Um dos muitos anúncios de casas comerciais que existiam na Guiné em 1956. A empresa Aly Souleiman & Companhia, com sede em Bissau, tinha filiais em diversos pontos do território da Guiné, de norte a sul, incluindo Bafatá e Gadamael.
"Aly Souleiman (apelido grafado à francesa...), e não "Ali Suleimane" (à portuguesa) era um próspero comerciante sírio-libanês, já citado pelo repórter Norberto Lopes em 1947 aquando da sua visita a Bafatá...
O acrónimo da empresa era ASCO, tal como o seu endereço telegráfico (*)... Algumas das mais importantes empresas estrangeiras, e nomeadamente as de origem francesas, com negócios no Senegal e na Guiné portuguesa, usavam acrónimos ou siglas: NOSOCO, SCOA, CFAO...
Está, definitivamente, explicado o mistério do acrónimo ASCO que aparece num edifício de Gadamael, e sobre o qual gastámos alguns bons KB...
Foto: © Màrio Vasconcelos (2015). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]
Guiné > Região de Tombali > Gadamael > CART 2410 (1968/69) > Messe e quarto de sargentos... Foi também, até ao início da guerra o edifício da filial local da empresa ASCO - Aly Souleiman & Conpanhia... O durante muito tempo o enigmático acrónimo (ou sigla) A.S.C.O. ainda já estava nessa época. (e ainda hoje lá está) , ao cima da parede lateral direita (*).
Foto (legenda): © Luís Guerreiro (2010). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]
1. Norberto Lopes (Vimioso, 1900-Linda A Velha, Oeiras, 1989) foi um notável jornalista e escritor, tendo estado entre outros ao serviço do "Diário de Lisboa", onde foi chefe de redação, desde 1921, cronista e grande repórter, além de diretor (entre 1956 e 1967). Saiu do "Diário de Lisboa" para cofundar em 1967 o vespertino "A Capital" (que dirigiu até 1970, ano em que se jubilou).
Mestre do jornalismo na época da censura, transmontano de
alma e coração,. sempre se bateu pela liberdade de expressão, que considerou a maior conquista do 25 de Abril. Entre a suas obras publicadadas, destaque-se:"Visado pela Censura: A Imprensa, Figuras, Evocações da Ditadura à Democracia "(1975). Aprendeu a lidar com a censura e os censores e a escrever nas entrelinhas.
Em sua honra e memória, foi criado pela Casa de Imprena o Prémio Norberto Lopes de Reportagem de Imprensa. Claro, conciso, preciso. objetivo e imparcial... são alguns dos atributos da sua escrita e do seu estilo como repórter da imprensa escrita, um dos maiores do nosso séc. XX português. Foi. além disso, um grande amigo da Guiné e dos guineenses. Tal como nós, também ele bebeu a água do Geba...
Já aqui publicámos uma nota de leitura sobre o seu livro "Terra Ardente -Narrativas da Guiné". (Lisboa, Editora Marítimo-Colonial, 1947, 148 pp. + fotos) (**).
Sobre o livro, o nosso crítico literário Beja Santos escreveu o seguinte:
"(...) Visitou a Guiné, como jornalista por ocasião das celebrações do 5.º centenário do seu descobrimento. Do que viu e sentiu publicou uma série de artigos e depois enfeixou-os sob o título de Terra Ardente. É uma prosa afogueada, sem fazer tagatés aos poderes do dia mas sem esconder a profunda admiração pelo trabalho do seu amigo Comandante Sarmento Rodrigues.
(...) Convém recordar que Norberto Lopes tinha da Guiné um termo de comparação, visitara-a cerca de 20 anos antes. Agora, mostra o seu entusiasmo (...)' É incontestável que a Guiné está no limiar de uma era nova. Quem tenha percorrido, como eu, o interior da colónia e admirado alguns dos aspectos mais salientes do progresso realizado nos últimos tempos, não pode deixar de reconhecer que está a escrever na Guiné uma página nova e brilhante em matéria de administração colonial'. (...)
Recorte do "Diário de Lisboa" (diretor: Joaquim Manso), nº 8708, ano 26, terça feira, 25 de fevereiro de 1947, pp. 1 e 3 .
Cortesia de portal Casa Comum > Fundação Mário Soares > Arquivos > Diário de Lisboa / Ruella Ramos > Pasta: 05780.044.11059
Citação:
Citação:(1947), "Diário de Lisboa", nº 8708, Ano 26, Terça, 25 de Fevereiro de 1947, CasaComum.org, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_22398 (2017-9-20)
(***) Vd. poste de 19 de março de 2017 > Guiné 61/74 - P17155: Historiografia da presença portuguesa em África (72): Subsecretário de Estado das Colónias em visita triunfal à Guiné, de 27/1 a 24/2/1947 - Parte I: A consagração do governador geral, o comandante Sarmento Rodrigues, como homem reformador e empreendedor (Reportagem de Norberto Lopes, "Diário de Lisboa", 27/1/1947)
(****) Último poste da série > 20 de setembro de 2017 > Guiné 61/74 - P17782: Historiografia da presença portuguesa em África (91): 1ª Exposição Colonial Portuguesa, Porto, 1934: parte do seu sucesso foi devido à Rosinha Balanta, 'exposta ao vivo', e ao seu fotógrafo, o portuense Domingos Alvão (1872-1946)
alma e coração,. sempre se bateu pela liberdade de expressão, que considerou a maior conquista do 25 de Abril. Entre a suas obras publicadadas, destaque-se:"Visado pela Censura: A Imprensa, Figuras, Evocações da Ditadura à Democracia "(1975). Aprendeu a lidar com a censura e os censores e a escrever nas entrelinhas.
