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domingo, 20 de outubro de 2024

Guiné 61/74 - P26062: Humor de caserna (78): o velho, a "bajuda fugidona" e a justiça salomónica do alferes Mota (Carlos Fortunato, ex-fur mil, CCAÇ 13, Bissorã, 1969/71)


Guiné > Região do Oio > Carta de Bula  (1953) > Escala 1/50 mil  > Posição relativa de Manga... e ainda Bula, Binar,  Choquemone (a vermelho, base do PAIGC), Nhamate, Changue, Unche, Ponta Cuboi  e João Landim...

Infografia: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2024)


Carlos Fortunato, em Bissau, 2006.   
Foto: Arquivo do Blogue Luís Graça
& Camaradas da Guiné

Humor de caserna > o velho, a "bajuda fugidona" e a justiça salomónica do alferes Mota  
A construção dos aldeamentos e aquartelamentos que realizámos, acabou por nos trazer outro tipo de problemas, além dos de índole militar, pois à falta de outra autoridade ou apoio, a população recorria aos militares pedindo ajuda.  Assim além de sermos os construtores de aldeias e aquartelamentos, éramos muitas vezes professores nas escolas primárias, médicos, policias, juízes, etc.

Um dos casos caricatos passou-se com o alferes Matos sedeado em Manga, quando lhe apareceu um velhote a pedir ajuda porque tinha comprado uma bajuda, e ela agora andava a fugir-lhe, mas tinha-a encontrado ali, e ela recusava-se a voltar com ele.

O velhote falava convicto de que os militares o iriam ajudar, pois isso fazia parte dos seus usos e costumes há muitos anos, e nem sequer imaginava que houvesse outros lugares em que as coisas não fossem assim.

Uma visita à tabanca onde estava a bajuda, confirmou a decisão desta em não regressar com o "marido" para o "harém".


Guiné > Região do Oio > Binar >
Manga > 1970 > A bajuda balanta

O alferes Matos tomou então uma decisão ao estilo de Salomão, que tinha dado uma espada a duas mulheres para cortarem ao meio um bebé, pois ambas diziam ser seu, e que acabou por dá-lo à que preferiu que a outra ficasse com ele a fazer tal coisa... 

Assim deu uma catana ao velhote, e disse-lhe que podia levar a bajuda, depois de cortar uma enorme árvore que ali existia com aquela catana.

O velhote ainda experimentou tentar cortar a árvore, mas logo se convenceu que os anos de vida que tinha não eram suficientes para a obra, e foi-se embora a resmungar contra a tropa, perante a alegria da bajuda.


Foto (e legenda): © Carlos Fortunato (2006). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

Fonte: Guiné - Os Leões Negros > CCAÇ 13 > Binar > 1970 > A bajuda fugidona
[ página que foi descontinuada, por estar alojada no "Sapo", tendo sido "capturada" e "salva" pelo Arquivo.pt; era administrada pelo nosso camarada Carlos Fortunato, ex-fur mil, CCAÇ 2591 / CCAÇ 13 (Bissorã, 1969/71). Texto publicado originalmente
publicado em 15/04/2006, e revisto em 21/07/2006 por Carlos Fortunato. ]

(Seleção, revisão/ foxação de texto, título: LG)

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segunda-feira, 14 de outubro de 2024

Guiné 61/74 - P26043: Humor de caserna (77): O "cubano" que afinal era... "russo" (Carlos Fortunato, ex-fur mil, CCAÇ 13, Bissorã, 1969/71)



2001 > O ex-furriel Teodoro, 
da CCAÇ 13 (Bissorá, 
1969/71)


Humor de caserna > O "cubano" que afinal era... "russo"



Um dos aquartelamentos perto de nós anuncia pelo rádio a captura de um grupo do PAIGC incluindo um cubano... 

Na verdade,  era o nosso camarada furriel Teodoro, mais conhecido por "Russo", que tinha saído com quatro soldados balantas para comprar vacas.

Ele bem dizia que não era cubano e mostrava que não trazia nenhuma Kalashnikov, mas apenas uma G3, mas com aquela barba à Fidel de Castro, aquela cor bronzeada, de calções, com um ar de turista, ninguém acreditava que não fosse cubano.

Sempre bem disposto, este nosso camarada algarvio, desta vez ficou mesmo "marafado" com os "periquitos", pois tinha ido ao seu encontro amigavelmente e estes tinham-no prendido.

Na verdade foram várias as vezes que estas confusões aconteceram, chegámos mesmo até a disparar uns contra os outros, entre nós,

Foi assim: ao reabrirmos a estrada para Nhamate, enviamos um pelotão pelo lado esquerdo da mesma e outro pelo direito, a estrada era o ponto de referência, só que a determinada altura a vegetação comeu a estrada, e os dois grupos começaram a aproximar-se um do outro, pensando que se tinham desviado da estrada.

Quando se encontraram, o mato não permitiu o reconhecimento imediato e ambos abriram fogo, contudo ao perceberam que só ouviam o som das G3 logo concluíram que estavam frente 
a frente. Um contacto pela rádio esclareceu tudo.

A vegetação no mato é tão densa que podemos passar a um metro de distância do inimigo e não o vermos, assim às vezes é só um vislumbre, e as reacções têm que ser rápidas.

(Seleção,  revisão / fixação de texto, título: LG)
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Fonte:  Guiné - Os Leões Negros > CCAÇ 13 > Binar > 1970 > O Cubano capturado (página que foi descontinuada, por estar alojada no "Sapo", tendo sido "salva" pelo Arquivo.pt; era administrada pelo nosso camarada Carlos Fortunato, ex-fur mil, CCAÇ 2591 / CCAÇ 13 (Bissorã, 1969/71).  Texto publicado originalmente em 24/02/2003, e revisto em 21/07/2006. 

Foto (e legenda): © Carlos Fortunato (2003). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

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Notas do editor:

Últiumo poste da série > 6 de outubro de 2024 > Guiné 61/74 - P26014: Humor de caserna (76): O Piteira , alentejano de Bencatel, "voando sobre um ninho de cucos, na prova de "slide" em Lamego (José Ferreira, "Memórias Boas da Minha Guerra", vol. I, Lisboa, Chiado Editora, 2016, pp.43-49)

segunda-feira, 15 de julho de 2024

Guiné 61/74 - P25745: Notas de leitura (1709): "Missões de Um Piloto de Guerra", por Rogério Lopes; edição de autor, 3.ª edição, 2019 - Memórias de um piloto nos primeiros anos da guerra da Guiné (2) (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá, Finete e Bambadinca, 1968/70), com data de 2 de Fevereiro de 2023:

Queridos amigos,
São memórias de um piloto que combateu na Guiné e Angola, um feixe de peripécias de situações omnipresentes em todo o tempo que aquela durou, desde aviões avariados, ao nascimento de crianças a bordo, o transporte de prisioneiros ou de sacos de cadáveres vitimados por uma daquelas explosões do combustível que pôs os corpos em tocha. Lembranças amargas umas, porque morreram pilotos heróicos e devotados, histórias de sobressalto, como uma cobra metida num sapato, a revelação de um sabotador em Bissalanca, os bombardeamentos noturnos, permanecer uma noite no quarto com um avião avariado e levar com uma flagelação, os T-6 na Operação Tridente, apanhando os guerrilheiros em plena praia, e não podemos deixar de gargalhar com a mulher do Governador Schulz levada pela multidão, a senhora a gritar e o Governador a pedir para apanharem a velha... Leitura que não vou esquecer tão cedo, até porque me assaltou à memória as ajudas recebidas da Força Aérea na evacuação dos meus feridos, pilotos tão solícitos e enfermeiras tão dedicadas.

