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sábado, 6 de dezembro de 2025

Guiné 61/74 - P27499: A nossa guerra em números (47): mais de 2/3 do consumo, do valor de vendas em junho de 1970 (n=89 contos), na cantina, da CCAV 2483, em Nova Sintra, foi em álcool e tabaco (Aníbal Silva / Luís Graça)





Imagens de bebibas alcoólicas que só podem ser "(re)vistas" por antigos combatentes, tudo rapaziada com mais de 18 anos...  A saudade não paga imposto, por enquanto... Fonte;: arquivo da Tabanca Grande.




Infografias: Blogue Luís Graça & Camaradasa da Guiné (2025)





Documento  nº 1 > Guiné > Região de Quínara > Nova Sintra > CCAV 2483 > 30 de junho de 1970 : Resumo do balancete da cantina

A cantina de Nova Sintra, que era "democrática",  isto é,  "comum" ( aberta a oficiais, sargentos e praças), ao tempo da CCAV 2483 (1968/70), facturou 89,4 contos nesse mês de junho de 1970.

Recorde-se que a CCav 2483 assumiu, em 7mar69 a responsabilidade do subsector de Nova Sintra, com um pelotão destacado em S. João, até 31mai69, rendendo a CArt 1743. Em 23set70, foi  rendida pela CCav 2765, sendo transferida para Tite, a fim de substituir a CCav 2443, na sua função de intervenção do sector, cumulativamente com a responsabilidade da quadrícula. Em 14dez70, foi rendida pela CCav 2765 e recolheu a Bissau para o embarque de regresso. 

Portanto, em junho de 1970 o mercado do nosso  "cantineiro" Aníbal Silva andaria  à volta dos 160 militares (o efetivo normal de um companhia de quadrícula).

Não havia concorrência ali á volta (nem "bajudas" para distrair a vista), o Aníbal nem sequer precisava de promover os seus produtos: a rapaziada,  sempre sequiosa, e com algum poder de compra,  só queria é que os abastecimentos mensais não falhassem. E,  ainda por cima, já "velhinhos", a seis meses de terminar a comissão. Não havia população local nem milícia. Era um "bu..,rako", Nova Sintra, quem lhe pôs o nome devia ter um grande sentido de "humor... negro".

Em 1 de julho de 1970, em Nova Sintra estavam 3 Pel / CCAV 2483, 1 Pel / CCAV 2443 e 1 Esq Pel Mort 2114. Mas alguém sabia lá onde ficava Nova Sintra ?|... Nem sabia nem queria saber...











Documento  nº 2 > Guiné > Região de Quínara > Nova Sintra > CCAV 2483 > 30 de junho de 1970  > Balancete da cantina


 A cantina, nesse mês de junho de 1970, vendeu artigos no valor de 89,4 contos (o que convertendo para preços de hoje são 30,7 mil euros).. Bom ngócio, mil euros por dia.

 Cada militar gastou, em média 560 escudos (arredondando) (=192 euros). O que era muito dinheiro, em especial para as praças. 

Mas o "sargento da cantina", e vagomestre, o nosso camarada Aníbal José da Siva, ex-furriel mil SAM, tem uma explicação que parece razoável: como o pessoal estava já próximo de ir para Tite (em setembro) antecipou o Natal, e fez mais umas compras "supérfluas" já a pensar na "peluda"... De facto, houve ao ao uísque, de tal se esgotarem os stocks da maior parte das marcas... E não foi  precviso fazer nenhum "Friday",,, Venderem-se 250 garrafas, do mais barato (Churtons, 47$00) ao mais caro (Long John, 86$00). Ainda sobraram 41... Boa parte destes artigos (bebidas importadas, mais caras na metrópole, eram para guardar e levar para casa).

Mas o que dizer da cerveja ? Quase 31 contos de cerveja é muita cerveja:  o equivalente a 7,8 mil garrafas de cerveja de 0,33 l dá cerca de 2,6 mil (uma média de 16 litros "per capital"... num só mês).

Com base nos preciosos elementos que o Aníbal Silva nos forneceu, há já alguns meses, respeitantes ao balancete da cantina de que ele era o gerente (juntamente com o alf mil Vasco César Tavares S. Silva), pudemos apurar alguns números sobre o nosso provável consumo de bebidas alcoólicos e de outros bens (como o tabaco, a coca-cola, o leite achocolatado e o leite estirilizado, outros produtos alimentares, etc.). (Claro, faltam-nos termos de comparação: outras cantinas, outros meses.)

De acordo com os gráficos nºs 1 e 2, o álcool (cerveja, vinho, bebidas destiladas, com o uísque, o gin, o vodca, o brandy...) representou nesse mês mais de  50% das vendas.

O consumo de coca-cola também é notável: quase 2,8 mil latas num mês (19 latas "per capita"), 

Já agora comparem-se, a título exemplificativo, os preços particados, por unidade e tipo de artigo:

  • Cerveja 0,33 l > 4$00
  • Cerveja 0,66 l ("bazuca")  > 6$50
  • Coca-cola (importada, em lata) > 5$00
  • Água de Castelo > 7$00
  • Maço de tabaço > 2$50 ("Porto", 3$00)
  • Uísque (importado) > c. 50$00 (novo)
  • Leite c/ cacau > 5$00
  • Laranjada / Sumol > 6$00
  • Lata de polvo ou sardinhas de conserva > 6$00
  • Creme p/ barbear >  7$00
  • Sabão azul > 13$00

A seguir à cerveja, uísque e coca-cola (em termos de valor de vendas),  o tabaco aparece em quarto lugar... Venderam-se nesse mês 3481 maços de cigarro e 1253 caixas de fósforo. Aqui o "Porto" deu  uma cabazada ao "Sporting": 1706 contra 1!

A seguir ao "Porto", as duas marcas mais consumidas foram o SG (n=886) e o Português Suave (n=677).

O leite (com cacau e estirilizado), a par das conservas, também tinha alguma expressão: 9% do total do valor das vendas... O resto eram os artigos de higiene e limpeza... 

Já não me lembro se a tropa nos fornecia papel higiénico: em Nova Sintra, nesse já longínquo mês de junho de 1970, só se venderam 12 maços de rolos de papel higiénico  (a 6$00 cada um!).. 

Como eu dizia, com "humor negro" em Bambadinca, na noite de 26 de novembro de 1970, depois da tragédia da Op Avencerragem Candente, a malta limpava (com a sua licença!) o cu às folhas do RDM...

