Guiné > Região do Oio > Mapa de Farim (1954) > Escala de 1/50 mil > Posição de Morocunda, bairro de Farim.
Guiné- Bissau > Região de Oio > Farim > Março de 2008 > Cádi ou Cati, uma sobrevivente dos trágicos acontecimentos de 1 de novembro de 1965. O António Paulo Bastos conheceu-a, ma Missão Católica, na altura da sua 3ª viagem à Guiné-Bissau.
Excerto de relatório sobre o período de 1 a 30 de novembro de 1965, inserido na história do BART 733, Bissau e Farim, 1964/66). Cortesia do nosso camarada e grã-tabanquerio António Paulo Bastos,
ex-1º Cabo do Pelotão de Caçadores 953 (Cacheu, Bissau, Farim, Canjambari e Jumbembem, 1964/66) (*).
1. Ainda está envolta em controvérsia a responsabilidade material e moral dos trágicos acontecimentos de 1 de novembro de 1965, em Morocunda [e não Morucunda...], nas imediações de Farim (**), aqui relatados em primeira mão pelo António Bastos, em 2009, em 3 postes (*) mas já referidos antes pelo Virgínio Briote (***)...
Só conhecemos a versão da PIDE e do BART 733, atribuindo a responsabilidade do atentado a "elementos subversivos"... Tanto quanto sabemos, o PAIGC nunca reivindicou a autoria deste horrendo atentado, que teve um balanço trágico, segundo o documento acima reproduzido: 27 mortos e 70 feridos graves, além de feridos ligeiros, entre a população civil; um ferido grave, entre as NT.
Só conhecemos a versão da PIDE e do BART 733, atribuindo a responsabilidade do atentado a "elementos subversivos"... Tanto quanto sabemos, o PAIGC nunca reivindicou a autoria deste horrendo atentado, que teve um balanço trágico, segundo o documento acima reproduzido: 27 mortos e 70 feridos graves, além de feridos ligeiros, entre a população civil; um ferido grave, entre as NT.
CARNIFICINA EM FARIM
1 de Novembro de 1965
Camaradas,
No passado dia 1 [de novembro de 2009] completaram-se 44 anos, sobre um ataque que me marcou profundamente. Tenho duas fotos de uma das sobreviventes e lembrei-me de enviar para serem publicadas no blogue.
Tudo aconteceu em Farim, resultante do rebentamento de um engenho explosivo, em pleno batuque na tabanca do Bairro da Morocunda.
Eram 21h30, quando um elemento da milícia lançou um fornilho (uma granada embebida em pregos, lâminas e bocados de ferros), para o meio do pessoal presente.
27 mortos e 70 feridos graves, uma deles era uma senhora que podem ver nas fotos e que, nessa altura, era ainda uma criança de 10 anos. Chama-se Cáti, mora atualmente em Farim e, em março de 2008, fui encontrá-la numa festa na Missão Católica em homenagem a um grupo de turistas “tugas”, que por ali passaram 2 dias.
Como tudo aconteceu: eu pertencia ao Pelotão Caçadores 953 e estava nesse dia de passagem por Farim, a caminho de Canjambari. No momento da explosão, eu estava junto à porta da caserna do pelotão de morteiros. Logo de seguida, começaram a passar viaturas com corpos em cima, a caminho das enfermarias civil e militar.
O engenho, duas granadas reforçadas com explosivos, pregos e lâminas, foi lançado para o meio do batuque onde era suposto estar muita tropa, o que não aconteceu, porque se tinha feito uma operação e o pessoal estava ainda a descansar.
Pela primeira vez na Guiné um Dakota levantou de noite para proceder à evacuação dos feridos.
No dia seguinte já se encontravam presos na 1.ª Companhia de Caçadores em Nema (Farim), 60 indivíduos entre eles: Pedro Mendes Fernandes, Bernardo da Cunha, Raul Teixeira Barbosa, José Maria Jonet, Dionísio Dias Monteiro, Pedro Tertuliano, Dionísio da Silva Pires (este empregado dos CTT) e muitos mais, todos empregados das repartições públicas e casas comerciais.
As prisões foram feitas pelo agente da Pide, de nome Prodízio e militares da CCS do BART 733. (...)
(...) No relatório falam de um agente da PIDE. O seu nome era Prodísio (nunca mais me esqueci) e, em conversa com a Cáti (ou Cádi, não me lembro exactamente), ela confirmou-me que, depois de recuperada dos graves ferimentos que sofreu, regressou a Farim, tendo sido empregada na casa dele.
(...) Nota da historiadora: Confirmado o incidente, a PIDE, em mensagem por rádio existente nos arquivos de Salazar, afirma que, no dia 1 de Novembro de 1965, cerca das 20 horas, fora lançado um engenho explosivo para o meio dos africanos que se encontravam num batuque em Farim. A explosão teria provocado 63 mortos e feridos, na sua maioria mulheres e crianças.