Um abraço do
Mário



Memórias de um piloto nos primeiros anos da guerra da Guiné (2)

Mário Beja Santos

Rogério Lopes, (2.º Sargento Piloto, Guiné, 1963-1965), nascido em 1939, tirou a primeira licença de piloto civil em 1959 através da Escola Aeronáutica da Mocidade Portuguesa e nesse mesmo ano entrou na Força Aérea. Durante 3 anos esteve colocado na base aérea de S. Jacinto, parte para a Guiné em 1963. Passou à reserva em 1970 e foi trabalhar para a aviação civil. Das suas missões em dois teatros de guerra deixa-nos este relato que já vai em 3.ª edição, Missões de Um Piloto de Guerra, 2019.

São narrativas versáteis, revelam memórias de um espírito otimista, entusiasta, dotado de grande espírito de corpo, de muitas coisas nos falará, desde o seu batismo de fogo, a missões de socorro, o seu apreço pelos heróis do ar, avarias que não acabaram em desastre, bombardeamentos noturnos, evacuações de uma atmosfera de tempestade, crianças que nasceram a bordo, episódios picarescos, vale a pena contar um pouco de tudo, são os primeiros anos da guerra da Guiné.

Obviamente que conheceu voos acidentados e alguns deles com a fuselagem crivada de tiros. Era um piloto bem preparado e não perdia o sangue frio, veja-se este episódio:
“Aconteceu-me um incidente numa missão de correio e transporte de Auster para Gadamale-Porto, cujo quartel ficava junto a um rio com um cais no fim da pista. Acontece que a dita pista era um caminho de terra e lama, onde só se podia aterrar na maré-baixa, tendo apenas 600 metros de comprimento. Ora, nesse dia, a maré já estava a encher, o que estreitava a faixa de aterragem e aumentava o perigo de derrapagem. Depois de uma passagem baixa resolvi aterrar, correndo todos os riscos inerentes, e porque tinha uma evacuação a fazer e isso podia custar a vida a alguém. Tudo correu bem até ao preciso momento de aconchegar os travões, que eram ao contrário de qualquer outro avião, que são na ponta dos pedais, enquanto estes eram nos calcanhares. Aí é que foi o diabo, o avião começou a dar ao rabo como uma dançarina de rumba, e lá vou eu, deslizando como sabão sobre azulejo molhado. Os 600 metros acabaram, consegui apontar à rampa de 5 metros de largura que dava acesso à doca e… entrei deslizando por ali dentro, gerando a confusão total. Soldados, civis, brancos, pretos e mestiços pareciam baratas aterrorizadas. Eu é que não estava pelos ajustes que só me restava uma solução: provocara um cavalo-de-pau, ou seja, rodar 360 graus, e assim fiz.”

Guarda saudades da Aldeia Formosa, o régulo recebia-o sempre prazenteiramente. Foi inevitável, nasceu-lhe uma criança a bordo, tudo aconteceu num Do-27, voou para Farim, a bordo seguia um mecânico e uma enfermeira paraquedista, tratava-se de um parto complicadíssimo. 

“No regresso e no eclodir dos primeiros gritos a bordo, a enfermeira-paraquedista, apesar dos seus temores, arregaçou as já curtas mangas, desinfetou-se, calçou luvas próprias, ordenou ao mecânico que agarrasse a mulher e mergulhou as suas mãos energicamente. Entre os gritos da paciente, da transpiração da enfermeira e da boca aberta do mecânico, esgazeado por todo aquele aparato a que nunca tinha assistido, eu ia tentando, com o meu feito brejeiro, amenizar um pouco todo aquele stress, dizia que ia sair do meu lugar para ajudar, o que deixava a pobre paraquedista ainda mais nervosa. Depois de uma hora de luta intensa, de berros, suores e cabelos em desalinho, finalmente ouvi um grito de jubilo: Ó Lopes, olhe, já se vê a cabecinha! O nosso cabo mecânico, com uma cara assaz comprometida, continuava a desculpar-se com o seu pouco ou nenhum auxílio, dizendo que não tinha luvas para tal tarefa. Quando aterrámos o bebé acabava de nascer.”

Uma vez foi a Tite levar passageiros e correio, quando este lhe foi entregue tentou ligar o motor, nada, como último recurso rodou a hélice à mão com os magnetos ligados, nada, ali ficou à espera de auxílio, no dia seguinte. Nessa noite houve flagelação, a sua grande preocupação era o avião, saiu ileso daquele confronto, em compensação parte do telhado da caserna tinha desaparecido. Ele fora bem recebido por um Furriel vagomestre, soube na manhã seguinte que tinha sido atingido à saída do quartel. 

Também passou por peripécias com jagudis intrometidos, houve um que lhe entrou no avião com uma bala de canhão, passou um mau bocado, mais tarde recebeu um jagudi embalsamado, “oferta dos nossos soldados do quartel de Binar para o aviador que nesse dia ia perdendo a vida ao tentar entregar o correio por que tanto ansiavam e não receberam, por este ter encontrado no caminho o guerreiro jagudi”.

E vem agora o episódio mais hilariante da narrativa, intitulado “A visita oficial do Governador”:
“Bem cedo, pela manhã, com o Dornier já preparado, pouco esperei pelo Governador e comitiva, que constava apenas da esposa, que aparentava ser mais velha do que ele e tinha dificuldade em andar, e o oficial de operações às ordens.
A viagem de Bissau a Bafatá era de mais ou menos uma hora. Nos bancos de trás, ia o oficial de operações e a senhora e, ao meu lado, o general. Como simpatizávamos um com o outro, aquela hora foi passada de forma e conversa agradável, até a nossa vista alcançar a pista de dois quilómetros de terra batida, mas em bom estado, ladeada pela formação das tropas dos três ramos das Forças Armadas. Todos eles com as suas melhores fardas e ostentando orgulhosamente as medalhas. A separar a população nativa havia um cordão da polícia militar para impedir a invasão da pista. Aterramos no meio de todo aquele aparato festivo, com o clamor de palmas, gritos, fanfarra, rufar tambores, guizos indígenas e bandeiras flutuando ao sabor da agitação de centenas de mãos; assim que parámos, um diligente oficial veio rapidamente abrir a porta de trás do Dornier, para ajudar e facilitar a saída da esposa do Governador.

Ainda hoje, não sei dizer ao certo como tal aconteceu, mas a verdade é que a populaça rompeu o cordão de segurança e, rodeando o Dornier, sacou rapidamente a senhora, levando-a em ombros, acompanhada de gritos festivos, para o meio da multidão em delírio.
A senhora olhava para trás e gritava para o marido a tirar dali, e ele, por sua vez, dizia para mim, com ar assustado: Ó Lopes, eles levam-me a velha!
Depois, gritando o mais que podia, para ser ouvido pela tropa que estava tão desnorteada como nós, repetia incessantemente: Apanhem a velha, apanhem a velha!
E lá se foi todo aquele aparato disciplinar por água abaixo. As alinhadas formaturas desfizeram-se, a multidão branca e preta corria para apanhar a senhora, que continuava a gritar para o marido, no meio daquele mar colorido de civis, militares, bandeiras, estandartes e fanfarra à mistura.”


Dedica um texto e muito emotivo à morte do alferes Pité, como igualmente nos relata a tragédia de fuzileiros falecidos mortos a caminha de Madina do Boé. Uma bazucada rebentara o depósito de combustível de um dos carros e todos os que ali iam foram consumidos pelas chamas, tiveram uma morte horrorosa. Os camaradas eram uma máscara de dor, com os seus gritos dilacerantes. E Rogério Lopes, pesaroso, descreve os voos para transportar os cadáveres envolvidos em enormes sacos de plástico preto. “Foram quarenta atrozes minutos em que as minhas narinas ficaram impregnadas de um cheiro que jamais esquecerei, assim como a pena por aqueles infelizes fuzileiros, que não conhecia pessoalmente, mas que admirava pela coragem demonstrada no campo de combate.”

Em maio findou a sua comissão, em junho foi condecorado no Terreiro do Paço com uma Cruz de Guerra, ao lado do seu Comandante na Guiné. Sentiu uma saudade imensa por aqueles que jamais voltariam.