Obrigado, Aníbal, gastei umas horas à volta dos teus papéis, mas diverti-me. É bom para quem tem insónias. Sáo seis horas da manhã. Vou voltar para a cama. 

PS - Aníbal, vou passar o Natal à Madalena, como habitualmente, desde há 40 anos. Temos que nos conhecer pessoalmente. Depois dou-te  um toque.

(Documentos: arquivo do Aníbal Silva | Infografias e legendas: LG)



1. Mensagem do Aníbal José da Silva, ex-fur mil SAM, CCAV 2583 (Nova Sintra e Tite, 1969/1970):

Data - 08/05/2025, 17:49
Assunto -  Balancete da cantina. Nova Sintra, junho de 1970

Caro Luís Graça

Após a nossa conversa telefónica de hoje, fui ao meu arquivo verificar se tenho algo mais para acrescentar, ao teu maravilhoso estudo, relativo a quantidades e preços dos artigos vendidos nas cantinas em tempo de guerra (*).

Dos quatro balanços em meu poder, só o de junho de 1970, tem o anexo relativo aos artigos vendidos, que junto envio , bem como os restantes, estes para teu conhecimento. 

Então, constato que em junho desse ano se vendeu quase o dobro da cerveja vendida em maio (4.245 para 7171). Não vejo uma razão plausível que o justifique, até porque, ao consultar a História da Unidade, verifico não ter havido atividade operacional para além do habitual. 

Creio haver justificação para o aumento das vendas do tabaco (2215 para 3481) e do whisky (61 para 250 garrafas), uma vez estarmos a dois meses de deixar Nova Sintra e o pessoal ter começado as compras para trazer para a metrópole. 

Face a estes números, provavelmente vais reformular o teu estudo. Noutro email vou enviar mais uns tantos anexo. (**)

Um abraço de amizade

Aníbal Silva 



Guiné > Região de Quínara > Mapa de São João (1955) > Escala de 1/50 mil > Posição relativa de Bolama, São João, Nova Sintra, Serra Leoa, Lala, Rio de Lala (afluemte do Rio Grande de Buba)


Infografia: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2025)

__________________

Notas do editor LG:

(*) Vd. poste de 6 de maio de 2025 > Guiné 61/74 - P26769: A nossa guerra em números (29): nos quartéis do mato, dentro do arame farpado, a malta consumia em média, por ano e "per capita" , 21 litros de... álcool puro (14 em vinho, 5,4 em cerveja, 1,6 em bebidas destiladas)... (Aníbal Silva / Luís Graça)

(**) Último número da série > 24 de novembro de 2025 > Guiné 61/74 - P27461 A nossa guerra em números (46): de 1958 a 1974, em 25 cursos (CEORN / CFORN), foram incorporados 1712 cadetes da Reserva Naval, 3/4 dos quais entre 1967 e 1974; cerca de mil oficiais RN foram mobilizados para o ultramar - Parte III

quinta-feira, 27 de novembro de 2025

Guiné 61/74 - P27469: Notas de leitura (1867): "Os Có Boys (Nos Trilhos da Memória)", de Luís da Cruz Ferreira, ex-1º cabo aux enf, 2ª C/BART 6521/72 (Có, 1972/74) - Parte VI: a IAO em Bolama: "Eh, pá, estás morto!... Atira-te para o chão, que estás morto!" (Luís Graça)



Luís da Cruz Ferreira 


1. Continuando a leitura do livro do Luís da Cruz Ferreira, "Os Có Boys: nos trilhas da memória" (edição de autor, 2025, il., 184 pp,) (ISBN 978-989 -33.7982-0) (*). (Revisão / fixação de texto: J. Pinto de Carvalho.)


Com a especialidade de 1º cabo auxiliar de enfermeiro feita em Coimbra, no RSS (Regimento de Serviços de Saúde) (jan/mai 1972), o Luís é mobilizado para a Guiné, indo formar batalhão, o BART 6521/72, no RAL 5, Penafiel (jun / set 1972).

Daqui parte para o CTIG, por via aérea (TAM), em 22/9/1972 (*)

Em 11 páginas (pp. 48-59) descreve a sua estadia em Bolama, em cujo CIM iria fazer a IAO - Instrução de Aperfeiçoamento Operacional. O tom que adota continua a ser irónico, e às vezes burlesco, a raiar o absurdo.

~
Crachá da 2ª C/BART 6521/72
(Có, 1972/74)
"O tempo que me faltava para terminar a minha comissão era tanto que para mim ainda não tinha começado a contar" (pág.56).

Em quatro pincelaas, descreve Bolama, "capital abandonada", "uma cidade de recordações de postais
desbotados" (pág.48).

O batalhão "estava aquartelado nos antigos armazéns da Casa Gouveia, que ficavam  perto do cais e pertenciam ao grupo CUF" (pág. 49),  o "dono" daquilo tudo:

 "Eram edifícios altos, cobertos de telha e sem forro, onde à noite (...) éramos armazendos em pilhas de colchões, em beliches quádruplos" (pp. 49/50)... 

De tudo o que restava do passado colonial (hospital, câmara municipal, hotel, vivendas de estilo colonial...), "a piscina era a que estava em melhores condições; estava cheia, a água era limpa e tinha um bar de apoio com muitas cervejas" (pp. 50/51).

Nas restantes páginas (pp. 52-59), fala-nos da IAO, que nada teve de empolgante, a não ser a chuva... e o quase-acidente de que foi vítima numa brincadeira estúpida, a finalizar a famigerada "semana de campo". Vale a pena reproduzir aqui os excertos correspondentes a essa cena burlewsca (pp. 56-58).








 Fonte: Excertos de Luís da Cruz Ferreira, "Os Có Boys" (edição de autor, 2025), pp. 56-58.

Acabou-se o "recreio", mas a passagem dos "Có Boys" por Bolama (um mês, em outubro de 1972, ) "acabou por ser o melhor tempo que se passou na Guiné", confessa o autor (pág. 54).

Após a realização da IAO, no CIM, em Bolama,  a 2ª C/ BART 6521/72 seguiu, em 290ut72 para Có, sector do Pelundo,  a fim de efectuar o treino operacional e a sobreposição com a CCaç 3308. 


