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quinta-feira, 22 de abril de 2010

Guiné 63/74 - P6213: O 6º aniversário do nosso blogue (13): A nossa blogoterapia, objecto de artigo da revista Visão, edição de hoje


Na edição de hoje, 23 de Abril de 2010, da revista Visão, o jornalista João Dias Miguel assina um artigo que ocupa 3/4 partes da página 78, sob a rúbrica Visão > Sociedade. O artigo é ilustrado por uma foto de Nuno Fox (acima reproduzida, com a devida vénia).

O texto começa com uma citação minha, resultado de uma longa entrevista com o jornalista: "Somos uma espécie de grupo de auto-ajuda. Costumamos falar em 'blogoterapia da guerra em África' "... E é depois referida sucintamente a  história do nosso blogue, apontado como "presta(ndo), seguramente, um serviço público, ao dar espaço a um assunto tabu - a Guerra Colonial - que estava 'enterrado debaixo de uma pedra' e que continua a fazer sofrer, em silêncio, muitos portugueses".

Destacado a amarelo, lê-se: "O blogue, onde todos se tratam por tu e não existem hierarquias militares, tem como lema a frase 'Não deixes que sejam os outros a contar a tua história por ti' e ali se faz todos os dias a petite histoire - o relato, na primeira pessoa, das experiências que cada um viveu na Guiné-Bissau".

E continua o jornalista:

"Há um efeito terapêutico", diz o fundador. "Muita gente que vivia isolada, sozinha com os seus fantasmas e memórias, sem ligações, sem suporte social, passou a conviver e a verbalizar as suas recordações, passou a registar isso no papel. E nós publicamos".

São citadas algumas histórias que tiveram impacto no público leitor. É ainda referido que o blogue tem mais de 400 membros inscritos, duas mil visitas por dia, que é lido dos EUA à Austrália, que apoia diversas iniciativas humanitárias na Guiné-Bissau e que tem sido fonte de alimentação de livros e autores. "E dali já saíram ideias para livros como, por exemplo, Estórias Cabralianas, pequenos contos sobre o absurdo do dia-a-dia da guerra" (numa referência ao livro do Jorge Cabral, que deve ser publicado este ano).

A foto, algo insólita, em que eu apareço com o título do livro do Amadu Djaló (Guineense, Comando, Português), projectado no rosto, foi tirada numa sala de aulas, com recurso ao projector e à ligação à Internet.

O nosso blogue faz amanhã 6 anos (*).
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Nota de L.G.:

(*) Vd. último poste da série < 22 de Abril de 2010 > Guiné 63/74 - P6212: O 6º aniversário do nosso blogue (12): Cem pesos ? Manga de patacão, pessoal! ( Luís Graça / Humberto Reis / A. Marques Lopes / Afonso Sousa / Jorge Santos / Luís Carvalhido / Sousa de Castro)



sexta-feira, 6 de março de 2009

Guiné 63/74 - P3991: (Ex)citações (19): Não quis antingir, nem ao de leve,a dignidade dos antigos combatentes (Luis A. Martins, Visão nº 835, 5/3/09)


O Luís Almeida Martins, jornalista da Visão, é um "rapaz da nossa idade" e, pelas palavras que escreveu no última edição do seu semanário (e que eu antecipo aqui, para apreciação dos nossos camaradas e amigos) merece mais do que o benefício da dúvida... Como eu costumo dizer, citando um velho provérbio do nosso povo (que não é estúpido), "os homens conhecem-se pelas palavras, e os bois pelos cornos"... (LG)
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"CORREIO DO LEITOR > Rectificação:

"Numerosos leitores, antigos combatentes da Guerra Colonial, escreveram-nos manifestando grande indignação por algumas frases do artigo 'Portugal e o passado' , sobre o livro do General Spínola (V833), em que tentei transmitir às gerações jovens os horrores de um conflito infelizmente hoje quase esquecido pelo poder político mas verdadeiramente marcante dos meados do nosso século XX - e em que só não participei por mero acaso, já que pertenço à geração que o fez.

"É claro que nunca foi minha intenção atingir [nem] ao de leve a dignidade dos antigos combatentes (afinal praticamente todos os jovens do sexo masculino da década de 60 e princípios da de 70), que, abandonados pelo poder político, guardam recordações gratas desse tempo marcado pelo sacrifício, a generosidade, a camaradagem e, retrospectivamente, a saudade.

"Mas se algum deles se considera ainda beliscado foi porque eu não soube transmitir o pretendido, e por essa inépcia peço, obviamente, desculpa".


Assinado: Luís Almeida Martins

(Visão, nº 835, 5 a 11 de Março de 2009, p. 10).

http://www.visao.pt/

terça-feira, 3 de março de 2009

Guiné 63/74 - P3975: Sr. jornalista da Visão, nós todos somos combatentes, não assassinos (12): José Teixeira, ex-1.º Cabo Enf da CCAÇ 2381

1. Mensagem de José Teixeira(*), ex-1.º Cabo Enfermeiro da CCAÇ 2381, Buba, Quebo, Mampatá e Empada, 1968/70, com data de 26 de Fevereiro de 2009:

Camaradas amigos
Junto mais um texto, escrito com o coração nas mãos, a sangrar de revolta. Chamem-me tudo, menos assassino e . . . já que procuram esquecer-me como filho da Pátria a quem dei o melhor da minha vida - a minha juventude, ao menos respeitem a minha velhice e deixem-me acabar os dias que Deus me vai conceder em paz e sossego.

Mando também uma foto minha mais actualizada, pois a idade não perdoa.

Um fraterno abraço para todos os camaradas

José Teixeira


Aquele abraço grande Vasco

A tua revolta é a minha revolta(**). É a revolta de todos nós. Todos aqueles que sofreram na carne e no espírito, uma guerra que na sua grande maioria, se não todos, não queriam fazer. O sangue que eu vi derramar, de brancos e africanos guineenses. Os mortos, cuja vida vi fugir, como enfermeiro feito às três pancadas em quatro meses, sem soluções, no meio da mesma selva por onde andaste uns anos depois.

Os gritos de dor dos que ficaram feridos e estropiados. As lágrimas que vi escorrer pelas faces dos homens meus camaradas e de mim mesmo pelo desespero de não os conseguir "safar". As lágrimas das mães que temiam pela vida das suas crianças. Ah aquela mãe em Buba que viu a sua bebé morrer carbonizada! A angústia sentida nas picadas de Buba, nas picadas de Gandembel, nas picadas de Mampatá e Chamarra, pelo perigo de emboscadas, muito bem montadas por um adversário que nos gritava:

- Tuga, vai para a tua terra - e nos deixava mensagens do mesmo teor. O acordar sobressaltado altas horas da noite, pelo despertar prematuro provocado pela a primeira “saída” dos canhões do inimigo, nas suas investidas nocturnas sobre o Tuga a convidá-lo a partir e deixar a Guiné em paz. Um pequeno atraso, foi fatal para o meu amigo Conceição Caixeiro. Quantas corridas para a vala, salva vidas, ou abrigo, de dia ou de noite para aguentar, enquanto os camaradas da frente se batiam com garra e destemor pela sua vida, a vida das populações que carinhosamente nos recebiam e a de todos nós. Os buracos onde tive de viver para tentar salvar a pele.