Foi detida meia centena de pessoas. Confissões obtidas levaram à detenção de um tal Issufo Mané, que declarou pretender atingir militares (?). Para o fazer, teria recebido 14 contos de Júlio Lopes Pereira, o qual, por seu lado, actuara por indicação do chefe da Alfândega de Farim, Nelson Lima Miranda. E este teria vindo a declarar que a bomba fora lançada a mando da direcção do PAIGC.
(AOS/CO/UL- 50-A, Informações da PIDE, 1965-1966, 86 subdivisões, pasta 2, fls. 636, 637, 638, 641 e 642).
1 de Novembro de 1965
Camaradas,
No passado dia 1 [de novembro de 2009] completaram-se 44 anos, sobre um ataque que me marcou profundamente. Tenho duas fotos de uma das sobreviventes e lembrei-me de enviar para serem publicadas no blogue.
Tudo aconteceu em Farim, resultante do rebentamento de um engenho explosivo, em pleno batuque na tabanca do Bairro da Morocunda.
Eram 21h30, quando um elemento da milícia lançou um fornilho (uma granada embebida em pregos, lâminas e bocados de ferros), para o meio do pessoal presente.
27 mortos e 70 feridos graves, uma deles era uma senhora que podem ver nas fotos e que, nessa altura, era ainda uma criança de 10 anos. Chama-se Cáti, mora atualmente em Farim e, em março de 2008, fui encontrá-la numa festa na Missão Católica em homenagem a um grupo de turistas “tugas”, que por ali passaram 2 dias.
Como tudo aconteceu: eu pertencia ao Pelotão Caçadores 953 e estava nesse dia de passagem por Farim, a caminho de Canjambari. No momento da explosão, eu estava junto à porta da caserna do pelotão de morteiros. Logo de seguida, começaram a passar viaturas com corpos em cima, a caminho das enfermarias civil e militar.
A maioria das vítimas eram crianças e, entre elas, estava a Cáti. Foi chamado um Dakota e recorreu-se à iluminação da pista de aterragem, com os faróis das viaturas, para se evacuar aquela gente toda.
Agora, passados estes anos, fui encontrar uma das sobreviventes e, como não podia deixar de ser, estivemos a falar do assunto, tendo ela permitido que eu obtivesse as 2 fotos do seu cicatrizado corpo. (...)
Agora, passados estes anos, fui encontrar uma das sobreviventes e, como não podia deixar de ser, estivemos a falar do assunto, tendo ela permitido que eu obtivesse as 2 fotos do seu cicatrizado corpo. (...)
(ii) Poste P7205, de 1 de novembro de 2010:
(...) Neste fatídico Dia 1 de novembro de 1965, pelas 21:30, horas estava eu de passagem por Farim esperando transporte para Canjambari, quando se dá um rebentamento no Bairro da Morocunda em Farim que causou a morte a 27 pessoas, 70 feridos graves e vários ligeiros, todos civis. As NT sofreram 1 ferido grave e um ligeiro.
(...) Neste fatídico Dia 1 de novembro de 1965, pelas 21:30, horas estava eu de passagem por Farim esperando transporte para Canjambari, quando se dá um rebentamento no Bairro da Morocunda em Farim que causou a morte a 27 pessoas, 70 feridos graves e vários ligeiros, todos civis. As NT sofreram 1 ferido grave e um ligeiro.
O engenho, duas granadas reforçadas com explosivos, pregos e lâminas, foi lançado para o meio do batuque onde era suposto estar muita tropa, o que não aconteceu, porque se tinha feito uma operação e o pessoal estava ainda a descansar.
Pela primeira vez na Guiné um Dakota levantou de noite para proceder à evacuação dos feridos.
No dia seguinte já se encontravam presos na 1.ª Companhia de Caçadores em Nema (Farim), 60 indivíduos entre eles: Pedro Mendes Fernandes, Bernardo da Cunha, Raul Teixeira Barbosa, José Maria Jonet, Dionísio Dias Monteiro, Pedro Tertuliano, Dionísio da Silva Pires (este empregado dos CTT) e muitos mais, todos empregados das repartições públicas e casas comerciais.
As prisões foram feitas pelo agente da Pide, de nome Prodízio e militares da CCS do BART 733. (...)
(...) No relatório falam de um agente da PIDE. O seu nome era Prodísio (nunca mais me esqueci) e, em conversa com a Cáti (ou Cádi, não me lembro exactamente), ela confirmou-me que, depois de recuperada dos graves ferimentos que sofreu, regressou a Farim, tendo sido empregada na casa dele.
No mês de narço de 2008, ao passear com a Cáti em Farim, ela disse-me onde tinha morado o tal PIDE e onde trabalhava.