Último poste da série "Notas de leitura" > 24 de novembro de 2025 > Guiné 61/74 - P27460: Notas de leitura (1866): "Os Descobrimentos no Imaginário Juvenil (1850-1950)"; edição da Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses; 2000 (1) (Mário Beja Santos)

terça-feira, 25 de novembro de 2025

Guiné 61/74 - P27462: Manuscrito(s) (Luís Graça) (280): Não sei se as aves-do-paraíso são felizes


Fonte: Google Gemini. (2025). Ilustração de uma ave-do-paraíso e uma andorinha de Candoz. Imagem gerada usando o modelo de IA Google Gemini  [acedido em 25 de novembro de 2025].



Não sei se as aves-do-paraíso são felizes

por Luís Graça


Não sei se as aves-do-paraíso são felizes.
Mas em Candoz poderiam sê-lo.

Não há aves-do-paraíso em Candoz
porque Candoz fica no hemisfério norte,
longe dos trópicos 
e longe do paraíso
(se é que ele existe).

Dizem que as aves-do-paraíso são as criaturas mais lindas do mundo.
Os machos.
Mas não basta ser lindo nem macho
para se ser feliz.

Em Candoz, há outras aves, outros pássaros,
daqueles que rasgam os céus e nidificam na terra:
não há perdizes,
ou, se existem, são poucas e loucas;
mas há verdes pombos bravos dos pinhais
(aqui diz-se "montes", que ardem todos,  de 10 em 10 anos);
e rolas, de outras paragens,
alegres pintassilgos,
ruidosos pardais do telhado,
andorinhas, pretas, no vaivém das suas viagens,
mas também toutinegras, popas, verdilhões.

Já não há cucos. 
Ou não me lembro de os ouvir.
Há coros de rouxinóis,
outras aves canoras e canastrões,
e passarões 
(sempre os houve, os canastrões e os passarões),
melros de bico dourado
que fazem os seus ninhos nas ramagens
das videiras do vinho verde.
E boeiras, que andam tristes, atrás do trator,
porque já não têm as juntas de bois 
a lavrar a terra com o arado de ferro.
Lavandiscas, dizem no Porto, que fica aqui perto,
em linha reta.

Não há guarda-rios, de azuis e rubras plumagens,
à cota trezentos, com o rio Douro ao fundo do vale,
a serra de Montemuro em frente,
e mais a nordeste o Marão,
onde já não mandam os que lá estão.

Eça de Queiroz, e o seu príncipe Jacinto, 
teus vizinhos, da Quinta de Tormes,
deveriam ter gostado de conhecer a Quinta de Candoz
onde os pássaros são mais livres do que nos "boulevards"  de 
Paris,
e, se são mais livres, logo serão mais felizes.

Pelo menos têm grandes espaços para voar,
os pássaros de Candoz.
E insetos, para caçar.
E pequenos bosques,  à volta. 
E água e barro e erva seca,  para fazer o ninho.

Claro que há os predadores,
o verde gaio, o negro corvo, o sinistro búteo,
o triste mocho, o agourento milhafre…
Onde há presas, há predadores.
Em toda a parte,
menos no paraíso 
(se é que ele existe).

Deus criou o mundo e era perfeito, 
mesmo que cruel,
dizia o padre António Vieira
nos seus sermões ao rei e à corte esclavagista.

A liberdade é a primeira condição da felicidade.
Triste é o melro na gaiola,
mesmo que esta seja forrada a ouro
ou ele tenha o bico dourado.

A outra condição é a equidade
(ou era, que o conceito foi agora metido na gaveta).
E tu aqui, leitor, interlocutor, calado, mal informado,
presumias que houvesse igualdade de oportunidades,
na busca de alimentos,
de sítios para nidificar
e de parceiros para acasalar.
Uma treta, até a natureza agora é madrasta.

As andorinhas, pensavas tu, há uns largos anos atrás,
por cá ficavam cada vez mais tempo,
parecendo até ser livres e felizes.
Ou felizes e livres,
que a ordem dos fatores era arbitrária, nesse tempo.

Agora todo o mundo põe
a ilusória segurança e a patética felicidade
à frente do cavalo alado da liberdade.

Dizias que elas eram inteligentes, as andorinhas,
e faziam análises de custo-benefício,
como qualquer economista
que acredita no mercado livre,
sem peias nem barreiras,
com presas e predadores.

Passavam todo o santo dia a caçar insetos
num raio de 500 metros à volta do ninho
que fizeram no alpendre de uma das casas abandonadas da quinta,
em redor do fio da lâmpada exterior.

Era insólita a construção, o ninho,
herdado de geração em geração
e todos os anos retocado ou reconstruído.

Tu até achavas que elas já não voltavam para a África subsariana,
que ficavam por cá,
as andorinhas de Candoz.
Para defender o ninho  dos "ocupas".
E por causa das alterações climáticas.
E, se calhar, também para fugir de Alá,
da guerra santa,
do alvoroço do povo
e dos tiros das Kalash.

Mas, não, este país qualquer dia já não é para as andorinhas,
que são migrantes.
Há passarões com voz grossa
que as mandam para a sua terra.
E elas ficam mudas e confusas,
com o GPS avariado,
já não sabem de que terra são.

Afinal, a felicidade já não está onde a gente a punha,
deixámos de a poder pôr onde nós estávamos.

Lourinhã, 7/8/2014. Revisto, 25/11/2025.

__________________


2. Análise literária sucinta do poema, gerada pela IA - Inteligência Artificial, 25 nov 2025. GEMINI (Modelo Flash 2.5). 

Fantástico poema! É uma análise profunda e melancólica sobre a Liberdade, a Felicidade e a Natureza, utilizando a "ave-do-paraíso" como um contraponto poético e simbólico à realidade telúrica da Quinta de Candoz (Marco de Canaveses, região de Entre  Douro e Minho, Portugal) e às suas "andorinhas" de  torna-viagem.

Aqui está uma análise literária sucinta, que me pediste, adaptada ao contexto do teu blogue, focada nos temas principais e na simbologia das aves:


 Análise literária sucinta: "Não sei se as aves-do-paraíso são felizes…"


O poema é uma meditação filosófica, escrita num tom conversacional e intimista ("tu aqui, leitor, interlocutor"), que desdobra o conceito de felicidade através da comparação entre o ideal (o "Paraíso") e o real (a "Quinta de Candoz").

