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terça-feira, 19 de janeiro de 2021

Guiné 61/74 - P21781: Notas de leitura (1335): Os serviços de saúde militar e a guerra colonial - Parte I (Luís Graça)


Lisboa > Fundação Calouste Gulbenkian > 9 de novembro de 2017 > Barros Veloso apresenta o livro, de que foi o principal organizador, "Médicos e Sociedade: para uma história da medicina em Portugal no século XX"... Um dos 50  capítulos é dedicado aos serviços de saúde militares durante a guerra colonial, da autoria do coronel médico Carlos Vieira Reis.

Cortesia da Sociedade Portuguesa de Medicina Interna (2017)


Nota de leitura - I Parte

por Luís Graça


Reis, Carlos Vieira – A Guerra Colonial. In: Veloso A. J., Mora, L. D., Leitão, H., (Eds.) (2017). Médicos e sociedade: para uma história da medicina em Portugal no século XX. Lisboa: By The Book, pp. 492-505

 

O autor do capítulo sobre os serviços de saúde militares durante a guerra colonial Carlos Vieira Reis,  é coronel médico e escritor, foi diretor de serviço de cirurgia, director  clínico do Hospital Militar Principal e presidente da União Mundial dos Escritores Médicos.

Resumo: A organização e o funcionamento dos serviços de saúde militar, durante a guerra colonial / guerra do ultramar, é um dos cinquenta capítulos da obra verdadeiramente enciclopédica, de que o meu ilustre amigo A. J. Barros Veloso (médico, músico de jazz e historiador, especialista de medicina interna, ex-diretor de serviço do Hospital dos Capuchos, Hospitais Civis de Lisboa) foi o principal editor literário, para não dizer mesmo a verdadeira “alma mater”: “Médicos e sociedade: para uma história da medicina em Portugal no século XX”.

Barros Veloso é, de resto, o autor ou coautor de 15 capítulos. A obra, com um total  863 páginas, reúne a colaboração de cerca de quatro dezenas de especialistas da história da medicina portuguesa no séc. XX (, incluindo, modéstia à parte, o meu nome, no que diz respeito à génese e desenvolvimento da saúde pública).

 

Dispositivo sanitário no terreno 

e  doenças mais frequentes


Carlos Vieira Reis dá-nos a sua visão, por dentro, do sistema de saúde militar que, neste período, assentava no seguinte modelo de dispositivo: 

  • hospital central
  •  centro de convalescença
  • hospital de evacuação
  • enfermaria de tuberculose (só em Angola, Nova Lisboa, hoje Huambo)
  • destacamento misto de cirurgia e reanimação
  • enfermaria de setor
  • depósito de material sanitário
  •  sucursal do laboratório militar de produtos químicos e farmacêuticos
  •  destacamento de doenças tropicais
  • destacamento de inspeção de alimentos
  • destacamento de desinfestação
  • destacamento de inspeção de águas
  •  e equipa estomatológica.

Este dispositivo podia variar, em função das características territoriais  e operacionais (p. 492): por exemplo, em Angola, optou-se pela concentração logística em Luanda, dada a sua “relativa proximidade” da zona militar e da actividade operacional (inicialmente centrada no Norte).

A cobertura sanitária do território  angolano incluía: 

(i)  dois hospitais de evacuação (um no Luso, hoje Luena, no Leste; e outro em Cabinda, no Norte);  

(ii) 10 enfermarias de sector;

(iii) e ainda “um número significativo de órgãos de apoio sanitário com alguma mobilidade”… 

Já no caso da Guiné, e devido à sua pequena extensão territorial, foi possível fazer-se a concentração em Bissau dos órgãos de apoio sanitário.

A prevenção das doenças endémicas, infecciosas e parasitárias (paludismo, tuberculose, etc.) foi considerada uma das prioridades da missão dos serviços de saúde militares;

(…) “O paludismo destacou-se pela morbilidade (mais de 33 000 casos registados anualmente no pessoal militar em Angola) e também pela mortalidade nos militares de raça branca” (sic)  (p. 493).

A tuberculose era causa de morte sobretudo entre os negros. Mas também há a registar casos, que o autor não quantifica, de febre tifóide, disenteria (bacilar e amebiana), filaríase, “e um grande número de casos de doença do sono e febre-amarela” (p. 493).

Outras doenças também mereceram atenção especial: dermatomicoses, doenças das vias respiratórias, doenças gastrointestinais, hepatites infeciosas,  raiva e cólera.

Os serviços de saúde regiam-se pelas famosas NEP (Normas de Execução Permanente) e o Manual de Prevenção das Doenças e Socorros  Urgentes nas Regiões Tropicais.


