mais perto, outros mais longe, com vontade de voltar no  ano seguinte (estava agendado, o 7º convívio,  para 29 de agosto de 2020, mas a pandemia de covid-19 pregou-nos a partida, e que partida!)... 

Afinal, a vida são dois dias e a festa da vida deviam ser três...

Foto (e legenda): © Luís Graça (2019). Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Teve bom acolhimento, entre os nossos leitores, o poste do Francisco Baptista sobre a matança do porco na sua aldeia de Brunhoso, concelho de Mogadouro, Terra Fria Transmontana (*). Uma terra  "rica e autossuficiente", escreveu ele, num dos postes da sua série "Brunhoso há 50 anos". Aliás, ninguém como ele, neste blogue, comnseguiu manifestar por escrito, com tanta evidência, ternura e talento literário, o amor que que se pode ter  à terra que nos viu nascer. (Desta série, sairia, de resto, o seu livro "Brunhoso, Era o Tempo das Segadas - Na Guiné, o capim Ardia", edição de autor, 2019, 388 pp.)

Não nos levem a mal que, em complemento dessa narrativa, de inegável interesse etnográfico, e que sobretudo nos ajuda a reconstituir ou reviver parte das memórias das nossas raízes telúricas, eu reproduza também aqui um texto, da lavra do meu cunhado e sócio, Augusto Pinto Soares (o "Gusto"), s0bre "a matança do porco de antigamente" em Candoz (região duriense), publicado originalmente no blogue de que somos, eu, a Alice e ele, editores, "A Nossa Quinta de Candoz" (**). Para além de saborosos pormenores que ilustram a "festa" e a "gastronomia" associadas ao porco (elemento essencial da economia doméstica das famílias rurais no Norte), há também uma boa ilustração fotográfica, que falta ao poste do Francisco Baptista.

São do Augusto Pinto Soares também dois notáveis postes, já aqui publicados, sobre as vindimas de antigamente (***). (De resto, a Quinta de Candoz também é uma tabanca: a Tabanca de Candoz tem mais de meia centena de referências no nosso blogue.)


Quinta de Candoz: a matança do porco de antigamente

Texto de Augusto Pinto Soares (2005)

Créditos fotográficos: Luís Graça (2005) e Luís Filipe Soares (2005)


Quinta de Candoz (sita em Candoz, antigo concelho de Bem Viver, hoje freguesia de Paredes Viadores, concelho do Marco de Canaveses, distrito do Porto) > O amanhecer em Candoz... O rio Douro, a albufeira da barragem do Carrapatelo, Porto Antigo, ao fundo,  a serra de Montemuro, Cinfães (já no distrito de Viseu) coberto de nevoeiro cerrado.

Manhã cedo, quase a alvorecer, fria como convinha. Ao longe, as serras estão brancas, cobertas com um manto de neve. Típica manhã de Dezembro.

Os dedos enregelavam. O dono da casa e os filhos já espigadotes, com corpo de homem, agasalhados com capotes e samarras com pele de coelho no colarinho, calçados com socos de madeira que estropiam nos montes de geada congelada no chão, esfregam as mãos tentando fazer girar o sangue para as aquecer.

Era o dia da matança do porco. Dia esperado com alguma ansiedade pois parecia dar abundância naqueles tempos de míngua, de escassez. A matança era um momento solene, porque muitas famílias não tinham mais nada além do porco.

O ambiente ia sendo preparado. O carro de bois já tinha sido colocado de feição. As panelas com água já estavam na lareira, entretanto acesa, para ferver água. Molhos de palha, amarradas como archotes, estavam prontos. Um alguidar com um pouco de vinho verde tinto no fundo aguardava junto ao carro.


Quinta de Candoz > O velho carro de bois, agora peça de museu, onde, antigamente, se sacrificava o animal...

Os preparativos estavam feitos. Munido das suas facas e do respectivo afiador, eis que chegava o matador. Homem experiente, já de certa idade, lavrador como todos os outros mas que há já muitos anos, nestas alturas, se dedicava a matar os porcos que a vizinhança das redondezas lhe solicitava. Era uma arte a que poucos se dedicavam.