Não consigo apagar estas cenas vividas e sentidas da minha memória, apesar das grandes alegrias vividas nos meus regressos recentes àquelas martirizadas terras, com a recepção das pessoas que passados quarenta anos me reconheceram, me chamaram pelo nome e se penduraram no meu pescoço para extravasarmos a alegria de um retorno em paz.



O abraço a antigos inimigos que se bateram comigo, do outro lado da barreira em situações algumas delas localizadas na data e no terreno, para como que a pedir desculpa, pedir o tal abraço e chamar “tu ermom de mim”. Sentir mágoa e dor nas suas palavras quando, um deles me pergunta se passei o campo de minas onde morreram seis camaradas da CCaç 2317 entre Chamarra e Ponte Balana (foram cerca de setenta) e depois me diz:
- Eu era sapador e fui um dos que as montei





Senti sim uma grande paz interior, porque estas reacções espontâneas que ainda hoje fazem eco na minha vida e se repetem nos telefonemas que continuo a receber (ainda na semana passada a minha "lavandera" me telefonou para saber se eu estava bem e partir mantanhas.



Não aceito. Não posso aceitar que alguém tente passar uma esponja por tudo isto que eu, tu, nós, e, tantos foram, vivemos, forçados por um sistema político ultrapassado na época, através de escritos estropiados da verdade dos factos, ou mesmo inventados por máquinas informativas que não pretendem senão calar-nos e provocar nas gerações vindouras, uma visão errada das estóicas realidades vividas, por todos nós.



Obrigado Luís e tantos outros camaradas que ousaram criar condições para podermos falar, escrever, passar à história a verdade dos factos. A verdade de quem sentiu e viveu.

Não podemos calar. Temos de gritar bem alto o que sentimos e demonstrar a esses atrasados mentais, os que não são capazes ou não querem ver e os que se servem da pena para escrever baboseiras, que a realidade foi outra, a nossa, a que nós vivemos e sentimos. As lágrimas, o suor e o sangue que lá deixamos e . . . mostrar também os seus frutos. A vontade cada vez maior e em mais quantidade de voltarmos, agora voluntários, para rever, reviver e alimentar as amizades que lá deixamos, na população. E não vamos de arma na mão bolsos vazios e coração a sofrer, como da primeira vez. Procuramos levar-lhes para além do carinho e amizade, um pouco de nós mesmos. Os contentores vão cheios com um pouco de cada um de nós, dos nossos amigos, para lá ficar e resolver situações de vida e de miséria, numa terra inóspita e agreste que pouco dá aos seus habitantes e que os sistemas políticos portugueses de outrora, pouco se preocuparam em dar às suas populações as condições de cultura que lhes permitisse tirar o melhor rendimento. O importante era “sacar” a pouca riqueza pela exploração de mão de obra barata.

Vasco, Vascos, Zés Maneis, Joaquins... aquele abraço.
Zé Teixeira
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Nota de CV:

(*) Vd. poste de 25 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3791: Estórias do Zé Teixeira (34): O El Gonzalez (José Teixeira)

(**) Vd. poste de 26 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3939: Sr. jornalista da Visão, nós todos fomos combatentes, não assassinos (1): Vasco da Gama, ex-Cap Mil, CCAV 8351, Cumbijã, 1972/74

Vd. último poste da série de 3 de Março > Guiné 63/74 - P3969: Sr. Jornalista da Visão, nós todos fomos combatentes, não assassinos (11): Jorge Picado, Manuel Reis, Luís Dias

Guiné 63/74 - P3969: Sr. Jornalista da Visão, nós todos fomos combatentes, não assassinos (11): Jorge Picado, Manuel Reis, Luís Dias

1. Na impossibilidade de, por razões práticas, técnicas ou editoriais, de publicar todas as mensagens e comentários (e foram largas dezenas), suscitados pelo artigo da Visão (nº 833, de 19-25 de Fevereiro de 2009, "Portugal e o passado"), aqui ficam as posições de mais três camaradas nossos. Os editores do blogue reservam-se o direito de responder ao jornalista Luís Almeida Martins, depois da saída da próxima edição da Visão, 5ª feira, dia 5. ( Bold do editor LG).


(i) Jorge Picado, ex-Capitão Miliciano (engenheiro agrónomo, na vida civil, reformado, Aveiro): CCAÇ 2589/BCAÇ 2885, Mansoa, CART 2732, Mansabá e CAOP 1, Teixeira Pinto (1970/72)

Caros Camaradas, embora retardado, ao ler o que um aprendiz de escrevinhador teve o desplante de dar à estampa, também me sinto ofendido.

"Perdoai-lhe Senhor que não sabe o que diz" é o que me vem á memória da minha educação de criança.

Mas isto é tudo fruto de quem nos tem governado, que não há maneira de tornarem obrigatório o ensino nas Escolas do nosso passado recente. Perdem-se com coisas de somenos importância... e depois dá nisto. Mas nós, que fomos combatentes, talvez tenhamos alguma culpa. Falo por mim, que vejo agora os meus netos, ignorantes destes assuntos, ficarem admirados por me verem tão empenhado nas leituras da Nossa Tabanca. E lá vou, a pouco e pouco contando alguma coisa.

O célebre parágrafo é verdadeiramente ultrajante, para não dizer "assassino", para qualquer interveniente na Guerra Colonial. Fomos todos ofendidos. Os "paisanos" e os "profissionais". Por isso, na minha santa ingenuidade, aguardo resposta adequada do Chefe Supremo das Forças Armadas.

Dum insignificante "paisano" que, pelo menos, se fartou de efectuar ralis numa bela pista alcatroada MANSOA-MANSABÁ e que se tivesse tido um azar...teria morrido de acidente de viação!

Um abração do tamanho de Portugal à Guiné, para todos os combatentes.


(ii) Manuel Reis, Aveiro, ex-Alf Mil, CCav 8350 (1972/74)
(Conheceu o inferno de Guileje e Gadamael)

Isto não me surpreende, vem de encontro à marginalização a que somos lançados pelos sucessivos Governos. Consideram-nos um pesado fardo!

Compete-nos defender este espaço de liberdade, onde podemos fazer ouvir a nossa voz e mostrarmos a nossa força.

A melhor resposta a estas situações é fazer como os nossos camaradas, que partiram para a Guiné para levar ajuda e uma palavra amiga aos nossos irmãos e amigos.

O meu aplauso à atitude do Vasco da Gama.

Um abraço amigo, Manuel Reis

(iii) Luís Dias, Lisboa, ex-Alf Mil da CCAÇ 3491/BCAÇ 3872, Dulombi e Galomaro, 1971/74

Caros Companheiros da Grande Tabanca

Como disse Jesus ao ser pregado na cruz, eu digo perdoai-lhes Senhor, porque eles não sabem o que fazem (o que dizem, o que escrevem) e perdoai-lhes, porque eu não! Não, porque já não tenho idade e paciência para certos senhores da nossa praça que escrevem e falam do que não sabem, do que não viram, do que não viveram, do que sentiram os que por lá tiveram de combater.

Num parágrafo resume-se quase 13 anos de guerra e 8 mil e tal mortos.

Nós não queremos ser heróis, mas alguns julgam-se importantes, de certeza unicamente em firmamento próprio, porque alguém lhes dá espaço, reserva, para omitirem as opiniões, mesmo que lamentavelmente erradas. Não só pelos mortos, não só pelos estropiados e feridos no corpo e na alma, mas também por todos que fizeram a guerra, voltaram e têm contribuído de forma decisiva para que este país se tenha levantado.