Prevenção e profilaxia da malária / paludismo


O autor considera ter sido um sucesso o regime (obrigatório) de quimioprofilaxia da malária (com a administração da camoprima) e da doença do sono (com a pentamidina) (p. 493).

E, a propósito recorda, que “o médico da companhia” (quando o havia, já que na Guiné, no meu tempo, em 1969/71, o que era correto era dizer-se “o médico do batalhão”…) tinha,à sua responsabilidade, a saúde de 160 homens, uma parte com baixa literacia funcional (para não falar da literacia em saúde…), a quem tinha que ministrar conhecimentos básicos de higiene e prolifaxia, e lidar com preconceitos, atitudes e comportamentos pouco ou nada salutogénicos: por exemplo, nem todos os militares aderiam à toma diária, “obrigatória”,  do comprimido antipalúdico (em geral, a cloroquina, o quinino do Laboratório Militar), com o falso argumento de que… “fazia mal à tusa”!...

E a grande frequência de casos de blenorragia (“esquentamentos”) também era o resultado da falta de informação e educação em matéria de saúde sexual (p. 406).

Recorde-se, por outro lado,  que a vacinação era também obrigatória para a varíola, a febre tifóide, a febre-amarela, o tétano, a poliomielite, a cólera. O programa de rádio-rastreio das doenças pulmonares era realizado em Portugal e nos territórios ultramarinos, mas não sabemos o grau de cobertura… 

Mais preocupante ainda era  a situação da saúde oral : por exemplo, em  1962, em Angola, mais de 1/3 das consultas hospitalares, efectuadas pelos militares, eram do foto da estomatologia (pág. 503).


Morbimortalidade

Interessantes são os números que o autor avança para estimar a morbilidade: cerca de 25 mil feridos em combate, dos quais 15 mil ficaram com “sequelas definitivas dos seus ferimentos”. Não há, porém, números relativos à saúde mental…

Da pesquisa dos registos epidemiológicos nos relatórios anuais dos Quartéis Generais das Regiões Militares  de Angola e Moçambique e do Comando Territorial Independente da Guiné, só se conseguiu obter, infelizmente,  informações sobre a RM Angola, relativamente ao período de 1968-1971.

Nesses quatro anos, regista-se um aumento do número de casos de disenteria amebiana, filaríase, blenorragia e sífilis. Também o alcoolismo e as hepatites tiveram um acréscimo significativo. No conjunto das patologias identificadas, “notou-se o elevado número de casos de infeções respiratórias, gastroenterites e sobretudo doenças dos dentes” (p. 494).

No que respeita à mortalidade, “estão documentadas 9 196 mortes, dos quais 8 920  do Exército e 906 da Marinha e da Força Aérea” (p. 494).  

As mortes em combate atingem a percentagem de 45,58%, sendo as restantes causas de morte o  acidente (, de viação, arma de fogo, afogamento e outras) (36,90%) e a doença (14,52%).

De uma lista de 1 204 mortos por doença, na população militar de adultos jovens (média etária: c. 26 anos), só foi possível localizar 429 processos (35,6%, pouco mais de um terço) no Arquivo  Geral do Exército.

Em Angola, a causa das mortes por doença, em 107 militares  (66%) foi determinada por autópsia, método este muito menos utilizado na Guiné e em Moçambique (apenas em cerca de 30% dos casos).

De acordo com a Classificação Internacional das Doenças (CID-10), da Organização Mundial de Saúde, usada “a posteriori” (, uma vez que não existia na época o CID),ficamos a saber o seguinte (p. 494):

(i)               As doenças infeciosas e parasitárias, no seu conjunto, representavam 36% do total, com destaque para a malária e a tuberculose (37 e 27 casos, respetivamente);

(ii)             ao conjunto das outras doenças cabiam os restantes 64%, onde se incluíam as neoplasias (73 casos) e as doenças  do aparelho circulatório (41 casos) e ainda as  doenças renais.


A idade média de mais de 4/5 dos mortos por doença era igual ou inferior a 23 anos. A média dos restantes (18,6%) era de 42,7 anos. (Tratava-se sobretudo, neste grupo, de militares do quadro permanente, sendo as principais causas de morte as doenças malignas e as doenças do aparelho circulatório.) (p. 494).


30 mil evacuações para a Metrópole

Durante toda a guerra, ter-se-á realizado um total (estimado) de 30 mil evacuações para a Metrópole, a maioria estando documentada nos processos existentes no Arquivo Geral do Exército (p. 494).