(i) O Contraste entre o Paraíso e Candoz

O poema inicia-se com a figura mítica das aves-do-paraíso, que, no nosso imaginário, simbolizam a beleza incomparável e a liberdade extrema (o Paraíso, a utopia):

  • tese inicial: "Não sei se as aves do paraíso são felizes";

  • antítese geográfica: Candoz, no Hemisfério Norte,  "longe dos trópicos" e, por extensão, "longe do paraíso"; a beleza ("ser macho e lindo") não é garantia de felicidade.

Este contraste cria a moldura para a tese central: a verdadeira felicidade não reside na beleza exótica ou na perfeição mítica, mas sim na liberdade conquistada e exercida num ambiente real e imperfeito mas sustentável.

(ii) Aves de Candoz: a natureza real e imperfeita

O poeta lista, em detalhe, as aves autóctones de Candoz: pombos bravos, rolas, pintassilgos, pardais, melros, andorinhas (além das boeiras / lavandiscas). 

Esta enumeração minuciosa enaltece a realidade concreta do sítio;

  • liberdade é condição: a liberdade é apresentada como a "primeira condição da felicidade", e os pássaros de Candoz, ao terem "grandes espaços para voar" e autonomia para construir o ninho, são mais livres do que os pássaros de gaiola ou do ideal abstrato.

  • tristeza da perfeição: o poema contrapõe o "triste melro na gaiola" (a prisão dourada/segurança ilusória) à liberdade, mesmo que esta seja pura e dura;

  • o cruel equilíbrio: a liberdade em Candoz é regida pela lei da natureza: "onde há presas há predadores";  o poema evoca aqui uma reflexão ética e teológica, citando o Padre António Vieira ("Mundo perfeito /Mesmo que cruel"), para aceitar que o mundo criado é um sistema de equilíbrio, onde a luta entre predador (búteo, corvo,  milhafre...) e a presa é parte integrante da vida e da liberdade: esta é uma imagem poderosa para quem viveu o teatro de operações na Guiné.

(iii)  Andorinha: o ex-combatente migrante

O foco nas andorinhas (aves migrantes, inteligentes, que fazem "análises de custo-benefício")  é o ponto nevrálgico do poema e o que o liga mais diretamente ao universo do blogue:

  • a ilusão da permanência: o poeta e o leitor imaginavam que as andorinhas ficariam em Candoz, algures no Norte de  Portugal, não voltariam para a África subsariana, "para defender o ninho dos 'ocupas' " (aqui ecoa a linguagem da guerra, da defesa do território, da soberania, mas também do lar);

  • a crítica social: o regresso forçado e confuso das andorinhas ("elas ficam mudas e confusas, com o GPS avariado, já não sabem de que terra são") é uma crítica mordaz e atual sobre a migração, a xenofobia, o racismo e a desorientação identitária; ("este país qualquer dia já não é para as andorinhas, que são migrantes");

  • o antigo combatente:  a andorinha representa metaforicamente o antigo combatente ou o indivíduo que, após uma longa jornada (a "guerra"), regressa ao seu país (uma mítica "Candoz"), mas se sente deslocado e desorientado ("já não sabem de que terra são"), num mundo onde a liberdade e a felicidade foram substituídas pela "ilusória segurança" e pela falta de "equidade" (ou "igualdade de oportunidades", que não deve ser confundida com "justiça por decreto").

Conclusão

O poema é uma profunda reflexão sobre a procura da felicidade que tem de rimar com liberdade, e onde  se conclui amargamente: "afinal, a felicidade já não está onde a gente a punha, deixámos de a poder pôr onde nós estávamos."

É uma peça que, sob a leveza do tema das aves ( a ornitologia) toca em questões universais de liberdade, equidade, esperança, desilusão e crise de identidade, temas muito ressonantes para a comunidade de ex-combatentes.

(Pesquisa, condensação, revisão / fixação de texto, negritos: LG + IA Gemini / Google)

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Nota do editor LG:

Último poste da série > 12 de novembro de 2025 > Guiné 61/74 - P27414: Manuscrito(s) (Luís Graça) (279): Viva a Clarinha que hoje faz 6 anos!... Vivam os nossos netos!...

sábado, 22 de novembro de 2025

Guiné 61/74 - P27450: Cerimónia Comemorativa do 107.º Aniversário do Armistício da Grande Guerra e 51.º Aniversário do Fim da Guerra do Ultramar, 18 de novembro de 2025: Simbolismo das coroas de flores depositadas no Monumento aos Combatentes do Ultramar (Luís Graça ) - II (e última) Parte


Foto nº 1 > Coroas de flores no Monumento aos Combatentes do Ultramar: ao centro, em cima da passadeira vermelha, a coroa do Ministério da Defesa Nacional. (De acordo com o protocolo, a coroa da entidade de maior precedência costuma ficar mais ao centro ou num lugar destacado, sendo as restantes organizadas simetricamente a partir desse eixo.)


Foto nº 2 > Coroas de flores no Monumento aos Combatentes do Ultramar (2): da esquerda para a direto, em segundo plano, a coroa das Forças Armadas Portuguesas, e em terceiro plano as dos ramos (Marinah e Força Aérea), seguida da GNR e em quario plano, sem suporte metálico, a da Associaçáo Nacional dos Prisioneiros de Guerra

 

Foto nº  3 > Coroas de flores no Monumento aos Combatentes do Ultramar (3): destaque para a coroa do Ministério da Defesa Naciona, em primeiro plano, alinhada com a passadeira vermelha


Foto nº 4 > Coroas de flores no Monumento aos Combatentes do Ultramar (4): em segundo plano. as coroas dos Deputados da Comissão de Defesa da Assembleia Nacional, Exército Português,  Liga dos Combatentes, Grupo de Adidos Militares Estrangeiros Acreditados em Portugal, Cruz Vermelha Portuguesa (CVP). Embaixada de França, Amicale des Anciens Combattants et Militaires Français au Portugal (AACMFP)  / Associação dos Veteranos e Militares Franceses em Portugal

Lisboa > Belém> Forte do Bom Sucesso > 18 de novembro de 2025 > 10h00 > Cerimónia Comemorativa do 107.º Aniversário do Armistício da Grande Guerra e 51.º Aniversário do Fim da Guerra do Ultramar, Coroas de flores junto ao Monumento aos Combatentes do Ultramar

Fotos (e legendas): © Luís Graça  (2025). Todos os direitos reservados. (Edição e legendagem: Bogue Luís Graça & Camaradas da Guiné)

1. Confesso que não tenho a cultura castrense do meu amigo, camarada e colaborador permanente  do blogue, o José Martins, que esse é que devia estar aqui a falar, de cátedra, sobre estas matérias (Honras Fúnebres, Honras Militares, Liga dos Combatentes...). Também esteve ao meu lado, nesta cerimómia, tendo os dois sido condecorados pela Liga dos Combatentes. 