Não vou esquecer tão cedo tão memorável, dura narrativa, recheada de peripécias inusitadas e outras não tanto, onde paira sempre o sentido de ver alanceado pelo otimismo.



Cruz de guerra, 3.ª classe
T-6 em pleno voo
O Do-27
O Auster
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Notas do editor:

Post anterior de 8 DE JULHO DE 2024 > Guiné 61/74 - P25726: Notas de leitura (1707): "Missões de Um Piloto de Guerra", por Rogério Lopes; edição de autor, 3.ª edição, 2019 - Memórias de um piloto nos primeiros anos da guerra da Guiné (1) (Mário Beja Santos)

Último post da série de 12 DE JULHO DE 2024 > Guiné 61/74 - P25738: Notas de leitura (1708): Factos passados na Costa da Guiné em meados do século XIX (e referidos no Boletim Official do Governo Geral de Cabo Verde, anos 1867 e 1868) (11) (Mário Beja Santos)

sábado, 17 de dezembro de 2022

Guiné 61/74 - P23887: O nosso livro de visitas (217): Pedro Galriça, filho do ex-cap art Fernando Manuel Jacob Galriça, cmdt da CART 1647 / BART 1904 (Bissau, Quinhamel e Binar, 1967/68)


Guiné-Região do Oio  > Binar > Abril de 2017 >  "Uma pequena capela construída encostada a um poilão, que felizmente ainda se encontra de pé, e em cujo interior se encontrava exposta uma pequena imagem de Nossa Senhora de Fátima, que já lá não está. Fui aqui Comandante, como Capitão Miliciano, da então CCAÇ 17, que era constituída por 23 militares do Continente e por 144 militares da Guiné. Na frente da capela, situava-se a parada do nosso quartel." 

Foto do álbum de António Acílio Azevedo (ex-cap mil,  1.ª CCAV/BCAV 8320/72, Bula e da CCAÇ 17, Binar, 1973/74). (*)

Segundo o nosso leitor, Pedro Galriça, esta capelinha teria sido construída pela companhia que o seu saudoso pai, o então cap art Fernando Manuel Jacob Galriça, comandou, a CART 1647 (Bissau, Quinhamel e Binar, 1967/68).

Foto (e legenda): © A. Acílio Azevedo (2017).
Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Mensagem de Pedro Galriça, filho do ex-cap art  Fernando Manuel Jacob Galriça, cmdt CART 1647 / BART 1904 (Bissau, Quinhamel e Binar, 1967/68)

Data - 16 dez 2022,  14:56  
Assunto - Guiné, Binar

Boa tarde,
Em pesquisas na Net, sobre referências ao meu Pai, cheguei ao blog que criou. O meu Pai foi oficial do exército, e esteve numa comissão na Guiné, em Binar e em Bula.

Pelo que sei,  a capela existente na árvore do aquartelamento de Binar terá sido construída por elementos da companhia que ele comandou;

Recordo-me de ele fazer referência a isso e ter inclusivamente algumas fotos/slides das várias fases da sua construção.
Esses slides, presumo que ainda em condições, devem estar por casa da minha Mãe, em Lisboa.
Interessa-vos este tipo de documentação, para instruir o vosso blog?

Cumprimentos,
Pedro Galriça

2. Resposta do editor Luís Graça:

Pedro, obrigado pelo seu contacto. O único oficial com o apelido Galriça, que passou pelo TO da Guiné, durante a guerra colonial / guerra do ultramar, só pode ser o seu pai, de nome completo Fernando Manuel Jacob Galriça. Foi comandante da CART 1647 / BART 1904, e esteve efetivamente em Binar, de setembro de 1967 a outubro de 1968, conforme ficha da unidade que reproduzimos a seguir.

Temos 25 referênciasao BART 1904 mas muito poucas às suas subunidades de quadrícula. Da CART 1647 não temos inclusive nenhum representante na nossa tertúlia (Tabanca Grande): o número de membros registados é já de 867 (entre vivos e mortos, desde 2004).

Tudo indica, pelo que me diz, que a construção da referida capelinha seja dessa época (set 67/out 68). O nosso camarada António Acílio Azevedo passou por Bula e Binar em abril de 2017 com mais um pequeno grupo de malta do Norte, numa viagem de "turismo de saudade", e tirou a foto que reproduzimos acima e a que o Pedro muito provavelmente se refere.

Se o Pedro um dia destes nos quiser e puder mandar algumas imagens digitalizadas não só da construção da capelinha como do resto da comissão de serviço do seu pai no CTIG, ficar-lhe-emos gratos. Os filhos dos nossos camaradas nossos filhos são... Bem haja por honrar a memória do seu pai e dos seus homens, nossos camaradas,  da CART 1647. Bom Natal e Melhor Ano Novo de 2023. Luís Graça

3. Ficha de unidade > Batalhão de Artilharia n.º 1904

Identificação:  BArt 1904
Unidade Mob: RAP 2 - Vila Nova de Gaia
Cmdt: TCor Art Fernando da Silva Branco
2º  Cmdt: Maj Art Adolfo Jorge Vilares da Costa
OInfOp/Adj: Cap Art Manuel Henrique Lestro Henriques

Cmdts Comp:
CCS: Cap Art João Gonçalves Vila Chã
Cap Art Artur Olímpio de Sá Nunes
CArt 1646: Cap Mil Art Manuel José Meirinhos
CArt 1647: Cap Art Fernando Manuel Jacob Galriça
CArt 1648: Cap Art Diogo Baptista Coelho | Cap Mil Art José Reis Fernandes Leitão
Divisa: "Firmes e Generosos"
Partida: Embarque em 11Jan67; desembarque em 18Jan67 | Regresso: Embarque em 310ut68

Síntese da Actividade Operacional

Inicialmente, foi colocado em Bissau, rendendo o BCaç 1876 e assumindo as responsabilidades de segurança e defesa dos pontos sensíveis do sector a partir de 23Jan67, com as subunidades que lhe foram atribuídas, com a sede em Bissau e englobando os subsectores de Brá (Bissau), Nhacra e Quinhámel, tendo colaborado intensivamente no recenseamento da maior parte da população suburbana da cidade.

Após ter sido substituído no sector de Bissau pelo BCaç 2834, assumiu, em 18Jan68, a responsabilidade do Sector LI, com sede em Bambadinca e abrangendo os subsectores de Xime, Xitole e Bambadinca e, a partir de 06Mai68, ainda o subsector de Mansambo, então criado, tendo rendido no referido sector o BCaç 1888.

Desenvolveu intensa actividade operacional, orientada para a desarticulação dos grupos inimigos que tentavam fixar-se na zona de acção, para assegurar a ocupação territorial e para promover a autodefesa, segurança e promoção socioeconómica das populações.

Dentre o material capturado mais significativo salienta-se: 1 metralhadora pesada, 4 metralhadoras ligeiras, 6 pistolas-metralhadora e 17 espingardas.

Em 160ut68, foi rendido no sector de Bambadinca pelo BCaç 2852 e recolheu seguidamente a Bissau, a fim de aguardar o embarque de regresso.

* * *

A CArt 1646 foi inicialmente colocada em Bissau, ficando integrada no dispositivo de segurança e protecção das instalações e das populações da área, em substituição da CCaç 799, na dependência do seu batalhão, sendo, de 21Mai67 a 23Jun67, transitoriamente, substituída pela CCaç 1683. 

Após ter cedido temporariamente um pelotão para Bula, em reforço do BCaç 1876, de 01
a 20Abr67, foi atribuída na totalidade em reforço do BCaç 1876, para tomar parte em operações nas regiões de Bipo, Choquemone, Ponta Matar e Pelundo, entre outras, de 21Mai67 a 04Ag067. 

Depois de ter sido substituída no sector de Bissau pela CArt 1742, foi transferida para Fá Mandinga, em 04Ag067, a fim de integrar o dispositivo e manobra do BCaç 1888, com um pelotão destacado em Bambadinca.

