Não gostavas de escrever a azul.
Também não gostavas de escrever a vermelho.
Sempre gostaste de escrever a preto.
Em papel liso.
Sempre detestaste as linhas
mas nem sempre havia papel liso
nem esferográficas pretas.
Vermelho, não, carmesim (*),
como se dizia antigamente,
no tempo em que o vermelho era proibido
nas repartições públicas do Estado de Direito.
E muito menos
nos registos paroquiais
Carmesim e não vermelho,
era a cor das vestes dos cardeais.
Carmesim flamejante.
Também se usava o carmesim
nas provas tipográficas dos livros
no tempo em que os tipógrafos eram anarcossindicalistas
e tinham três ódios de estimação:
Deus, o Rei e o Capital.
Branca e azul era a bandeira.
Depois passou a ser verde e vermelha,
Por pudor dizia-se verde-rubra.
Rubra da cor das faces das moçoilas do povo
que era pouco republicano
e muito temente a Deus.
Deus que, nesse tempo,
Mas sempre a azul, celestial.
Deus, Pátria e Família
também só podiam ser escritos a azul.
Gostavas de escrever à mão.
Mas às vezes não tinhas esferográficas pretas, à mão.
E, depois, nem todas as esferográfica pretas prestavam.
Nem todas eram válidas e fiáveis.
arranhava o papel liso do teu bloco de notas gráfico.
Dizia-se bico (e náo ponta) no tempo da Bic.
Gostavas da Bic, passe a publicidade.
Mas depois a Bic passou a ser feita em países
que eram pouco fiáveis mas que tinham futuro.
O teu país era fiável,
e passava a navegar à bolina,
em linguagem náutica.
Ou à deriva,
E mataram-se uns aos outros.
carmesim
(car·me·sim)

Gradação muito carregada da cor vermelha.
nome masculino
1. Gradação muito carregada da cor vermelha.
2. Que tem essa cor.
Origem etimológica: árabe qirmezi, tingido de vermelho, de qirmiz, vermelhão, encarnado.
"carmesim", in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2025, https://dicionario.priberam.org/carmesim.
_______________
Último poste da série > 20 de março de 2025 > Guiné 61/74 - P26599: Manuscrito(s) (Luís Graça) (268): A velha Amura dos tugas, agora panteão nacional...