Pelos milhares de combatentes vivos é tempo de se exigir CORRECÇÃO e VERDADE, por aqueles que se sacrificaram, que deram o melhor tempo das suas vidas - mesmo não querendo - pela Pátria.

Basta de ilusionistas, de encantadores com balões coloridos, de escribas opinadores do que não sabem. Quem não sente não é filho de boa gente! É o que diz o ditado - a voz populi. Mesmo que a Dignidade dos Combatentes não lhes convenha, esta, juntamente com a Verdade é como a Justiça, não se pede, exige-se!

Um abraço a todos aqueles que ainda têm a postura cervical direita e sabem honrar a memória e o espírito de todos aqueles que, mesmo em condições extremamente difíceis, souberam manter um elevado espírito de moral combatente e dignificar o ser soldado português.

Luís Dias
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Nota de L.G.:

(*) Vd. último poste da série > 2 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P3957: Sr. jornalista da Visão, nós todos fomos combatentes, não assassinos (10): José Brás, autor de "Vindimas no Capim" (1986)

segunda-feira, 2 de março de 2009

Guiné 63/74 - P3957: Sr. jornalista da Visão, nós todos fomos combatentes, não assassinos (10): José Brás, autor de "Vindimas no Capim" (1986)

1. Mensagem, de 25 de Fevereiro último, de José Brás, ex-Fur Mil da CCAÇ 1622, Aldeia Formosa e Mejo, 1966/68, autor do romance "Vindimas no Capim", que lhe valeu o Prémio de Revelação de Ficção de 1986, da Associação Portuguesa de Escritores e do Instituto Português do Livro e da Leitura.


1.1. Luís: Completa e profundamente contigo, com Vasco da Gama que não conheço senão do (muito bem) que escreve e dos lugares por onde andámos os dois, eu em 67/68, ele mais tarde (Aldeia, Mampatá, Colibuía, Cumbijã, 72/74).

Acabo de enviar isto à Visão sabendo, embora, que irá para o caixote do lixo, não apenas porque tem mais de 60 palavras (poucas palavras para a indignação). Queimei as mãos nos canos das G3 que disparava, sabendo que as balas matam mas não me sentia nem sinto um assassino nem sequer má pessoa.

Também não admito que nos ofenda, embora possa ter atenuantes o que nem sabe do que fala.

Um abraço, José Brás.

1.2. Senhor Luís Almeida Martins (*)
Revista VISÃO
visao@edimpresa.pt

Deixe citar-lhe uma velha canção do excelente brasileiro Raul Seixas:

“quem sabe sabe/quem não sabe sobra/cobra caminha sem ter direcção/que sabe a cabra das barbas do bode/a ave avoa sem ser avião”

E quem é que sobra aqui, senhor Almeida Martins? Quem é que sabe do combate que havia e não havia; dos acidentes que também vitimavam; das minas que matavam e salvavam (não acredita que também salvavam?).

Que “não se tratava de uma guerra de frentes”, diz você e com isso descobriu a pólvora, quarenta anos depois de milhares de jovens portugueses e guineenses (neste caso) lhe terem descoberto o calor da reacção química e o cheiro que ficava no ar, nas entranhas e nos membros decepados.

Na verdade o que a mim parece que o que você quer dizer é que era uma “guerrazeca” onde mais se morria de acidentes de viação do que do combate, e, às vezes numa mina ou outra, numa azelhice de comandante ou de soldado, que (de novo neste caso), que o IN (meus irmãos do PAIGC) eram uns pobres subdesenvolvidos sem arte nem engenho para “guerras a sério” e escassos de material.

Ora, amigo!

Voltaria eu à questão da cabra e do bode, se não soubesse que a vida está também muito difícil para jornalistas, enredados na falta de emprego, nos contratos a prazo e recibos verdes, nos interesses dos proprietários dos órgãos de Comunicação, na “política do chefe de redacção”, etc.

No entanto, não posso aceitar que se escreva à toa para milhares de pessoas e sobre um assunto complexo e pesado da sociedade portuguesa, beliscando (e não sei se foi isso que quis ou apenas lhe saiu como podia sair o contrário) a gente que sofridamente cumpriu aquilo que aceitou ser seu dever, uns apenas porque lhe diziam que a Pátria estava a ser atacada e, se estava, por ela dava a vida, outros já num estágio cultural e de consciência mais avançados mas amando a sua terra e os seus compatriotas e não se esquivavam ao combate.

Foi de guerrilha, sim senhor, como no Vietname e no Afeganistão, salvaguardando evidentes diferenças e protagonistas.

Sabe o que é uma guerra destas, sabe? Não sabe porque nem lá esteve nem a estudou como devia. Apenas descobriu a pólvora.

Eu estive e conheci verdadeiros heróis. Uns a quem não aprovava a bravura (mas que o eram), outros que apenas cumpriam um dever que era o de combater, sabendo que num combate destes sempre se mata e morre um pouco.

Uma guerra de frentes?

Sabe ou imagina a você o que foi a ocupação de Gadamael?

Sabe você o que é ter de aguentar dias e dias, semanas, meses, dentro de valas, aguentar a investida de centenas de guerrilheiros determinados e bem armados?

Sabe o que era ter de fazer a estrada Gadamae-Guileje-Gadamael, cerca de quinze quilómetros de emboscadas e minas (as tais minas), numa mata onde os pilotos da FA nos diziam “tá bem, vou despejar ali, mas não vejo ninguém”?

Conheceu o Banharia, homem do Porto que disparava a MG em corrida e gritando “sanguinho e molho” a proteger o Alf Ávila que, desarmado carregava companheiros, um em cada braço, retirando os seus corpos da zona de morte?

Não os conhece porque nunca os viu chorar os amigos mortos e, penso eu, a própria violência da trama em que tinham de agir.

Portanto, amigo (outra vez), estude um pouco a coisa, pergunte sem complexos e…escreva uma coisa séria.

Porque eu sei que daqui a cinquenta anos alguém ainda escreverá sobre o tema, uns como você, a esmo e apenas porque tem de manter o emprego, outros estudando, lendo…trabalhando e, nisto, talvez sofrendo as tristezas e as alegrias dos que o viveram no tempo e no lugar.

Confesso que não me agrada o que lhe digo aqui, imaginando que o estou a dizer a um dessas centenas de jovens que saem das Universidades com necessidade de trabalho e pouco conhecimento da vida, quer dizer, mal preparados culturalmente.
As minhas desculpas, então.

José Brás

Nota - Sei que nem lerão esta prosa, quanto mais considerá-la para publicação. Ainda assim aqui fica, provavelmente para outras serventias, porque a indignação é um direito que quero guardar.
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Nota de L.G.:

(*) Vd. último poste da série > 1 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P3956: Sr. jornalista da Visão, nós todos fomos combatentes, não assasinos (9): João Melo e Carlos Machado, Tigres do Cumbijã

sábado, 28 de fevereiro de 2009

Guiné 63/74 - P3951: Sr. jornalista da Visão, nós todos fomos combatentes, não assassinos (8): Diana Andringa, jornalista e cineasta

1. Mensagem, com data de 25 do corrente, da Diana Andringa, que é uma das ainda relativamente poucas mulheres que é membro da nossa Tabanca Grande, jornalista, cineasta, realizadora (com o guineense Flora Gomes) do filme documentário As Duas Faces da Guerra (Portugal, 2007), disponível de resto em duas partes no sitío da Guerra Colonial, da A25A, em versão da RTP:

1970-01-20 • As Duas Faces da Guerra - Parte 1
1970-02-20 • As Duas Faces da Guerra - Parte 2


Luís,

Não irá sendo altura de deitares um pouco de água na fervura que vai pelo vosso blogue em relação aos jornalistas? Sabendo como é doloroso o tema em causa, parece-me que estão a ferver em pouca água.