Em 14Nov67, por troca com a CCaç 1551, assumiu a responsabilidade do subsector de Xitole, com pelotões destacados em Saltinho e Mansambo, este até 05Mai68, ficando integrada no BCaç 1888 e depois no seu batalhão.

Em 18Set68, foi rendida pela CArt 2413 por troca e voltou a Fá Mandinga em 20Set68, onde se manteve até 060ut68. Em seguida, recolheu a Bissau, a fim de aguardar o embarque de regresso, sendo transitoriamente integrada no dispositivo de segurança e protecção das instalações e das populações da área a cargo do BCaç 1911.

***

A CArt 1647 foi inicialmente colocada no sector de Bissau a fim de colmatar a saída anterior da CCaç 1589 no dispositivo de segurança e protecção das instalações e das populações da área a cargo do BArt 1904.

Em 24Mar67, por troca com a CCaç 1438, iniciou o deslocamento para o subsector de Quinhámel, com destacamentos em Ilondé, Orne, Ponta Vicente da Mata e Ondame, tendo assumido a responsabilidade do referido subsector em 31Mar67.

Em 05Ag067, rendida pela CCaç 1549, foi colocada de novo em Bissau, a fim de substituir a CCaç 1438 no dispositivo do sector e, cumulativamente, desempenhar as funções de subunidade de reserva do CTIG, sendo atribuída a partir de 07Ag067 ao BCaç 1876, para realização de operações na região de Bula.

Em 11, 16 e 20Set67, deslocou-se por fracções para Binar, a fim de render a CCaç 1498, assumindo a responsabi lidade do respectivo subsector em 19Set67 e ficando integrada no dispositivo e manobra do BCaç 1876 e depois do BCav 1915.

Em 130ut68, foi substituída pela CCaç 2404 e recolheu a Bissau, a fim de  aguardar o embarque de regresso e sendo integrada transitoriamente no dispositivo do BCaç 1911, com vista a cooperar na segurança e protecção das instalações e das populações da área.

***

A CArt 1648 ficou colocada em Bissau como subunidade de intervenção e reserva do CTIG, sendo utilizada em diversas operações realizadas na região de Pelundo, Queré, Churobrique e Tiligi, em reforço do BCav 1905 e na região de Bula-Jolmete, em reforço do BCaç 1876.

Em 3IJu167, rendendo a CCaç 1487, assumiu a responsabilidade do subsector de Nhacra, com efectivos destacados em Safim, João Landim, Dugal e ponte de Ensalmá, ficando integrada no dispositivo do BArt 1904.

Depois de ter sido substituída no subsector de Nhacra pela CArt 1614, assumiu, em 13Jan68, a responsabilidade do subsector de Binta, com um pelotão destacado em Guidage, onde rendeu a CCaç 1546 e ficou integrada no dispositivo e manobra do BCaç 1932 e depois do COP 3.

Em 140ut68 foi substituída pela CArt 2412 e recolheu a Bissau a fim de aguardar o embarque de regresso, sendo transitoriamente integrada no dispositivo do BCaç 1911, com vista a cooperar na segurança e protecção das instalações e das populações da área.

Observações - Tem História da Unidade (Caixa n." 80 - 2ªDiv/4ª Sec, do AHM).

Fonte: Excertos de Portugal. Estado-Maior do Exército. Comissão para o Estudo das Campanhas de África, 1961-1974 [CECA] - Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África (1961-1974). 7.º volume: Fichas das Unidades. Tomo II: Guiné. Lisboa: 2002, pp. 212/ 214
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Nota do editor:


(...) Percorridos cerca de 10 quilómetros por uma estrada bem asfaltada e com muitas retas, chegámos a Binar, onde no período de 1973 e 1974, se sediou o aquartelamento da Companhia de Caçadores 17 (CCAÇ 17), constituída por 23 homens do Continente Português (1 Capitão, 4 Alferes, 1 Sargento, 9 furriéis, 5 cabos e 3 praças e mais 144 elementos africanos (5 furriéis, 11 cabos e mais 128 soldados, que comandei, como Capitão Miliciano, durante cerca de oito meses.

Ao chegarmos ao cruzamento da localidade, virámos para norte, para cerca de 500 metros depois, chegarmos ao local onde existiu o antigo aquartelamento, tendo de imediato sentido um arrepio ao ver o local onde estive instalado e em zona onde também existiam habitações da administração e tabancas da população local.

Começando por falar da vedação das nossas antigas instalações, referiria que da mesma, na altura constituída por duas redes de arame farpado paralelas e separadas cerca de uns 15 metros uma da outra, com entrada/saída nos topos norte e sul, nem sinais dela agora existem.

Mal estacionámos no local onde era a parada do antigo aquartelamento, senti logo uma profunda emoção ao ver ainda de pé e em estado de boa conservação, uma antiga capelinha, encostada a um enorme poilão, que continha no seu interior um pequeno oratório, onde estava colocada uma pequena imagem de Nossa Senhora de Fátima, capelinha essa que havia sido construída pela Companhia de Militares Portugueses que nos antecedeu e da qual não me recordo a sua identificação.

Essa capelinha, creio que foi construída como agradecimento a Nossa Senhora pelo facto de quase no topo dessa árvores e bem lá em cima, ainda se poder ver uma granada de RPG, que havia sido disparada por tropas do PAIGC e que lá ficou espetada, sem explodir. (...)


(**) Último poste da série > 18 de julho de 2022 > Guiné 61/74 - P23439: O nosso livro de visitas (216): Areolino Cruz (Bafatá, 1944 - Cubucaré, 1965) foi meu colega de carteira no Colégio Nuno Álvares, em Tomar, nos anos de 1957/58. Guardo dele uma terna recordação (Francisco A. Monteiro e Souza, natural de Cabo Verde, a viver nos Açores, ex-membro da FAP e da TAP)

sexta-feira, 22 de julho de 2022

Guiné 61/74 - P23451: Nota de leitura (1467): "A Minha Vida Militar", por José Costa; edição de autor, 2016 (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 27 de Novembro de 2019:

Queridos amigos,
Encontrei esta edição de autor na Biblioteca da Liga dos Combatentes, e dou novamente comigo a pensar na imensidão de testemunhos que andam por aí dispersos, obras que seguramente são distribuídas nos convívios e nunca passam por livrarias. Tendo-me outorgado a esta missão de referenciar ou repertoriar tudo quanto se tem escrito sobre a Guiné, com destaque para memórias e peças literárias em que os autores são antigos combatentes, volto a apelar a quem possui obras como esta do José dos Santos Costa que tenha a gentileza de me contatar por mail, é a única possibilidade de eu poder ler e fazer a necessária recensão pois estou seguro que um dia virá em que os historiadores e os investigadores da Guiné baterão inapelavelmente à nossa porta, o nosso blogue já é o mais importante acervo fotográfico sobre a guerra, tudo devíamos fazer para corrigirmos o maior número de referências a livros, ensaios e artigos publicados, assim cumpriremos o que há de mais gratificante no dever de memória.

Um abraço do
Mário



Um furriel mecânico em Binar… com muitos mais anos de tropa, que atribulações!