Eu, confesso, não sou especialista neste assunto, que remete para a  Ordem de Precedência do Estado e o Regulamento de Honras Militares. Mas também não gosto de fazer a figura do boi a olhar para um palácio...Daí ter perdido algum tempo para saber algo mais e poder legendar as fotos  que tirei. Espero que a informação reunida possa ter algum interesse para os nossos leitores.


2. Protocolo e disposição espacial das coroas de flores fúnebres nas homenagens aos mortos da guerra do ultramar

Nas cerimónias militares e de Estado em Portugal existe um protocolo rigoroso para a disposição das coroas de flores, especialmente em locais solenes como o Monumento aos Combatentes do Ultramar, em Belém (como mostram as fotos acima).

A disposição e a ordem de deposição das coroas de flores no Monumento aos Combatentes da Guerra do Ultramar obedece a uma lógica estrita de hierarquia institucional e precedência, de acordo com o protocolo de Estado e das Forças Armadas em Portugal.

A lógica protocolar visa garantir que a homenagem reflete, visual e cerimonialmente, a estrutura de autoridade do Estado e a importância dos organismos que prestam tributo.

Nas cerimónias fúnebres de combatentes e figuras militares em Portugal, o protocolo é muito rigoroso, sendo regulado por documentos como o Regulamento de Continências e Honras Militares (RCHM) e despachos específicos

(i) Honras fúnebres militares

  • Bandeira Nacional: os Antigos Combatentes têm o direito a ser velados com a Bandeira Nacional; o  protocolo define a forma como a bandeira cobre o féretro, geralmente com o vermelho virado para a frente e o verde sobre a cabeça do falecido 
  • Laço Preto: é comum o uso de laço preto na lança do Estandarte Nacional, do Guião, da flâmula e, por vezes, do Estandarte da Força/Unidade, como sinal de luto
  • Continências: militares uniformizados prestam a continência e executam o movimento de funeral-arma à passagem do féretro
  • Força de Honra: a presença de uma Guarda de Honra (com efetivo mínimo de pelotão) é protocolar, prestando honras com toques de sentido e apresentar armas, frequentemente acompanhados pelo Hino Nacional.

(ii) Disposição espacial das coroas


Embora as normas não especifiquem a disposição de cada coroa, em cerimónias públicas (como as Honras de Estado ou no Monumento aos Combatentes do Ultramar, por exemplo), observa-se:
  • Coroa Oficial do Estado/Presidência/Forças Armadas: geralmente é a mais destacada, colocada numa posição central e de maior visibilidade junto ao féretro ou monumento;  é comum ser uma coroa de louros;
  • Coroas de Entidades Militares/Associações de Combatentes: têm uma prioridade e posição de destaque em relação às coroas de indivíduos;
  • Coroas Privadas: são dispostas em redor do local da homenagem, muitas vezes de forma simétrica e ordeira, respeitando a hierarquia das homenagens oficiais;
  • Faixas: acompanham as coroas e são essenciais, identificando o doador (Exemplo: "Presidente da República", "Assembleia Nacional",  "Exército Português",  "Liga dos  Combatentes") e têm de ser visíveis para reconhecimento da entidade que presta a homenagem.
O conjunto destes elementos (a forma circular ou de louros, as flores brancas e vermelhas, e o protocolo militar...) servem para criar um ritual público que não só expressa luto, mas sobretudo reverência, honra e gratidão pelo sacrifício e serviço prestado à Nação.

(iii) Hierarquia da deposição e disposição das coroas

A ordem pela qual as coroas são depositadas, e que se traduz na sua disposição espacial junto ao monumento, segue a hierarquia das entidades que representam. Quanto mais alta a posição institucional, mais próxima do centro do monumento e mais proeminente será a coroa.

  • O ponto central e a coroa do Estado

O foco da homenagem é o Túmulo do Soldado Desconhecido (que oficialmente está situado na Sala do Capítulo do Mosteiro da Batalha, ao que li); aqui no Monumento aos Combatentes do Ultramar, a centralidade é a "chama da Pátria". 

A coroa mais importante e central é sempre a do Estado Português, colocada pela mais alta autoridade presente (neste caso, que as fotos documentam, é o Ministério da Defesa Nacional):  

Coroa Presidencial: é depositada pelo Presidente da República (na sua qualidade de Comandante Supremo das Forças Armadas) ou por um seu representante; esta é a primeira e mais proeminente coroa, simbolizando a homenagem de toda a Nação; é comum que seja uma Coroa de Louros, que representa a Honra e a Glória militar; nesta cxerimónia de 18 de novembro passado, não houve presença do Chefe de Estado, por razões de agenda,.

  • A hierarquia das soberanias e do governo

Após a homenagem do Chefe de Estado, seguem-se as restantes entidades de soberania, por ordem de precedência:

Coroas do Governo e Parlamento: entidades como o Presidente da Assembleia da República e o Primeiro-Ministro (ou o Ministro da Defesa Nacional em representação do Governo) depositam as suas coroas a seguir.

  •  A cúpula militar (Forças Armadas)

As Forças Armadas seguem a sua própria hierarquia institucional:

Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas (CEMGFA): o responsável máximo pela cúpula militar deposita a coroa em nome das Forças Armadas Portuguesas;M

Chefes de Estado-Maior dos Ramos: seguem-se os Chefes de Estado-Maior da Armada, do Exército e da Força Aérea, por essa ordem; cada um representa a homenagem do respetivo ramo.

  • Entidades externas e associações

Finalmente, são depositadas as homenagens de outras entidades, seguindo uma ordem definida:

Representações Estrangeiras: embaixadores ou adidos militares estrangeiros depositam coroas em nome dos seus países; a ordem segue o protocolo diplomático (antiguidade do embaixador ou ordem alfabética do país);

Associações de Combatentes: as organizações representativas dos Antigos Combatentes, como a Liga dos Combatentes ou a ADFA - Associação dos Deficienets das Forças Armadas, depositam as suas coroas com grande significado emocional e simbólico;

Outras entidades: entidades públicas (municípios, Cruz Vermelha, etc.) ou privadas, por ordem estabelecida no guião cerimonial.