A dona da casa já tinha preparado o mata-bicho (broa de milho e centeio e aguardente – alguns preferiam-na com um pouco de açúcar) para aquecer os corpos, ainda esfriados como a manhã.

O dono da casa, o matador e mais três ou quatro filhos lá se dirigiam para a corte onde o bicho, qual condenado sem saber a sentença que lhe coubera de sorte – mas parecendo que a adivinhava – olhava de soslaio, e com alguns guinchos, para aqueles vultos que não era costume aparecerem àquelas horas para lhe darem de comer – o que tanto desejava pois desde o dia anterior que pouco ou nada tinha comido, apenas alguma água de lavagem. Desconfiado, ia-se resguardando no canto mais recôndito que encontrava na corte.


Marco de Canaveses >  Feira do gado > O porco era o governinho da patroa e o boizinho, vendido na feira do Marco, uma das poucas fontes de receita dos lavradores e sobretudo dos caseiros, para além do vinho e do milho, antes do 25 de Abril. (O boi da foto era um animal de trabalho, a junta de bois substituía o tractor.)

O dono da casa ou normalmente o próprio matador, munido de uma corda de amarrar os bois, entrava e aproximava-se do animal. Os outros, à porta cercavam o local.

– Oh bitcho! Oh bitcho!

Com alguma dificuldade mas com a mestria de quem tantas vezes já tinha efectuado aquela tarefa, o matador colocava a corda, como um açaimo, em redor do focinho e entre os dentes do animal.

Agora, puxado para fora da corte e com os restantes homens a vigiar – não fosse o bicho fugir, o que não seria a primeira vez – era conduzido para o carro de bois. E todos num verdadeiro esforço lá conseguiam deitá-lo com a cabeça para baixo junto à cabeceira do carro.

Os quatro homens seguram-no, cada um em sua pata e colocado o alguidar com o vinho (para o sangue não coagular) por debaixo da cabeça do bicho, o matador, dando uma palmada (tal como se fosse para dar uma injecção) por cima do sítio onde a faca iria entrar, espeta-a com precisão cirúrgica, junto à goela, no único sítio que fará com que o sangue flua completamente para o alguidar. Os berros do bicho são essenciais para que o sangue saia todo e são sinal que a faca foi espetada no sitio certo.

 Sim senhor! A faca foi bem metida! Nem uma pinta de sangue lá ficou! Deu-o todo!

O alguidar já vai para a cozinha onde o sangue será cozido (a água já ferve na panela de ferro que está à lareira) para, daqui a pouco, ser levado como pitéu, juntamente com broa e vinho verde tinto, aos homens. È o dejujuadoro (deixar de estar em jejum) daquele dia.


Quinta de Candoz > c. 1980 > A matança do porco: cinco homens e duas mukheres oara matar um porco... Uma cena, hoje cruel para os nossos filhos e netos citadinos (a que a criança do cmapo se habituava desde tenra idade...), e  que Bruxelas quis definitivamente banir dos nossos campos e aldeias em nome de uma concepção fundamentalista da saúde pública e de uma Europa globalizada, normalizada e tecnocrática, matando a etnodiversidade... O "Gusto", em segundo plano, ao centro, de óculos...A Alice Ferreira Carneiro, do lado direito, de perfil, em primeiro plano...  O "matador" é o Manuel Ferreira Carneiro, o único dos três rapazes da família que ficou livre da tropa por deficiência  numa perna. Três raparigas completavam a famíia Ferreira Carneiro.

Aceso um molhe de palha pouco a pouco vai-se tostando a pele do bicho, queimando-se os pêlos para que o couro fique o mais liso possível. Os homens já não sentem tanto o frio. O esforço e a tocha a queimar a pele do bicho já os fez aquecer. Entretanto já lá vem o sangue cozido que, com a broa e o vinho, os fará aquecer ainda mais. Os casacos e as samarras já são um estorvo!

– Bitcho bô! ...Pesa bem cem quilos!

– Eu não dou tanto! P’raí uns noventa e três!

– Depois veremos! Há aí uma balança para tirar as teimas!