Beja Santos

Trata-se de uma edição de autor, 2016, José António dos Santos Costa, furriel miliciano mecânico auto em Binar, na CCAÇ 17, em rendição individual, tem muito que contar. Este tomarense que aos vinte anos residia no Alto do Piolhinho vai à inspeção, é apurado para todo o serviço militar, a sua profissão era mecânico de automóveis, o Exército aproveitou-lhe as competências e habilidades, marchou para Binar, para uma companhia essencialmente constituída por Balantas. Vem o 25 de Abril, muitíssimo doente, consegue transporte, lá pensava-se que sofria de paludismo, o médico que o vê já em Portugal diagnostica-lhe tuberculose pulmonar. Ele vai contar minuciosamente um pesadelo burocrático que demorará anos até se fazer elementar justiça. É tenaz, não quer só reconhecimento da doença adquirida em serviço, contra ventos e marés vai procurar os arquivos para saber por onde param os militares da CCAÇ 17, tornou-se no dinamizador dos convívios. Uma escrita simples, linear, um testemunho de quem recusa abdicar dos seus direitos e de fomentar a camaradagem daqueles antigos combatentes da Guiné. Dá-nos o elementar da progressão, a recruta, especialidade, torna-se mecânico auto rodas, frequenta Sacavém, onde acaba o estágio e é colocado na Companhia Divisória de Manutenção de Material, no Entroncamento, já estamos em 1972, em junho sabe que foi nomeado para a Guiné, em rendição individual. Escreve que lhe deram uma pasta muito pesada em Binar: viaturas e os seus complementos, ferramentas, oficina auto, combustíveis, grupos de geradores e motobombas. Atribuíram-lhe um morteiro 81 na defesa do aquartelamento, faz-se sempre acompanhar de G3. Mas o mais importante, e que ele exalta, é o mosquiteiro, a melhor coisa que teve enquanto esteve na Guiné. Há quem lhe pergunte se é da família do general Santos Costa, ele fica a saber que havia um general poderoso, e quem procura fidelização com o dito também pergunta como é que ele veio parar à Guiné…

Ele é responsável por que a coluna semanal entre Binar e Bula, e no sentido inverso, corra na perfeição, não podem faltar comida, bebidas, correio, combustíveis, para isso as viaturas precisam de andar. Tudo parecia correr bem, até que no início de novembro de 1972 o PAIGC monta uma emboscada, morrem civis e militares, autêntica chacina, a partir de então não faltou uma Panhard à frente da coluna. Há flagelações à volta de Binar, aqui parece tudo calmo, até que no dia 10 de maio de 1973 veio uma flagelação, não faltaram granadas incendiárias, ardeu a arrecadação com armas, munições e muito material inflamável. E o fogo alastrou-se à oficina auto, tudo desapareceu: ferramentas, lubrificantes, combustíveis, garrafas de oxigénio e acetileno. Sobraram dois alicates que o José Costa trouxe para Tomar, e ainda hoje fazem parte do seu quadro de ferramentas.

Conta muitas histórias, releva a exigência de um aspirante e de um alferes que queriam à viva força ter acesso pessoal a viaturas, acabaram por estampar dois Unimog, o que deu origem a um processo disciplinar. Recorda os camaradas que morreram, acidentes não faltaram. E chegou o 25 de Abril à Guiné, seguiram-se confraternizações com os guerrilheiros. A sua saúde ia piorando, já não reagia à medicação com soro. Sente-se debilitado e só, mete-se numa viatura e vai a Bissau, pede encarecidamente ao major que o deixe partir. Deplora que tenham desaparecido as centenas de cartas que trocou com a namorada, logo sua mulher quando regressou.

Aterra em Lisboa a 15 de agosto de 1974, é-lhe diagnosticada a tuberculose, dá entrada no Hospital Militar no Largo da Boa Hora, onde se tratam as doenças infecto-contagiosas. Fazem-lhe menção de que existe legislação referente às doenças contraídas durante a comissão militar. Faz requerimento ao Chefe de Estado-Maior do Exército, quer ser considerado como um militar evacuado, pretende que a doença seja considerada em serviço, não obtém resposta, continua a fazer tratamento no hospital. Não conformado, consegue, depois de muitos trabalhos, obter as moradas de dois oficiais que conhecera em Binar e Bula, são suas testemunhas, ninguém sabe por anda a documentação da CCAÇ 17. Pede ajuda à Associação dos Deficientes das Forças Armadas. Em maio de 1977 é dado como clinicamente curado e rotulado de “incapaz de todo o serviço e apto para todo o trabalho”. Volta a baixar ao Hospital Militar, nova junta médica, é-lhe dada uma pequena incapacidade. A 17 de julho de 1977 passou à disponibilidade, cumprira cinco anos e trezentos e cinquenta e quatro dias de vida militar.

Atira-se a uma nova tarefa, quer saber por onde pára a malta do seu tempo, bate à porta do Arquivo-Geral do Exército, surgem pistas, recorre à ajuda do filho, então na PT, para ir encontrando a gente da CCAÇ 17. O primeiro convívio realiza-se em Tomar, em 2003, em 2015 terá lugar em Fátima o oitavo convívio. E desabafa: “Há meia dúzia de anos ninguém sabia de ninguém. Hoje todos temos os contatos uns dos outros. Tenho pena que sejamos cada vez menos, uns já faleceram, outros com o avançar da idade não podem ou não querem sair de casa, outros se calhar devido à crise financeira. No primeiro almoço que realizei em Tomar, em 2003, juntámo-nos quarenta dos cinquenta militares então localizados. Hoje, juntamos em média vinte militares e os seus familiares. Costumamos dizer que somos uma família numerosa. Durante alguns anos ainda mantive contato com quatro militares guineenses em Lisboa, o Paulo da Arrecadação, que veio a falecer na Guiné, o Luís Fafe que emigrou para o Reino Unido, o Mengo também já faleceu e o Yala deixou de atender o telemóvel”.

Para tornar a sua história na vida militar o mais credível possível, anexa imensa documentação, desde a cédula do recenseamento militar, às notas, guias de marcha, documentação enviada para vários quarteis, e até a cópia da folha feita em agosto de 1974 com nomes e moradas dos últimos militares da CCAÇ 17. É obra.


O que resta de um memorial aos militares da CCAÇ 17, em Binar, imagem retirada do nosso blogue.
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Nota do editor

Último poste da série de 18 DE JULHO DE 2022 > Guiné 61/74 - P23440: Nota de leitura (1466): "O colonialismo português - novos rumos da historiografia dos PALOP"; Edições Húmus, 2013 (Mário Beja Santos)

sábado, 25 de junho de 2022

Guiné 61/74 - P23384: Memória dos lugares (442): Apenas um mês em Bula e a Mata do Choquemone marcou para sempre a CCaç 4541/72 (Victor Costa, ex-Fur Mil Inf)

1. Mensagem do nosso camarada Victor Costa, ex-Fur Mil At Inf, CCAÇ 4541/72 (Safim, 1974), com data de 2 de Junho de 2022:

Amigos e camaradas da Guiné,
Apenas um mês em Bula e a mata do Choquemone marcou para sempre a CCaç 4541/72.

Chegados à Guiné em 21 de Setembro de 1972, estes "periquitos", numa das suas ações ofensivas no Choquemone e Ponta Matar tiveram o primeiro embate sério com o IN, na mata do Choquemone em 25 de Novembro de 1972 e são obrigados recolher a Bissau, embalar os seus mortos, para os enviar à família e tratar das suas feridas.

Ainda mal refeitos do desfecho desta operação, vão participar na Operação Grande Empresa em 12 de Dezembro de 1972 e posteriormente ocupar Caboxanque, na região de Tombali, onde estiveram mais de 15 meses e durante este período reforçaram ainda as posições de Jemberem, Cadique e Cufar.

Depois de quase 18 meses de Guiné, vão para Safim, onde chegaram em 6 de Março de 1974 e já com o estatuto de "velhos" foi o merecido descanso do guerreiro, mas para alguns durou pouco. O destacamento de Capunga a sul e o destacamento de João Landim a norte foram de seguida ocupados. Em Safim ficaram o Comando, a gestão corrente da Unidade e os restantes militares.

Fui ter com eles a Safim em Março de 1974, passados 15 dias escrevi um aerograma aos meus pais com uma pequena mensagem a dizer que estava na Guiné e bem. Escusado será dizer que nem eles sabiam que tinha sido mobilizado para a Guiné . Apesar de me sentir bem preparado física e psico e manobrar muito bem as armas, constatei que não era o suficiente. Aqui fui encontrar uma Unidade muito segura, disciplinada e eficiente, nas patrulhas pouco se falava e muito menos de noite, cada um sabia exactamente o que fazer e como fazer, o que tornava tudo muito simples.