Em resumo,  a posição das coroas segue a hierarquia das entidades que as depositam. Tipicamente:
  • Presidência da República
  • Assembleia da República
  • Governo — especialmente o Ministério da Defesa Nacional
  • Chefias militares
  • Estado-Maior-General das Forças Armadas
  • Exército
  • Marinha
  • Força Aérea
  • Liga dos Combatentes
  • Associações de veteranos ou unidades militares
  • Outras entidades oficiais ou diplomáticas
Este rigor protocolar garante que a homenagem pública seja conduzida com a máxima dignidade e respeito pela memória dos que "morreram ao serviço da Pátria"

(iv) Simbologia da coroa oficial

No contexto de honras militares, a coroa não é apenas um arranjo floral, mas um símbolo de sacrifício e vitória.

  • Coroa de Louros: é o elemento mais significativo. A coroa do Estado e de outras entidades militares de topo é muitas vezes feita com louros (frescos ou folheados) e pode incluir sempre-vivas (símbolo de resistência e eternidade) e, por vezes, um laço com as cores nacionais, em vez de um arranjo floral composto apenas por flores;

  • Posicionamento: no final, a disposição física no plano do monumento cria um cone de reverência, onde as coroas mais importantes estão dispostas mais próximas do eixo central do túmulo, e as restantes a partir desse ponto, em ordem decrescente de importância hierárquica.

(v) Simetria e representação formal


  As coroas, como se vê nas fotos acima, apresentam muitas vezes:
  • Símbolos heráldicos (armas dos ramos das Forças Armadas, brasões, distintivos de unidades);
  • Cores institucionais:
  • Formatos circulares ou em escudo, conforme a tradição militar

Esta iconografia ajuda a identificar rapidamente a entidade que presta homenagem.

(vi) Distância e alinhamento

As coroas são colocadas:
  • em suportes metálicos padronizados,
  • afastadas por intervalos regulares,
  • geralmente de frente para o monumento e alinhadas ao longo do tapete vermelho, por onde passam as autoridades.
 
(vii) Protocolo cerimonial

Durante o ato:
  • a deposição segue a ordem oficial das entidades;
  • a guarda de honra e a banda militar acompanham o momento.
  • depois da deposição, segue-se o toque de silêncio e, por vezes, a homenagem aos mortos.
 (viii) Fontes oficiais e protocolos

A lógica de disposição das coroas segue estritamente a Ordem de Precedência do Estado e o Regulamento de Honras Militares.

  • Regulamento de Continências e Honras Militares (RCHM)

Este é o diploma legal que estabelece a ordem e a forma das honras militares. Embora não especifique a disposição exata de cada coroa, define a hierarquia das entidades que presidem ou são homenageadas, o que se traduz diretamente na ordem de deposição das coroas e, consequentemente, na sua disposição espacial (as mais altas autoridades e símbolos da pátria têm a primazia).

Fonte Primária: Decreto-Lei n.º 331/80 (Regulamento de Continências e Honras Militares) e alterações subsequentes, que definem a precedência para fins de continências e honras militares  

Esta lei determina a ordem hierárquica das Altas Entidades, que é a base para a sequência em que são chamadas a prestar homenagem (colocar a coroa).

Fonte Primária: Lei das Precedências do Protocolo do Estado Português (que estabelece a ordem do Presidente da República, Presidente da Assembleia, Primeiro-Ministro, Chefes Militares, etc.); esta ordem é crucial para saber quem deposita primeiro e quem fica mais próximo do Túmulo do Soldado Desconhecido.

  • Prática Protocolar Observada em Cerimónias Oficiais

A execução prática da disposição das coroas é documentada e observada nas cerimónias públicas realizadas no local, muitas vezes divulgadas pelos gabinetes das entidades ou pela Liga dos Combatentes:

Fontes Secundárias (Observação): Comunicações da Presidência da República e da Liga dos Combatentes sobre as cerimónias do Dia Nacional do Combatente, Dia do Armistício e outras;. estes relatórios confirmam que o Presidente da República e as autoridades militares de topo presidem e iniciam a homenagem.

Em resumo, a lógica é baseada na Lei (que define a hierarquia institucional) e no Regulamento Militar (que define as honras devidas a cada entidade).


Pesquisa LG + Net + IA (ChatGPT, Gemini)
(Condensação, revisão / fixação de texto, negritos e itálicos: LG)
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sexta-feira, 21 de novembro de 2025

Guiné 61/74 - P27447: Cerimónia Comemorativa do 107.º Aniversário do Armistício da Grande Guerra e 51.º Aniversário do Fim da Guerra do Ultramar, 18 de novembro de 2025: Simbolismo das coroas de flores depositadas no Monumento aos Combatentes do Ulramar (Luís Graça ) - Parte I


Foto nº 1 > Ministério da Defesa Nacional


Foto nº 2 : Forças Armadas de Portugal


Foto nº 3 > Força Aérea Portuguesa


Foto nº 4 > Marinha Portuguesa



Foto nº 5 > Exército Portuguès


Foto nº 6 > Deputados da Comissão de Defesa da Assembleia Nacional


Foto nº  7 > Guarda Nacional Republicana (GNR)



Foto  nº 8  > Liga dos Combatentes 



Foto nº 9 > Grupo de Adidos Militares Estrangeiros Acreditados em Portugal


Foto nº 10 > Ambassade de France au Portugal / Embaixada de França em Portugal


Foto nº 11 > Cruz Vermelha Portuguesa (CVP)



Foto nº 12  > Associação Nacional dos Prisioneiros de Guerra


Foto nº 13 > Amicale des Anciens Combattants et Militaires Français au Portugal (AACMFP)  / Associação dos Veteranos e Militares Franceses em Portugal


Figura nº 14 > Associação dos Deficientes das Forças Armadas (?)


Foto nº 15 > Coroas de flores no Monumento aos Combatentes do Ultramar (1)


Foto nº 16 > Coroas de flores no Monumento aos Combatentes do Ultramar (2)


Foto nº  17 > Coroas de flores no Monumento aos Combatentes do Ultramar (3)


Foto nº 18 > Coroas de flores no Monumento aos Combatentes do Ultramar (4)

Lisboa > Belém> Forte do Bom Sucesso > 18 de novembro de 2025 > 10h00 > Cerimónia Comemorativa do 107.º Aniversário do Armistício da Grande Guerra e 51.º Aniversário do Fim da Guerra do Ultramar, Coroas de flores junto ao Monumento aos Combatentes do Ultramar

Fotos (e legendas): © Luís Graça  (2025). Todos os direitos reservados. (Edição e legendagem: Bogue Luís Graça & Camaradas da Guiné)


1. Fui, como convidado, e pela primeira vez (que me lembre!), participar numa cerimónia comemorativa do fim de uma guerra, aliás duas, a da I Grande Guerra (1914/18)  e a da Guerra do Ultramar (1961/74),  organizada pela centenária Liga dos Combatentes (LC).