Como bem sabes, a imagem que passarão aos vossos filhos e netos será a que quiserem que seja. A Comunicação Social não altera o conhecimento directo que cada um tem da realidade. O mais natural é que a imagem que passem seja “O meu pai (o meu avô), na juventude, teve de participar (ou participou) na guerra travada nas antigas colónia portuguesas. Foi para a guerra por que acreditava que ia defender a Pátria (ou por que foi obrigado, ou por que não teve outra hipótese). Aquilo foi muito duro! Com vinte anos corriam o risco de morrer, viam morrer camaradas, às vezes matavam outras pessoas... Quero crer que não cometeu nenhum crime de guerra, mas, às vezes, confrontada com o perigo, ou com a dor da morte de um amigo, uma pessoa faz coisas de que mais tarde se arrepende... E, afinal, o país veio depois a concluir que a guerra não tinha razão de ser, que Portugal devia ter dado a independência às colónias quando os outros deram. E se calhar, eles, os soldados, foram os que mais se alegraram com o 25 de Abril. Aliás, agora, ele até tem amigos entre os que combateu. Temos sorte, nós, em não termos um governo a mandar-nos para a guerra.”

Esta é, aliás, creio, a imagem que fazem dos combatentes a maioria dos jornalistas. Mas isso não os pode impedir de, ao falarem da guerra, referir os crimes de guerra que foram cometidos (e foram) e condenar a política seguida por Salazar e Caetano. Não o fazem, no entanto, com o intuito de ofender os combatentes. Quando criticas o facto de a caravana humanitária ter sido pouco referida nos jornais também não estás a querer atacar os jornalistas, pois não?

Quanto ao vosso sofrimento – tão referido sempre em contraponto aos trabalhos jornalísticos – é óbvio que nenhum jornalista o conta como cada um de vós gostaria de contá-lo. Seja qual for o tema sobre que se escreva, haverá sempre alguém a dizer que “não foi exactamente assim”. É por isso que o vosso blogue é tão importante.

Não tendo nenhuma procuração para falar por outros jornalistas, não posso também deixar de lembrar que já houve reportagens sobre algumas dessas viagens de antigos combatentes à Guiné. (Pessoalmente, como sabem alguns bloguistas, só por problemas de produção não acompanhei a ida de um desses grupos.) E que perguntar ao Joaquim Furtado se fez a guerra, num debate sobre a série A Guerra, é um pouco como pretender que, para escrever sobre o cancro, tem de se ter tido um, ou que não se pode escrever sobre o abandono escolar se se completou um curso universitário.

Abraço, Diana

PS - O Almeida Martins é um bom jornalista, um profissional sério – e foi, parece-me, mal interpretado.Também senti como injustas algumas das críticas quando As 2 Faces da Guerra passou na RTP. Entendi que não devia alimentar discussões. Mas agora não sei se fiz bem. (...) .

2. Comentário de L.G.:

Cara amiga: Agradeço as tuas palavras e o teu apelo à serenidade. Já recebi também o comentário do jornalista em questão, Luís Almeida Martins, um homem de resto da nossa geração e da geração do Afonso Praça (um antigo combatente, em Angola, que eu conheci e estimei, como jornalista de O Jornal). Irei publicar a resposta do Luís Almeida Martins no fim de semana, com um comentário (final) meu.

Não seria saudável prolongarmos este clima de tensão no blogue. Não creio, aliás, que o nosso blogue tenha vocação para provocar e alimentar polémicas. O nosso blogue é uma estrada, aonde afluem viajantes de diferentes tempos e lugares. É um caminho, plural, feito de muitas picadas, trilhos de floresta, rios e braços de mar. Somos um grupo de pertença, mas o nosso único denominador é a Guiné e os verdes anos que lá passámos (ou deixámos). Como tu muito bem dizes, o nosso blogue é importante por que o essencial da sua matéria-prima não são as notícias nem sequer os docuemntos, mas o vivido, as memórias, a experiência pessoal, única e intransmissível.

Somos todos pessoas civilizadas. E responsáveis. Todos reconhecemos que a emoção nem sempre é boa conselheira. E que as memórias da guerra, desta guerra, são um caixa de Pandora. Muitos dos meus camaradas que aqui escrevem não são, contudo, profissionais da palavra. Quero com isso dizer que não têm necessariamente o domínio da arte de comunicar. Tu sabes, melhor do que ninguém, que se pode ferir e até matar com as palavras (por exemplo, o assassínio de carácter). A propaganda é uma forma de comunicação. O communicare (do latim, pôr em comum) não é fácil. Nem é natural. Nem é neutro. Rio-me quando eu próprio falo, em sessões de formação, na comunicação assertiva. É a maior treta que impingimos às pessoas nas organizações. As nossas comunicações tresandam a emoção e às vezes a manipulação.

Como já tenho aqui dito e redito, nós não fazemos, no nosso blogue, nem jornalismo nem historiografia. Não competimos nem com os jornalistas nem com os historiadores. Queremos apenas contar as nossas histórias uns aos outros. E arrumá-las, por séries temáticas. O que também não é fácil...

Por isso também fazemos blogoterapia. Temos posto camaradas da Guiné a falar, em voz alta, do passado, coisa que eles não faziam há muitos, muitos anos... Não somos um comunidade terapêutica, não somos um grupo de autoajuda, nenhum de nós está doente ou em reabilitação. Mas a verdadade é que somos veteranos de guerra, quer se goste ou não do termo. Ex-combatentes, dizem outros. E esse é um traço de união. O passado que partilhámos, no teatro de operaçõeas (TO) da Guiné, é o nosso traço de união. Talvez o único, para além da circunstância da sermos concidadãos, portugueses, falantes da língua portuguesa...

Não te sei, dizer, Diana, se eu próprio e os meus camaradas fervemos em pouca água... Não é habitual. Costumamos cultivar a contenção verbal. E ainda temos o velho hábito, dado pela disciplina militar, de pôr a G3 em posição de segurança. Não puxamos facilmente pela G3. Mas não quero, ainda para mais na pele de editor deste blogue (que também sou, com o Carlos Vinhal e o Virgínio Briote), fazer um juízo de valor acerca das nossas reacções ao texto (ou melhor, ao parágrafo) do Luís Almeida Martins que, ele próprio, achou repentinas e até despropositadas. Eu aliás, alertei para o risco de se tomar a árvore pela floresta, pelo que aconselhei a leitura na íntegra do artigo. É sempre possível sermos mal interpretados. Temos, nós próprios, essa experiência no blogue.

Sou editor, mas não sou juiz. Deixei fluir a palavra, as nossas palavras, evitando apemas o anonimato, o insulto e o excesso verbal. Há comentários que estão no downstairs do blogue que eu não trarei à superfície, mas que também não vou eliminar. Excessivos ou não, foram ditados pelo calor da batalha (que, desta vez, é ou foi felizmente apenas verbal).

Deixa-me, por fim, dizer-te que não nego, bem pelo contrário, valorizo e defendo o papel do jornalismo (seja de opinião, de notícia ou de investigação). E por isso é que é tão preciosa, para mim, pelo menos (e seguramemte para todos nós), a liberdade de imprensa, a liberdade de expressão.