Já aqui publicámos uma nota de leitura sobre o seu livro "Terra Ardente -Narrativas da Guiné". (Lisboa, Editora Marítimo-Colonial, 1947, 148 pp. + fotos) (**).
Sobre o livro, o nosso crítico literário Beja Santos escreveu o seguinte:
"(...) Visitou a Guiné, como jornalista por ocasião das celebrações do 5.º centenário do seu descobrimento. Do que viu e sentiu publicou uma série de artigos e depois enfeixou-os sob o título de Terra Ardente. É uma prosa afogueada, sem fazer tagatés aos poderes do dia mas sem esconder a profunda admiração pelo trabalho do seu amigo Comandante Sarmento Rodrigues.
(...) Convém recordar que Norberto Lopes tinha da Guiné um termo de comparação, visitara-a cerca de 20 anos antes. Agora, mostra o seu entusiasmo (...)' É incontestável que a Guiné está no limiar de uma era nova. Quem tenha percorrido, como eu, o interior da colónia e admirado alguns dos aspectos mais salientes do progresso realizado nos últimos tempos, não pode deixar de reconhecer que está a escrever na Guiné uma página nova e brilhante em matéria de administração colonial'. (...)
Enfim, diz Beja Santos, "há momentos em que o jornalista sem contenção mostra-se lavrante da prosa, aprimora o que em princípio é o espartilho do espaço da reportagem" (...)
Pois está na altura de dar a conhecer, um pouco mais, o trabalho de Norberto Lopes, sobre a Guiné ao tempo do governador geral Sarmento Rodrigues (***). O livro, "Terra Ardente", não é de fácil acesso, para a generalidade dos nossos leitores, mas em contrapartida as suas reportagens publicadas do "Diário de Lisboa" podem ser lidas no portal Casa Comum, da Fundação Mário Soares.
Pois está na altura de dar a conhecer, um pouco mais, o trabalho de Norberto Lopes, sobre a Guiné ao tempo do governador geral Sarmento Rodrigues (***). O livro, "Terra Ardente", não é de fácil acesso, para a generalidade dos nossos leitores, mas em contrapartida as suas reportagens publicadas do "Diário de Lisboa" podem ser lidas no portal Casa Comum, da Fundação Mário Soares.
2. Recuperámos e publicamos com a devida vénia, a narrativa nº 8, relativa à viagem Bolama-Bafatá... A reportagem foi originalmente publicada no "Diário de Lisboa", em 25/2/1947.
Síntese:
(i) Norberto Lopes deixa Bolama, agora decadente, que ele conhecera, há anos atrás, ainda com o estatatuto de capital da Guiné, sob o governo de Velez Caroço, personagem que admira;
(ii) segue, cambando o Rio Grande, para São João e Fulacunda;
(iii) a decadência dos biafadas leva-o a refletir sobre o risco de crescente "islamização" dos povos da Guiné e a necessidade de apostar forte numa política de integração dos povos ribeirinhos, animistas (balantas, felupes, papéis, bijagós...);
(iv) dali segue para Buba, Xitole e Bambadinca, atravessando o rio Corubal de canoa, dado o colapso de um setor da ponte General Carmona, logo depois da sua inauguração (1937);
(v) fala dos problemas de comunicação no território, de difícil resolução, o que é ilustrado com uma incrível foto de uma "ponte de estacaria" na estrada Gabu-Pirada (e não Tirada, evidente gralha tipográfica);
(vi) do outro lado do rio Corubal está uma carrinha "Austin" que o levará a Bambadinca e Bafatá, passando pelo Xitole, sendo esta região descrita como uma das mais férteis e prósperas da Guiné;
(vii) Bambadinca é referida como uma "florescente povoação" e "importante centro comercial" mas é Bafatá que lhe enche os olhos;
(viii) aqui produzia-se na altura cerca de 14 mil toneladas de mancarra por ano, metade do total da produção da colónia;
(ix) vila desde 1918, Bafatá destronara a histórica vila de Geba, tornando-se o segundo maior centro populacional e o maior entreposto comercial do território;
(x) são citadas duas grandes casas comerciais, que florescem na capital da mancarra; a Aly Souleimane & Companhia, de origem sírio-libanesa (***), e a Barbosa & Comandita, de origem cabo-verdiana.