Sobre relatórios, tenho em meu poder, ainda, os do BART 733 e do BCAV 490, pois foram os batalhões onde estive adido. (...)
Em 2007, o Virgínio Briote já se te tinha referido a este ato de terrorismo, citando o testemunho de um preso político entrevistado pela historiógrafa Dalila Cabrita Mateus (**): Pedro Pinto Pereira, nascido em Bissau, em 1926, preso e desterrado para São Nicolau, Angola (1966-1969), libertado no tempo do Spínola. Será mais tarde preso depois da independência da Guiné-Bissau, acusado de colaboracionismo.
O Virgínio Briote também estava lá nessa altura, em Farim (***)
______________
(...) Que assistira ao fabrico de uma bomba. Quando eles (PIDE) é que tinham deitado uma bomba em Farim, onde mataram muita gente,
(...) (quem lançou a bomba?) Foi a PIDE que mandou, tenho a certeza disso. Lançou a bomba para depois dizer que nós até matávamos africanos. Ali não havia quartéis, só havia casas comerciais, onde era fácil lançar bombas e fugir. Porque é que não lançavam as bombas nos quiosques, frequentados pelos militares portugueses? E iam deitar onde só estava a população? Queriam arranjar pretexto para fazer prisões. Havia, então, uma festa numa tabanca e morreram mais de cem pessoas. Isto passou-se no dia 1 de Novembro de 1965. (...)
Notas do editor:
(*) Vd. postes de:
3 de novembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5203: Efemérides (30): 1 de Novembro de 1965 - Carnificina em Farim (António Paulo Bastos)
4 de novembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5211: Efemérides (32): 1 de Novembro de 1965 – Relatório Oficial da Carnificina em Farim (António Paulo Bastos)
(***) Vd. poste de 18 de agosto de 2007 > Guiné 63/74 - P2060: Bibliografia de uma guerra (14) : o testemunho de Pedro Pinto Pereira. "Memórias do Colonialismo e da Guerra", de Dalila Cabrita Mateus (Virgínio Briote)
1 de novembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7205: Efemérides (54): O fatídico dia 1 de Novembro de 1965 (António Bastos)
(**) Último poste da série > 19 de julho de 2016 > Guiné 63/74 - P16317: Controvérsias (132): Quem conta um conto, acrescenta-lhe sempre um ponto... A morte do comandante Mamadu Cassamá,e as viaturas blindadas, em Copá, em 7/1/1974 (confrontando duas versões, a do guineense Bobo Keita, "o comandante dos tanques anfíbios" e a do escritor cubano Ramón Pérez Cabrera)
(***) Vd. poste de 18 de agosto de 2007 > Guiné 63/74 - P2060: Bibliografia de uma guerra (14) : o testemunho de Pedro Pinto Pereira. "Memórias do Colonialismo e da Guerra", de Dalila Cabrita Mateus (Virgínio Briote)
(...) (quem lançou a bomba?) Foi a PIDE que mandou, tenho a certeza disso. Lançou a bomba para depois dizer que nós até matávamos africanos. Ali não havia quartéis, só havia casas comerciais, onde era fácil lançar bombas e fugir. Porque é que não lançavam as bombas nos quiosques, frequentados pelos militares portugueses? E iam deitar onde só estava a população? Queriam arranjar pretexto para fazer prisões. Havia, então, uma festa numa tabanca e morreram mais de cem pessoas. Isto passou-se no dia 1 de Novembro de 1965. (...)
(...) Nota da historiadora: Confirmado o incidente, a PIDE, em mensagem por rádio existente nos arquivos de Salazar, afirma que, no dia 1 de Novembro de 1965, cerca das 20 horas, fora lançado um engenho explosivo para o meio dos africanos que se encontravam num batuque em Farim. A explosão teria provocado 63 mortos e feridos, na sua maioria mulheres e crianças.
Foi detida meia centena de pessoas. Confissões obtidas levaram à detenção de um tal Issufo Mané, que declarou pretender atingir militares (?). Para o fazer, teria recebido 14 contos de Júlio Lopes Pereira, o qual, por seu lado, actuara por indicação do chefe da Alfândega de Farim, Nelson Lima Miranda. E este teria vindo a declarar que a bomba fora lançada a mando da direcção do PAIGC.
(AOS/CO/UL- 50-A, Informações da PIDE, 1965-1966, 86 subdivisões, pasta 2, fls. 636, 637, 638, 641 e 642).
(****) Vd. poste de 6 de agosto de 2015 > Guiné 63/74 - P14975: Guiné, Ir e Voltar (Virgínio Briote, ex-Alf Mil Comando) (IX Parte): Mais dois lugares è mesa; Bomba em Farim e Rumo a Barro