Tu sabes a força que têm as palavras, as imagens e outros signos. A força da comunicação (social). Os jornalistas não podem, por seu turno, ficar surpreendidos, muito menos melindrados, com as reacções, às vezes aparentemente intempestivas e até injustas, dos seus leitores. São os ossos do ofício de quem escreve e publica, de quem se expõe e dá a cara...

Quando há conflito entre duas partes, o problema nunca está no A ou no B, mas na sua relação A/B. Aqui houve tão apenas um problema de comunicação. Não está em causa um jornalista, que até deve ser uma pessoa estimável e estimada. (Embora eu não o conheça pessoalmente, leio-o há anos; não nenhum novato em bicos de pé, à procura da glória e da fama). Não estão sequer em causa os jornalistas. Não vamos diabolizar ninguém, muito menos os jornalistas. Estão em causa, às vezes, os nossos processos de percepção e de comunicação. Obrigado, Diana, pela tua tentativa de ajuda na melhoraria do processo de comunicação entre todos nós, os amigos e camaradas da Guiné.
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Nota de L.G.:

(*) Vd. último poste desta série > 28 de Fevereiro de 2009 >Guiné 63/74 - P3950: Sr. jornalista da Visão, nós todos fomos combatentes, não assasinos (7): Manuel Maia, o bardo do Cantanhez

Guiné 63/74 - P3950: Sr. jornalista da Visão, nós todos fomos combatentes, não assasinos (7): Manuel Maia, o bardo do Cantanhez

1. Mensagem, algo original, do Manuel Maia, ex-Fur Mil da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4610, Bissum Naga, Cafal Balanta e Cafine (1972/74)

Caro Luis tive oportunidade de ler comentários de camaradas relativamente ao artigo supracitado (*), de que espreitei a parte evidenciada na caserna, e decidi também, à guiza do que tantos já fizeram, dizer de minha justiça pela forma de sextilhas...

Presumo que se trata de jornalista jovem a querer "ganhar espaço" e influenciado por gentalha que teima a apelidar-nos de maus da fita.


Se porventura achares por bem dar a conhecer ao resto do pessoal da caserna, fá-lo. Um abraço do Manuel Maia. (**).


Assente em deturpada narrativa
de escória desertora, fugitiva,
escriba da Visão, agride, insulta.
Do vilipêndio, a geração sofrida,
em nome dos que lá deram a vida
exige-lhe o pedido de desculpa.

Não fomos assassinos, mercenários,
mas antes combatentes, solidários
com povos que aprendemos a gostar.
A prova está no enorme abraço dado
entre afros e as gentes deste lado
de cada vez que encontro tem lugar...

Depois da desastrosa entrada em cena,
terá de retractar-se a estulta pena,
p´ra além do que é dever, está o direito.
Da exigência não abramos mão
pois mancha a veterana condição
e mortos mereciam mais respeito...


___________

Notas de L.G.:

(*) 27 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3947: Sr. jornalista da Visão, nós todos fomos combatentes, não assassinos (6): Luís Graça, CCAÇ 12 (Bambadinca, 1969/71)

(**) 20 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3915: Cancioneiro do Cantanhez (1): De Cafal Balanta a Cafine, Cobumba, Chugué, Dugal, Fatim... (Manuel Maia)

sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

Guiné 63/74 - P3947: Sr. jornalista da Visão, nós todos fomos combatentes, não assassinos (6): Luís Graça, CCAÇ 12 (Bambadinca, 1969/71)

Comentários e mensagens do Luís Graça, ex-Fur Mil Henriques, ex-jornalista, CCAÇ 2590/CCAÇ 12 (Contuboel e Bambadinca, Maio de de 1969/Março de 1971); foi instrutor e comandante de secção num companhia de soldados fulas; colaborou com o saudoso jornalista de O Jornal, Afonso de Praça (ex-Alf Mil, em Angola) na organização das Memórias da Guerra Colonial, no início da década de 1980; o Afonso dei-me a entender que O Jornal foi pressionado, na época, por gente do Conselho da Revolução, a fechar esta secção incómoda... De qualquer modo, foi uma louvável e pioneira inciativa daquele já extinto e saudoso semanário.

Aproveito para recordar que ficaram lá com montes de cartazes, fotografias e documentos que eu tinha cedido temporariamente para a organização de uma exposição sobre a Guerra Colonial que nunca chegou a ver a luz do dia... O Afonso morreu em 2001. A Visão é herdeira de O Jornal.

Legendas das fotos (acima):

(À esquerda) Guiné > Zona Leste > Contuboel> CCAÇ 12 > Junho de 1969 > Furriéis Levezinho e Henriques, no oásis de paz que era então Contuboel, no bem-bom da instrução de especialidade dada aos nossos queridos nharros da futura CCAÇ 12 (na altura CCAÇ 2590)... No fim da instrução, passado um meio e meio, a companhia, em farda nº 3 (!), estava a levar porrada da grossa, em Madina Xaquili... Em Contuboel, havia tempo para tudo, até para brincadeiras estúpidas ou tão inocentes como esta simulação de um catana a exercer o seu mister no delicado pescoço de um tuga... (LG)

Foto: © António Levezinho (2006). Direitos reservados

(À direita) Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Bambadinca > Finete, regulado do Cuor > 1969: Destacamento de milícias e aldeia em autodefesa de Finete, junto ao Rio Geba. Na foto, o furriel miliciano Henriques e dois dos soldados africanos da CCAÇ 2590/CCAÇ 12, do 4º Grupo de Combate, o Soldado Arvorado (mais tarde promovido a 1º cabo) José Carlos Suleimane Baldé e o Soldado Umarú Baldé, apontador de morteiro 60. Umaru, o Puto, na foto, de pé, de cachimbo: na época teria 16 ou 17 anos

Foto: © Luís Graça (2005). Direitos reservados


1. Pois é, à força de aparecerem em letra de forma, à força de serem repetidas até à exaustão, há ideias feitas, preconceitos, estereótipos, que se tornam ‘verdades’... Oficiais, oficiosas...

Além disso, é sempre abusivo fazer generalizações: terror, desespero, massacres, napalm... Só conheci o TO da Guiné, em 1969/71. E para mais, durante o consulado spinolista. Reconheço que tenho o meu bocadinho de inferno, na terra, em vida... De qualquer modo, seria abusivo, da minha parte, falar de Angola e de Moçambique, e dos seus teatros de guerra, das especifidades do terreno, da organização e da estratégia do IN... Enfim, seria abusivo pôr tudo no mesmo saco: 1961, 1971... No caso da Guiné, por exemplo, Schulz e Spínola...

É preciso contextualizar a guerra, e dar-lhe a dimensão sócio-antropológica, do quotidiano, que não vem nos relatórios, nas estatísticas, nem sequer nos arquivos, nem nos livros de história... É pena que o jornalista da Visão não tenha tido tempo, ao menos, de visitar o nosso blogue...

Sabemos do que falamos, não sei se o jornalista Luis Almeida Martins sabe do que fala... Refiro-mo à experiência de guerra, vivida, no TO da Guiné... Se calhar nem tem que saber, para falar do Spínola, que é uma figura que já faz parte da nossa história...