A descrição da vila de Bafatá e dos seus progressos termina com a seguinte nota de belo recorte literário:
“À noite acende-se a luz eléctrica. Já corre a água nos marcos fontenários. Trilam ralos. Coaxam sapos. Chiam morcegos. Silvos agudos anunciam a proximidade do mato, porque, em qualquer povoação da Guiné em que se estejam, a selva nunca está distante e faz sempre valer os seus direitos milenários”.
Como diríamos hoje, a Guiné do tempo de Sarmento Rodrigues (****) também teve a sorte de ter uma "boa imprensa"... Muito melhor, de resto, da que tem hoje, infelizmente, a Guiné-Bissau. (LG)
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Síntese:
(i) Norberto Lopes deixa Bolama, agora decadente, que ele conhecera, há anos atrás, ainda com o estatatuto de capital da Guiné, sob o governo de Velez Caroço, personagem que admira;
(ii) segue, cambando o Rio Grande, para São João e Fulacunda;
(iii) a decadência dos biafadas leva-o a refletir sobre o risco de crescente "islamização" dos povos da Guiné e a necessidade de apostar forte numa política de integração dos povos ribeirinhos, animistas (balantas, felupes, papéis, bijagós...);
(iv) dali segue para Buba, Xitole e Bambadinca, atravessando o rio Corubal de canoa, dado o colapso de um setor da ponte General Carmona, logo depois da sua inauguração (1937);
(v) fala dos problemas de comunicação no território, de difícil resolução, o que é ilustrado com uma incrível foto de uma "ponte de estacaria" na estrada Gabu-Pirada (e não Tirada, evidente gralha tipográfica);
(vi) do outro lado do rio Corubal está uma carrinha "Austin" que o levará a Bambadinca e Bafatá, passando pelo Xitole, sendo esta região descrita como uma das mais férteis e prósperas da Guiné;
(vii) Bambadinca é referida como uma "florescente povoação" e "importante centro comercial" mas é Bafatá que lhe enche os olhos;
(viii) aqui produzia-se na altura cerca de 14 mil toneladas de mancarra por ano, metade do total da produção da colónia;
(ix) vila desde 1918, Bafatá destronara a histórica vila de Geba, tornando-se o segundo maior centro populacional e o maior entreposto comercial do território;
(x) são citadas duas grandes casas comerciais, que florescem na capital da mancarra; a Aly Souleimane & Companhia, de origem sírio-libanesa (***), e a Barbosa & Comandita, de origem cabo-verdiana.
A descrição da vila de Bafatá e dos seus progressos termina com a seguinte nota de belo recorte literário:
“À noite acende-se a luz eléctrica. Já corre a água nos marcos fontenários. Trilam ralos. Coaxam sapos. Chiam morcegos. Silvos agudos anunciam a proximidade do mato, porque, em qualquer povoação da Guiné em que se estejam, a selva nunca está distante e faz sempre valer os seus direitos milenários”.
Como diríamos hoje, a Guiné do tempo de Sarmento Rodrigues (****) também teve a sorte de ter uma "boa imprensa"... Muito melhor, de resto, da que tem hoje, infelizmente, a Guiné-Bissau. (LG)
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Cortesia de portal Casa Comum > Fundação Mário Soares > Arquivos > Diário de Lisboa / Ruella Ramos > Pasta: 05780.044.11059
Citação:
Citação:(1947), "Diário de Lisboa", nº 8708, Ano 26, Terça, 25 de Fevereiro de 1947, CasaComum.org, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_22398 (2017-9-20)
[Seleção, montagem dos recortes, edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]
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Notas do editor:
(*) Vd. poste de 20 de janeiro de 2015 > Guiné 63/74 - P14165: Memória dos lugares (283): Gadamael... O enigma da palavra ASCO que consta de um edifício em ruínas (que era messe de oficiais no tempo da CART 2410...) pode estar decifrado: seria o acrónimo da casa comercial Aly Souleiman & Companhia que existia em 1956 (Luís Graça / Mário Vasconcelos)
(**) Vd. poste de 14 de novembro de 2011 > Guiné 63/74 - P9039: Notas de leitura (302): Terra Ardente - Narrativas da Guiné, de Norberto Lopes (Mário Beja Santos)
(*) Vd. poste de 20 de janeiro de 2015 > Guiné 63/74 - P14165: Memória dos lugares (283): Gadamael... O enigma da palavra ASCO que consta de um edifício em ruínas (que era messe de oficiais no tempo da CART 2410...) pode estar decifrado: seria o acrónimo da casa comercial Aly Souleiman & Companhia que existia em 1956 (Luís Graça / Mário Vasconcelos)
(**) Vd. poste de 14 de novembro de 2011 > Guiné 63/74 - P9039: Notas de leitura (302): Terra Ardente - Narrativas da Guiné, de Norberto Lopes (Mário Beja Santos)
(****) Último poste da série > 20 de setembro de 2017 > Guiné 61/74 - P17782: Historiografia da presença portuguesa em África (91): 1ª Exposição Colonial Portuguesa, Porto, 1934: parte do seu sucesso foi devido à Rosinha Balanta, 'exposta ao vivo', e ao seu fotógrafo, o portuense Domingos Alvão (1872-1946)