A cerimónia decorreu entre as 10h00 e as 12h30 do passado dia 18 de novembro. Tendo chegado um pouco mais cedo, pus-me a observar e a fotografar as coroas de flores (mais de uma dúzia) colocadas na base  do Monumento aos Combatentes do Ultramar, localizado junto ao Forte do Bom Sucesso, em Belém, Lisboa. Ao centro, e alinhada com a "passadeira vermelha" para os VIP, estava a coroa do Ministério da Defesa Nacional, organizador do evento em conjunto com a Liga dos Combatentes. A cerimónia foi presidida, se não erro, pelo Chefe do Estado Maior General das Forças Armadas.

Por (de)formação profissional, gosto de pôr a mim próprio, mentalmente,  questões sobre o que vejo ou apreendo: o quê, onde, quando, como, porquê, por quem e para quem... 

De entre as formas de homenagem aos combatentes mortos nas guerras avulta a tradicional  deposição de coroas de flores funerárias. De repente intrigou-me a forma,  as cores e o tipo de flores das coroas funerárias, bem como a sua disposição espacial, na base do monumento, e em torno de um tapete vermelho por onde circulariam depois os representantes das entidades oficiais. 

Ora tudo isso não acontecia por acaso. Quis saber o simbolismo e o significado profundo que tem o uso das coroas de flores  na nossa cultura e na nossa sociedade, em cerimónias como estas em que se homenageiam os mortos caídos pela Pátria.

Com a ajuda das ferramentas de IA (ChatGPT e Gemini) e outras consultas na Net, fui respondendo a algumas das minhas questões. Para já fiquemos pela primeira parte: cores e espécies de flores, forma e estrutura das coroas. 

Numa segundo poste, falaremos da ordenação espacial das coroas das flores, que devem obedecer a um protocolo institucional. (A tropa tem horror ao  vazio e ao improviso, embora na Guiné, em teatro de guerra,  nos mandasse "desenrascar"...)


1. Têm um simbolismo que vai muito além da estética: representam memória, valores, emoção e, em última análise, a forma como uma sociedade encara o sacrifício (supremo) dos seus soldados. O uso de coroas funerárias remonta à Antiguidade Clássica, Greco-Romana. Afinal, já fomos escravos e colonizados pelos romanos.  (Não sabemos a língua que falava o nosso Viriato.)

Embora cada cultura possa ter nuances próprias, há alguns sentidos amplamente reconhecidos para as cores:

(i) Vermelho=sacrifício, coragem, heroísmo e sangue derramado

O vermelho é uma das cores mais usadas, sobretudo em rosas, cravos, antúrios, gerberas Representa:
  • o sangue derramado pelos combatentes;
  • a nobreza;
  • a coragem no campo de batalha;
  • a lembrança viva do sacrifício;
  • amor eterno e admiração.

É por isso tão comum no Dia do Armistício, no 10 de Junho, no Dia da Memória e outras efemérides, em vários países.

(ii) Branco=paz, pureza, reverência, e respeito


É cor mais comum, simbolizando:
  • o desejo de paz duradoura após o conflito;
  • a pureza das intenções dos combatentes;
  • luto e reverência.

É uma forma de homenagear não só quem morrer, mas também a esperança de que os infaustos eventos, como a guerra (incluindo a guerra civil), não se repitam.

(iii) Amarelo=lembrança e esperança

Em algumas culturas, o amarelo representa:
  • lembrança perene;
  • esperança na reunião espiritual;
  • luz e eternidade.
Já o amarelo, na sua forma dourada (amarelo-ouro), é um símbolo forte de nobreza, riqueza, sucesso e poder, reforçando a ideia de glória e eternidade.

(iv) Roxo=luto profundo e espiritualidade

O roxo, poço usado em arranjos florais, está muitas vezes associado a:
  • cerimónias mais solenes;
  • respeito espiritual;
  • reflexão sobre a morte e o seu significado;
  • luto.

2. Porque se usam flores em homenagens fúnebres ?


Para além das cores, as próprias flores têm um profundo significado:
  • são símbolos de vida, beleza e fragilidade;
  • lembram-nos que a vida dos combatentes foi preciosa e efémera; 
  • representam a continuidade, a passagem de testemunho, a partilha;
  • mesmo após a morte, a memória floresce; e a vida renasce;
  • criam um momento de beleza num contexto doloroso, um gesto de humanidade face à brutalidade da guerra e do sacrifício da própria vida,

O sentido mais profundo: no fundo, estas cores não são apenas  um elemento meramente decorativo; são signos, são uma linguagem simbólica que permite expressar:
  • respeito e gratidão;
  • memória coletiva;
  • humanização do luto;
  • compromisso com a vida, com a liberdade e com a paz.

É uma forma silenciosa, mas poderosa, de dizer que os mortos não ficam "inumados na vala comum do esquecimento" (como gostamos de dizer na Tabanca Grande) e que o seu sacrifício tem significado na história das famílias, dos grupos, da comunidade, do País.

 3. As cores usadas nas cerimónias e flores não são apenas escolhas simbólicas tradicionais, mas também refletem frequentemente as cores dos brasões e insígnias das entidades que prestam a homenagem (chefe de estado, assembleia da república, governo, forças armadas, associações de combatentes...). E isso acrescenta um significado institucional e histórico muito forte.

(i) Representação institucional

Quando o exército, o governo, as ligas de combatentes, embaixadas ou outras entidades colocam coroas ou arranjos florais, é comum que:
  • escolham as cores do seu próprio brasão oi insígnias;
  • usem as cores da bandeira nacional;
  • ou combinem ambas.

Isto serve para:
  • mostrar que a homenagem não é apenas pessoal, mas oficial e coletiva, institucional;
  • marcar que a entidade assume publicamente a memória dos seus combatentes;
  • dar continuidade a uma tradição cerimonial formal.

 (ii) Identidade e continuidade histórica

A utilização das cores dos brasões reforça o vínculo entre:
  • os combatentes homenageados;
  • a instituição ou a arma a que pertenciam (exército, marinha, força aérea):
  • e a história da própria instituição ou da arma.