Tudo isto para te dizer, meu querido Vasco da Gama (o de Cumbijã, não o da Índia), que entendo e partilho a tua indignação. Mais uma razão para, parafraseando o slogan do nosso blogue, "não deixarmos que sejam os outros a contar a nossa história por nós"...

É que quem conta um conto, acrescenta-lhe um ponto... Neste caso, parece que nos querem tirar, não um, mas muitos pontos...

2. Reforço o que disse algures, como editor (porra, também sou gente!):

"Que imagem vamos passar aos nossos filhos e netos ? Nós fomos combatentes, não fomos assassinos!" - parece ser a reacção natural de qualquer um dos nossos camaradas que são veteranos da guerra da Guiné, e que partilham os valores consagrados no nosso blogue...

Por sinal, por ironia, por coincidência ou não, o artigo da Visão, evocativo dos 35 anos do livro do Spínola, Portugal e o Futuro, surge na mesma semana em que camaradas generosos e solidários como o António Camilo (Lagoa), o José Moreira (Coimbra) ou o Xico Allen (Matosinhos / Porto), e mais umas dezenas de outros, ex-combatentes na sua maioria da guerra colonial, seguem, por terra, em caravana, a levar ajuda humanitária a (e a matar saudades de) um povo que nós consideramos irmão...

Que me perdoem os jornalistas portugueses, mas eu não vi a grande imprensa (rádio, televisão, jornais) - com excepção de alguns jornais regionalistas, como o Diário As Beiras, de Coimbra - dedicar um bocadinho da sua preciosa atenção a esta expedição humanitária nem aos seus preparativos, aos meses e meses de trabalho, anónimo e voluntário, e que exemplifica bem o que é o melhor do povo português, o seu sentido de nobreza, compaixão, generosidade, ecumenismo e solidariedade. Andamos todos distraídos com a crise... (que é sobretudo de valores!).

PS 1 - Não posso esquecer aqui o Carlos Fortunato, o Carlos Silva e o resto da malta da Ajuda Amiga (da região de Lisboa), que seguem de avião este fim de semana, a caminho de Bissau, também em missão humanitária e turismo de saudade. Para todos eles, que são os melhores de todos nós, aqui vai um Alfa Bravo do tamanho deste pequeno grande Portugal.

Amigos e camaradas, "partam mantenhas" com aquele povo gentil que não guarda ressentimentos nem ódios do tempo em que nos combatemos uns aos outros, portugueses e guineenses contra outros guineenses (mas também contra alguns portugueses, alguns cubanos, alguns caboverdianos)...

PS 2 - Escreve-me telegraficamente o Zé Teixeira, da Tabanca de Matosinhos, ontem, às 14h59, alvoraçado:

"Mensagem do Zé Manel. 'Estamos a almoçar em Gabú. Estas pessoas são maravilhosas. Estou muito feliz'.

"Falei com ele de seguida. Está emocionado com o acolhimento de pessoas que nunca viu na vida, pois nunca esteve em Gabú. Abraço. José Teixeira"


3. Mail enviado ao Director da Visão:

Caro director da Visão:

Sou leitor, de longa data, da Visão e editor do blogue Luís Graça e Camaradas da Guiné. Fui objectivamente um combatente do exército colonial português, comandei soldados fulas. Fui actor crítico e testemunha atenta. Sofri violentas emboscadas, no mato, com algumas dezenas de baixas (entre mortos e feridos graves). Tive acidentes de viação em acções militares. Voei, com a minha GMC, debaixo de uma mina anticarro. Fizémos e interrrogámos prisioneiros. Aprisionámos população civil do PAIGC...

É pena que o Luís Almeida Martins (que assinou o artigo 'Portugal e o passado' da Visão, nº 833, de 19 a 25/2/09), não tenha tempo, ao menos, de visitar, de vez em quando, o nosso blogue... Sabemos do que falamos, não sei se o jornalista sabe do que fala... Refiro-mo à experiência de guerra, vivida, no TO da Guiné, o nosso Vietname... Se calhar nem tem que saber, para falar do Spínola, que já morreu e já faz parte da nossa história... Agora o jornalista não pode confundir combatentes com assassinos.

Atenciosamente, Luís Graça


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Nota de L.G.:

(*) Vd. último poste da série > 26 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3943: Sr. jornalista da Visão, nós todos fomos combatentes, não assassinos (5): Quero exprimir a minha revolta (Fernando Franco)

quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

Guiné 63/74 - P3942: Sr. jornalista da Visão, nós todos fomos combatentes, não assassinos (4): Camaradas, sei o que vos vai na alma (Virgínio Briote)

1. Mensagem de Virgínio Briote, nosso co-editor, ex-Alf Mil Comando, CCAV 489/BCAV 490, Cuntima, e CCmds, Brá, 1965/67, com data de 25 de Fevereiro de 2009:

Caros Luís, Carlos e Camaradas,

[Negrito, do editor, C.V]


Compreendo bem o que vos vai na alma. Quem deu o corpo e a alma por aquele Portugal de então, a troco de cigarros e cerveja (e uísque, para os mais favorecidos), sente-se ofendido, no seu mais íntimo, por tão apressada crónica.

E, no entanto, a opinião do Luís Almeida Martins, embora muito à tona (duas páginas também não davam para muito mais e, ainda por cima, com marcianos no filme), não me parece totalmente incorrecta. Massacres e acidentes de viação, são, na referida crónica, os aspectos mais discutíveis.

Massacres, é a palavra que mais nos dói e é injusta, felizmente, para a grande maioria de nós. Mas houve-os, comprovadamente. Para referir apenas dois: o assassinato dos "majores" e acompanhantes, no chão Manjaco, na Guiné, e o "Wiriamu", em Moçambique, ocorreram. Luís Cabral, Aristides Pereira e Pedro Pires referiram-se a esse facto com uma frase simples: era guerra, tratava-se de guerra.

O alferes de "Wiriamu", acidentalmente cmdt da CCmds e responsável pela operação, confessou-o para as câmaras. Pediu perdão às vítimas. Senti-me envergonhado quando o ouvi descrever como tudo se processou. Um jovem de 20 e poucos, com a mesma idade dos seus camaradas, com um historial de baixas na companhia... compreendi-o, mas confesso-vos que não fiquei orgulhoso.

Foram casos que não fazem exemplo, dirão muitos e eu também, mas existiram vítimas. Embora raros, casos desses fazem parte da guerra. E a guerra é um charco, quanto mais nos metemos nele, mais sujos ficamos.

Que as baixas eram mais devidas a minas fortuitas e a acidentes de viação... Não posso falar por Moçambique nem por Angola. O tipo de guerra era similar, diferentes eram o IN, as características do território e as populações. Da Guiné, temos, entre nós, infelizmente, gente mais habilitada para falar de como o IN se comportava no terreno. Apenas acrescento: é verdadeiramente invulgar que, sujeitos a uma guerra a sério, com testemunhas que, ainda hoje estão vivas e que trazem no corpo as marcas da luta, os INs de então sintam uns pelos outros uma compreensão e amizade tão grande.

Acima de tudo, da crónica do Almeida Martins, o que ressalta, para mim, é que reflecte a visão dos que têm, acima de tudo, privilegiado a chamada opinião politicamente correcta, a de que aqueles povos estavam submetidos a uma ocupação, que, embora histórica, lhes parece ilegítima.
Massacres só houve de um lado, pelo que depreendo da crónica. Não é novidade, é uma opinião recorrente, temo-la ouvido estes anos todos. E têm todo o direito, como qualquer um de nós, de expressar o seu ponto de vista. Diferente, para mim, é que, no seu afã de defenderem ou justificarem esse ponto de vista, deixam passar para último plano o que de melhor Portugal tem tido ao longo da sua História, os seus Soldados. Foi com eles que este pequeno País se fez e se tem mantido, há quase mil anos.

