sábado, 14 de março de 2020

Guiné 61/74 - P20733: Os nossos seres, saberes e lazeres (381): Itinerâncias pelo Sotavento Algarvio (1) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 27 de Agosto de 2019:

Queridos amigos,
Por mim, não sentiria qualquer desfastio em dar-vos novas imagens de Tavira, com os seus poços fenícios, as belas peças islâmicas, o que resta do bairro Almóada, os vestígios do gótico e do manuelino, as belas igrejas, conventos e capelas, num total de catorze, segundo um folheto dado no Turismo. Mas preferiu-se outra errância por este sotavento algarvio, começa-se por Vila Real, há uma neta que quer ondas e água morninha, impossível fugir das multidões, seja na ilha de Tavira, Cabanas, Cacela ou Manta Rota, ninguém sonha, em pleno agosto, ter mais de metro e meio de areal por sua conta, o que é altamente acessível é mesmo passear à beira-mar, mesmo que, fenómeno raro, o oceano vai expelindo a todo o instante algas às toneladas. Vicissitudes de banhista, é o preço de passar férias em locais da maior convergência da sociedade de massas.

Um abraço do
Mário


Itinerâncias pelo Sotavento Algarvio (1)

Beja Santos

Viajar em Agosto por qualquer ponto do Algarve significa deambular entre multidões, escolher um ponto do areal e dez minutos depois estar despudoradamente cercado de gente de diferentes proveniências nacionais. Mas tinha que acontecer, houvera um convite irrecusável, estacionar uns dias numa urbanização perto de Tavira, a neta clamava por ondas, a filha clamava por descanso, reivindicações a ter em conta. Depois de uma viagem sem engarrafamentos, atinado com o local da estância, feitos os arrumos e compras elementares, avança-se para a praia, jogada a moeda ao ar, pensa-se iniciar as férias na ilha de Tavira. E daí estas duas surpreendentes imagens, não houve inundações, nem tsunami, o que se vê são banhistas com a trouxa às costas ou no braço, nada de gastar dinheiro na embarcação a motor que faz o trânsito entre a areia e terra firme.


O coletivo começou novo dia a revisitar Vila Real de Santo António, tudo surpreende, por muitas vezes que lá se passe, para o viandante é o permanente deleite das dimensões da praça que recorda a reconstrução depois do terramoto, a traça pombalina, de uma geometria perfeita, atenda-se ao agradecimento ao Senhor Dom José I, questão de protocolo, quem deu ordem foi Sebastião José. A igreja, diga-se em abono da verdade, não é uma dessas joias inesquecíveis, mas não se pode obliterar os cuidados na manutenção e o pleno equilíbrio do seu altar-mor.





Viandante e comitiva entram na Câmara Municipal, conheceu um gravíssimo incêndio, quase tudo reduzido a cinzas. A reconstrução é tocante, aproveitou-se o que ficou, o teto é lindíssimo, o mesmo quer dizer que se sugere a quem por lá passe que não deixe de se avistar com esta intervenção talentosa no edifício autárquico.




Outro local inescapável é percorrer a beira-rio, marcada por um tempo áureo de negócios de fronteira, muito comércio por grosso e atacado, um bom hotel. Impressiona a escultura de João Cutileiro dedicada a Sebastião de José, é uma peça-maior da sua obra, salvo melhor opinião.



E aqui se suspende a digressão mostrando algum estadão de outrora que chegou ao momento presente. Vila Real de Santo António continua a ter uma enorme afluência por direito próprio e pelos turistas nacionais e internacionais, ali perto está Monte Gordo, Praia Verde e Alagoa/Altura, uns quilómetros adiante a bela Cacela Velha, e quem sobe tem Castro Marim, a Reserva Natural do Sapal de Castro Marim e Vila Real de Santo António, barragens não faltam, e há panoramas inexcedíveis em Alcoutim. Viandante e comitiva sentem-se felizes, caminham pouco mais, têm outros alvos neste sotavento para atingir.



(continua)
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Nota do editor

Último poste da série de 7 de março de 2020 > Guiné 61/74 - P20709: Os nossos seres, saberes e lazeres (380): A Bélgica a cores que guardo no coração, e para sempre (8) (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P20732: Memória dos lugares (404): Tavira, o CISMI, e Cacela A Velha... (Eduardo Estrela, ex-fur mil at inf, CCAÇ 14, Cuntima, 1969/71)


Vila Real de Santo António  > Cacela A Velha  > Fortaleza de Cacela A Velha (séc. XVII) com vista sobre a Ria Formosa


A conquista de Cacela


As praças fortes foram conquistadas
por seu poder e foram sitiadas
as cidades do mar pela riqueza

Porém Cacela
foi desejada só pela beleza


Livro Sexto (1962, Lisboa, Livraria Morais Editora)

Sophia de Mello Breyner Andresen (Porto, 1920 - Lisboa, 2004)


Foto (e legenda): © Eduardo Francisco Estrela (2020). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Eduardo Estrela (2012)
 1. Mensagem do Eduardo Estrela [ ex-Fur Mil da CCAÇ 14, Cuntima, 1969/71]

natural de Faro, vive em Cacela (que já não é Tavira, mas Vila Real de Santo António, entre Tavira e a Manta Rota);  estivemos juntos no CISMI, em Tavira, no último trimestre de 1968, ele a na 3ª companhia (a "tirar" a especialidade de atirador de infantaria), eu na 2º companhia, do tenente Esteves Pinto, a fazer uma inútil especialidade de armas pesadas de infantaria; foi comigo e mais umas centenas de camaradas para o TO da Guiné, no T/T Niassa, em 24/5/1969; também ia connosco o camarada  Jerónimo de Sousa, Soldado Condutor Auto da Companhia Polícia Militar  (CPM) 2537 (Bissau, 1969/71): mas só soubemos uns dos outros muitoso anos depois; é membro da nossa Tabanca Grande desde o início de 2012; faz teatro, integrando o Grupo de Teatro Lethes, também gosta de ler e escrever poesia (, obrigatório paar quem ama Cacela  A Velha).

Data: 13 mar 2020, 17:28

Assunto: Cacela

Fotografia acabada de fazer [segue, em anexo].

O comandante da 3ª  Companhia do CISMI, Tavira,  era o cap Eduardo Fernandes, militar íntegro e respeitador. 

O ten Madeira era o adjunto e era uma flor sem cheiro. Mau e sádico. Uma vez, levou durante a noite a companhia para as salinas (, o capitão estava ausente). Dei-lhe a volta e vim de lá com trampa só até aos joelhos. 

Já tive o privilégio de lhe dizer isso pessoalmente num almoço no CISMI. O homem agora é coronel reformado e mora, como sempre morou, em Castro Marim. 

Abraço. Eduardo Estrela

2. Comentário de LG:
Capa do "Livro Sexto" (1962)

Eduardo, quando estive em Tavira, no CISMI, entre outubro e dezembro de 1969, devo ter ido a Cacela A Velha (como eu gosto de "grafar"), e lá ter lido e  relido aquele e outros poemas do Livro Sexto de Sophia (que levei comigo para a Guiné, numa mala cheia de livros, convencido que ia passar umas férias tropicais... pobre de mim!).

Tavira ficava longe da minha terra, o comboio era ronceiro, parava em todas as estações e apeadeiros, perdia-se o fim de semana em viagens... Depois de chegar ao Barreiro, era preciso apanhar o barco e depois a camioneta, na Rua da Palma,  que ia até à Lourinhã, último concelho do distrito de Lisboa, e eram mais horas três de caminho!...

Penso que só fui a casa uma vez quando estive em Tavira, na minha instrução de especialiidade... Valeu-me a beleza da ria Formosa, Tavira, Cacela e a poesia dos poetas, como a Sophia,  que se encantaram pela tua terra... Obrigado pela tua foto: aquela ria Formosa e aquela fortaleza parada no tempo são um mar de emoções e de sabores...Foi lá que comi o melhor  arroz de lingueirão do céu e da terra, no sítio da Fábrica, num tasco que tinha um telheiro...

Voltei a Tavira, algumas vezes (poucas...), a última em abril de 2014 (*)... Aí, sím, com olhos de ver e rever... Mas não tive tempo de revistar Cacela. Não ia sozinho, em grupo temos que abdicar de algo de nós.... Escrevi, nesta altura no blogue, um conjunto de seis textos, e à laia de conclusão o seguinte:

(... ) Damos por encerrado aqui o roteiro (breve) de Tavira, aonde regressei, com "olhos de ver" e sem "mágoa no coração", 45 anos depois de ter feito o 2º Ciclo do CSM, no quartel da Atalaia, CISMI, no último trimestre de 1968 (...)

Fiquei alojado dois dias no Convento das Bernardas Residence, acessível na época baixa... É um notável projeto de recuperação arquitetónico, com a assinatura de Eduardo Souto de Moura... Aproveitei, obviamente, para percorrer o caminho que ia dar à ilha de Tavira, a famosa estrada dos Quatro Caminhos, onde se toma o barco para, atravessando o Gilão, se chegar à ilha de Tavira que alguns de nós conheceram, no tempo da recruta e/ou especialidade...