A pele do animal já está quase escura. Com sacholas, facas, escovas e pedras rapam-se os pêlos já queimados, lavando ao mesmo tempo o couro.


Quinta de Candoz > A palha de centeio com que se limpava e tostava a pele do animal...

Escaldada a língua e a orelheira, faz-se a limpeza a essas partes. Dá-se agora mais uma achega de calor com a palha a arder para que a pele fique mais tostada – a cor dum verdadeiro leitão assado – e com água e sabão completa-se a aparência final.

Com as mãos da frente amarradas a um estadulho do carro de bois e o mesmo para as patas traseiras o bicho é erguido pelos quatro homens que, quais gatos-pingados em cortejo fúnebre, o levam para a loja da casa – o sítio mais fresco – onde pendurado nuns ferros fixos ao tecto (que sempre lá existiram para o efeito) e com a cabeça para baixo será preparado para uma primeira dissecação.


Quinta de Candoz > A desmancha do bitcho na loja (o piso térreo da casa rural que servia para armazenamento ou para apoio às actividades agrícolas: era lá que ficava o lagar, as pipas do vinho, a salgadeira, etc.)

Enquanto os homens se ocupam em outros serviços (é tempo de podar as videiras), o matador e a dona da casa iniciam a primeira operação de desmanchar o porco. Aberta a barriga desde a garganta até ao ânus, são-lhe então retiradas as tripas (que depois de frenética e convenientemente lavadas em água corredia, passadas várias vezes por água bem quente, esfregadas com sal e limão e marinadas com vinho alho e limão serão usadas para fazer as moiras e os salpicões); os miúdos (coração, bofes, goela, etc.) que no dia seguinte devidamente cortados em pequenos pedaços, adicionadas com vinho verde tinto, algum sangue, de carne das capas e demais condimentos, darão as referidas moiras que depois de fumadas no sarilho (cravado na chaminé por cima da lareira), propiciarão um lauto manjar de arroz “a fugir pelo prato fora” com feijão branco e grelos.

A língua servirá para um óptimo salpicão que será apreciado no Carnaval. O fígado cozia-se para depois ser comido frio, ás fatias, com um bom naco de broa. A bexiga, depois de cheia com ar e amarrada no topo, como um balão, vai a secar junto ao fumo da lareira como sinal que se tinha feito uma matança de porco e em alguns casos para servir como irrigador para dar clisteres a quem deles necessitava. Desde o unto à bexiga nada se podia perder. 

Nesses tempos, o porco era o governo da casa, algo de que a patroa se poderia socorrer sempre que era preciso confeccionar uma refeição mais elaborada (em dias de festa por exemplo) para a família ou para eventuais visitantes citadinos que de quando em vez apareciam. Era uma boa oportunidade para a patroa pôr à prova os seus dotes culinários e de gestão alimentar transformando o corpulento animal em fartura para a casa durante o ano.

Já sem as entranhas, com a barriga bem aberta e segura por espetos de madeira cravados duma banda à outra para melhor expor o interior, recheado de ramos de folhas de loureiro aí vai ficar o bicho a secar e a arrefecer a carne até ao outro dia.

A porta devidamente fechada à chave não só para prevenir a entrada de moscas (não são normais neste tempo de frio mas…) que poderão conspurcar a carne, mas também não vá aparecer um daqueles vizinhos maganões que por brincadeira leve o porco da loja deixando os donos da casa atormentados e com os cabelos em pé por pensarem que lhes roubaram o que tanto lhes tinha custado a criar no último ano e que seria o principal sustento da família durante o próximo.

O almoço já apetecia. O odor do salpicão paioto (o maior) – reservado até agora da matança do porco do ano anterior – a cozer juntamente com um arroz malandro convidava ao repasto e fazia crescer água na boca.

Novo dia. Nova expectativa de mais fartura.

A meio da manhã, o matador chegava preparado para a segunda operação de desmanchar o porco. Descido dos ganchos que o sustiveram durante a noite era então levado para a balança.

– Cento e cinco quilos!
– Eu sempre tinha razão! Tenho o peso nos olhos!
– Pois,  olhe, eu fazia-lhe menos um bocado!

Preparada a tábua – em cima de uns cepos – com uma toalha de linho onde o porco seria dissecado, preparados os panos – também de linho – onde as várias qualidades de carne seriam colocadas consoante o seu destino – o matador, sob a vigilância aguçada da dona da casa, começava a desmancha cortando sabiamente cada peça de forma a ter o maior aproveitamento possível.

 – Corte mais por ali! Tire as capas mais fininhas!

 – Tá bem, Tia Maria!

 – Arredonde-me mais esse presunto! Essa gordura vai para pingue!

Meticulosamente cada peça dá o seu melhor para a salgadeira ou para o fumeiro.


Quinta de Candoz > A continuação da desmancha do bitcho na loja...Um dos especialistas era o mano mais velho, o António Ferreira Carneiro, que na tropa foi 1º cabo magarefe, e é DFA: fez parte do  Destacamento Avançado Móvel de Intendência nº 664 (Moçambique, Tete, 1964/66; era conhecido como o "brasileiro")  

E pouco a pouco as várias partes do porco lá iam sendo cortadas, preparadas e separadas: as bandas (para fazer os rojões), os coelhos (para os melhores salpicões pois é a coisa mais gostosa que tem o porco, muito tenrinha.), a cabeça com as orelhas a serem comidas por altura do Entrudo ou na primeira lavourada, a caluba (para salpicões), a espinha (para dar sabor à sopa), os lombos (para os salpicões), as costelas, as capas (donde saíam as melhores fêveras para assar – que sabor… – mas poucas, pois poupar era preciso e eram bem necessárias para as moiras), os meios, os presuntos, as pás e finalmente a cumeeira (couro com a parte mais gorda que se usava para fazer banha ou unto – cortava-se aos poucos, um bocadinho de cada vez, para durar o ano todo - e juntava-se à sopa para lhe dar a gordura que a enriquecia ou, quantas vezes, migava-se com sal fazendo-se assim extrair mais gordura).

A hora de almoço chegava e naturalmente era servido um arroz de costelas mas, um ossinho para cada pessoa e, só porque era o dia da matança. À lareira umas boas brasas aqueciam o ambiente frio da manhã e … assavam fêveras das bandas, só com uma pitada de sal para – uma por pessoa – acompanhar aquele arroz com o suco que delas saía.

O cheirinho que exalava.

 Oh! Sabor dos sabores… Só possível dum porco caseiro, criado durante quase um ano com os restos da comida caseira. Era quando uma boa caneca de vinho verde tinto da casa, da colheita há pouco acabada de fazer, com o característico sabor málico – a transformação malo-láctica ainda não se tinha efectuado – bem adstringente, fazia exclamar:

– Isto até dá vida a um morto! …

Acabada aquela soberba refeição e enquanto os homens se dirigiam para os trabalhos do campo (podar, cortar erva para os bois, pensar o gado, etc.), o matador e a dona da casa lá iam para a loja tratar de salgar o porco.

E esfrega que esfrega, os presuntos e as pás, mais que as outras peças, lá iam ficando bem impregnados de sal. Então, na salgadeira (caixa enorme de madeira) – o frigorífico da altura – onde iriam ser consumidos entre cem a cento e vinte quilos de sal, as peças, de acordo com a sua utilização temporal iam sendo acondicionadas com cuidado e sempre bem cobertas e aconchegadas com o sal – nisso a “patroa” era intransigente –.

 –  Olhe, Tio Rocha, aqui está a cumeeira! Ponha-a bem no fundo! Tem que dar para o ano todo!

E lá seguiam os presuntos (que aí permaneceriam cerca de quatro meses, para depois, previamente esfregadas com colorau - pimentão doce - e conjuntamente com as pás, serem expostas ao fumo), as pás (cerca de três meses), os ossos a calçar as várias peças, as unhas, os lombos (aí estariam só cerca de dois a três dias para depois serem colocados em vinha d’alhos e quarenta e oito horas depois se fazerem os salpicões) e a cabeça.

Mais umas boas garfadas de sal a cobrir tudo para que nada ficasse exposto ao ar e… estava terminado o trabalho.


Quita de Candoz > A panela de ferro onde se faziam os rojões...

A noite aproximava-se. Era preciso preparar a panela de ferro onde os rojões seriam feitos para dar cumprimento à tradição e ao manjar final do dia da matança do porco. Uma pequena parte, das bandas do porco, já tinha sido separada e cortada aos pedaços. A carne entremeada de uma parte gorda e outra magra (próprio daquela parte da barriga), juntamente com o couro e sempre acompanhada do redenho ou gola ou lenço – tecido que separa as tripas grossas das finas – é então deitada na panela com um pouco de banha e com paciência e a ajuda de uma colher de pau, mexe e remexe e torna a mexer, lá se vai vendo os rojões a ficar douradinhos, untados, deliciosos quanto baste para se ter a tentação – sem que a dona da casa o visse – de sorrateiramente se surripiar um, bem quentinho, directamente de panela, que é o que melhor sabe de todos os que se irão comer. A boca até parece empolar com a quentura e sofreguidão com que é facilmente mastigado e digerido. As batatinhas mais miúdas – separadas especialmente para o efeito – também já estão prontas e bem molhadas na banha que serviu para as cozer.


Quinta de Candoz > Os rojões douradinhos...


Quinta de Candoz > Os manjares do porco ... Que cheirinho!... Que sabor!... Que saudade!…

Uns bons travos de vinho para acompanhar e está terminado o dia da matança do porco. Durante o ano que se vai aproximar, naco a naco, o porco vai ser utilizado para ocasiões especiais mas sempre poupadinho para durar até à matança do próximo.


Quinta de Candoz > A matança do porco era também uma festa... E à noite havia sempre cantorias... Em primeiro plano, o Manuel Ferreira Carneiro.


Quinta de Candoz > Vinham os vizinhos, os amigos e os familiares de mais perto e de mais longe... Ainda era vivo o patrão da casa, o José Carneiro (1911-1996) (ao fundo, à cabeceira da mesa), tal como a dona da casa, Maria Ferreira (1912-1995). Portanto, a foto só pode ser do séc. XX...


Quinta de Candoz > A festa à volta da mesa... Do lado direito, em primeiro plano, de perfil o caçula da família, o irmão mais novo da Alice (que é do meio), o José Ferreira Carneiro (ex-1º cabo, operador de transmissões, de rendição individual,  1969/71: pertenceu  à CCAÇ 313 / BCAÇ 13 (1969/71), aquartelada em Camabatela; era uma companhia que guardava os cafezais lá da região, no norte de Angola, perto de Negage e de Quitexe; hoje, Camabatela, sede do município de Ambaca, pertence à província de Quanza Norte). (Engraçado, caçula, vem do quimbundo, "kasule", filho último, derradeiro, o último de uma série.)

Hoje em dia, a matança do porco ainda se realiza aqui ou ali, mas com menos frequência e os métodos utilizados também evoluíram sendo já mais modernos. Cada vez é mais rara a criação doméstica do porco e tende a desaparecer a tradição da matança. 

Em Bruxelas vai-se discutindo se isto é uma tradição mas, mesmo que decida em sentido contrário (alguém se importará?) tal não é necessário porque enquanto este costume se for mantendo a tradição completar-se-á. Naturalmente, pouco a pouco, este uso vai perder-se porque é mais fácil, menos trabalhoso, provavelmente mais económico ir a qualquer grande ou pequeno supermercado comprar as partes e quantidades necessárias para simular uma matança de porco.

freima, aquela pequena festa, aquela fugaz alegria de ter fartura durante uns tempos, essas não se compram e... o sabor da carne daquele porco caseiro, criado durante quase um ano com os restos da comida caseira, algum farelo, couves, batata cozida, etc., esse… muito menos.

Texto de Augusto Pinto Soares (2005)

Créditos fotográficos: Luís Graça (2005) e Luís Filipe Soares (2005)

[ Seleção / revisão e fixação de texto / negritos / título, para efeitos de publicação neste blogue: LG]
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