Mas este Portugal, da pena do articulista de que estamos a falar, é o que estamos a viver. Não sei é se há muita gente que gosta dele. Eu não.

Um abraço do
Briote
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 26 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3941: Sr. jornalista da Visão, nós todos fomos combatentes, não assassinos (3): Mário Fitas, aliás, Mamadu (CCAÇ 763, Cufar, 1965/66)

Guiné 63/74 - P3941: Sr. jornalista da Visão, nós todos fomos combatentes, não assassinos (3): Mário Fitas, aliás, Mamadu (CCAÇ 763, Cufar, 1965/66)

1. Do nosso camarada Mário Fitas - de seu nome completo, Mário Vicente Fitas Ralhete -, alentejano danado, natural de Elvas, residente em S. Pedro do Estoril, Cascais, homem de fé e de coragem, homem de sete ofícios e talentos, que foi puto, gandulo, vagabundo e Mamadu na Região de Tombali, Cufar, ex-Fur Mil Op Esp, que pertenceu aos temíveis dos Lassas, a CCAÇ 763, 1965/66...

É autor de dois livros, de fundo autobiográfico, sobre a guerra colonial da Guiné, Putos, Gandulos e Guerra (2000) e Pami Na Dondo, a guerrilheira (2005); criador de uma notável personagem, uma mulher guineense, balanta, exemplo de grande coragem e dignidade, a quem ele deu o nome de Pami Na Dondo.


Caro pessoal da Tabanca Grande

Não há crise?... Uma porra! Há e é de valores!

Andei aqui a rodilhar, para não ultrapassar as 60 palavras. Mas estou preparado, se lhe não agradar, não escrevem.

Mas pelo menos disse ao sr. Luís Martins (*), que tinha pena de ele não me ter acompanhado nas e bolanhas da Guiné, e convidei-o a visitar o blogue LuisGraça& CamaradasdaGuiné - vamos ver é se contam uma palavra - para ver se aprende alguma coisa.

É claro que estou em consonância com toda a Tabanca. E aqui se vê como aquela linda Terra une a malta, independentemente das sensibilidades.

Força, Tabanqueiros! Aqui se escreve e aqui se diz o que estes... ia largar uma morteirada Alentejana, mas... Não vale a pena!

Também morrem! Julgam que ficam cá para semente? És barro e à terra voltarás.

Em frente! Vamos para o milhão!

Hoje ainda mais forte não só do Cumbijã, mas de todos os rios da Guiné o Veterano Abraço,

Mário Fitas
__________

Os Alentejanos são Assim:
Sugestão para encher a caixa de correio da "Visão"

Texto:

Exmo sr. Director da Revista Visão

Favor transmitir, ao Exmo. Sr. "JORNALISTA" Luís Almeida Martins, a tristeza que se apoderou de mim, por o referido Sr. não me ter acompanhado, nas matas, bolanhas, lalas e rios da Guiné.

Com os desejos de grandes reportagens como a efectuada por Luís Almeida Martins.
Com os melhores cumprimentos,

Um turista na Guiné

Mário Fitas

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Resposta ao artigo de Luís Almeida Martins, sobre a Guerra (Colonial)

Pena não sermos companheiros nas matas, bolanhas, e rios Sul da Guiné, Cufar, CCAÇ 763! Era comandante do (PAIGC) o actual presidente da GUINÉ-BISSAU! Tivemos (7) mortos (53) feridos em combate.

Deveria ler "Pami na Dondo, a Guerrilheira", comentado por René Pélissier, "Guerres Australes et Guerres Coloniales" . Visite o Blogue LuísGraça&CamaradasdaGuiné, a verdade sobre a Guerra, por aqueles que nela participaram. Mário Fitas (...)

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Nota de L.G.:

(*) Vd. poste anterior desta série > 26 de Fevereiro de 2009 >Guiné 63/74 - P3940: Sr. jornalista da Visão, nós todos fomos combatentes, não assassinos (2): J. Mexia Alves, ex-Alf Mil (Xitole, Mato Cão, Mansoa)

Guiné 63/74 - P3940: Sr. jornalista da Visão, nós todos fomos combatentes, não assassinos (2): J. Mexia Alves, ex-Alf Mil (Xitole, Mato Cão, Mansoa)

1. O primeiro de mais de 3 dezenas de comentários e mensagens que suscitou o poste do Vasco da Gama (*), desta feita enviada pelo nosso camarigo J. Mexia Alves (hoje, à esquerda; ontem, à direita):

O Joaquim Mexia Alves que organizou o nosso último encontro (Monte Real, 2008), vive na Marinha Grande. É autor de letras e cantor de fado. Quando menino e moço, esteve na Guiné e na zona leste (Sector L1) e também na região do Óio (1971/73)... Recorde-se o seu historial de playboy, gozando as delícias do sistema: Depois de Bolama, veio com a sua CART 3942 para o Xitole, comandou, como Alf Mil Op Esp, o Pel Caç Nat 52 (Mato Cão / Rio Udunduma) e esteve ainda, na parte finald a sua comissão, na CCAÇ 15 (Mansoa).

Caros Camarigos

Não sei quem é o sr. Luís Almeida Martins e nem me interessa!

Quando as coisas me tocam cá por dentro, confesso que me irrito, será lá o tal “stress da guerra” como já me disseram, e respondo desabridamente.

Hoje neste país qualquer sujeito escreve nos jornais e revistas porque tem umas ideias sobre umas coisas e vai daí decide expor as suas teorias.

É verdade que muitas baixas foram devidas a acidentes, não só de viação, mas de armas de fogo, mas com certeza e também de emboscadas e ataques e flagelações.

Reduzir a guerra a umas bombas de napalm e a umas aldeias montadas por nós, é de quem não faz ideia do que está a dizer, nem faz ideia do que se passou.

"massacres como armas ditadas pelo desespero."... Será o desespero de quem escreve uma merda destas.

Não seria grave para mim, pois quem escreve tal coisa apenas merece a minha total indiferença, mas nós temos filhos e netos e esses têm obrigação de saber que nós não andámos numa “guerra do Raul Solnado”.

Não vou escrever para a Visão, porque “tão ladrão é o que vai à vinha como o que fica a vigiar”, ou seja, aquela revista há-de ter um director que tem por obrigação dar um mínimo de credibilidade àquilo que na mesma é escrito.

Mas não tenham dúvidas, meus camarigos, isto faz parte de uma “estratégia”, agora que começou a falar-se mais nos ex-combatentes.

Dêem a vida pela Nação, mas não chateiem! Há dinheiro para almoços e jantares, prémios de administrações e quejandos, mas não há para os desgraçados que andaram por África a combater.

Sabem porquê? Porque eles afinal não estiveram na guerra, não houve combates frontais, foram apenas baixas de acidentes e minas!!!!

Não peço nada para mim, mas exijo para aqueles que ainda não dormem e têm os seus sonhos povoados de gritos e explosões, para aqueles que ainda não conseguem dominar as suas irritações, para aqueles que ainda não conseguem ter uma vida familiar estável.

Estes “escritores” não merecem o meu desprezo!