Essa estrada era também uma das estações do calvário dos milicianos, havendo instrutores que adoravam pôr-nos de salmoura, nas salinas.. Também fui (...)  a Santa Luzia, zona piscatória de Tavira, para provar as especialidades gastronómicas de Tavira onde o polvo continua a ser rei... E ainda houve tempo para dar um salto à pombalina Vila Real de Santo António...

Faltou, por manifesta escassez de tempo, revisitar a Cacela Velha, um dos lugares mais mágicos da costa algarvia (, pertence já ao concelho vizinho, de Vila Real de Santo António, ) e sobre o qual escreveu a nossa grande poetisa Sophia de Mello Breyner Andersen (Porto, 1919-Lisboa, 2004) [o poema antológico que acima se reproduz] (...)


Mas já dexei, em tempos, no blogue,  em jeito de  confissão uma das minhas "penas" (**):

(...) Dos sítios que nos calhou, a alguns de nós, no nosso percurso militar, da metrópole até à Guiné, Tavira é possivelmente um dos quais com que mantemos uma relação de amor/ódio.

(....). Nos escassos dois meses e meio em que lá fiz a especialidade de armas pesadas de infantaria (na 2ª companhia, em set/dez de 1968), não tive condições físicas e psicólogicas para descobrir a cidade, as suas ruas, o seu património e as suas gentes... O fantasma da Guiné (, não sei porquê nunca pensei em Angola ou Moçambique) já estava na minha cabeça...

Claro que deambulei pela cidade e arredores (Santa Luzia, Ilha de Tavira...) mas não tinha cabeça para aprofundar o conhecimento da sua história e do seu património... Voltei lá há um mês, com outra disponibilidade mental... Passei lá um fim de semana, dois dias, alojado no Convento das Bernardas, junto às salinas, (...) e depois fui visitar o velho quartel da Atalaia onde funcionou o CISMI, e por onde passámos, muitos de nós furriéis milicianos, antes de irmos parar à Guiné (...)


Obrigado, Eduardo, por este "regalo", nesta sexta feira, 13, em que estou/estamos trancado(s) em casa por causa da maldita pandemia do Covid-19. Mas olho a ria Formosa e vêm-me à lembrança aquele tempo em que havia ali, talvez mais à direita, uma nesga de terra e de mar, onde fazíamos fogo real, com as armas pesadas, a Breda, o morteiro 81, o canhão s/r...

Era uma dor de alma,  para mim,  ter que violar toda aquela beleza de areal e mar... Será que ainda te lembras desse sítio da costa onde se fazia fogo real  de armas pesadas ? Havia lá, em baixo, muita sucata, incluindo granadas por explodir... Tinha que ser uma faixa da linha costeira,. sob estrita jurisdição militar. Já não tenho ideia se era mais à esquerda ou à  direita de Tavira... Ou não seria na própria ilha ?... Não, não, devia ser, tenho uma vaga ideia de estar a fazer a fogo de Breda ou Browning, de uma arriba para o mar... (***)   
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Notas do editor:



Guiné 61/74 - P20731: Parabéns a você (1770): Leopoldo Correia, ex-Fur Mil Art da CART 564 (Guiné, 1963/65)

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Nota do editor

Último poste da série de 10 de Março de 2020 > Guiné 61/74 - P20725: Parabéns a você (1769): SAj Ref da GNR Manuel Luís Rodrigues Sousa, ex-Soldado At Inf do BCAÇ 4512 (Guiné, 1972/74)

sexta-feira, 13 de março de 2020

Guiné 61/74 - P20730: Casos: a verdade sobre... (8): O campo penal da Ilha das Galinhas e o Campo de Trabalho de Chão Bom (ou Tarrafal II)


Cabo Verde > Ilha de Santiago > Concelho de Tarrafal > Chão Bom ("Txon Bon") >  Julho de 2018 > O antigo antigo Campo Penal do Tarrafal (1936-1954) e depois Campo de Trabalho de Chão Bom (1961-1974) > Hoje Museu da Resistência > Entrada exterior


Cabo Verde > Ilha de Santiago > Concelho de Tarrafal > Chão Bom ("Txon Bon") >  Julho de 2018 > O antigo antigo Campo Penal do Tarrafal (1936-1954) e depois Campo de Trabalho de Chão Bom (1961-1974) > Hoje Museu da Resistência > Entrada interior

Fotos (e legendas): © Hélder Sousa (2020). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]






Lisboa > IndieLisboa'10 > 7º Festival Internacional de Cinema Independente > Culturgest > 23 de Abril de 2010 > Sessão de estreia do filme "Tarrafal: Memórias do Campo da Morte Lenta", produção e realização de de Diana Andringa (Portugal, 2009, 90'' > Não se trata de fotogramas mas de imagens obtidas por máquina fotográfica durante a exibição do filme (com a devida vénia à realizadora a quem não pedi expressamenete autorização...), e editadas por mim >  Reprodução da Portaria nº 18539, de 17 de junho de 1961, que cria o Campo de Trabalho de Chão Bom... (Não se diz aonde, e muito menos há referência ao antigo campo do Tarrafal, encerrado em 1954...Deixa-se para o "regulamento", a aprovar pelo Ministro do Ultramar, os detalhes da sua localização, organização e funcionamento.)



1. Como é sabido (, antes do 25 de Abril, poucos o sabiam...), a "colónia penal de Cabo Verde", no Tarrafal,  ilha de Santiago, foi criada em 1936, e ficou tristemente conhecida como "campo da morte lenta". Surge na sequência da grande reforma do sistema prisional de 1936 (Decreto-Lei n.º 26 539, de 23 de Abril de 1936), da autoria do professor doutor José Beleza dos Santos, da Unversidade de Coimbra. (Nasceu em Vila da Feira, em 1885, morreu em Lisboa, 1962).

Era destinada a presos políticos, opositores do regime do Estado Novo... Dez por cento dos presos, de um total de 340 que por lá passaram, entre 1936 e 1954, morreram, na sequência das duras condições de detenção: sevícias, maus tratos, alimentação, alojamento, higiene, cuidados sanitários, isolamento, clima, etc.

Eram nossos concidadãos, de diferentes opções político-ideológicas (comunistas, anarquistas, republicanos...), sobretudo "arraia-miúda", como diria o cronista Fernão Lopes (c. 1380/90 - c. 1460), o nosso primeiro historiógrafo... Eram marinheiros, estivadores, operários, artesãos, empregados de escritório e de comércio, etc., dos mais diversos pontos do país, da Marinha Grande a Vila Nova de Foz Côa, de Lisboa a Castro Verde, de Almada a Vila Nova de Gaia.
Apesar da vitória das "forças democráticas", os "Aliados", em 1945, sobre as potências do Eixo (os "regimes nazifascistas" da Alemanha, Itália e Japão...), o campo (de concentração) do Tarrafal só foi fechado... quase vinte anos depois, em 1954!... Dizem que por "pressão internacional"...


 2. Vai reabrir, todavia, na sequência da guerra colonial, que se inicia em Angola, em 1961, mas com outro nome, um eufemismo "Campo de Trabalho do Chão Bom" (CTCB) (sic)... Desta vez para detenção dos "terroristas angolanos" (, como eram tratados, na época, os nacionalistas que lutacam contra o colonialismo português).
Haverá, no entanto,  mais campos para detenção de nacionalistas africanos durante a guerra do ultramar, e com condições de detenção bem mais duras, e de que pouco se fala entre nós: Missombo e São Nicolau, em Angola; Machava e Madalane, em Moçambique... Na Guiné, já existia a "colónia penal  e agrícola" da Ilha das Galinhas (, fundada em 1934) (*)... 
No Tarrafal, ou melhor do Campo de Trabalho de Chão Bom, na 2ª fase, dita "africana (1961-1974), morreram apenas 3 homens, por doença, incluindo 2 guineenses, com sequência, muito provavelmente,  dos "maus tratos" recebidos na altura da sua prisão pela PIDE...
Já em São Nicolau, no Sul de Angola, e segundo a historiadora Dalila Mateus ("A PIDE/DGS na Guerra Colonial 1961-1974", Lisboa, Terramar, 2004), terão morrido "de doença", só entre 1969 e 1972, "bem mais de uma centena de pessoas". Em 1972, em Angola, em São Nicolau havia 123 presos, enquanto no Missombo estavam 874.

Há quem diga que o Tarrafal, nesta fase, não era assim tão "mau"... (Chamemos-lhe Tarrafal II).

O jornalista e investigador cabo-verdiano, José Vicente Lopes, que já se cruzou connosco no nosso blogue (**), tem uma obra de referência sobre o Tarrafal: "Tarrafal - Chão Bom; memórias e verdades", 2 volumes, Praia, IIPC - Instituto de Investigação e do Património Cultural, 2010.  Ainda não não conhecemos o original, mas também acesso a uma extensa recensão bibliográfica, feita pelo  José Pedro Castanheira (Expresso, revista Atual, 14 de agosto de 2010: "Tarrafal: Verdades e mentiras do Campo de Trabalho de Chão Bom").
Também é desta ano, 2010, o documento de hora e meia produzido e realizado pela Diana Andringa "Tarrafal,  Memórias do Campo da Morte Lenta".  (Vd. poste P6204, de 21 de abril de 2010.)