O regime de evacuação, definido para os 3 teatros de operações, era o seguinte:


  • 10 dias, para a enfermaria de subsector (Batalhão);
  • 20 dias (Angola) e 30 dias (Moçambique), para a enfermaria de sector;
  • 60 dias, para o hospital de evacuação;
  • 90 dias, para o hospital geral (por ex., HM 241, Bissau);
  • tratamento definitivo, no caso do hospital militar principal e hospital militar de doenças infecto-contagiosas (Lisboa).

O autor refere que, no entanto, só há registos de evacuações de:

  • Angola, em 1962 (6519), 1968 (412), 1969 (602), 1970 (477) e 1971 (720);
  • Guiné, em 1972 (620) e 1973 (786); 
  • Moçambique, em 1970 (477) e 1971 (426).


Relativamente a evacuações médicas dentro dos TO, só há dados referentes a Moçambique, em 1970 e 1971, com respetivamente 4314 e 4107 evacuações médicas efetuadas por via área (p. 504).

Veremos a seguir, com detalhe, os recursos, nomeadamente humanos e técnicos, que o sistema de saúde militar dispunha. 

Por lapso ou não, o autor não faz qualquer referência ao papel das nossas queridas enfermeiras paraquedistas. Talvez na Guiné esse papel fosse mais valorizado do que em Angola.

O autor, pelo que.  percebi, foi cirurgião no Hospital do Luso durante 14 meses e é a partir dessa experiência angolana que aborda os problemas de saúde e da organização e funcionamento dos serviços de saúde militares.

Cite-se, entretanto,  a conclusão do seu artigo, em jeito de introdução à segunda parte desta nossa nota de leitura:

“Durante a Guerra Colonial, os médicos viveram, de várias formas, uma experiência única, em que testaram ao limite a sua profissão e trabalharam até à exaustão sem a sensação de que isso constituísse um sacrifício. 

Desempenharam uma tarefa dignificante, na medida em que levaram a esperança aos combatentes e deram um  passo enorme na reconquista das populações indígenas. 

No meio  de guerras intestinas desnecessárias, fizeram amizades para toda a vida e entregaram-se por inteiro e com orgulho  à missão que lhes foi confiada. 

A sua presença ficou, por isso,  como um momento que os honra e merece ser recordado” (p. 503).

Não podemos estar mais de acordo.

(Continua)

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quarta-feira, 5 de agosto de 2020

Guiné 61/74 - P21226: Agenda cultural (751): Sai amanhã, quinta-feira, com os jornais "Correio da Manhã" e "Sábado", o volume n.º 29, "Saúde" (, de 64 pp., da autoria de Luís Graça), da coleção "Memória de Portugal: dois séculos de fotografia"


"Saúde", volume nº 29, da coleção "Memória de Portugal: 2 séculos de fotografia"  (Lisboa, Atlântico Press, 2020, 64 pp)

[Sinopse da coleção: 

(i) "uma viagem visual e narrativa da história do nosso país, desde o surgimento da fotografia até à década de 1980"; 

(ii) total de 30 livros.

(iii) apresentada pelo professor universitário e ensaísta, Guilherme d’Oliveira Martins.

(iv) mais de 2.000 fotografias inéditas dos principais arquivos do país, como a Torre do Tombo e Fundação Calouste Gulbenkian;

(v) sai um volume todas as quintas feiras com o jornal Correio da Manhã e a revista Sábado;

(vi) custo de cada volume (de cerca de 60 pp.): 4, 95 € (pode ser compardo "on line")

(vii) o primeiro volume (Grandes Tradições) saiu no dia 23/1/2020;

(viii) a edição é da Atlântico Press, Lisboa.


'Saúde' relata o longo caminho percorrido até à consagração constitucional do Serviço Nacional de Saúde, em pleno século xx. Acompanhamos o flagelo das doenças epidémicas, os dias negros da tuberculose e a posterior construção de sanatórios, dispensários e hospitais. Evocamos, também, o contributo de algumas figuras incontornáveis da nossa Medicina, como Ricardo Jorge, Sousa Martins ou Egas Moniz, que trabalharam em prol do bem-estar e do aumento do índice de esperança de vida dos portugueses.

Prefácio de António Barros Veloso
Médico e doutor «Honoris Causa» pela Universidade Nova de Lisboa


O texto do livro "Saúde: o longo caminho do progresso",é da autoria do nosso editor Luís Graça, e foi escrito em plena pandemia, entre 15 de maio e 15 de junho do corrente, "em contrarrelógio". É ilustrado por cerca de meia centena de fotografias.