Sob o comando do Alf. Mil. Pratas fomos ocupar o Destacamento de João Landim norte, constituído por um pequeno "Hotel" cavado debaixo da terra circundado por uma trincheira, com um chuveiro de água ligado a vários bidões de 200 litros, que deixava o cabelo duro como um capacete e um pequeno barraco com uma arca frigorífica a petróleo para bebidas normalmente quentes e dois unimogs, não existia arame farpado, mas também senti que não era necessário. Não havia nada em redor, nem árvores nem população e tudo isto localizado a meia distância entre Bula e o Rio Mansoa.

O abastecimento de água para os gastos gerais do destacamento, provinha de uma pequena fonte localizada nas imediações de uma Bolanha a uns escassos quilómetros da mata do Choquemone. Com um condutor e a Secção de infantaria armada, partimos na direcção de Bula com um auto tanque de 5000 litros atrelado ao unimog. Depois de passar o Quartel, virávamos à direita e íamos por uma picada que nos levava até à fonte e aqui, depois de encher o auto-tanque, regressávamos ao destacamento.

Tinham passado já 18 meses, todos haviam esquecido o nome Choquemone ou parecia. Na verdade os "velhos" pouco falavam disso, mas aquela mata e o dia 25 de Novembro de 1972 estavam bem presentes na sua memória e agora voltar ali a Bula, bem perto da mata foi quase como voltar ao princípio e vieram as recordações.

A minha integração foi muito simples, os problemas deles começam a interessar-me e passam também a ser meus. Fazer baixas ao IN era para mim estar do lado certo da História e bem, os nossos camaradas mortos assim o exigiam, sinto que pertenço a este corpo, o resto era conversa, a Figueira e a Metrópole eram para esquecer, tinham ficado para trás.

As patrulhas e as operações de segurança da travessia do Rio Mansoa, feitas pela secção de infantaria. decorriam sem problemas. Até parecia que a Maria-turra e o PAIGC também se lembravam bem da CCaç 4541/72, sabiam quem eram, de onde vinham e dos "coices de mula" que tinham trocado no Choquemone. Eu sabia apenas das nossas baixas mas não das deles.

Na Cronologia da Guerra Colonial - 1972 - 2/2-por José Brandão estão registados 6 mortos em combate (cinco da CCaç 4541/72 e um paraquedista do BCP 12) todos no dia 25 de Novembro de 1972.

Guardo na memória os lamentos e a revolta do Silva, um soldado experiente, (de 26anos) o de óculos escuros na fotografia à entrada da LDM no Rio Cumbijã, um dos que me relatou a operação na mata do Choquemone em 25 de Novembro de 1972, apenas 2 meses depois da CCaç 4541 chegar à Guiné e recordo também o 1.º Cabo Dantas de G3 na mão no meio da malta, ambos da minha Secção.
Choquemone > Posição relativa a Bula e Binar. Infogravura © Luís Graça & Camaradas da Guiné 

Tratou-se de uma emboscada seguida de outra, com envolvimento, numa mata densa do Choquemone de que resultaram 5 mortos e 12 feridos em combate e entre os feridos o Comandante Sr. Cap. Mil. Inf. Dias Silva, que obrigou à intervenção de 2 Fiat G91, 1 helicanhão e 1 helisocorro para evacuação de feridos, tendo a CCaç 4541/72 na sequência desta operação recolhido a Bissau.

Não sei se a morte do paraquedista das forças do BCP 12 neste mesmo dia, está relacionada com esta operação. Toda esta informação é resumida mas é tudo o que disponho.[1]

Será possivel tornar público o relatório desta operação na mata do Choquemone, comandada pelo Sr. Cap. Dias Silva no dia 25 de Novembro de 1972, ou alguma informação complementar da FAP, BCP 12 ou algum camarada, para conhecer em pormenor o que foi e como terminou esta operação, qual o número de baixas do lado do IN e corrigir algumas informações acima descritas que possam estar incorrectas.

Quero agradecer ao José Guerreiro da CCaç 4541/72 pelas fotografias do Sold. Silva e do 1.º Cabo Dantas aqui publicadas em 07 de Abril de 2013 e 31 de Janeiro de 2013, respectivamente, porque me permitiram recordar as acções e vivências do tempo de aprender com os "velhos", que influenciaram o meu percurso de vida ao longo destes anos. Por tudo isto eles merecem bem a minha homenagem.
1.º Cabo Dantas segurando a sua G3
Soldado Silva junto da LDM

Fotos: © José Guerreiro da CCAÇ 4541/72. Todos os direitos reservados

Junto fotografia da constituição da minha Secção de Infantaria

O meu obrigado e um abraço,
Victor Costa
Ex-Fur. Mil. At. Inf.

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[1] - Notas do editor:

i - O militar paraquedista referido faleceu em combate durante a Op. Urso Vermelho em Cufar-Bedanda pelo que nada tem a ver com a emboscada sofrida pelo pelo pessoal da CCAÇ 4541/72. 

ii - Os militares da CCAÇ 4541/72 mortos na emboscada de 25 de Novembro de 1972, foram:

- 1.º Cabo Radiotelegrafista Fernando da Conceição Fernandes
- Soldado Atirador Germano de Jesus Almeida
- Soldado Atirador José António Ferreira Correia
- Soldado Atirador Manuel Gomes Neto

segunda-feira, 11 de abril de 2022

Guiné 61/74 - P23158: Humor de caserna (46): Histórias pícaras: O Gasparinho - Parte III (António J. Pereira da Costa / Luís Faria / José Afonso / José Borrego): (vi) Picagem automática: as rajadas de G3 em vez da pica; (vii) Mensagem-relâmpago: Quem viu passar as minhas chapas de zinco, levadas pelo tornado? (viii) Informo Vexa que Sexa passou na mecha


Guiné > Zona Leste > Região de Bafatá > Sector de Galomaro > Dulombi > CCAÇ 2700 (1970/72) > Aspecto do edifício do Comando após o tornado de 25 de Abri... de 1971. A maior parte dos militares portugueses não estava famializarizado com as bruscas tempestades tropicais, os tornados, nem muito menos preparado para suportar o calor e a humidade do território... Até à natureza estava contra eles...

Foto (e legenda): Fernando Barata (2007). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Continuamos  a recompilar histórias do (ou atribuídas ao) cap art José Joaquim Vilares Gaspar, o primeiro de três comandantes que teve a CART 3330 (Nhamate e Bula, 1970/72), entretanto promovido a major: ainda  no CTIG, seria 2.º cmdt do BA 7 e  faria uma breve passagem pelo COP 6, em Mansabá, antes de ser evacuado para a Metrópole, alegadamente por problemas psiquiátricos. (Vd. aqui os comentários ao Poste P23156, dos nossos camaradas António J. Pereira da Costa,  Carlos Vinhal e Francisco Baptista,) (*)

No CTIG ficou conhecido pelo "nick name" Gasparinho, sendo um oficial querido entre a sua tropa e até entre aqueles que o conheceram. Apesar de (ou talvez por) as suas "excentricidades". Faleceu por volta de 1977.

O António J. Pereira da Costa comentou (*):

(...) Fui amigo do major Gaspar. Procurarei fazer umas rectificações. Creio que foi em princípios de 1972, que o major Gaspar tomou o comando do COP 6, onde se demorou pouco tempo (talvez um mês). Efectivamente, numa ida a Bissau, ele e outro camarada, terão andado aos tiros à Bandeira, à passagem por Nhacra (?) , após o que foi evacuado para a Metrópole, com problemas psiquiátricos.

Do que sei dele vi que era um frequentador de bares. Porém tinha atenuantes pois andava naquela vida desde a passagem pelo Estado da Índia Portuguesa. Casou lá, com uma senhora indiana (inglesa) de quem se terá divorciado, em poucos anos.

