1. A escolha é do Valdemar Queiroz, que nos enviou no passado dia 19, às 14:25, este pungente poema de Natal, do David Mourão Ferreira (1927-1996), e que, ele, Valdemar, dedica a todos "os que estão sós, velhos e doentes (que às vezes me lembro ser o meu caso)".
Com este poste inauguramos uma nova série, "A Nossa Poemateca".
O nosso leitor manda-nos um poema de que gosta, da sua autoria ou de algum poeta lusófono (português, brasileiro, cabo-verdiano, guineense, são tomense, angolano, moçambicano, goês, macaense, timorense, e por aí fora). A gente em princípio publica (depois de uma primeira apreciação crítica).
Temos de ter em atenção os direitos de autor: se o poema não for original, convém indicar a fonte: o autor,o título do livro, a editora, o local, a data, a página...
De qualquer modo, este é um exercício de "blogoterapia" (ler poesia faz bem à saúde de cada um de nós e ao moral das nossas tropas...), mas também de divulgação dos nossos poetas lusófonos ("Do Minho a Timor", sem complexos de superioridade ou inferioridade, e muito menos sem ressentimentos: afinal, a nossa Pátria é a nossa língua, é um território mais vasto que o delimitado pelas nossas fronteiras...).
O Valdemar Queiroz tem 195 referências no nosso blogue. Integra a nossa Tabanca Grande desde 16/2/2014. Foi fur mil art, CART 2479 / CART 11 (Contuboel, Nova Lamego, Canquelifá, Paunca, Guiro Iero Bocari, 1969/70).
O Valdemar Queiroz tem 195 referências no nosso blogue. Integra a nossa Tabanca Grande desde 16/2/2014. Foi fur mil art, CART 2479 / CART 11 (Contuboel, Nova Lamego, Canquelifá, Paunca, Guiro Iero Bocari, 1969/70).
Minhoto de nascimento (Afife, Viana do Castelo), veio para Lisboa trabalhar, ainda menino e moço. A inspeção do trabalho nunca deu conta de nada... Afinal, era preciso ganhar para a bucha...Depois foi Valdemar Queiroz "Embaló" lá na zona leste da Guiné, em 1969 e 1970.
É doente crónico, portador de uma DPOC (Doença Pulmonar Obstrutiva Crónica). Pai e avô, com filho e netos nos Países Baixos. É um lutador nato e um exemplo para todos nós. "Parte mantenhas" em crioulo com a vizinhança que passa sob a a sua janela: vive na Rua (multiétnica) de Colaride, Agualva-Cacém, Sintra. E é um leitor (e comentador) quotidiano do Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Já lhe ofereceram um "pelouro": diz que não quer ser "corrompido"...
A Nossa Poemateca (1)
LADAINHA DOS PÓSTUMOS NATAIS
Por David Mourão Ferreira (1927-1996)
Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que se veja à mesa o meu lugar vazio
Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que hão-de me lembrar de modo menos nítido
Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que só uma voz me evoque a sós consigo
Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que não viva já ninguém meu conhecido
Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que nem vivo esteja um verso deste livro
Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que terei de novo o Nada a sós comigo
Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que nem o Natal terá qualquer sentido
Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que o Nada retome a cor do Infinito
David Mourão-Ferreira,
in "Cancioneiro de Natal" (Prémio Nacional de Poesia, 1971)
(Lisboa, Editorial Verbo, 1971)