Abraço a todos camarigos e levantemo-nos decididamente, porque todos não somos demais para lutar por aqueles que tendo estado connosco ainda precisam da nossa ajuda.

Joaquim Mexia Alves
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Nota de L.G.:

(*) Vd. poste de 24 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3935: O Spínola que eu conheci (2): O artigo da Visão e o meu direito à indignação (Vasco da Gama)

terça-feira, 24 de fevereiro de 2009

Guiné 63/74 - P3935: Banalidades da Foz do Mondego (Vasco da Gama) (II): O artigo da Visão e o meu direito à indignação

1. Mensagem do Vasco da Gama, ex-Cap Mil da CCAV 8351, Cumbijã, 1972/74:


Neste texto a seguir, o nosso camarada, figueirense exerce o seu direito à indignação...

PORRA! NÃO QUERO NEM PEÇO NENHUM RECONHECIMENTO, MAS NÃO ADMITO SER OFENDIDO.



BANALIDADES DA FOZ DO MONDEGO II > AINDA O POSTE 3925 (*)


[Bold, a cor, da responsabilidade do editor, L.G.]

Comandante Luís Graça,

Sempre preferi o silêncio dos bastidores à luz da ribalta e, para o meu gosto, estou a aparecer demasiadas vezes.

Obrigado pela publicação do meu pobre e singelo comentário (**), mas a singeleza é sinónimo de sinceridade, que tanto prezo e tento manter em tudo o que faço.

Quando hoje reli o comentário do nosso camarada Torcato, que não tenho o prazer de conhecer pessoalmente, comentário esse que referi no texto que te enviei e que me ajudou a escrevinhá-lo na parte que diz respeito ao Gen Spínola, fiquei com a pulga atrás da orelha no que diz respeito a uma citação que ele retira da revista Visão. Como não tinha lido a Visão e a tinha procurado, sem êxito, por Buarcos, pedi a pessoa amiga que fizesse o favor de me enviar o referido texto. Vou completar a citação que o nosso camarada Torcato faz, dando à luz todo o parágrafo:

“ Raramente havia combates frontais, sendo as explosões de minas e os acidentes de viação as principais causas das baixas entre as tropas portuguesas, que recorriam à concentração das populações em aldeias estratégicas, ao uso de napalm e até mesmo aos massacres como armas ditadas pelo desespero.”

Caros camaradas: de que estamos à espera para reagir a um texto destes que diz preto no branco que, para além dos ralis que fazíamos e que pelos vistos provocavam imensas vítimas com os despistes dos nossos bólides, para além de umas minas que explodiam de quando em vez, fomos também assassinos que recorriam a massacres e ao napalm?


Como é possível ficarmos indiferentes a baboseiras destas, se nos lembrarmos de todos os mortos que tivemos em combate, dos camaradas que ficaram estropiados para toda a vida, da fome, do frio, dos paludismos, das condições desumanas em que vivemos, do sacrifício do abandono das nossas famílias, da interrupção dos estudos que poucos retomariam, de famílias desfeitas, de empregos perdidos…


Ataque-se o regime, ataquem-se os governantes de então, ataquem-se os grandes comandantes militares, mas não belisquem nem a honra nem a dignidade dos que eram obrigados a ir combater.

PORRA! NÃO QUERO NEM PEÇO NENHUM RECONHECIMENTO, MAS NÃO ADMITO SER OFENDIDO.

Por favor, camaradas, alguém com capacidade de escrita ensine a esta gente o quão importante foi a nossa geração.

Temos escritos magníficos no nosso blogue; há que juntá-los, há que os publicar, há que os divulgar para fora do nosso círculo, se não por nós, que seja feito em memória dos nossos camaradas mortos em combates frontais!

Um abraço, nervoso, do camarada e amigo

Vasco

2. Comentário de L.G., editor:

Os amigos e camaradas que queiram comentar o texto da Visão, assinado por Luis Almeida Martins (é sempre aconselhável lê-lo primeiro, na íntegra), e em especial o polémico parágrafo citado pelo Vasco da Gama (i), poderão fazê-lo, directamente, no nosso blogue, mas também poderão enviar uma mensagem para o Correio dos Leitores, daquele semanário.

A mensagem a enviar deverá conter até 60 palavras (no máximo), além do vosso nome, morada e tefefone. Deve ser enviada por mail. O endereço electrónico da Visão é: visao@edimpresa.pt

A revista sai às quintas-feiras.

(i) O parágrafo completo é o seguinte (pp. 50-51):

"Principiada em Angola em 1961, a guerra colonial na sua nova faceta menos tribal e politicamente mais organizada estendera-se à Guiné em 1963 e a Moçambique em 1964. Não de tratava de uma guerra de frentes, mas de uma intrincada sucessão de acções de guerrilha, difícil de travar e desafiadora de qualquer planificação eficaz. Raramente havia combates frontais, sendo as explosões de minas e os acidentes de viação as principais causas das baixas entre as tropas portuguesas, que recorriam à concentração das populações em aldeias estratégicas, ao uso de napalm e até mesmo aos massacres como armas ditadas pelo desespero."



__________




Que imagem vamos passar aos nossos filhos e netos ? Nós fomos combatentes, não fomos assassinos! - é a reacção generalizada dos veteranos da guerra da Guiné, a este excerto de um artigo ("Portugal e o passado"), de Luís Almeida Martins, evocativo dos 35 anos da publicação do livro de Spínola, Portugal e o Futuro , na edição da revista Visão, desta semana (nº 833, 19 a 25 de Fevereiro de 2009, pp. 50-51)...

Na mesma semana, por ironia, em que há algumas dezenas de homens e até de mulheres, ex-combatentes da guerra colonial (na sua maioria), que seguem, por terra, em caravana, do Porto, de Coimbra e de Portimão, a levar ajuda humanitária a (e a matar saudades de) um povo que eles consideram irmão...

Não vi a imprensa de Lisboa (rádio, televisão, jornais) dedicar 30 segundos ou um parágrafo sequer a este pequeno grande evento, que culmina meses e meses de trabalho, anónimo e voluntário, e que é bem revelador do sentido de nobreza, compaixão, generosidade, ecumenismo fraternidade e solidariedade de um povo... Não são as sobras dos ricos que eles levam em contentores que já seguiram por mar, mas sim artigos essenciais que fazem muita falta às crianças da Guiné-Bissau, na sua maioria material escolar, didáctico e sanitário... E até um parque infantil, o primeiro de Bissau, vai ser montado desta vez! (LG).







Visão nº 833, de 19 a 25 de Fevereiro de 2009 > Artigo de Luís Almeida Martins, "Portugal e o passado" (pp. 50-51). O nosso camarada Vasco da Gama, ex-Cap Mil da CART 8351 (Cumbijã, 1972/74), não gostou do que o jornalista escreveu, a propósito do quotidiano da guerra colonial:

"Raramente havia combates frontais, sendo as explosões de minas e os acidentes de viação as principais causas das baixas entre as tropas portuguesas, que recorriam à concentração das populações em aldeias estratégicas, ao uso de napalm e até mesmo aos massacres como armas ditadas pelo desespero."...

 
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Notas de LG.:

(*) Vd. poste de 23 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3925: Efemérides (16): Portugal e o Futuro, de António Spínola, um best-seller há 35 anos

(**) Vd. poste anterior desta série de 24 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3929: Banalidades da Foz do Mondego (Vasco da Gama) (I): Antes que me chamem spinolista...