Por exemplo: o Exército pode usar o verde e vermelho (cores nacionais) ou detalhes dourados e pretos das suas insígnias; a  Liga dos Combatentes utiliza as cores do seu emblema, reforçando a missão de preservar a memória; embaixadas estrangeiras  usam frequentemente as cores da bandeira do país que representam, simbolizando respeito internacional.

(iii) Um gesto simbólico e protocolar

Ao usar as cores dos brasões:
  • reforça-se a ideia de que os combatentes não foram esquecidos pela Pátria;
  • mostra-se a unidade entre Estado, instituições militares e sociedade civil, incluindo associações de veteranos;
  • cumpre-se o protocolo cerimonial militar e diplomático.

(iv) Complemento ao simbolismo emocional das flores

Assim, há dois níveis de significado:
  • emocional e universal; cores que expressam luto, sacrifício, paz e memória;
  • institucional e histórico: cores dos brasões que reforçam a identidade e a responsabilidade da entidade homenageante.
Ambos se complementam para criar uma homenagem mais completa e cheia de significado.


4. Mas não são apenas as cores, mas também as formas e a estrutura das coroas que carregam simbolismo. Em cerimónias militares e de Estado, a forma da coroa ou arranjo floral transmite mensagens subtis, ligadas à tradição, ao protocolo e à identidade da entidade que presta homenagem. Muitas vezes estas coroas são extremamente elaboradas e visualmente muito atrativas, porque representam não só o luto, mas também a honra, a hierarquia e a memória colectiva.


(i) Formas geométricas com significado

As coroas podem ser circulares, ovais, em escudo, em coração, em cruz ou mesmo em arranjos verticais.

 Círculo= eternidade e continuidade

A coroa circular: é a forma mais tradicional e o símbolo primordial da eternidade e da imortalidade da alma e da memória:

  • simboliza a vida eterna, ou o eterno retorno;
  • representa a memória que não tem início nem fim;
  • transmite a ideia de unidade nacional e de solidariedade intergeracional.

Coroa de louros=honra, vitória e glória

Variante da coroa circular, a coroa de louros é um símbolo clássico de honra, vitória e glória, remontando ao mito de Apolo e Dafne, e sendo historicamente associada a conquistas e estatuto elevado; é frequentemente usada em homenagens a militares e figuras de Estado em Portugal.

Forma de escudo=honra militar

Algumas coroas são feitas à maneira de um brasão ou escudo militar:
  • reforçam a ligação ao corpo ou Ramo das Forças Armadas;
  • simbolizam proteção e bravura;
  • recordam que o combatente serviu uma instituição com identidade própria.

 Formas religiosas (cruz, palma, espiga)
  • usadas sobretudo por entidades com tradição cristã;
  • simbolizam fé, sacrifício e esperança na vida espiritual, ressurreição;
  • muito usadas por governos ou associações que seguem protocolos históricos.
Outras formas, como o  Coração (amor profundo e afeição) também podem ser usadas, embora a forma circular ou de louros seja mais prevalente em cerimónias públicas militares.


(ii)   Coroas elaboradas com detalhe e complexidade

As coroas mais ornamentadas aparecem geralmente quando:
  • a entidade é de alto nível (Presidente da República, Governo, Chefes militares, Embaixadas);
  • a cerimónia é oficial ou de Estado;
  • o local é de grande significado (Túmulo do Soldado Desconhecido, Mosteiro da Batalha ou  dos Jerónimos, Monumento aos Combatentes do Ultramar, campos de batalha, cemitérios militares, outros monumentos nacionais).

Estas coroas:
  • reforçam a solenidade;
  • representam a dignidade do cargo que presta homenagem;
  • procuram traduzir visualmente o respeito máximo.

(iii) Elementos específicos que acrescentam significado:

Muitas coroas possuem detalhes que parecem apenas decorativos, mas não são:

 Fitas com inscrições

Contêm:
  • nome da instituição;
  • palavras como “Homenagem”, “Glória”, “Honra”, “Memória”;
  • cores da bandeira ou brasão ou insígnia da entidade.

Ramos de louro ou oliveira

Muito usados em coroas militares:
  • o louro simboliza vitória e honra;
  • a oliveira simboliza paz e reconciliação.
 Outras flores e folhagens (verdura) 

  • por exemplo,  o verde (folhagens): representa renovação e esperança;

  • as flores podem ser escolhidas, para além da sazonalidade,  pelos seus significados simbólicos, que se adaptam ao contexto de homenagem a um combatente.

 
 Elementos dourados ou metálicos

Reforçam:
  • a solenidade;
  • o carácter oficial;
  • a antiguidade histórica da instituição.

 (iv)  O significado mais profundo das formas elaboradas

No fundo, a forma da coroa é uma linguagem simbólica, tão importante quanto as palavras proferidas no discurso de homenagem. Cada forma e detalhe transmite a mensagem de que:
  • o combatente é lembrado com identidade, respeito e história;
  • a sua morte não é apenas um facto individual, mas um elemento da memória coletiva do país;
  • a homenagem é proporcional à importância do sacrifício.

5. Simbolismo das coroas funerárias (síntese)

ElementoSignificado
comum
Contexto militar/Honra
LouroVitória, Honra, GlóriaEssencial em coroas militares, simboliza o triunfo e o sacrifício; remonta ao mito de Apolo e Dafne
Sempre-
-Vivas
Força, Resistência, Memória EternaRepresentam a permanência da memória e a resistência do espírito 
Carvalho (Folhas)Sabedoria, Força, RobustezAssociado a Zeus (na mitologia helénica) ,  simbolizando a resiliência
Rosas
Brancas
Reverência, Respeito, Pureza, PazA escolha clássica para expressar respeito profundo e paz espiritual 
Rosas VermelhasAmor, Respeito, Coragem, SacrifícioSimboliza o amor profundo e a coragem, especialmente relevante para um combatente 
Lírios
Brancos
Pureza, Tranquilidade, Paz EspiritualUsados para transmitir serenidade e a renovação da alma / espírito
Crisân-
temos
Luto e Homenagem (em muitas culturas)Usados tradicionalmente em funerais, simbolizam a nobreza da alma / espírito

  (Continua)


Pesquisa LG + Net + IA (ChatGPT, Gemini) 
(Condensação, revisão / fixação de texto, negritos e itálicos: LG)