2. Os "deportados" foram chegando ao CTCB / Tarrafal, em várias levas, a última em 1972 (14 elementos do MPLA).

Na primeira leva, em 1961,  vieram angolanos (n=107), de vários movimentos, com destaque para o MPLA.... Todos eles "condenados em tribunal"... Numa segunda leva, em 4/9/1962, vieram os pobres dos guineenses (, os 100, para ser um número redondo), mesmo sem julgamento, que já não havia nem tempo, nem paciência, nem juízes, nem leis para os julgar... Já andava tudo nervoso em Bissau e em Lisboa...Nessa centena de "deportados" guineenses, estava também o Inácio Soares de Carvalho (***)...

Os guineenses foram alojados numa ala separada. Em 1964 saíram cerca de 60 guineenses, sem qualquer culpa formada nem julgamento, sendo os restantes libertados em 30 de Julho de 1969, no âmbito da política "Por uma Guiné Melhor", do Governador Geral e Com-Chefe António Spínola.

Recorde-se que, ao todo, Spínola mandou libertar 92 presos políticos, incluindo um dos históricos do PAIGC, Rafael Barbosa (1926-2007), detido na colónia penal da Ilha das Galinhas, nos Bijagós (, nunca tendo sido "tarrafalista": não se sabe porquê, mas a PIDE quis tê-lo à mão, no território da Guiné)...  Foi escolhido para discursar no 10º aniversário do Massacre do Pi(n)djiguiti, em 3 de agosto de 1969, agradecendo em seu nome e dos  outros prisioneiros o gesto de Spínola. Esse momento foi terrível para o antigo nº 2 do PAI(GC). O labéu de "colaboracionista" colou-se à sua pele. Será julgado e condenado à morte depois da independência, pena que lhe será comutada por 'Nino' Vieira,

Antes de serem soltos do CTCB (Tarrafal II), parece que tinham que responder a um questonário e fazer uma declaração de confissão de arrependimento", e em que se comprometiam a nunca mais se envolver em atividades contra a segurança do Estado.... Três deles ter-se-ão recusado a responder, incluindo Aristides Barbosa e Mário Mamadú Turé... Curiosamente, por coincidência ou não,   em janeiro de 1972,  em Conacri, estes dois últimos irão figurar  no grupo de dissidentes do PAIGC que estarão no complô para prender e/ou assassinar Amílcar Cabral.

Mas também estiveram lá, no CTCB, 20 cabo-verdianos, militantes do PAIGC... Os últimos presos foram libertados com o 25 de Abril de 1974, aliás um semana depois em 1 de Maio. Mas o PAIGC, ao que escreve o csbo-verdiano José Vicente Lopes,  cedo se apoderou do CTCB e meteu lá dentro, passado algum tempo,  70 "opositores", militantes de outros movimentos (como a UDC e UPICV)... (Às vezes, até parece que a História se repete...).
Caricatas são as visitas que a Cruz Vermelha Internacional faz ao  CTCB,  por duas vezes, em fevereiro de 1969 e em fins de 1971... Os seus delegados parece que ficam com uma boa impressão do lugar... Aquilo, afinal,  não era "assim tão mau": os presos até tinham algumas "regalias", como idas semanais à praia, sessões de cinema, biblioteca (oferecida pela Fundação Calouste Gulbenkian), consultas no hospital da cidade da Praia, possibilidade de prosseguir os estudos e fazer exames, e até de escrever livros como o "Luuanda", do Luandino Veira... (***)

Dos 238 presos angolanos, guineenses e cabo-verdianos que estiveram no Tarrafal, na 2ª fase (1961-1973), apenas menos de um quarto (cerca de 50) estavam ainda vivos, por ocasião do Simpósio Internacional sobre o Campo de Concentração do Tarrafal, que teve lugar entre 28 de Abril e 1 de Maio de 2009.

Mas, segundo José Vicente Lopes, o autor do livro, em 2 volumes,  "Tarrafal - Chão Bom; memórias e verdades", 85 a 90% dos guineenses "tarrafalistas" já tinham morrido. Foi o caso do Inácio Soares de Carvalho (,cabo-verdiano, nascido em 1916, mas levado em criança para a Guiné, com os seus pais): voltou para a Praia, sua terra natal, em finais de 1970, cinquenta e tal anos depois, muito provavelmente desgostoso com (e ignorado por) o seu partido; morreu em 1994. (****) 
3 de agosto de  2012 > Guiné 63/74 - P10221: Notas de leitura (387): Aristides Pereira, Minha Vida, Nossa História, entrevistas de José Vicente Lopes (1) (Mário Beja Santos)

6 de agosto de 2012 > Guiné 63/74 - P10230: Notas de leitura (388): Aristides Pereira, Minha Vida, Nossa História, entrevistas de José Vicente Lopes (2) (Mário Beja Santos)

10 de agosto de 2012 > Guiné 63/74 - P10247: Notas de leitura (390): Aristides Pereira, Minha Vida, Nossa História, entrevistas de José Vicente Lopes (3) (Mário Beja Santos)

(***) Último poste da série > 27 de janeiro de 2015 > Guiné 63/74 - P14194: Casos: a verdade sobre... (7): O tema da Guerra da Guiné a imputar-nos a execução de detidos, de prisioneiros e da mutilação dos cadáveres voltou à Tabanca Grande (Manuel Luís Lomba)

(***) Vd. poste de 9 de março de 2020 > Guiné 61/74 - P20717: (D)o outro lado do combate (58): memórias do militante do PAIGC , Inácio Soares de Carvalho, cabo-verdiano, funcionário do BNU - Banco Nacional Ultramarino, em Bissau, detido pela PIDE em 1962, em seguida deportado para o Tarrafal, donde regressa em 1965, sendo colocado na Ilha das Galinhas... Liberto em 1967, é de novo preso em 1972 e 1973... Regressa à sua terra natal, em finais de 1970, afastando-se da vida política ativa... Morreu em 1994 - V ( e última) Parte (Carlos de Carvalho, Praia, Santiago, CV)

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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 3 de dezembro de 2013 > Guiné 63/74 - P12383: Memória dos lugares (257): Ilha das Galinhas em 1968 (José António Viegas)

(...) Sobre a "colónia penal agrícola" (sic) da Ilha das Galinhas, vd.

Casa Comum > Arquivos > Arquivo Amílcar Cabral

Instituição: Fundação Mário Soares
Pasta: 07063.036.028
Título: Promulgação de medidas de assistência geral pelo Governo da Colónia da Guiné
Assunto: Cópia do Diploma Legislativo n.º 884 (Boletim Oficial n.º 44, de 29 de Outubro de 1934) sobre a promulgação de medidas de assistência geral pelo Governo da Colónia da Guiné. Instituição do reformatório de Menores e Asilo da Infância Desvalida de Bor; criação da Colónia Penal Agrícola da Ilha das Galinhas.
Data: Segunda, 29 de Outubro de 1934
Observações: Doc. incluído no dossier intitulado Operação de Cadigue / com. em 1-3-1963 / Notas gerência mercearias.
Fundo: DAC - Documentos Amílcar Cabral (...)

Citação:
(1934), "Promulgação de medidas de assistência geral pelo Governo da Colónia da Guiné", CasaComum.org, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_42954 (2013-12-4)

 (**) Vd. postes de

15 de janeiro de 2015 > Guiné 63/74 - P14150: Casos: a verdade sobre... (1) Jaime Mota (1940-1974), combatente do PAIGC, natural da ilha de Santo Antão, Cabo Verde, morto em 7 de janeiro de 1974, em Canquelifá por forças da CCAÇ 21 (Virgínio Briote / Amadu Djaló / José Vicente Lopes)

15 de janeiro de 2015 > Guiné 63/74 - P14151: Casos: a verdade sobre... (2): Jaime Mota (1940-1974), combatente do PAIGC, natural da ilha de Santo Antão, Cabo Verde, morto em 7 de janeiro de 1974, em Canquelifá por forças da CCAÇ 21 - Parte II (Virgínio Briote / Rachid Bari, ex-sold trms, CCAÇ 21, Bambadinca, 1973/74, natural do Quebo e residente em Portugal)

17 de janeiro de 2015 > Guiné 63/74 - P14156: Casos: a verdade sobre... (3): Jaime Mota (1940-1974), combatente do PAIGC, natural da ilha de Santo Antão, Cabo Verde, morto em 7 de janeiro de 1974, em Canquelifá por forças da CCAÇ 21 - Parte III (Luís Graça / José Vicente Lopes / José Manuel Matos Dinis)
e
18 de janeiro de 2015 > Guiné 63/74 - P14160: Casos: a verdade sobre... (4): Jaime Mota (1940-1974), combatente do PAIGC, natural da ilha de Santo Antão, Cabo Verde, morto em 7 de janeiro de 1974, em Canquelifá por forças da CCAÇ 21 - Parte IV: "Guerra é guerra, meu irmão", dizia-me em 2008 o antigo guerrilheiro Braima Cassamá que reencontrei em Guileje (José Teixeira)

Vd. também postes de:

Guiné 61/74 - P20729: Notas de leitura (1272): Missão cumprida… e a que vamos cumprindo, história do BCAV 490 em verso, por Santos Andrade (49) (Mário Beja Santos)



1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 16 de Outubro de 2019:

Queridos amigos,
O bardo despede-se da guerra, seguir-se-ão duas alusões sentimentais, é um dedilhar da guitarra com acordes de saudade, recorda a Mãe e canta o fado do regresso.
Impossível não se comentar aqui o que de mais relevante aconteceu no teatro de operações neste último ano da comissão do BCAV 490. Coisa curiosa, é manuseando estes diferentes volumes que a "Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África", dedicados à Guiné, que se atina na verdadeira dimensão da atividade operacional, nas melhorias instaladas no campo das infraestruturas, no apoio às populações. Há muito caminho ainda a desbravar para que fique convenientemente iluminado todo este contexto em que germinou e se desenvolveu a guerra da Guiné, nestes anos correspondentes à presença do BCAV 490, de 1963 a 1965, trabalho de investigação em arquivos onde jazem papéis decisivos para a compreensão da atuação tanto do Brigadeiro Louro de Sousa como do General Arnaldo Schulz. Para acabar de vez com a crítica infundamentada de que estes dois oficiais-generais não foram altamente competentes, resolutos e determinados, e que não estiveram à altura da situação crítica que viveram, houvera que depositar todas as esperanças num salvador que chegou à Guiné em maio de 1968.

Um abraço do
Mário


Missão cumprida… e a que vamos cumprindo (49)

Beja Santos

“Fui à Guiné, fiquei maravilhado
ao ver os batuques a tocar
com os africanos a dançar,
eu fiquei entusiasmado.
Voltava-me para qualquer lado
via grupos dançando contentes,
diversas raças patentes
rolavam uns baixos outros de pé.
Vi na Província da Guiné
coisas bárbaras, transcendentes.

Outros costumes, outras gentes
nesta Província vim ver.
Fiquei também a conhecer
o que foi pisado pelos antecedentes.
Tivemos homens valentes
que deixaram nome gravado.
Actualmente no mato cerrado
ainda se distinguem muitos companheiros
contra o grupo de bandoleiros
do povo negro esturrado.

Vi homens de cornos armados
a imitarem bois guerreando
e outros com caraças também imitando
diversas feras e veados.
Alguns de flechas formados
mantinham-se muito prudentes.
Estavam equipados como os combatentes
de há séculos atrasados
de quando se faziam bravados
a desafiar espaços, continentes.

Vi mulheres nuas, peitos pendentes
e coisas de diversos aspectos.
Vi os filhos dos insurrectos
rasgados, descalços e inocentes.
Aqueles homens divergentes
se nos tornam endiabrados
por eles somos espiados
a qualquer hora do dia.
Mas só têm cobardia
os rebeldes famintos, esfarrapados.

O tempo está acabado,
vou fechar as poesias.
Despeço-me de todas as Companhias
que eu tenho aqui publicado.
Este tempo foi passado
com grande descontracção.
No resumo do Batalhão
passaram-se muitas amarguras
e houve muitas aventuras,
amigos do coração”.

********************

Confesso que me toca muito este derradeiro abraço em que o bardo envolve os seus camaradas. Estamos em 1965, impõe-se apresentar algumas notas sobre o pano de fundo daquela guerra, e o que se previa para o ano vindouro. Consta na “Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África, 6.º volume, Aspectos da Actividade Operacional, Tomo II, Guiné”, 2014, que o ano de 1965 foi dominado por uma evolução da organização das FARP – Forças Armadas Revolucionárias Populares, o movimento das unidades das forças portuguesas foi enorme. Em 12 de agosto, partiu o BCAV 490 com as CCAV 487, 488 e 489, além do BCAÇ 512 e 513, dias depois regressava também à metrópole o BCAÇ 600. Iluda-se quem continue a supor que este período da governação de Arnaldo Schulz teve quebras na dinâmica ofensiva e esclerosamento na quadrícula. Estão descritas operações em Bula, Mansoa, Farim, Tite, Buba, Catió, por toda a colónia, e com grande regularidade. O PAIGC ripostava, sobretudo no Sul e no Centro-Norte. Na época ainda havia operações que levavam à destruição de várias tabancas em pontos dados de acesso extremamente difícil, caso das tabancas de Chinchim Dari, Salancaur Fula, Salancaur Jate e outras próximas. Sucedem-se as Diretivas do Comandante-Chefe, mostra-se polarizado por desarticular o inimigo na região do Oio (quadrilátero Mansoa-Bissorã-Olossato-Mansabá), havia indícios no seu reforço nos últimos tempos; sabia-se claramente que a região da margem direita do Corubal, situada entre Ponta do Inglês e a povoação do Xitole, continuava a ser peça fundamental da linha de comunicações. Havia a pretensão de dificultar a utilização da região de Ponta do Inglês – Xitole como base intermediária da linha de comunicações do inimigo, foram previstas várias operações, ia-se às bases, destruíam-se acampamentos, eles iriam ressurgir ali bem perto. Centrou-se igualmente a atenção na região entre o rio Canjambari e a estrada de Banjara – Mansabá, sabia-se que era uma passagem obrigatória da guerrilha. Tomaram-se medidas para um melhor controlo e defesa de Bissau. Propuseram-se novas medidas de ação psicológica. No final do ano, através da sua Directiva n.º 26/C, Schulz dá conta da situação da guerra, escreve obviamente para que o governo em Lisboa tire as suas elações, a pretexto de a Directiva ser canalizada para os três ramos das Forças Armadas na Guiné.

É uma narrativa sem ilusões, seria impossível não tirar dela conclusões merecedoras de grande preocupação:
“Apesar dos golpes sofridos no decurso dos últimos anos, a virulência político-militar do inimigo não tem diminuído. O inimigo conta com o apoio decidido dos países do bloco comunista, da generalidade dos países da OUA e de alguns países ‘não alinhados’. Um factor novo relativamente recente – o aparecimento de brancos, em especial cubanos, como instrutores, conselheiros ou especialistas – vem demonstrar a extensão deste apoio.
No aspecto exterior, as facilidades cada vez maiores que vêm sempre concedidas pelo Senegal ao PAIGC, as quais foram objecto de acordo formal entre o Governo Senegalês e aquele agrupamento subversivo e estão-se traduzindo, designadamente, no estabelecimento progressivo de grupos armados ao longo de toda a fronteira norte da Província, na organização de bases fronteiriças de certo valor, em liberdade condicionada de trânsito de pessoal, armamento e abastecimentos”.

Volumes da “Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África” referentes à atividade operacional da Guiné.

O documento enfatiza o aperfeiçoamento da propaganda do PAIGC, a melhoria dos seus quadros políticos, técnicos e militares, o aperfeiçoamento da organização e apetrechamento de militares quanto a equipamento, transmissões, fardamento e apoio sanitário; era dado como seguro que melhorara substancialmente o controlo do PAIGC sobre os núcleos populacionais, com destaque no Sul. E detalha-se igualmente os termos como se estava a processar a expansão do PAIGC pelo Interior. Considerava-se que a partir de setembro de 1965 o PAIGC progredia para a região dos Manjacos; havia uma notória acumulação de meios inimigos ao longo da fronteira do Senegal, desde Saré Bacar até Susana, por enquanto não havia motivo de séria preocupação, mas não se excluía, a prazo, a tentativa de reforçar os meios existentes no interior da Província com a finalidade de envolver Bissau. E escreve: “Atribuo uma grande importância à possibilidade de ataque súbito e maciço a algumas das nossas posições fronteiriças que pode ter lugar em prazos muito curtos que dificultem grandemente o ocorrer, em tempo oportuno, das nossas reservas”.

A sul do Geba e a oeste do Corubal, a organização político-militar do inimigo estendia-se um pouco por toda a parte e mostrava-se particularmente evoluída nas regiões de Quitafine, Cantanhez e Como. A ligação técnica, política e económica entre as diversas zonas controladas pelo inimigo faz-se com relativa facilidade. “Considera-se, no entanto, que os principais núcleos inimigos não têm possibilidade de evitar uma desorganização sensível das suas estruturas, se atacados sistematicamente e com decisão com meios de fogos terrestres, navais e aéreos e sujeitos com frequência a acções terrestres, anfíbias ou aerotransportadas de objecto limitado. É admissível que Schulz apelava para uma continuação da guerra subversiva em moldes mais ofensivos, a que o governo de Lisboa multiplicasse efetivos e recursos de toda a ordem, era impossível fechar o corredor de Guileje, a riqueza agrícola do Sul garantia a subsistência dos efetivos do PAIGC na região, aliás, previa-se uma maior agressividade das forças do PAIGC nos nossos aquartelamentos e sobre a zona do Forreá. E advertia: “Admito que o inimigo poderá tentar uma ou mais acções de surpresa lançadas a partir de território estrangeiro, do Cantanhez ou de Quitafine, sobre algumas das nossas posições mais expostas, em especial Guileje, Gadamael, Cacoca e Cameconde”.

Imagem retirada do Arquivo do Correio da Manhã, com a devida vénia.

O Leste continuava a resistir à subversão, houvera que evacuar populações de certas zonas transfronteiriças, mas no Boé intensificara-se a presença do PAIGC.

É prematuro, até porque não está estudado o acervo documental entre o Comandante-Chefe e os Ministérios da Defesa Nacional e do Ultramar, dizer abertamente que Schulz, chegado em maio de 1964 à Guiné, e que a encontrou em perfeito tumulto, porque era completamente incerto por onde o PAIGC procurava consolidar-se e irradiar, havendo milhares de guineenses em fuga para as regiões fronteiriças do Senegal e da República da Guiné, povoações queimadas, inúmeras populações sujeitos a duplo controlo, com o esforço de guerra centrado em apagar fogos e espalhar os efetivos militares, e tudo o mais que se sabe, atribuir-lhe responsabilidades na condução da ofensiva contra a luta armada. Naquele período, o PAIGC consolidara-se, expandira-se, posicionara-se estrategicamente em pontos de dificílima acessibilidade, gozava progressivamente de apoio internacional, o seu armamento, inicialmente tão precário e antiquado, melhorara substancialmente.

Schulz obtivera a garantia de apoios, iniciara a africanização da guerra, instituíam-se aldeamentos, os bombardeamentos eram incessantes, as lanchas da Marinha patrulhavam os cursos de água; recebeu algum dinheiro para fazer infraestruturas, melhorou bairros, deu-se ênfase à educação e às infraestruturas de saúde. Proteger as populações, procurar subtraí-las ao duplo controlo, significava derramar os efetivos militares em destacamentos, com todos os riscos inerentes e as exigências de patrulhamentos, com a realização de operações que demoravam escassos dias, queimar um acampamento de guerrilha, capturar população e trazer material tinha que se fazer em curtíssimo espaço de tempo, o inimigo estava já preparado para reagir, emboscando nos pontos mais imprevistos.

Amílcar Cabral com o lendário comandante “Manecas” dos Santos, algures na Guiné, enquadrados pela Segurança que os acompanhava pela Guiné, imagem retirada do blogue Notícias da Guerra, com a devida vénia.

Em 1965, Amílcar Cabral é já um líder altamente cotado na esfera internacional, é o ideólogo de proa das colónias africanas de língua portuguesa; a colaboração cubana ainda é ténue, será muito maior quanto Fidel Castro lhe der um impulso, no ano seguinte; os quadros combatentes, como Nino, Osvaldo Vieira, Domingos Ramos, Rui Djassi, e muitos mais, revelam motivação, conhecimento do terreno, são de uma enorme fidelidade ao líder fundador.

O quadro de fundo antevisto por Schulz para o ano de 1966 conhecerá mudanças sensíveis com o apoio externo, com o desenvolvimento da propaganda do PAIGC. Nota curiosa, basta ler a “Resenha Histórico-Militar” referente a esse ano, 1966 salda-se num tempo de equilíbrio precário, o PAIGC irá acomodar-se a uma toada ofensiva marcada pelas forças especiais, é ano de contenção, de compasso de espera.

(continua)
____________

Nota do editor

Poste anterior de 6 de março de 2020 > Guiné 61/74 - P20707: Notas de leitura (1270): Missão cumprida… e a que vamos cumprindo, história do BCAV 490 em verso, por Santos Andrade (48) (Mário Beja Santos)

Último poste da série de 9 de março de 2020 > Guiné 61/74 - P20716: Notas de leitura (1271): “Bacomé Sambu”, por Afonso Correia; edição de autor, Lisboa, 1931 (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P20728: Em busca de... (302): instruendos do CISMI, Tavira, a tirar a especialidade de atiradores de infantaria, 6º Pelotão / 3ª Companhia, outubro de 1968: "Eu, o Torres, o Joaquim Fernandes, o Loureiro e o Saramago fomos todos para o CTIG...mas dos outros gostava de saber do paradeiro"... (Eduardo Francisco Estrela, ex-fur mil at inf, CCAÇ 14, Cuntima, 1969/71; vive em Cacela)




Tavira > CISMI > Parada > Outubro de 1968 > Atiradores de infantaria  > 6º Pelotão, 3ª Companhia > Da esquerda para a direita, de pé:

(i) Estrela (1), Fonseca (2), Pereira (3), João (4), Torres (5), Chichorro (6) e Joaquim Fernandes (7)

(ii) Santos (1a), Chora (2a), Salas (3a), Paulo (4a), Loureiro (5a), Saramago (6a)

Foto (e legenda): © Eduardo Francisco Estrela  (2020). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Mensagem do Eduardo Estrela [ ex-Fur Mil da CCAÇ 14, Cuntima, 1969/71]


Data: 9 mar 2020 21h42
Assunto:  Por onde andam eles ?

Meu caro Luís!
Junto fotografia tirada na parada do CISMI, Tavira,  em outubro de 1968. São os "galardoados " com a especialidade de atirador de infantaria que tinham acabado a recruta integrados no 6º Pelotão da 3ª Companhia.

Sempre a contar da esquerda, o 1º  de pé sou eu,  o Torres é o 5º  e o Joaquim Fernandes, o último. Em baixo o Loureiro é o 5º,  e o Saramago o último. 

Todos fomos para a Guiné e sabemos do paradeiro uns dos outros.

O Salas, o  3º [a]. em baixo, vive em Vila Real de  Sto. Antônio e foi para Angola. 

Gostava de saber do paradeiro dos outros que são a contar, da esquerda  e de pé,   o Fonseca (2), o Pereira (3),  o João (4),  e  o Chichorro (6) e Joaquim Fernandes (7); e em baixo   o Santos (1a), o Chora (2a) e o Paulo (4a).

Publica no blogue por favor, pode ser que algum camarada saiba por onde eles andam. 

Abraço fraterno. Eduardo Estrela.

2. Comentário do editor:

Há dias, à procura do João Barrote, ex-alf mil, da CCAÇ 16 (Bachile, 1971/72), troquei mensagens e telefonemas com o Eduardo Francisco Estrela, um "rapaz do meu tempo" (de Tavira e da Guiné), eu da CCAÇ 12 (Contuboel e Bambadinca, 1969/71) e ele da CCAÇ 14 (Cuntima, 1969/71). Fomos no mesmo navio, o T/T Niassa, em 24 de maio de 1969.

Estivemos no CMS,  no CISMI, em Tavira, a tirar a a especialidade, no último trimestre de 1968, antes de nos mandarem para a Guiné. Ele era atirador de infantaria, eu de armas pesadas de infantaria, nunca cheguei a perceber a diferença, porque lá na guerra deram-nos, a cada um de nós, uma G3.

Reencontrámo-nos através do blogue, comprovando aquilo que gostamos de dizer, que o  Mundo, afinal, é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande. (Os CISMI tem cerca de meia centena de referências no nosso blogue.)
Fiquei a saber que o Eduardo Estrela, natural de Cacela (, tendo feito a sua vida escolar e profissional em Faro,) concelho de Tavira, a escassos quilómetros do João Barrote (que vive em Tavira, há 40 e tal anos, embora seja de Olhão). Trocámos coordenadas e disse-lhe, ao telefone, que "adorava Cacela, a ria, Tavira (locais deslumbrantes, mágicos, do nosso Portugal, não os deixes estragar!)".
E ele respondeu-me, por email, nestes termos, começando por citar um dos muitos poemas que foram dedicados a Cacela (, sendo este da sua autoria):

Cacela tem aroma de mulher
e a elegância perfumada de um arbusto.
Seus olhos da cor da lua
bailam ao som da música do mar.
Cacela é sonho luz poema.
É vontade de não partir
e de sempre voltar.


E ele aproveitou para acrescentar algo mais sobre o que tem feito na vida:

(...) "Dividi a minha actividade profissional entre uma empresa de venda de automóveis durante 20 anos e como profissional de seguros na área da regularização de sinistros no resto do tempo, até atingir a idade da reforma.

"Desde 1965 sou amador de teatro, integrado no Grupo de Teatro Lethes, que é um dos grupos mais antigos do país. Actualmente temos apresentado a "Relíquia", do Eça de Queiroz [, adaptação teatral de Sttau Monteiro e Artur Ramos]. O último espectáculo foi há duas semanas. O próximo estava previsto para amanhã [, dia 7 de março,], mas imponderáveis fizeram adiar o mesmo. 

"Se vieres fazer algum 'patrulhamento' cá para baixo, dá um toque. Abraço fraterno. (...)"

Voltando agora ao seu pedido, confesso que só reconheço o Joaquim A. M. Fernandes, meu camarada de armas da CCAÇ 12, e que depois trabalhou, profissionalmente, na Quimigal, Barreiro, como engenheiro técnico. Já não nos vemos há uns largos anos. Temos aqui no blogue algumas referências a ele (e fotos).


Castro Daire > Freguesia de Monteiras > Zona Industrial da Ouvida > Restaurante P/P > 30 de Maio de 2009 > 15º Convívio do pessoal de Bambadinca, 1968/71, CCS do BCAÇ 2852, CCAÇ 12 e outras subunidades adidas

Três camaradas da CCAÇ 12 (Contuboel e Bambadinca, Junho 69/ Março 71): da esquerda para a direita; (i) o ex-Fur Mil Joaquim Fernandes, (ii) o ex-1º Cabo Aux Enf Fernando Sousa;  e (iii)  o ex-Fur Mil António Marques... 
O Fernandes e o Marques foram vítimas de explosão de minas A/C, à saída do reordenamento de Nhabijões, a 13 de Janeiro de 1971, com vinte meses de comissão... O Marques, que teve às portas da morte (se não fora a evacuação Y para o Hospital de Bissau), "ganhou" mais "dois anos de comissão" (desta vez, no "estaleiro")...
Foto (e legenda): © Luis Graça (2009). Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]
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Nota do editor:

Último poste da série > 24 de fevereiro de  2020 > Guiné 61/74 - P20682: Em busca de... (301): Raul Fernandes Coelho, natural de Braga, piloto de Heli AL III e de caça-bombardeiro T 6, do meu tempo (Francisco José Rato Mendonça, ex-1º cabo esp MARME, BA 12, Bissalanca, 1972/74)

quinta-feira, 12 de março de 2020

Guiné 61/74 - P20727: O mundo é pequeno e a nossa Tabanca...é Grande (115): A Sorte Protege os Audazes, mas não... do novo coronavírus COVID-19.


Infografia: Cortesia da  Direção-Geral de Saúde.


1. Mensagem  que deixei hoje na página da Magnífica Tabanca da Linha cujo régulo estava com intenção de manter, até ao fim da manhã, a convocação, para a próxima 5ª feira, do  48º almoço-convívio... e já tinha quase meia centena de inscrições.

O régulo Manuel Resende ouviu os "magníficos", sobretudo as razões dos que aconselhavam o cancelamento, por causa da atual pandemia, ponderou e decidiu... cancelar.

Mas a minha mensagem não perde oportunidade, atualidade e relevância, tendo em conta a anunciada realização de muitos outros convívios de antigos combatentes, nas próximas semanas.

Amigos e camaradas: trabalhei na saúde pública durante quatro décadas, sou doutorado nesta área (. não sendo médico, sou sociólogo...), estive empenhado no grupo de investigação e ação da Escola Nacional de Saúde Pública / NOVA, em 2009, aquando da gripe pandémica do H1N1...Sou contra o alarmismo, a paranoia e o medo que se está gerar e a instalar (nas redes sociais, nas escolas, nos transportes, nos hipermercados...).

Sou a favor do alinhamento com as autoridades de saúde pública deste paìs; fui militar como vocês, valorizo muito, em situações-limite como a guerra ou uma pandemia, a existência de (e a obediência a) uma única linha de comando-controlo...

O vírus, o novo coronavírus COVI-19, já entrou na comunidade...o que significa que não já podemos saber, como até agora, quem infecta quem... A OMS, com a autoridade, o saber, a experiência e o prestígío e a idade que tem (, é da nossa idade...), já declarou a situação como pandemia... É a segunda pandemia do séc. XXI... Dizem que há 3 por século... Se sim, temos que nos safar desta e esperar já não apanhar a terceira...

A partir daí, reuniões de grandes grupos (50 ou mais), em espaços fechados, começam a tornar-se um risco... Aprendamos com os erros dos outros países... Recordem-se do que nos ensinaram na tropa: "mais vale perder um minuto na vida do que a vida num minuto"... Foi um conselho valioso para quem andou e penou na Guiné. E não brinquemos, por favor, " com a sorte que protege os audazes": esta é outra guerra, e já temos vinte anos, nem o sistema imunitário de há 50 anos atrás...

Há camaradas nossos a subestimar a gravidade da situação... E até a fazer humor negro. Os epediemiologistas e infecciologistas dizem-nos que  pior está para vir (, no que diz respeito, por exemplo, ao nosso país)... Os "machos latinos" também se abatem... Oxalá nenhum de nós seja infectado: na nossa faixa etária, o risco de morrer, em caso de infeção pelo COVID-19, é elevado, provavelmente muito mais do que o de "lerpar" na Guiné, há 50 anos atrás... 

De resto, não há anticorpos para este "bicho"... Este novo coronavírus é muito agressivo para as pessoas da nossa idade...Somos muitos mais vulneráveis do que os nossos netos... e o risco de sermos infetados é grande. E a taxa de letalidade, elevada.  

Poupem-se!... Tranquem-se em casa... Nada de beijinhos, cichorações, abraços... Nem beijos íntímos... Ponderem, inclusive, a hipótese de dormir em camas separadas... Agora já não faz tanto frio  à noite...em-se!...

Adoecer nesta altura é uma carga de trabalhos e de aflições para nós e para aqueles que nos amam, sem esquecer os que nos têm de tratar, e que nesta altura são uns heróis (pessoal do INEM, médicos, enfermeiros, assistentes operacionais, farmacèuticos, pessoal da Linha Saúde 24, bombeiros, e demais pessoal da proteção civil, etc. ), sem esquecer os que mantêm, todos os dias, as atividades essenciais à nossa vida, segurança e bem-estar...

Outras tabancas (Matosinhos e Melros, por ex,) também estão a tomar as devidas precauções. Não sejamos nós a dar o mau exemplo de irresponsabilidade social e quebra de solidariedade comunitária e nacional... Obrigado à Marta Rosales, filha do Jorge Rosales, pela sua oportuna e lúcida tomada de posição, ontem na página do Facebook da Tabanca da Linha. Disse escreveu ela ao Manuel Resende, o régulo que sucedeu ao seu pai:

"Caro Manuel, penso que é a primeira vez que escrevo sobre qualquer actividade da Tabanca, mas vou seguindo os seus posts com atenção. 
"Como sabe sou cientista e professora na ULisboa. Dado o perfil dos membros da Tabanca, pedia-lhe que reconsiderassem esta decisão.

"Sei que o quanto estes convívios são importantes (o pai gostava muito deles). Mas também sei o que é acompanhar uma infecção de alguém aparentemente saudável até à morte.

"O vírus é agressivo para o vosso grupo etário. Peço-vos que ponderem. Pelo menos até termos reunida mais informação. acredite que não sou dada a alarmes. Um grande beijinho para si."


Eu também acho que os "magnificos" terão mais e melhores oportunidades de marcar presença na Tabanca da Linha...

Como dizia o meu velhote (, que esteve como expedicionário em Cabo Verde, no RI 23, em 1941/43), "mais vale andar neste mundo de muletas do que no outro em carretas"... Melhores dias hão de vir... Eu sei que custa ficar sozinho em casa... Mas é nestas alturas que temos de pôr a imaginação e a criatividade a trabalhar... Hoje a minha neta, a primeira e única que tenho até agora, faz 4 meses... Com muita pena não vou poder estar com ela, para jantarmos todos em conjunto, mas já lhe fiz uma quadra festiva:

"Abaixo a pandemia, / Que a Clarinha está em festa,/ Hoje é dia de alegria, / Mesm' sem beijinhos na testa" (Assinam os avós, do Continente e da Madeira, "em quarentena", no dia em que a sua netinha faz 4 mesinhos de vida...).

Em suma, camaradas e amigos, a nossa geração tem uma responsabilidade acrescida, a de proteger e promover a nossa saúde, a da nossa família, dos nossos amigos, camaradas e demais concidadãos. Sigam e cumpram, com inteligêmcia, bom senso e ponderação,   as recomendações da Direção-Geral de Saúde.

 (E já agora, que têm mais tempo, vejam ou revejam a  "grande entrevista" dada à RTP 3, ontem pelo dr. Filipe Froes, pneumologista e intensivista do Hospital Polido Valente, de resto, pessoa que muito estimo e admiro desde que foi meu aluno do curso de doutoramento em saúde pública, na ENSP/NOVA há uns anos atrás.)

Luís Graça

PS - Por estas e demais razões, temos, de ponderar, muito seriamente, nos próximos dias a decisão de cancelar ou adiar (para o próximo outono, por exemplo) o nosso XV Encontro Nacional da Tabanca Grande, já marcado para o dia de 2 de maio de 2020, em Monte Real.

Recordo que em 2009, tivemos sorte: o IV Encontro Nacional da Tabanca Grande realizou-se, com 132 participantes, em 20 de junho de 2009, na Ortigosa, Monte Real,  já no inicio da gripe pandémica do H1N1 (, em Portugal, o primeiro doente infetado foi registado em 4/5/2009 e a primeira morte em 23/9/2009).

Em 1 de fevereiro de 2020, eu já estava receoso do que poderia vir a acontecer, defendo a realização do encontro em setembro o outubro: 

(...) "Estamos a tentar arranjar uma data para voltarmos a encontrarmo-nos, este ano, no nosso convívio anual... Será o XV Encontro Nacional da Tabanca Grande. Muito provavelmente no fim do verão, em 26 de setembro de 2020. Em Monte Real, se o atual surto de pneumonia por novo Coronavírus (2019-nCoV ou SARS-CoV-2) nos deixar, isto é, se não se transformar numa pandemia... Daremos notícias em breve. (...)"...  

Guiné 61/74 - P20726: Pequeno dicionário da Tabanca Grande (11): edição, revista e aumentada, Letras R / S /T / U / V / Z


Guiné > Região de Quínara > Empada > CCAÇ 1587 (Cachil, Empada, Bolama e Bissau, 1966/68) > Ualada > Destacamento "Rancho da Ponderosa> O soldado Jorge Patrício, à porta do destacamento. A tabanca terá sido abandonada pela população e o destacamento desativado no segundo semestre de 1968 (, facto a confirmar), na sequência da retração e racionalização do dispositivo no CTIG, no início do "consulado" de Spínola, altura (2º semestre de 1968/ 1º semestre de 1969) em que foram abandonadas outras posições como Ponta do Inglês, Gandembel, Ganturé, Cacoca, Sangonhá, Beli, Madina do Boé, Cheche... (Em 2009, o José Patrício vivia em Viseu, já aposentado da função pública.)

O destacamento deve ter sido construído pela CCAÇ 1423 (RI 15, Tomar), que ocupou o aquartelamento de Empada entre janeiro de 1966 e dezembro do mesmo ano, seguindo depois para o Cachil. [Foi comandada pelo cap inf Artur Pita Alves,cap inf  João Augusto dos Santos Dias de Carvalho, cap cav Eurico António Sacavém da Fonseca, de novo, cap inf João Augusto dos Santos Dias de Carvalho, e de novo,  cap inf Artur Pita Alves. Ostentou como Divisa “Firmes e Constantes”.]

Antes da CCAÇ 1423, estiveram em Empada:


(i) a CCAÇ 616 (RI 1, Amadora), ocupou o aquartelamento entre abril de 1964 e janeiro de 1966, quando acabou a comissão. [Foi comandada pelo nosso grã-tabanqueiro , de Ferrel, Peniche, alf mil Joaquim da Silva Jorge, pelo cap mil inf Francisco do Vale, cap inf José Pedro Mendes Franco do Carmo, de novo pelo alf mil inf Joaquim da Silva Jorge e cap cav Germano Miquelina Cardoso Simões; ostentou como Divisa “Super Omnia”]M

(ii) segui-se a Companhia de Milícias n.º 6, do recrutamento local, quem ocupou o aquartelamento entre Janeiro de 1965 e Dezembro de 1971, até à extinção da força.

Por informação posterior, do nosso amigo e camarada Joaquim Jorge, ficamos a saber que "quem "fundou e construiu a 'Ponderosa' foi a CCAÇ 616 da qual eu era comandante em 17 de Março de 1965." O nome é seguramente influenciado pela popular série televisiva 
Bonanza, que passou na RTP no início dos anos 60, e  que narrava a saga familia da família Cartwright, pai, viúvio, e três  três filhos (de mães diferentes), que vivem no velho Oeste, em Neva, na defesa de seu rancho Ponderosa.

Fonte: Cortesia do CM - Correio da Manhã, edição de 4/10/2009. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Guiné > Região de Bolama > Nova Sintra > 1972 > Entrada do quartel dos Duros de Nova Sintra, a CART 2711, 1970/72... É possível que este pórtico, "Rancho dos Duros", tenha sido inspirado pelos vizinhos, mais antigos, do "Rancho da Ponderosa", destacamento de Ualada, subsetor de Empada, ao tempo da CCAÇ 1587 (1966/68).

Foto (e legenda): © Herlander Simões (2007). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagen complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]




1. Ultima parte da publicação do Pequeno Dicionário da Tabanca Grande (*), de A a Z, em construção desde 2007, com o contributo de todos os amigos e camaradas da Guiné que se sentam aqui à sombra do nosso simbólico e fraterno poilão. Entradas das letras R/S/U/V/Z. Esperam-se comentários, críticas e sugestões dos nossos leitores.

Letra R


Rabecada - Vd. piçada (calão)

Racal - 
TR 28, um equipamento portátil, de origem sul-africana, podendo ser usado em viaturas ou às costas do operador. Creio que não era usado em aviões, transmitindo em fonia. As frequências poderão ser estas (de 38 a 54,9 Mc/s) e estavam agrupdos e grupos de 4 que comunicavam entre si. 

RAL - Regimento de Artilharia Ligeira


Rancho da Ponderosa - Destacamento construído pela CCAÇ 616 (Empada, 1964/66); localizava-se na tabanca de Ualala 

Rancho Os Duros - Quartel dos Duros de Nova Sintra, a CART 2711, 1970/72

RCacheu - Rio Cacheu

RCorubal - Rio Corubal

RCumbijã - Rio Cumbijã

RDM - Regulamento de Disciplina Militar


Ref - Militar na Reforma

R
eforço - Aumento das medidas de segurança dos nossos aquartelamentos ou da força que as materializava; havia outras formas de reforço: do rancho, de verba ou algumas situações táctica-administrativas em que algumas pequenas unidades poderiam estar.

RELIM - Abreviatura de Relatório Imediato

Reordenamento (REORD) - Aldeia estratégica, construída pelas NT, 
reagrupando uma ou mais tabancas Aldeia estratégica, construída pelas NT, reagrupando uma ou mais tabancas, visando impedir o contacto das populações com o IN e aumentar as suas capacidades de defesa.
Rep - Repartição (do Quartel-General)


REPACAP - Repartição do QG/ComChefe / Assuntos Civis e Acção Psicológica  

Res - Militar na Reserva (ou seja, antes da Reforma)


RFoto - Reconhecimento fotográfico (FAP)

RGeba - Rio Geba

RI - Regimento de Infantaria (ex., RI 2, Abrantes)

RN - Reserva Naval (Marinha)


Rocket - Granada lançadas pelo RGP 2 ou RPG 7 (PAIGC; roquete (Projéctil com um motor de propulsão);as s NT usavam rockets 37 mm disparados por um LGF "improvisado", uma bateira nas LFP da Marinha e pela FAP.

Rôz kuntango (ou simplesmente Kuntango) - Arroz cozinhado (bianda) sem mafe(crioulo)

RPG - Lança-granadas-foguete (PAIGC): havia o RPG2 e o RPG7; e ainda o
 P27 (Pacerovka)

RVIS - Voo de reconhecimento aéreo (FAP)



Letra S


SA-7 - Míssil Sam-7, Strela, de origem russa (PAIGC)

Sabe sabe - Gostoso (crioulo)

Sakalata - Confusão, conflito, chatice (crioulo)

Salgadeira - Urna funerária, caixão (gíria)

SAM - Serviço de Administração Militar, especialidade do Exército

Sancu - Macaco (crioulo)

Sec - Secção; equipa (Um Gr Comb ou pelotão era composto por 3 Sec) (NT)

Setor L1 - Setor 1 da Zona Leste (Bambadinca, Região de Bafatá) (NT)

Sexa - (i) Sua Excelência; mas também (ii) Sexagenário (gíria)


SG - Serviço Geral (FAP)

SGE - Serviço Geral do Exército; oficiais oriundos da classe de sargentos, depois de frequentarem a Escola Central de Sargentos em Águeda

Siga a Marinha - Embora, vamos a isto! (gíria)

Sintex - Pequena embarcação, de fibra, com motor fora de bordo, de 50 cavalos, usado para cambar um rio; parecia uma banheira (NT)

SM - Serviço de Material (vd. Ferrugem)

SNEB - Rocket antipessoal, de calibre 37 mm, que equipava o T-6 e que também era usado pelos paraquedistas e demais tropas (por ex.,  africanas) como LGFog

Sold - Soldado

Sold Arv - Soldado Arvorado

Solmar - Cervejaria de Bissau, do tempo colonial

SPM - Serviço Postal Militar

Srgt - Sargento

STM - Serviço de Transmissões Militares

Strela - Flecha, em russo (стрела); míssil russo terra-ar SAM 7

Suma - Como, igual (crioulo) 


Supintrep - Relatório de informação suplementar (Vd. Perintrep)

Supositório - Granada de obus (gíria) 



 Letra T


T/T - Navio de Transporte de Tropas (v.g., T/T Niassa, T/T Uíge)

T6 - Avião bombardeiro, monomotor; equipado c/ lança-roquetes e metralhadora (NT) 

Tabanca - Aldeia (crioulo); mas também morança, cubata, casa: mas também tertúlia (v.g., Tabanca de Matosinhos



Tabanca da Lapónia - Iglô, no círculo polar ártico, onde quem manda é o o luso-lapão ["sami"...] Joseph Belo, que se refugia aqui para fugir aos furacões de Key West, na Flórida. Na Internet, não tem pouso certo.

Tabanca da Linha (ou A Magnífica Tabanca da Linha) - Tertúlia de ex-combatentes da guerra colonial, que abrange a Grande Lisboa; reune-se em Algés, ultimamente no Restaurante Caravela de Oiro; régulos: Jorge Rosales (1939-2019) e Manuel Resende (desde 2019). 