Não esteve prisioneiro, mas a vida correu-lhe mal, por lá. Na Guiné, andaria, pois "destroçado e enojado" e eu acrescento cansado e saturado, sendo um homem inteligente e frontal, a vida que levava era-lhe penosa. Em Bissau na companhia do tal camarada que veio com ele de Mansabá, fez alguns distúrbios.

Conheci-o na EPA (Escola Prática de Artilharia), num curso que frequentámos com diversos camaradas e vi que estava claramente perturbado. As histórias que dele se contam têm (muitas) um fundo de verdade.(...) 

Eis mais um depoimento sobre ele, e mais uma história,  desta feita pelo nosso saudoso Luís Faria  (1948-2013), ex-fur mil inf MA,  CCAÇ 2791, Bula e Teixeira Pinto, 1970/72) (Vd. poste P4657, de 8/7/2009).


Histórias pícaras > Gasparinho
 
(vi) Picagem automática: as rajadas de G3 em vez da pica

(...) Um dia, creio que pelo final da manhã, fomos surpreendidos por disparos de G3 vindos da direcção da estrada de Bissorã e cada vez mais próximos. Ficados à defesa, depara-se-nos uma nuvem de pó cada vez mais próxima, até que avistámos duas viaturas que a antecediam: da primeira, com a pica G3 na mão, apeia-se o Cap Gaspar (Gasparinho) que era por demais falado pelas estórias que dele se contavam e contam (já referenciadas neste Blogue) e que, veio de Nhamate ao nosso burgo, se bem recordo, em missão de cortesia apresentar os cumprimentos de boas-vindas ao Cap Mil Mamede e dar uma de conversa com o pessoal e uns copos à mistura bem bebidos!!

Apesar do pouco tempo em presença, recordo-o como um homem educado e alegre, simpático e bonacheirão, terra-a-terra sem papas na língua e valente, que me pareceu gozar com a guerra e com o sistema, em especial com a hierarquia dominante, (seria curioso ver a resposta que daria ao nosso AB, o Almeida Bruno!!) o quem julgo, contribuía em parte para a estima que a sua rapaziada lhe tinha e demonstrava. 

Podiam dizer que ele funcionava assim por estar bem encostado!? Que fosse? Não me pareceu nada dar-se ares de importante e muito menos egocêntrico, como outros!

Acabada a visita, lá se montaram ele e a sua rapaziada nas viaturas, qual vedeta cinéfila aos olhos do pessoal sorridente que presenciava a sua partida, na esperança de um regresso para breve, mas que não mais aconteceu. Foram na verdade umas horas diferentes e marcantes, pela positiva.

Pena não ter havido muitos como o Gasparinho, que com todos os seus defeitos e virtudes era ao que parece, um raio de sol para a sua Rapaziada e por aquelas terras de sofrimento. Que esteja em Paz! (...)

Luís Faria
 
O José Afonso, ex-fur mil at cav, CCAV 3420 (Bula, 1971/73), a companhia do Salgueiro Maia, já aqui outra variante desta  história: vd. (iii) Reconhecimento pelo fogo, na picada de Nhamate-Binar (**).

A história seguinte também foi aqui contada pelo José Afonso:


(vii) Mensagem-relâmpago: quem viu passar as minhas chapas de zinco, levadas pelo tornado ?


(...) Em Nhamate (, sede da CART 3330, 1970/72), como em toda a Guiné de vez enquanto aconteciam pequenos tornados, anunciando que pouco tempo depois iria chover torrencialmente. 

Uma das vezes voaram as chapas que cobriam algumas casernas do destacamento de Nhamate. 

Então o Capitão Gasparinho envia uma mensagem a todas as Unidades, com grau de urgência relâmpago, nos seguintes termos:
- Solicito e informem se viram passar as minhas chapas de zinco!

(O grau de urgência relâmpago obrigava a cessarem todas as comunicações rádio, pois era normalmente utilizado para pedir evacuações aéreas, quando havia vidas em perigo,) (...)

Há uma outra variante desta história, aqui conta pelo José Francisco Robalo Borrego (Poste P4628 de 2/7/2009);

(...) A certa altura o pessoal do BEng 447 foi colocar chapas de zinco nos telhados das casernas (barracões?) da companhia. 

Passados uns dias um tornado muito forte arrancou as ditas chapas e nunca mais ninguém as viu. O inevitável capitão Gaspar perguntou ao BEng por mensagem mais ou menos nestes termos: "Solicito informe se chapas colocadas nesta em tal data… regressaram à sua Unidade de origem" (...) 

José Borrego

A história seguinte também já foi contada pelo José Afonso:


(viii) Informo Vexa  que Sexa passou na mecha!

(...) Durante o período do Natal, o General Spínola visitava todas ou quase todas as tropas aquarteladas na Guiné, mesmo aquelas estacionadas em sítios mais perigosos. Deslocava-se quase sempre de Heli e um Heli-Canhão de apoio. Nestas deslocações toda a zona onde ele circulava e os sectores envolventes tinham instruções para toda a rede de rádios estar em escuta permanente. 

Como estava prevista a ida a Bula, o Comandante do Batalhão de Bula ordenou que a Companhia do Capitão Gaspar informasse a sede do Batalhão logo que os hélis sobrevoassem Nhamate e se deslocassem para Bula.

Considerando a importância da missão, o Capitão Gaspar achou conveniente ir pessoalmente para o rádio e, assim, logo que ouviu barulho dos hélis a aproximarem-se chamou o comando do Batalhão de Bula ao rádio e informou:
- Informo Vexa (vossa excelência) que Sexa (sua excelência) passou na mecha !!! Terminado.

No dia seguinte todas as unidades do Teatro de Operações da Guiné receberam a seguinte mensagem:
- A partir desta data é expressamente proibido o uso de abreviaturas SEXA e VEXA. (...)



[ Seleção / Revisão / Fixação de textos e títulos, para efeitos de publicação deste poste no blogue: LG ]
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(**) Vd. poste 9 de abril de 2022 > Guiné 61/74 - P23154: Humor de caserna (44): Histórias pícaras: O Gasparinho - Parte I (António J. Pereira da Costa / José Afonso): (i) Siga a marinha; (ii) E viva a Pátria! Viva o nosso General!... Puuum"!; (iii) Reconhecimento pelo fogo, na picada de Nhamate-Binar; (iv) Não há rádios AVP1? Então mandem-me... o Teixeira Pinto!

segunda-feira, 4 de abril de 2022

Guiné 61/74 - P23138: Recordando o Salgueiro Maia, que eu conheci, o meu comandante, bem como os demais bravos da minha CCAV 3420 (Bula, 1971/73) (José Afonso) - Parte I: Um cartão pessoal... para a história: "Sinto-me feliz não só pelo acontecimento, mas por me permitir ter vingado todas as injustiças que nos fizeram na Guiné", disse-me ele, agradecendo um telegrama de felicitações, enviado logo a seguir ao 25 de Abril de 1974




Reprodução de um cartão pessoal, manuscrito, de Salgueiro Maia, ex-comandante da CCav 3420 (Bula, Mansoa, Pete, Farim, Binta, Bissau, 1971/73, 1971/73), agradecendo ao José Afonso, seu ex-fur mil, do 3º Gr Comb, o telegrama que este lhe enviara, felicitando-o pela sua participação no golpe militar do 25 de Abril de 1974 e pelo sucesso do movimento dos capitães... Documento s/d, mas próximo do 25 de Abril de 1974, talvez maio de 1974.(*)

Salgueiro Maia voltara, entretanto, à unidade de origem, a  EPC - Escola Prática de Cavalaria, em Santarém. Repare-se que ele ainda utilizou papel da sua ex-companhia, tendo por timbre, cortado por um traço, o brasão da CCAV 3420, "Os Progressistas", sediada em Bula, SPM 1898.