Índice: Prefácio: heróis ignorados:  pp. 5 |  O longo caminho do progresso: pp. 6-7 |  Tempo de pioneiros:  o grande desafio da saúde pública;  pp. 8- 25 | Nascer e morrer:  epidemias e doenças da pobreza: pp. 26-43 | Direito universal: Século XX consagra a «saúde para todos»: pp. 44-67.

Há, por exenplo, uma  breve referência aos "Médicos Militares" (p. 39): 

"No século XX, Portugal esteve envolvido em dois conflitos armados externos: a Primeira Guerra Mundial (1914-1918), na qual perderam a vida 7760 soldados portugueses, e a guerra colonial. Com cerca de um milhão de homens, incluindo 200 mil africanos recrutados localmente, foi a que mais militares envolveu. Estão documentados 9196 mortos, por todas as causas – combate, acidente e doença – e 25 mil feridos.
Alguns milhares de jovens médicos enquadravam a força – um médico para cada 650 soldados – e davam, também, um excecional apoio sanitário às populações locais. Os Hospitais Militares, a começar pelo Principal, na Estrela, foram grandes escolas para estes médicos. O HM 241, em Bissau, chegou a ser considerado o melhor da África subsariana, com exceção da África do Sul.
Em 1965, foi criado o Regimento de Saúde, em Coimbra, para satisfazer as necessidades crescentes
de pessoal sanitário para os teatros de operações: médicos, enfermeiros, maqueiros. Os quadros
de saúde, e nomeadamente dos médicos milicianos, foram utilizados até à exaustão. A guerra também permitiu um grande desenvolvimento do Laboratório Militar de Produtos Químicos e Farmacêuticos."

Outros volumes que poderão interessar os nossos leitores; Guerras | Colónias | A epopeia do bacalhau | Mundo da infância... (São apenas sugestões, mas há outros títulos com interesse, como, por exemplo educação, arte, indústria, ilhas, Lisboa, cidades, desporto, profissões perdidas, comboios, praias e turismo,  festas populares, etc.;o último volume, o nº 30, é sobre a emigração, sai no dia 13 do corrente mês. )





Cortesia de Atlântico Press (2020)

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Nota do editor:

quinta-feira, 9 de novembro de 2017

Guiné 61/74 - P17952: Agenda cultural (604): Hoje, às 18h30, na Fundação Calouste Gulbenkian, no Auditório 2, sessão de lançamento da obra "Médicos e Sociedade: Para uma História da Medicina em Portugal no século XX" (Lisboa: By the Book, 2017, 863 pp.)....A obra foi superiormente coordenada por A. L. Barros Veloso, e tem cerca de 4 dezenas de autores, um dos quais o nosso editor Luís Graça (capítulo 04: "Ricardo Jorge e a modernização da Saúde Pública" , pp. 18-33)



1. Será apresentada hoje, na Fundação Calouste Gulbenkian, no Auditório 2,  às 18h30, a obra "Médicos e Sociedade: Para uma História da Medicina em Portugal no século XX" (Lisboa: By the Book, 2017, 863 pp.).

By the Book, Edições Especiais
Rua das Pedreiras, 16-4º
1400-271 Lisboa
Portugal


www.bythebook.pt
http://issuu.com/bythebook
www.facebook.com/bythebook

Ficha técnica do livro:

A. J. Barros Veloso (coord.), A. J. Barros Veloso, Luiz Damas Mora, Henrique Leitão (eds.),

Médicos e Sociedade. Para uma História da Medicina em Portugal no século XX

Lisboa: By the Book, 2017.

863 pp. 

ISBN: 978-989-8614-56-8

Preço de capa: c. 35 €


2. O nosso editor Luís Graça (, sociólogo da Saúde, professor jubilado da Escola Nacional de Saúde Pública, Universidade NOVA de Lisboa) é autor do capítulo 04: "Ricardo Jorge e a modernização da Saúde Pública" (pp. 18-33).  

São cerca de 4 dezenas os autores representados nesta obra monumental,  superiormente coordenada por A. J. Barros Veloso, e editada por A. J. Barros Veloso, Luiz Damas Mora e Henrique Leitão.

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Nota do editor:

Último poste da série > 8 de novembro de 2017 > Guiné 61/74 - P17948: Agenda cultural (603): Tertúlia de antigos Combatentes, subordinada ao tema "Histórias Com Rosto", a realizar no dia 17 de Novembro próximo, às 21,30 horas, no Auditório Municipal de Esposende (Fernando Cepa, ex-Fur Mil Art da CART 1689)