Tabanca da Maia - Tertúlia de ex-combantentes da guerra colonial, com sede na Maia; régulo: José Casimiro de Carvalho



Tabanca de Matosinhos (,ou Tabanca Pequena) - A mais antiga das nossas tertúlias de convívio de ex-combatentes, amigos da Guiné-Bissau, que se sentam à sombra do poilão da Tabanca Grande; tem sede em Matosinhos; abanca no restaurante Espigueiro [, ex-"Milho Rei"; tem página no Facebook

Tabanca do Centro - Tertúlia de ex-combantentes da guerra colonial, com sede em Monte Real, Leiria; edita a revista "on line" Karas, diretor: Miguel Pessoa; régulo: Joaquim Mexia Alves;



Tabanca dos Melros - Tertúlia de ex-combatentes,  com sede em Fânzeres, Gondomar; abanca no restaurante Choupal dos Melros; tem blogue e página no Facebook

Tabanca Grande – A mãe de todas as tabancas ou tertúlias de antigos combatentes da Guiné que se foram criando ao longo dos anos (desde 2004); tem este blogue e também página no Facebook (v.g., Tabanca de Matosinhos, Tabanca do Centro, Tabanca da Linha, Tabanca dos Melros, Tabanca da Maia, Tabanca do Algarve, Tabanca da Lapónia, etc.) 




Tabanca do Centro, Monte Real, Leiria


Tarrafe - Vegetação aquática, típica das zonas ribeirinha 

Taufik Saad - Casa comercial, de origem libanesa, em Bissau

 

Taxy Way - Caminho de rolagem (FAP)

Tchora - Chorar (crioulo)

Tem manga di sabe sabe - Muito gostoso (crioulo)

Ten - Tenente

Ten Cor - Tenente-Coronel

Ten Gen - Tenente General, antigo general de 
3 estrelas [Posto reintroduzido no Exército Português em 1999, em substituição do posto de general de 3 estrelas; é a mais alta patente de oficial general no ativo, já que os postos superiores são apenas funcionais ou honoríficos: por exemplo, chefe do estado maior general].

Tertúlia – Reunião regular de amigos e camaradas (, também sinónimo de Tabanca Grande)

TEVS - Transporte em evacução (FAP)

Tigre de Missirá - Nome de guerra (Alf Mil Beja Santos, Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70; nosso grã-tabanqueiro da primeira hora)

Tigres - Esquadra de Fiat G-91, na BA 12


TN - Território nacional

TO - Teatro de Operações

Toca-toca - Transporte colectivo, privado, nas zonas urbans da Guiné-Bissau (carrinha tipo Hyace, de cores azul e amarela) (crioulo)


Tocar uma punheta aos obuses - 



Guiné > Regoão de Bafatá > Setor L1 (Bambadinca) > CCAÇ 12 (1969/71) + CART 2520 (1969/70) > Op Safira Única, 21 de janeiro de 1970, no subsetor do Xime, nas proximidades da Ponta do Inglês


Uma pistola de origem soviética, Tokarev, de 7,62, igual ou parecida à que que foi apreendida ao guerrilheiro Festa Na Lona, na Ponta do Inglês, no decurso da Op Safira Única ... Pelo que me recordo, esta pistola ficou à guarda do alf mil Abel Maria Rodrigues, comandante do 3º Grupo de Combate da CCAÇ 12 (onde eu muitas vezes me integrei, conforme as faltas de pessoal...) , que a tomou como ronco... Não sei se a conseguiu trazer para a Metrópole e legalizá-la... Ao que parece, esta arma teve a sua estreia na Guerra Civil de Espanha, em 1936, nas fileiras do exército republicano, estando distribuída a pilotos e tripulações de tanques, entre outros... (LG). 

Fonte: Kentaur, República Checa (2006) [página já não disponível]

(...) Por volta das 15. 30h, já nas proximidades do objectivo, foram notados indícios de presença humana: trilhos batidos, moringas nas palmeiras para recolha de vinho e um cesto de arroz.

Seguindo um dos trilhos, avistou-se um homem desarmado que seguia em direcção contrárias às NT. Capturado, informou que ia recolher vinho de palma, que a tabanca ficava próxima, que não havia elementos armados e que a maior parte da população estava àquela hora a trabalhar na bolanha.

Feita a aproximação com envolvimento, capturaram-se mais 2 homens, 5 mulheres e 6 crianças. Um dos homens capturados disse chamar-se Festa Na Lona, de etnia Balanta, estar alí a passar férias e pertencer a uma unidade combatente do Gabu. Foi-lhe apreendido uma pistola Tokarev (7,62, m/ 1933) e vários documentos.

Havia 2 tabancas, cada uma com 4-5 casas, afastadas umas das outras cerca de 200 metros. Cada casa era revestida de chapa de bidão e coberta de capim. Para o efeito foram aproveitados os bidões existentes no antigo aquartelamento da Ponta do Inglês que as NT haviam retirarado  em novembro de 1968.

Foram destruídos todos os meios de vida encontrados e incendiadas casas, a excepção das que ficaram armadilhadas. Os 2 Dest executaram toda a acção sem disparar um único tiro. A  retirada fez-se igualmente a corta-mato em direcção de Gundagué Beafada, tendo-se chegado ao Xime pelas 18.30h. Durante a noite, a Artilharia fez fogo de concentração sobre os acampamentos IN do Baio/Buruntoni e Ponta Varela/Poindon. (...)

Fonte: Extractos de: História da CCAÇ. 12: Guiné 1969/71. Bambadinca: Companhia de Caçadores 12. 1971. Capítulo II. 24-26.


Tokarev - Pistola de calibre 7,62 mm, de origem soviética (PAIGC)

TPF - Transmissões Por Fios

Trms - Transmissões

Tropa-macaca - Por oposição a tropa especial (páras, comandos, fuzos) (termo depreciativo, gíria); infantes

TSF - Transmissões Sem Fios

Tuga - Português, branco, colonialista (termo na altura depreciativo) (crioulo)

Turpeça - Banquinho, de três pés, onde se sentam em exclusivo os régulos felupes (crioulo)

Turra - Terrorista, guerrilheiro, combatente do PAIGC (termo na altura depreciativo)



Letra U

Ultramarina - Sociedade Comercial Ultramarina, ligada ao grupo BNU; rival da Casa Gouveia, do grupo CUF

Uma larga e dois estreitos - Galões de tenente-coronel

UXO - Unexploded (Explosive) Ordenance (em inglês); Engenhos Explosivos Não Explodidos (em português)



Letra V

Vè-Cê-Vê  (ou VCC) - Velhinho Como o C... Militar que ultrapassou o tempo legal da comissão de serviço no CTIG (21/22 meses) (calão)

 
Velhice - Militares em fim de comissão (gíria)

Vietname - Guiné, para lá de Bissau; mato ('versus'... "guerra do ar condicionado")




Letra Z 

ZA - Zona de Acção

Zebro - Barco de borracha com motor fora de borda, usado pelos fuzileiros

ZI - Zona de Intervenção (do Com-Chefe)

ZLIFA - Zona Livre de Intervenção da Força Aérea

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31 de dezembro de 2019 > Guiné 61/74 - P20516: Pequeno dicionário da Tabanca Grande, de A a Z (8): edição, revista e aumentada, Letras I, J, K e L

28 de dezembro de 2019 > Guiné 61/74 - P20506: Pequeno dicionário da Tabanca Grande, de A a Z (7): edição, revista e aumentada, Letras F, G e H

3 de dezembro 2019 > Guiné 61/74 - P20411: Pequeno dicionário da Tabanca Grande, de A a Z (6): edição, revista e aumentada, Letras D/E

18 de outubro de 2019 > Guiné 61/74 - P20255: Pequeno dicionário da Tabanca Grande, de A a Z (5): edição, revista e aumentada, Letra C

14 de outubro de 2019 > Guiné 61/74 - P20240: Pequeno Dicionário da Tabanca Grande, de A a Z (4): 2ª edição, revista e aumentada, Letras M, de Maçarico, P de Periquito e C de Checa... Qual a origem destas designações para "novato, inexperiente, militar que acaba de chegar ao teatro de operações" ?

13 de outubro de 2019 > Guiné 61/74 - P20237: Pequeno Dicionário da Tabanca Grande, de A a Z (3): 2ª edição, revista e aumentada, Letra B

13 de outubro de 2019 > Guiné 61/74 - P20235: Pequeno Dicionário da Tabanca Grande, de A a Z (2): 2ª edição, revista e aumentada, Letra A

30 de dezembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2389: Abreviaturas, siglas, acrónimos, gíria, calão, expressões idiomáticas, crioulo (6): Racal (José Martins)

29 de Dezembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2388: Abreviaturas, siglas, acrónimos, gíria, calão, expressões idiomáticas, crioulo (5): Periquito (Joaquim Almeida)

26 de junho de 2007 > Guiné 63/74 - P1887: Abreviaturas, siglas, acrónimos, gíria, calão, expressões idiomáticas, crioulo (3)... (Zé Teixeira)


24 de junho de 2007 > Guiné 63/74 - P1874: Abreviaturas, siglas, acrónimos, gíria, calão, expressões idiomáticas, crioulo (2)... (António Pinto / Joaquim Mexia Alves)

23 de Junho de 2007 > Guiné 63/74 - P1872: Abreviaturas, siglas, acrónimos, gíria, calão, expressões idiomáticas, crioulo (1)...(Luís Graça)