O nosso camarada José Afonso, ou José Baptista Afonso, por sua vez,  é bancário, reformado da CGD, dividindo, em 2009, o seu tempo entre Castelo Branco, de donde é natural, e o Fundão, onde trabalhou e tinha residência.. Não temos notícias suas desde esse ano. Nasceu em 1949, e deixou de ter o endereço de email que tinha. Não temos o seu nº de telemóvel.


Teor do cartão, sem data:

 [ Ao canto superior esquerdo, Brasão  da CCAV 3420, Os Progressistas, SPM  1898 (Particular)]:

"Caro amigo: Só agora tenho tempo de agdecer o agradável telegrama. Sinto-me feliz não só pelo acontecimento, mas por me permitir ter vingado todas as injustiças que nos fizeram na Guiné. Do pessoal da Comp[anhia] guardo as melhores recordações mesmo depois de fazer o balanço dos maus bocados. Um dia que nos encontremos poderemos esclarecer muitas situações.

"Há pouco esteve aqui o ex-fur[riel] Gomes. O 1º [sargento] Beliz mandou vir e foi  expulso do curso para oficial mas deve agora [depois do 25 de Abril] ser readmitido. O 1º Pascoal continua aqui [na EPC, Santarém] como dantes.

"Sem mais, um abraço do amigo ao dispor. (Ilegível)"


 [A foto acima é, de  há muito,  um ícone,  foi tirada pelo grande fotógrafo português Alfredo Cunha, no 25 de Abril de 1974: é apenas um detalhe da foto original. Cortesia de Wikipedia.] 

Foto (e legenda): © José Afonso (2009). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Guião da CCAV 3420 (Bula, 1971/74). 
Coleção de Carlos Coutinho, com a devida vénia


1. O capitão Salgueiro Maia, de seu nome completo Fernando José Salgueiro Maia (Castelo de Vide, 1 de julho de 1944 - Santarém, 3 de abril de 1992), ficará na história de Portugal como um dos nossos heróis do séc. XX.

Passado quase meio século depois do 25 de Abril de 1974, e trinta depois da morte do mais famoso capitão de Abril, parece haver hoje um amplo consenso na sociedade portuguesa sobre o seu lugar na história da nossa Pátria. 

O homem que comandou a coluna de cavalaria que veio de Santarém, cercou os ministérios do Terreiro do Paço e levou Marcelo Caetano a render-se no quartel do Carmo, sede da GNR, é um exemplo das melhores virtudes pátrias que pode ter uma militar: coragem (física e moral), serenidade, bom senso, liderança, abnegação, honestidade intelectual, coerência, amor à república, amor à Pátria...

Mas não nos compete, a nós, blogue, escrever aqui "hagiografias" (Nem biografias, não somos historiadores.) Para nós, foi um dos nossos camaradas na Guiné (regressado em outubro de 1973), e isso basta, não nos podendo todavia esquecer, muito menos ignorar ou escamotear, que ele se irá distinguir depois pelo seu papel, decisivo, nobre, orajoso e impoluto, no 25 de Abril de 1974. 

Morreu, precocemente, aos 47 anos, vítima de cancro. Quiçá amargurado, pelas injustiças de foi vítima, sobretudo por parte do poder instituído, não apenas militar como político.




José Baptista Afonso, ex-fur mil at cav, 3º Gr Comb,
CCAV 3420 (1971/73). Natural de Freixail de Cima, Castelo Branco,
tem casa também no Fundão onde trabalhou, 
e conhecia o nosso saudoso Torcato Mendonça.


2. Vamos, por estes dias, recordar a  ação do cap Salgueiro Maia, nomeadamente na Guiné, enquanto comandante da CCav 3420 (Bula, Mansoa, Pete, Farim, Binta, Bissau, 1971/73, 1971/73). E sobretudo a partir dos testemunhos de quem o conheceu no CTIG. 

Infelizmente só temos um representante da CCAC 3420 na Tabanca Grande: o nosso camarada José Afonso (fotos acima), de resto um excelente contador de histórias.

E começamos justamente pela reprodução de um cartão pessoal, escrito pelo Salgueiro Maia, já depois do 25 de Abril de 1974, talvez em Maio, enviado ao José Afonso que o havia felicitado  pela acção na Revolução dos Cravos (documento acima reproduzido).

Nas neste primeiro poste de homenagem a este homem da nossa geração e nosso camarada da Guiné, de que muito nos orgulhamos,  é bom sabermos algo mais sobre a CCAV 3420 que ele comandou. 

Depois iremos repescar algumas das histórias do José Afonso sobre o Salgueiro Maia e outros bravos da CCAV 3420, esperando, por outro lado, que ele, José Afonso,  volte a dar notícias,  o que não acontece há muitos anos (desde, pelo menos, 2009).

PS - Já pusemos as notícias em dia, e tenho o atual endereço de email, além de "carta branca" para republicar as suas histórias do Salgueiro Maia e dos demais bravos da CCAV 3420.


Ficha de unidade > Companhia de Cavalaria n.º 3420

Identificação:  CCav 3420

Unidade Mob: RC 4 - Santa Margarida

Cmdt: Cap Cav Fernando José Salgueiro Maia

Divisa: "Progressistas" - "Perguntai ao Inimigo Quem Somos"

Partida: Embarque em 04Jul71; desembarque em 09Jul71 | Regresso: Embarque em 030ut73


Síntese da Actividade Operacional

Após realização da IAO, de 12Jul71 a 06Ag071, no CMI, em Cumeré, seguiu em 11Ag071 para Bula, a fim de efectuar o treino operacional e render a CCav 2639.

Em 29Ag071, iniciou a actividade de intervenção e reserva do BCaç 2928, substituindo a CCav 2639 a partir de 20Set71, e actuando nas regiões de Choquemone, Cuboi, Ponta Matar-Ponate e outras, bem como nas acções de contrapenetração e na segurança e protecção dos trabalhos da estrada Bula-Binar,

De 05Mai72 a 08Jul72, foi deslocada para Mansoa, em reforço do BCav 3852, com a missão principal de garantir a segurança e protecção dos trabalhos da estrada Mansoa-Namedão-Bissorã, recolhendo a Bula quando os trabalhos atingiram Namedão e voltando à dependência do BCaç 2928 e depois do BCav 8320/72.

Em 09Jul72, rendendo a CCaç 2789, assumiu a responsabilidade do subsector de Pete, com destacamentos em Ponta Consolação e Capunga, com vista à execução e controlo dos trabalhos de construção, dos respectivos reordenamentos e promoção socioeconómica das populações. 

Em 07Dez72, assumiu, em acumulação, por saída do CCaç 3328 e extinção do subsector de Ponta Augusto Barros, a responsabilidade daquela zona de acção, mantendo a sede em Pete e guarnecendo então os destacamentos de João Landim, Capunga e Mato Dingal.

Em 23Mai73, foi substituída nos reordenamentos pela 1ª Comp/BCav 8320/72 e seguiu, em 25Mai73, para Farim e depois para Binta, a fim de reforçar as forças do COP 3 empenhadas no início dos trabalhos da reabertura do itinerário Binta-Guidage; em 29Jun73, foi rendida nesta missão pela CCav 3568, recolhendo então a Bissau.

Em 30Jun73, substituiu no sector de Brá a CArt 3521, ficando integrada no dispositivo e manobra do COMBIS, a fim de garantir a segurança e protecção das instalações e das populações da área.

Em 30Set73, foi substituída no subsector de Brá pela CCaç 3476, a fim de aguardar o embarque de regresso.

Observações - Tem História da Unidade (Caixa n." 99 - 2ª Div/4ª  Sec, do AHM).

Fonte: Excertos de: CECA - Comissão para Estudo das Campanhas de África: Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África (1961-1974) : 7.º Volume - Fichas das Unidades: Tomo II - Guiné - 1.ª edição, Lisboa, Estado Maior do Exército, 2002, pp. 515/516
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Nota do editor: