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quarta-feira, 26 de abril de 2017

Guiné 61/74 - P17284: "Expedicionários do Onze a Cabo Verde (1941/1943)", da autoria do capitão SGE José Rebelo (Setúbal, Assembleia Distrital de Setúbal, 1983, 76 pp) - Parte XII: O "cancioneiro" da Ilha do Sal



Cabo Verde > Ilha do Sal > Pedra Lume > 1942 > Militares expedicionário da 1ª companhia do 1º batalhão do RI 11 (Setúbal).  O primeiro à esquerda é o 1º cabo Feliciano Delfim Santos,  pai do nosso camarada e membro desta Tabanca Grande Augusto Silva dos Santos (que reside em Almada e foi fur mil da CCAÇ 3306/BCAÇ 3833, Pelundo, Có e Jolmete, 1971/73).

Foto (e legenda): © Augusto Silva Santos (2017). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]






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1. Continuação da publicação da brochura "Expedicionários do Onze a Cabo Verde (1941/1943)", da autoria do capitão SGE ref José Rebelo (Setúbal, Assembleia Distrital de Setúbal, 1983, 76 pp. inumeradas, il.) [, imagem da capa, à direita].(*)
José Rebelo, capitão SGE reformado, foi em plena II Guerra Mundial um dos jovens expedicionários do RI I1, que partiu para Cabo Verde, em missão de soberania, então com o posto de furriel (1º batalhão, RI 11, Ilha de São Vicente, ilha do Sal e ilha de Santo Antão, junho de 1941/ dezembro de 1943). Faria depois da Escola de Sargentos de Águeda. Promovido a alferes, comandou a GNR em Tavira, até 1968. Colaborava com regularidade, no jornal "Povo Algarvio", onde o nosso camarada Manuel Amaro o conheceu, pessoalmente. Em 1969, já capitão, sendo o Comandante da Companhia da Formação no Hospital Militar da Estrela, em Lisboa.

É provável que já não esteja entre os vivos [, e no caso de estar vivo, terá os seus 96/97 anos]. De qualquer modo, é credor de toda a nossa simpatia, apreço e gratidão, cabendo-nos por isso honrar a sua memória e a dos seus camaradas, onde se incluíram os pais de alguns de nós, mobilizados para Cabo Verde, por este e por outros regimentos.

[Foto, à esquerda,  do então furriel José Rebelo, expedicionário do 1º batalhão do RI 11]

A brochura, de grande interesse documental, e que estamos a reproduzir, é uma cópia, digitalizada, em formato pdf, de um exemplar que fazia parte do espólio do Feliciano Delfim Santos (1922-1989), que foi 1.º cabo da 1.ª companhia do 1.º batalhão expedicionário do RI 11, pai do nosso camarada e grã-tabanqueiro Augusto Silva dos Santos (que reside em Almada e foi fur mil da CCAÇ 3306 / BCAÇ 3833, Pelundo, Có e Jolmete, 1971/73).

Recorde-se que se trata de  um conjunto de crónicas publicadas originalmente no semanário regional,  "O Distrito de Setúbal", e depois editadas em livro, por iniciativa da Assembleia Distrital de Setúbal, em 1983, ao tempo do Governador Civil Victor Manuel Quintão Caldeira. 

A brochura, ilustrada com diversas fotos, dos antigos expedicionários ainda vivos nessa altura, tem 76 páginas, inumeradas.  

O batalhão expedicionário do RI 11, Setúbal, com pessoal basicamente originário do distrito, partiu de Lisboa em 16 de junho de 1941 e desembarcou na Praia, ilha de Santiago, no dia 23. Esteve em missão de soberania na ilha do Sal cerca de 20 meses (até 15 de março de 1943), cumprindo o resto da comissão de serviço (até dezembro de 1943) na ilha de Santo Antão.

As páginas que publicamos hoje [cap XVIII,  das pp.  63 a 66ap ] não vêm numeradas no livro.

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Nota do editor:

Último poste da série  > 11 de abril de 2017 > Guiné 61/74 - P17234: "Expedicionários do Onze a Cabo Verde (1941/1943)", da autoria do capitão SGE José Rebelo (Setúbal, Assembleia Distrital de Setúbal, 1983, 76 pp) - Parte XI: trinta e nove anos depois, homenagem aos mortos, em 1981, em Setúbal


terça-feira, 6 de outubro de 2015

Guiné 63/74 - P15206: Lembrete (13): Todos os dias, de 2ª a 6ª feira, na Antena Um, às 14h55, o programa de António Luís Marinho, "Canções da Guerra"... Destaque para "Lágrima da preta": poema de António Gedeão (1961), musicado por José Niza e interpretado por Adriano Correia de Oliveira (1970)



Portal da RTP > "Canções da Guerra": programa de rádio, passa todo os dias, de 2ª a 6ª na Antena Um, às 14h55. Os episódios mais antigos e os mais recentes podem aqui ser vistos.

 O nosso blogue noticiou o arranque do programa e tem dado sugestões à equipa de produção e realização (*). Os ex-combatentes da guerra colonial na Guiné também têm o seu "cancioneiro", os seus versos e canções têm vindo a ser recolhidos ao longo dos anos pelo nosso blogue: aqui vão alguns dos nossos marcadores/descritores:

cancioneiro (63)
Cancioneiro de Bambadinca (3)
cancioneiro de Bedanda (2)
cancioneiro de Canjadude (2)
cancioneiro de Gadamael (1)
Cancioneiro de Gandembel (10)
Cancioneiro de Mampatá (4)
Cancioneiro do Niassa (2)
canção de Coimbra (1)
Canções do Niassa (4)
fado (37)
Fado da Guiné (7)
música (86)
música da tropa (1) [recordada hoje por guineenses, homens e mulheres]


Mas há mais cancioneiros (dispersos): Xime, Mansoa, Cufar, Bafatá, Buba, Empada... São alguns que me lembro de cor, e que têm recolhas de letras...

Um dos nossos camaradas, que está a colaborar com o programa "Canções da Guerra", é o José Martins com uma canção do Cancioneiro de Canjadude, que era uma paródia à canção "Óculos de Sol", interpretada por Natércia Barreto (**)...

Está na altura de ir, novamente, rapar o baú das nossas memórias (neste caso, poéticas e musicais)... Vamos criar uma nova série, "O Nosso Cancioneiro", para reunir todos estes materiais... Algumas das letras não eram musicadas ou perdeu-se a música... LG


1. Sinopse > “CANÇÕES DA GUERRA”

A Antena 1 apresenta "As Canções da Guerra".

A guerra colonial, tendo em conta o seu enorme impacto social, foi motivo de canções.

Desde o hino “Angola é Nossa”, criado após o início da rebelião em Angola, que levou a uma guerra que durou 14 anos.

As canções ligadas à guerra, falam da vida dos soldados, da saudade da terra, ou criticam de forma mais dissimulada ou mais directa, a própria guerra.

De 2ª a 6ª feira, às 14h55 na Antena1, ou nesta página, escute as canções da guerra colonial, enquadradas por uma história. Que pode ser a da própria canção, do seu autor ou de um episódio que com ela esteja relacionado.


Um programa: António Luís Marinho
Produção: Joana Jorge



2. Lágrima da preta, de António Gedeao (letra) e José Niza (música). Intrepatação de Adriano Correia de Oliveira.

Dos episódios mais recentes, permito-.me destacar este poema do António Gedeão, retirado do seu livro livro Máquina de Fogo (1961).

A "Lágrima de Preta" vai ser musicada  por José Niza, e cantada por Adriano Correia de Oliveira, em 1970 (, incluída no seu álbum Cantaremos). 

"O poema é um magnífico hino à igualdade de todas as raças. Apesar disso, ou talvez por causa disso, a censura proibiu a canção.", diz o realizador do programa, António Luís Marinho,

Aqui fica, a seguir,  o poema,que não me lembro de ter ouvido no meu tempo na Guiné: compreensivelmente ainda não fazia parte do reportório dos nossos "baladeiros" no mato... Popularizou-se depois do meu regresso, em março de 1971.

Nas noites de insónia, música e  álcool de Bambadinca, o que estava em voga (em 1969/71) era um outro poema do António Gedeão, a "Pedra Filosofal", cuja letra tinha para alguns de nós um segundo sentido... O último verso ( "ELES" não sabem nem sonham"...)  era cantado a plenos pulmões para "ELES", ali ao lado, ouvirem: o comando de batalhão, os oficiais superiores (tanto do BCAÇ 2852 como sobretudo do BART 2917)...

Para quem a quiser recordar, aqui está, disponível o poema no portal do CITI. É um poema de 1956, do livro Movimento Perpétuo

A interpretação de Manuel Freire ,no progama Zip-Zip, tornou-se "viral", como diríamos hoje... Espero que o Luís Marinho a inclua na sua seleção de "Canções da Guerra"... Muita malta sabia a  letra (e a música) de cor!... (LG). (***)


Lágrima de preta,  de Anónio Gedeão (1961)


Encontrei uma preta
que estava a chorar,
pedi-lhe uma lágrima
para a analisar.

Recolhi a lágrima
com todo o cuidado
num tubo de ensaio
bem esterilizado.

Olhei-a de um lado,
do outro e de frente:
tinha um ar de gota
muito transparente.

Mandei vir os ácidos,
as bases e os sais,
as drogas usadas
em casos que tais.

Ensaiei a frio,
experimentei ao lume,
de todas as vezes
deu-me o que é costume:

Nem sinais de negro,
nem vestígios de ódio.
Água (quase tudo)
e cloreto de sódio.


(Cortesia do portal CITI - Centro de Investigação para Tecnologias Interativas)

____________________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 18 de setembro de 2015 > Guiné 63/74 - P15127: Agenda cultural (424): "Canções da Guerra", um programa da Antena 1, todos os dias, a partir de 14 do corrente, de 2ª a 6ª feira, às 10h45, 14h55 e 20h55, com António Luís Marinho...

(**) Vd. poste de 28 de junho de 2009 > Guiné 63/74 - P4595: Cancioneiro de Canjadude (CCAÇ 5, Gatos Pretos) (2): Binóculos de Sol (José Martins)

Vd. também poste de 28 de fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - P576: Cancioneiro de Canjadude (CCAÇ 5, Gatos Pretos)

sábado, 27 de junho de 2015

Guiné 63/74 - P14802: Cancioneiro de Buba: "Oh! Xenhôr dos Matosinhos /, Oh! Xenhôra da Boa-Hora,/ Ensinai-nos os caminhos /P'ra desandarmos daqui p'ra fora!" ...(Manuel Traquina, ex-fur mil at inf, CCAÇ 2382, Buba, 1968/70)



Manuel Traquina, ex-fur mil at inf,
CCAÇ 2382, Buba, 1968/70,

1. Diz o Manuel Traquina, alentejano, no poste  P7324 (*), que os seus 24 anos, passados em Buba, no dia 5 de junho de 1969, foram celebrados como deve ser e melhor regados com uísque do bom. 

Tinha já ele dois anos e meio de tropa e ainda lhe faltava mais um ano para a peluda, se lá chegasse com vida e saúde... Estava mais que farto... Estava "farto deles"... Estávamos todos "fartos deles",. camarada... 

"Eles" era muita gente, mas cada um lá sabía dos seus ódios de estimação...Nessa altura,. eu tinha apenas uma semana de Guiné, e já tinha chegado a Contuboel onde puseram a funcionar um pseudo centro de intrução militar... Éramos mais de 400, entre instrutores
e recrutas, a CART 2479 e a CCAÇ 2590 (reduzia a 60 gatos pingados)... Os nossos recrutas, do recrutamento local, eram mais de 3e deram origem às futuras CART 11 / CCAÇ11 e CCAÇ 12...


Ao fim de seis meses eu também já cantava o "Eles não sabem nem sonham / Que o sonho comanda a vida / E que sempre que um homem sonha / O mundo pula e avança / Como  bola colorida / Entre as mãos de uma criança".. O poema era do António Gedeão, lembram-se ?...

Não admira, por isso, que a canção favorita em Buba, por esses tempos, fosse o "senhor de Matosinhos", com o Cardoso da 15ª Companhia de Comandos, à viola, e o Gonçalves da CCS do Batalhão 2834, no acordeão...

Cantava esta e outras, ao fim de seis meses, já "apanhado do clima"... Não admira, por isso, que o "senhor de Matosinhos"  fosse uma das canções favoritas da malta da Guiné, cantarolada por muitos de nós, nas noites de álcool, camaradagem e solidão... Não só por ser brejeira e divertida mas também pelo seu refrão, a que dávamos um sentido e um tom, sarcásticos, de contestação à tropa e à guerra... Em Buba, em Bambadinca, em muitos outros sítios... Julgo que a maior parte da malta não sabia a letra completa, mas todos sabiamos ao menos o refrão, muitas vezes cantado à moda do norte:

Oh! Xenhôr dos Matosinhos,
Oh! Xenhôra da Boa-Hora,
Ensinai-nos os caminhos
P'ra desandarmos daqui p'ra fora.


2. Aqui fica a letra. recuperada de um sítio dos escoteiros, e reproduzida com a devida vénia... [Ar livre > Escotismo > Cancioneiro].

Li algures, mas ainda não pude confirmar, que o autor (da letra e da música) seria um tal Avelino Carneiro (1907-1961), natural de Telheiro, São Mamede de Infesta, Matosinhos, talentoso autor, amador, de alguns peças de teatro de revista (, a primeira das quais terá sido, em 1942, "O senhor de Matosinhos), levadas a cena no Porto mas também em Lisboa, no parque Mayer. 

Nada como a malta de Matosinhos para me esclarecer sobre este ponto... Por falta de tempo, não pesquisei mais nada sobre o "senhor de Matosinhos" que eu devo ter ouvido, pela primeira vez, na Guiné... E confesso que nem sequer sabia bem onde ficava Matosinhos... Só lá fui depois do 25 de abril, não à festa mas à terra, de gente boa, trabalhadora e hospitaleira... LG


Pom pom...

Da chidade da birgem, os dois,
Nós biemos há dias para cá,
A biagem foi bom mas depois
Ninguém biu o que a gente biu já.

Dizem que lá por Lisboa
A bida é boa, boa bai ela,
Mas só se bêem p'las ruas
Catraias nuas, ó lariló lé las.

Por isso como em Paranhos
Há paus tamanhos que é de 'spantar,
Na Baixa ou no Arrebalde
São de ramal os paus no ar.

Refrão

Oh! Xenhôr dos Matosinhos,
Oh! Xenhôra da Boa-Hora,
Ensinai-nos os caminhos
P'ra desandarmos daqui p'ra fora.

Pom pom . . .

Sant' Antoninho da Estrada,
Não digas nada, de tudo isto,
Quinté já sinto ingonias
Das porcarias que tenho bisto.

Ind' ontem ali na abenida,
Uma astrebida de perna à bela
Quis m' agarrar na mãozinha,
Mas, coitadinha, lebou com ela.

Refrão (...)



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  Nota do editor:

(*) Vd poste de 23 de novembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7324: Venturas e Desventuras do Zé do Olho Vivo (Manuel Traquina (8): Dia de Aniversário

segunda-feira, 8 de setembro de 2014

Guiné 63/74 - P13587: Convívios (623): I Encontro de paraquedistas do Oeste... Lourinhã, 6 de setembro de 2014... Parte II: O Hino dos Boinas Verdes







Lourinhã > Largo António Granjo > Monumento aos Combatentes do Ultramar > 6 de setembro de 2014 > I Encontro dos Paraquedistas do Oeste > Lourinhã >  Um grupo de antigos páras, da Associação de Pára-quedistas Tejo Norte, com sede em Oeiras, canta o "Hino dos Boinas Verdes"...

Vídeo (2' 10''):. Alojado em You Tube > Nhabijões.

Foto e vídeo: © Luís Graça (2014). Todos os direitos reservados.


Hino dos Boinas Verdes

Lá do céu com valentia,
Descem sempre de noite ou dia,
São soldados desconhecidos,
Boinas Verdes são destemidos.

Olhem bem, sintam respeito,
Eles têm asas ao peito,
Cabeça erguida, heróis do ar,
Boinas verdes vão a passar.

Com orgulho em defender
A Nação p'ra não morrer,
Lutadores são, afinal,
Boinas Verdes de Portugal.

Lá do céu a gente pede
Para na terra morrer de pé,
Dando a vida que Deus nos deu,
Boinas Verdes sobem ao céu.

Olhem bem, sintam respeito,
Eles têm asas ao peito,
Cabeça erguida, heróis do ar,
Boinas verdes vão a passar.


[Fonte: Cortesia de Boinas Verdes de Portugal]

Música dos americanos  SSgt [Staff Sargent] SF[Special Forces] Barry Sadler  e Robin Moore. Título original "The Ballad of The Green Berets", 1966. Vd. no You Tube uma interpretação do próprio Barry Sadler]

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quinta-feira, 30 de janeiro de 2014

Guiné 63/74 - P12657: O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande (79): Notícias do nosso primeiro Silvério Dias e da "nossa tenente", rostos do Programa das Forças Armadas (ou PIFAS)

Silvério Dias
1. O nosso leitor Poeta Todos os Dias deixou, hoje, um comentário ao poste P10366  (*):

Olá amigos!
Que comoção! 
Ao fim de quase meio século, poder escrever:
"sempre ao vosso lado", 
quando "lá"
o dizia de viva e sentida voz.

Sou o "velho" 1º Sarg Silvério Dias,
vivo na Graça de Deus 
e tendo a meu lado a "senhora tenente" 
que me acompanha em 53 anos de matrimónio.

O que tenho para recordar? 
Um rol infinito de que procurarei ir dando conta. 
Para já, o reencontro!




Página principal do bogue do Silvério Dias, "Poeta Todos os Dias"... e onde se lê: "Sou beirão; ex-militar; Índia, Moçambique e Guiné. Na velhice, o vício da poesia, e o amor que me une às boas tradições beirãs"...


2. Comentário de L. G.:

Camarada, em nome da Tabanca Grande, os amigos e
camaradas da Guiné que já são mais do que um batalhão, damos as boas vindas ao nosso primeiro Dias e à "nossa tenente!" [, foto à direita,] que, durante alguns anos  foram o rosto do Programa das Forças Armadas (PFA), na Guiiné..

É caso para dizer, depois deste nosso reencontro, que o Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande!... É Grande, no sentido de nela caberam sempre... mais dois!... Ficamos à espera de novas. O mail é o seguinte: luisgracaecamaradasdaguine@gmail.com

Descobrimos que o camarada Silvério Dias criou, em 2011, e mantém até agora um bogue que dá pelo nome de Poeta Todos os Dias... Já tem mais de 26 mil visualizações. Aqui, para ilustração, um poema que ele publicou em 30 de dezembro de 2011:

Heróis do meu País

São dez mil, identificados,
Na pedra fria do Bom Sucesso!
Todos eles foram chorados,
A quando da ida, sem regresso.

São os mártires do meu país,
Vítimas do chamado Ultramar.
Por lá andei e Deus quis
Conceder-me a Graça de voltar.

Perdi amigos; chorei a perda;
Hoje, quando a dúvida se instala,
Mando, mentalmente, "à merda",
"Ilustres" a quem "bati a pala".

Onde mora o brio, o amor à farda?
O juramento feito à Bandeira?
Será que uma geração bastarda
Se rendeu, à bandalheira?


3. Já agora, aqui vão, ao sabor dos (a)casos da Guiné, mais alguns versos, com a devida vénia a autor [, Silvério Dias,. foto à esquerda,] e reforçando o convite para se juntar à nossa Tabanca Grande:

Silvério,  "O nascido na selva"

Significado bem original
Do nome que me foi dado.
Corrijo, algo errado.
Foi na serra que fui gerado!
13/1/2014






P.F.A. Noturno

"2001 Uma Odisseia no Espaço"
É referência que agora faço.
Abertura, "Programa das Forças Armadas"
Que na Guiné de então,
Unia todos os camaradas
Em "encontros" ao serão.

...no espaço do tempo, já lá vai meio século!


Testemunho Público

Também eu, estive lá!...

O MEU TESTEMUNHO
Ao Ilustre, António Ramalho Eanes

Do Presidente e General, falará a História.
Daquele Capitão que "promovi" a Major, *
No meu raro momento de glória,
Me pronuncio eu, em tom maior!

Servi-lo, uma honra na circunstância.
Foi fácil obedecer, vindo o exemplo
De quem, esquecendo a importância,
Desceu até nós, face ao momento.

Momentos que na Guiné partilhámos,
Sabendo ambos qual era o Dever.
Cada um por si, bem o prestámos,
À Causa que se viria a perder.

Ficou o elo, bem firme em mim,
Da admiração pelo Homem-Militar
Para prosseguir, agora e sem fim,
Até que esta minha vida durar.

Na mente, guardo o conceito,
Reservado às figuras duma existência.
A saber: Deus, meu pai e "Este Eleito",
Pelos exemplos, associados à evidência.

* Na cerimónia, impôs que fosse eu, a
colocar um dos galões.
Era, ao tempo, 2º Sarg.do Exército.

25/11/2013


Ao Soldado Desconhecido

Da CART 1802, "Pioneiros da Nova Sintra"

O Alentejo os viu nascer.
Do mesmo, um dia partiram
Para certo destino, a saber,
Sem saberem, ao que iam...

Defender a Pátria, a mensagem.
E com espingardas vos armaram.
Bilhete, só de ida na bagagem,
Pois quantos foram e não voltaram!...

Teu número de condenado, 1802-
Como "fato de riscas", o camuflado-
Trabalhos forçados, te deram depois,
Desde esse dia, malfadado.

Do mesmo lugar de antanho,
Donde partiram as caravelas,
Eis que partem, sem arreganho.
No coração, mil mazelas.

Falar da viagem, a odisseia,
É o dizer, de agonia prolongada,
Feita de enjoos, à mão cheia,
Da novidade não programada.

A chegada a lugar estranho,
De calor tórrido, pegajoso,
Terra à vista, de mau amanho,
Sem vestígios de algo vistoso.

Nova viagem, novo atropelo,
Na barca cinza, de nome lancha.
Todos ao monte, como em novelo
Que desordenado se desmancha.

Pé firme em terras de Farim.
Aqui ficarás, nobre Zé soldado,
Até que um toque de clarim,
Te remeta, a qualquer outro lado.

E foste, como "um pau mandado"
Tropeçando aqui, levantado além,
Por vezes mal comandado,
Tu cumpriste, forte e bem!

Comendo o pão do diabo,
Por ele amassado e com teu suor,
"Temperaste"o que te era negado,
Por falhas, de vulgar superior.

Soubeste traduzir, "bolanha",
Num momento, todo ele sacrificado,
Quando em prova de esforço, tamanha,
Tiveste de passar, p'ró outro lado.

E foste, de novo "baptizado"
Na pia baptismal da picada.
Causou danos, mas bafejado,
Subtraíste o corpo à rajada.

Alguém ficou. Por ti chorado
Em dia fatídico de má desdita,
Sem honras devidas a um finado
Que, longe dos seus, já não palpita.

Quantas palpitações, tantos medos,
Sofridos, em constante desalento...
E os dias parecendo quedos,
Pois decorriam, de modo lento...

Do teu Mundo do Alentejo,
À terra que te viu nascer,
Juntaste nomes de sobejo
Que te obrigaram a conhecer:

Fulacunda, Jabadá, S.João...
São hoje recordações a rever.
Lá deixaste parte do coração,
Não por amor, mas p'lo sofrer.

Construíste, um lugar novo.
Nova Sintra, assim registado.
E, por seres homem do povo,
Como "pioneiro" serás recordado!

O regresso. Missão cumprida.
Dela esquece, a má memória.
Ao longo da tua vida,
Constarás, da nossa História,

Lembrando o Homem-soldado
Que obrigaram a lutar,
Por um ideal mal contado
Que o futuro veio revogar.

Porque tens a alma pura,
Perdoa a quem te fez mal.
Acabada a ditadura,
Temos um novo Portugal.

Embora, com outras sequelas.
Pois parece ser nosso Destino,
Viver sempre em más novelas,
Quando se é pequenino!

"Pioneiros de Nova Sintra"
Em comissão na Guiné, de 1967-69.


segunda-feira, 13 de janeiro de 2014

Guiné 63/74 - P12582: O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande (78): Informação sobre o ex-1º srgt Fernando Brito, da CCS/BART 2917 (Bambadinca, 1970/72), que é meu avô, está reformado como major e vive em Coimbra (Cláudio Brito)



Guiné > Zona leste > Setor L1 > Bambadinca > CSS/BART 2917 (1970/72) > c. 2º trimestre de 1970 > O então 1º sargento Fernando Brito, na estrada de Bambadinca-Bafatá às voltas, com o condutor e um outro militar, com um problema no motor do seu jipe.


Fotos: © Benjamim Durães (2010). Todos os direitos reservados.[Edição e legendagem: L.G.]



Coimbra > c. 2013 > Avô e neto, da esquerda para a direita, Fernando Brito e Cláudio Brito.

Foto: © Cláudio Brito (2014). Todos os direitos reservados.

1. Mensagem do nosso leitor Cláudio Brito:

De: Claudio Brito

Data: 12 de Janeiro de 2014 às 15:47

Assunto: Informação sobre o Capitão Fernando Brito



Boa Tarde, Caro Sr. Luís Graça,


Observei com atenção o seu blog, no qual fala, entre muitas outras coisas, do meu avô, o Capitão Fernando Brito, reformado como Major e, na altura da comissão na Guiné, 1º Sargento [, da CCS/BART 2917, Bambadinca, 1970/72]. Foi numa pesquisa que encontrei, para minha felicidade, esta página, o poste P9144.(*)

Congratulo vossas excelências pelo magnífico trabalho da História militar que no blog em causa executaram. Eu próprio sou formado em História, licenciatura e mestrado, e muito (se não quase tudo) devo ao meu avô.

Quero então informar, para atualizar o seu blog, que o Capitão Fernando Brito, por quem expressam carinho e saudade na página em causa, está vivo, tem 82 anos, está de boa saúde e continua a morar em Coimbra, no mesmo prédio, só o telefone é que mudou [Endereço a comunicar aos camaradas de Bambadinca, pelo correio interno da nossa Tabanca Grande, incluindo os orgnaizadores dos encontros do pessoal do BART 2917, L.G].

A minha avó, a senhora com o nome russo que falaram na página, Natacha, infelizmente morreu no passado dia 23 de Março do ano 2012. A juntar com a morte do meu pai (seu filho), a 9 de fevereiro de 2001, como devem entender, foram dois duros golpes para o meu avô que, para minha admiração, continua "rijo que nem um pêro", mantendo o físico e o verbo.

Pedia, se quisessem, pois o deixaria muito feliz, que lhe ligassem e falassem um pouco com ele ou mesmo que um dia se pudesse organizar um almoço ou convívio para relembrar algo que ainda o deixa feliz, os dias da tropa (e não da guerra).

Gostaria também de adquirir esse Cancioneiro, de que falam com tanto orgulho no blog :)

Deixo então as informações, aguardando uma resposta. Envio, igualmente, uma foto atual do meu avô comigo. Espero que gostem.

Os meus melhores cumprimentos e saudações

Cláudio Fernando Brito


2. Comentário de L.G.:

Meu caro Cláudio: Como costumamos dizer o Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande!... Sem imodéstia: somos 636 "amigos e camaradas da Guiné", a maior parte combatentes. Acabei de falar, pelo telefone fixo que me deste, com o teu avô, e meu antigo camarada de armas de Bambadinca, onde estivemos kuntos cerca de 10 meses, entre maio de 1970 e março de 1971. Ele era o 1º srgt da CCS/BART 2917 e eu era o fur mil armas pesadas inf Henriques, da CCAÇ 12 (Bambadinca, 1969/71). 

Reconheci-lhe a voz, de imediato, e perguntei-lhe se ainda cantava... Ele tinha uma bela voz de barítono... Continua, de facto, na mesma, em boa forma, pelo que me pareceu, à distância... Quarenta e três anos nos separam. Embora eu soubesse onde ele morava, em Coimbra, nunca mais nos encontrámos. Tentei, em vão, ligar-lhe algumas vezes. Foi graças ao teu mail, que acabo de descobrir o nosso Fernando Brito... E deixa-te tratar-te por tu porque os filhos e os netos dos nossos camaradas nossos filhos e netos são...

Falámos um bom bocado e eu confirmei aquilo que me transmitiste: a morte do seu filho e teu pai, num brutal acidente de viação, em 2001, e a perda, mais recente, da sua querida Natacha, sua esposa e tua avó. Foram dois duros golpes para a família, mas  também fiquei a perceber quanto ele te adora e admira.  Para ti, desejo boa sorte, em termos pessoais, académicos  e profissionais. Sei que gostas de história, como eu, oxalá tenhas oportunidade de trabalhar nessa área, como investigador e/ou docente.

Quanto ao teu avô, não sabia que ele tinha voltado à Guiné, para uma nova comuissão, desta vez em Madina Mandinga, na região do Gabu. onde terá apanhado "manga de porrada",  nos anos terminais da guerra. Também fiquei a saber que, depois da reforma, foi dirigente da Associação Académica de Coimbra – Secção de Futebol.

Para terminar, deixa-me dizer-te que eu convidei  o teu avô para integrar a nossa Tabanca Grande. Disse-me logo que sim, que teria muita honra. Prometeu-me ceder imagens dos seus diapositivos de Bambadinca e Madina Mandinga. Disse-lhe que tinha um lugar, o nº 637, à sua espera, para ele se sentar à sombra do poilão da nossa Tabanca Grande (**). 

Muita saúde longa vida para ti, Fernando Brito.

PS - Quanto ao Cancioneiro de Bambadinca, para já só tem uma letra e uma música, o fado "Brito que és Militar"... Uma homenagem, na época ao teu avô (*)... Temos feito recolha de letras de canções de caserna, que cantávamos  durante a guerra colonial na Guiné. Pode ser que um dia  destes se publique um livrinho com esse material (ou uma seleção)... E nessa altura o fado "Brito que és militar" irá figurar nessa antologia...

______________

Notas do editor:

(*) Vd. poste de 6 de Dezembro de 2011 > Guiné 63/74 - P9144: O nosso fad...ário (5): Fado Brito que és militar (Letra de Tony Levezinho, ex-Fur Mil At Inf, CCAÇ 2590/CCAÇ 12, Bambadinca, 1969/71)

(**) Último poste da série > 15 de novembro de 2013 > Guiné 63/74 - P12297: O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande (77): Dois antigos camaradas da mesma unidade (CCAÇ 12), mas de épocas diferentes, sem grande tempo para se encontrarem em Lisboa, partem sábado, no mesmo avião, para Luanda, onde vão em trabalho...

sábado, 16 de março de 2013

Guiné 63/74 - P11263: Memórias de Manuel Joaquim (10): Se em Bissau não "Tombe la Neige" pela certa "Tombe la Pluie"

1. Mensagem de Manuel Joaquim (ex-Fur Mil de Armas Pesadas da CCAÇ 1419, Bissau, Bissorã e Mansabá, 1965/67), com data de 12 de Março de 2013:

Meus caros Luís, Carlos e Eduardo:
Também eu, um dia, fui soldado-letrista. Mas o resultado não foi brilhante. As suas repercussões não passaram muito para lá do meu umbigo!
Vai aqui a "estória".
Se nela acharem alguma piada para poder ser publicada, ficam ao vosso critério, que muito respeito, o modo e os possíveis cortes que porventura achem por bem fazer.
Um afetuoso abraço
Manuel Joaquim


MEMÓRIAS DE MANUEL JOAQUIM

10 - Tombe la pluie

Tenho uma “estória” sobre uma canção famosa de Adamo, a “Tombe la Neige”

Bissau, inícios de Setembro de 1965, Quartel de Sta. Luzia.

Tinha comprado, há pouco tempo, um rádio-gravador que, de imediato, se tornou um “companheiro” imprescindível. A primeira coisa que nele gravei foi o que me apareceu à mão, quatro canções de Adamo, de entre elas a “Tombe la neige” (Cai a neve), muito na berra naquela altura.


Numa noite chuvosa passada em serviço de “sargento de dia” na Casa da Guarda ao lado da Porta de Armas, ouvindo e reouvindo Adamo, achei piada à discrepância entre as palavras da canção “Tombe la neige” (Cai a neve) e a realidade do clima tropical quente e húmido que estava a suportar naquele momento. Ao som da chuva a cair logo surgiu um título alternativo, “Tombe la pluie” (Cai a chuva). E assim arranjei um belo motivo para me ajudar a passar a noite. Umas horas depois já tinha o rascunho de uma versão da letra, adaptada ao local onde vivia.

Tempos mais tarde pedi ajuda na messe de sargentos a um furriel que por ali via frequentemente a ler em francês e lá fizemos uma versão “definitiva” que depois tentei implantar nos momentos de convívio “cantoral” mas os resultados foram desanimadores. Só se percebiam uma ou duas vozes cantando a nova letra, o resto eram confusos “lalalás” da maioria. A maior parte do pessoal não sabia o suficiente de francês para apreender o texto e assim não se saía do básico “Tombe la pluie, lalalalala …lalalalala …”. Mesmo desmotivante.

Pensei, então, em arranjar uma versão em português mas o entusiasmo passou e o interesse foi-se diluindo na variedade de chamarizes existentes em Bissau para nos preencher os tempos livres. De vez em quando, na camarata, ao ouvir-se o original saído de algum aparelho, lá vinha um “tombe la pluie” ou um “e cai a chuva” sem continuação. E a chuva como tema da canção acabou por morrer.

Adamo foi substituído no gravador por outro(s) intérprete(s) e canções. A folha com esta nova versão em francês ficou perdida, dei por isso mais tarde, entre as folhas de um livro de Jorge Amado, “Mar Morto”, livro que emprestei ao furriel Henriques, camarada da CCaç 1419, aquando duma sua “viagem” de barco a Bedanda em serviço de segurança a um batelão de abastecimentos. Entretanto a estação das chuvas foi chegando ao fim, a CCaç 1419 saiu de Bissau para Bissorã e a letra de “Tombe la pluie” andou a “marinar” no “Mar Morto” que me foi devolvido já em Bissorã, exalando um forte e especial cheiro. É que o livro tinha viajado com o saco do bacalhau que a secção do Manuel Henriques levou para comer durante a viagem. As suas folhas ficaram de tal modo impregnadas que ficaram durante muitos meses a cheirar fortemente a bacalhau, de tal modo que o seu título ficou mesmo a condizer com o objecto, cheirava a “mar morto”.

Ao retomar o livro, encontrei dentro dele a folha com a “Tombe la pluie”, folha que tinha servido para o Henriques marcar a página de leitura. Foi guardada com uma leve esperança de ainda poder vir a ser utilizada na futura estação das chuvas para reavivar a canção com a malta de Bissorã. Qual quê! Tão quietinha ficou entre outros papéis que nunca mais me lembrei dela até uns largos anos mais tarde quando, ao procurar bases para a redacção de um texto sobre a guerra colonial para o semanário “O Jornal”, a encontrei.

Achei muita graça ao facto, até pelas memórias que me trazia. Ofereci tal “obra” à minha esposa, com um bom beijinho a condizer com os termos em que está redigida. E ela gostou muito! Até me sugeriu a compra do original “Tombe la neige” para lembrar melhor os passos da canção, coisa que eu fiz. E assim demos nova vida à “Tombe la pluie”. Ainda hoje, naqueles dias chatos de chuva, nos salta um “Tombe la pluie et mon coeur s’habille de noir”.

____________

Nota do editor:

Vd. último poste da série de 25 DE NOVEMBRO DE 2012 > Guiné 63/74 - P10722: Memórias de Manuel Joaquim (9): Na guerra, nunca dei um tiro!... (só dei um)

sábado, 4 de fevereiro de 2012

Guiné 63/74 - P9442: In Memoriam (108): Fur Mil SAM Fernando Maria Teixeira Dias, da CART 1746, morto na emboscada de 14 de Novembro de 1968, perto da Ponta Coli, Xime (Manuel Moreira / Rui Dias Moreira)



Guiné > Região do Oio > Bissorã > 1968 > CART 1746 (Bissorã e Xime, 1967/69) > O saudoso Fur Mil SAM é o militar de óculos escuros, na ponta esquerda.

Foto: © Manuel Moreira (2012). Todos os direitos reservados


1. Mensagem do nosso leitor Rui Moreira, empresário e gestor do Porto, enviada em 24 de Janeiro último:

Assunto: Pedido de informação

 Luís Graça:

Ao visionar por mero acaso o seu blogue Luis Graça & Camaradas da Guiné deparei-me com um gigantesco manancial de informação sobre a Guerra Colonial nomeadamente no teatro de operações da Guiné.

Chamo-me Rui Fernando Teixeira Dias Moreira,  tenho 53 anos de idade, dois filhos já adultos (com 27 e 21 anos,  respectivamente) e o meu tio Fernando Maria Teixeira Dias, irmão mais novo de minha mãe, furriel miliciano VM [ vagomestre, nº mecanográfico]03682465 pertenceu ao BCac 2852 /CArt 1746 e faleceu na Guiné em 14/11/1968, julgo que a pouco tempo de regressar.

Estas são as únicas informações que possuo e que consegui obter através da Net.

Sendo eu o primeiro de 4 irmãos, o meu tio Fernando foi o mais próximo de um irmão mais velho que alguma vez tive. Natural de Amarante veio, ainda adolescente, estudar para o Porto, passando a viver em casa dos meus pais, onde compartilhava um quarto comigo. A sua partida para a Guiné arquivou,  nas minhas memórias de criança, um dos raros sentimentos de infelicidade e saudade que perduram até hoje.

Por um triste acaso fui eu que atendi a porta, a um estafeta que julgo era da companhia Marconi, portador de um telegrama e que me pediu para falar com o pai. Os acontecimentos que se seguiram gostaria de os manter apenas na minha memória.

O assunto da morte do tio Fernando, foi sempre uma espécie de tabu nomeadamente para as crianças da família, que era a minha condição na altura. Ouvimos alguns zum zuns como o de uma visita feita ao meu avô, homem rijo, temperado por uma guerra e uma vida não isenta de dificuldades, por um antigo companheiro de armas de meu tio, que o teria deixado bastante combalido.

Depois nunca mais se falou no assunto e o meu tio Fernando passou a ser uma memória visual na sala de estar da casa dos meus avós.

Por entender que os Portugueses, independentemente de quaisquer considerações filosóficas ou políticas, mereciam ter tido um outro tratamento por parte da Nação que defenderam com armas na mão, com todo o tipo de custos que esse facto lhes terá acarretado, bem como a sua história estar ainda por escrever, vi-a respeitada, no sentido estrito e lato da palavra, no seu blogue.

Também porque ainda hoje, enquanto lhe escrevo, tenho sentimentos que pensava o tempo tinha já apagado para sempre, atrevo-me a pedir-lhe o favor de, se lhe for possível, guiar-me ou ajudar-me no sentido de saber como o meu tio deixou a sua ainda curta vida na Guiné.

Com um pedido de desculpas por o importunar, não o conhecendo e agradecendo desde já o seu tempo.
Com os melhores cumprimentos,
Rui Fernando Teixeira Dias Moreira.

 

2. Informação, com data de 31 de janeiro,  que nos foi dada pelo nosso camarada Manuel Moreira, a nosso pedido, sobre a emboscada de 14/11/1968 que vitimou o

Assunto: A Emboscada de 14 de Novembro de 1968

 
Amigo e Camarada Luís:

O dia 14 de Novembro de 1968 está na memória de toda a CART 1746 .

Eu tinha chegado no dia 13 à tarde da talvez mais dura Coluna em que a CART 1746 participou e que durou três dias mas fica para contar a qualquer momento.

No dia 14, a coluna prepara-se para sair [do Xime] e o 1º Cabo Mec Pinheiro que foi nela, e  que também é de Águeda, pediu-me para ser eu a ir no lugar dele porque temia algum perigo nesse dia. Como eu tinha acabado de chegar de uma outra coluna muito dura e complicada, estaria preparado para outra, ao que eu recusei. Também ia o Furriel  Mecânico.


A coluna sai,  vou ao "Abrigo dos Mecânicos " fazer a minha cama e, qual o meu espanto, encontro um papel escrito pelo Pinheiro debaixo da minha almofada que dizia: "Moreira, hoje vou morrer na emboscada. Peço-te que,  quando fores embora, contes à minha Mãe como aconteceu".

Claro que abanei todo de cima a baixo e disse: "Este gajo é doido !"... Tinha acabado de ler esta mensagem quando rebenta o fogo na mata a seguir à bolanha da saída do Xime entre Taliuara e Ponta Coli.

Um Grupo de Combate  acorreu imediatamente do Xime para socorrer e apoiar a coluna e eu segui sozinho num Unimog à procura de feridos. Encontro o Pinheiro com um joelho ferido e carreguei-o para o Xime .


O fogo durou cerca de 15 minutos e,  quando acabou, regressaram ao Xime todas as viaturas com todo o pessoal e os feridos, que foram muitos,  atingidos nas costas,  já no chão, por estilhaços quando uma granada de RPG bateu no taipal de uma viatura e fez ricochete.


Numa das viaturas vinha o Fur Dias , já sem vida. O Fernando Maria Teixeira Dias era o nosso Vaguemestre.


Como faz parte do meu "Diário de Guerra" em verso, junto as quadras alusivas à emboscada e que são:


285


O Novembro de 68
Foi o mês de pior sorte,
A Companhia sofreu,
Em Combate, a única morte


291


Mas 14 de Novembro
É a data mais lembrada,
Morreu-nos o Vaguemestre
Em terrível emboscada.


292


Ia em muitas colunas,
Comprar gado era a missão,
Pois ele era o responsável
Pela nossa alimentação.


293


Fernando Dias,  de seu nomem,
Furriel era o seu Posto,
Era muito popular,
Sentimos grande desgosto.


E para que fique registado, envio uma foto tirada em Bissorã num desfile pela Vila onde o Fur Dias, de óculos, eu e o Fur Polho fazemos a linha da frente. Curiosamente o Fur Polho faleceu em Janeiro de 2011.


Envio um Abraço de Solidariedade ao sobrinho Rui Fernando .


Um Abraço,  Luis.

Manuel Moreira

3. Resposta ao Rui F. T. Dias Moreira:

Meu caro Rui:


Li com mágoa, compaixão mas também com algum conforto a sua mensagem. Ficamos sempre sem jeito quando um familiar de um camarada nosso nos pergunta: "Diga-me como morreu o meu tio, o meu irmão, o marido, o meu namorado, ou até o meu pai"...

Temos portugueses, 40 anos depois, que não sabem como morreram os seus entes queridos na guerra colonial... O exército limitava-se a mandar um seco telegrama com a triste ocorrência... Isso acontecia com toda a gente, incluindo os oficiais do quadro... Ora o silêncio sobre a morte de alguém (e as suas circunstâncias, ainda para mais na guerra) é sempre opressivo e não nos ajuda a fazer o luto... Por isso, dou-lhe os parabéns também pela sua iniciativa, reveladora de uma grande nobreza de caráter e de uma grande humanidade... O Rui é um exemplo e um conforto para todos nós que, tendo vivido o fantasma da morte e do abandono, tivemos apesar de tudo a sorte de regressar...

Interessei-me naturalmente pelo seu caso e pedi ao meu camarada Manuel Moreira, que é de Águeda e foi da mesma companhia do seu tio, para me dar informação adicional sobre essa terrível emboscada do dia 14 de novembro de 1968... O Manuel Moreira é dos bravos do Xime que faz parte desta comunidade virtual que é o nosso blogue.

Eu ainda não estava na Guiné, só lá cheguei no início de Junho de 1969 mas ainda conheci (de vista) alguns camaradas da CART 1746: foram eles que montaram segurança à estrada Xime-Bambadinca, quando viémos de Bissau, em Lancha de Desembarque Grande (LDG), e abicámos ao Xime, a caminho do leste... O inferno do Xime, como eu próprio viria mais tarde a conhecer (A minha companhia africana, CCAÇ 12, fez lá muitas operações e inclusive fez segurança à nossa estrada, alcatroada, que entretanto foi feita)...

Essa emboscada ficou na memória dos nossos camaradas... Muitos meses depois, em meados de 1969, eu ouvi contar a história e soube da morte do nosso camarada, o furriel vagomestre Fernando Maria Teixeira Dias... Sempre que passávamos à na zona de Taliuará / Ponta Coli, a seguir ao Xime (ou antes do Xime, para quem vem de Bambadinca) (vd. aqui o mapa do Xime), lembrávamo-nos respeitosamente dos camaradas que tinham sido vítimas dessa emboscada...

Melhor do que ninguém, o Manuel Moreira explica-lhe o que se passou, nessa manhã. Ele é o único representante, no nosso blogue, da CART 1746, juntamente com um outro camarada que está nos EUA há 40 anos, o J. Ferraz, mas que chegou ao Xime já depois da morte do seu tio... Também já aqui apareceu o capitão da companhia, cap António Manuel Rodrigues Vaz, como simples leitor, não tenho a certeza de ele nos ter deixado o seu endereço de email... Vou ver melhor com tempo e vagar... (O Gilberto Madail também era desta companhia, mas nunca entrou em contacto connosco: temos no blogue uma ou outra história ou foto com ele).

O Manuel Moreira teve, além disso, a gentileza de nos mandar uma foto com o seu tio.. E mais: alguns versos do seu cancioneiro do Xime...em que ele presta homenagem ao único morto em combate da companhia... Tomo a liberdade de partilhar, com ele, esta mensagem que lhe mando a si, em privado. Gostaria no entanto de pedir ao Rui autorização para publicar no blogue esta nossa troca de mensagens, no caso de não achar inconveniente. O seu exemplo merece ser conhecido da nossa geração e da geração dos nossos filhos, bem como dos portugueses, em geral, que são um povo amnésico.... E queremos também fazer um poste, para a série In Memoriam, de homenagem ao furriel Dias. Podemos, no entanto, omitir a identidade do Rui, por razões éticas, sociais, profissionais ou outras.

Peço-lhe desculpa pela demora na resposta. Hoje tentei telefonar-lhe para a empresa. Disponha sempre. E, inclusive, fica convidado para integrar este espaço de partilha de memórias e de afetos que é o nosso blogue, e a nossa Tabanca Grande (reunimo-nos pelo menos 1 vez por ano, em Monte Real,e já somos mais de meio milhar). Um Alfa Bravo (ABraço).

Luís Graça
 
4. Resposta, de 1 de fevereiro, do Rui Dias Moreira:
 
Caro Luis Graça: Começo por lhe agradecer, respeitosamente, o tempo e o esforço que despendeu para satisfazer o meu pedido, agradecimentos que estendo ao seu camarada Manuel Moreira.
 
Não respondo hoje ao telefonema que teve a amabilidade de me fazer(não estava no escritório, por mera coincidência tinha ido a Amarante por questões profissionais), porque fiquei com os sentimentos ou pouco baralhados e tenho receio de não conseguir articular a conversa que gostaria de ter consigo… escrevendo é mais fácil.
 
Mas se me autorizar devolvo-lhe posteriormente o telefonema, para um dos números que menciona no seu mail.Quanto á utilização da nossa troca de palavras, fará o Luis aquilo que entender, não tenho qualquer problema seja de que natureza for a que ela se torne pública , antes pelo contrário!
 
Vou pedir autorização à minha mãe, minhas tias e ao meu tio, para digitalizar algumas fotos do tio Fernando que lhe enviarei. Porque da memória dos vivos, tem também que fazer parte a saudade dos mortos. Com um muito obrigado mais uma vez. Abraço,  Rui Dias Moreira
_____________

 Nota do editor:

Último poste da série > 29 de janeiro de 2012 >
Guiné 63/74 – P9416: In Memoriam (107): Está de luto a CCAV 488 do BCAV 490, pelo falecimento de Augusto Pimenta Henriques Simões (Fur Mil)

terça-feira, 13 de dezembro de 2011

Guiné 63/74 - P9189: O nosso fad...ário (7): O fado do BART 2857: Parte I: Obras em Piche: letra de José Luís Tavares, recolha de Manuel Mata (Esq Rec Fox 2640, Bafatá, 1969/71)



Guiné > Zona Leste > Bafatá > Esq Rec Fox 2640 (1969/71) > Jardim da Bafatá > Eis o autor das quadras que aqui se publicam, buscando inspiração na espuma dos dias, o José Luís Tavares, sentado, à direita, sob a estátua de João Augusto Oliveira Muzanty, um dos pacificadores da Guiné tal como Teixeira Pinto. Primeiro tenente da Marinha,  foi governador do território entre 1906 e 1909.

O monumento a Oliveira Muzanty, inaugurado em 28 de Maio de 1950, foi obra do escultor António Duarte e do arquitecto Fernando Pessoa. Encontra-se hoje parcialmente destruído (só resta a base em pedra onde assentava a estátua do nosso antepassado).

Foto: © Manuel Mata (2006). Todos os direitos reservados




Guiné > Zona Leste > Bafatá > Esq Rec Fox 2640 (1969/71) > O Manuel Mata em cima de uma Autometrelhadora Daimler.

Foto: © Manuel Mata (2006). Todos os direitos reservados


1. Manuel Mata é dos mais antigos membros da nossa Tabanca Grande. Na I Série do nosso blogue tem diversos postes publicados. Foi 1º cabo apontador de Carros de Combate M 47 (, máquina de guerra que nem sequer havia no TO da Guiné...). É do meu tempo do leste: pertenceu ao Esquadrão de Reconhecimento Fox 2640 (Bafatá, 1969/71, e era amigo (e confidente) do velho Teófilo, do Café Teófilo.

Há cinco anos atrás, ele mandou-nos algumas quadras que foram agrupadas, com maior ou menor propriedade sob a designação de Cancioneiro da Cavalaria de Bafatá. Foi a minha maneira de fazer uma pequena homenagem aos nossos camaradas da arma de cavalaria que penaram lá para os lados de Bafatá, Nova Lamego, Piche, Buruntuma... Também iam a Bambadinca, mas menos vezes. Bambadinca tinha o seu Pel Rec Daimler, que fazia o que podia (e podia pouco) para, com dignidade e coragem, ir aos pontos mais críticos e difíceis (sobretudo na época das chuvas) do Sector l1, como Mansambo, Xitole, Saltinho...

Do alentejano Manuel Mata, que vive no Crato, aqui vão algumas quadras do seu amigo José Luís Tavares, "homem de transmissões, companheiro do Esquadrão e das lides de organização dos convívios anuais" (sic)... Ele fez, em 2006, questão de sublinhar que se destinavam aos "amigos que gostam de quadras com algum sentido crítico-satírico"... 


Nunca cheguei a saber, junto dele, se na Cavalaria de Bafatá se cantava o fado... marialva ou não. Presumo que sim... Mas não tenho qualquer indicação de música de fado (ou outra) para acompanhar esta letra...  As quadras, com versos de 7 sílabas, são perfeitas (depois de um retoque final),  tocam-se com música de um fado tradicional, haja uma viola, um guitarra e uma garganta afinada. Pode ser o fado corrido, que casa bem com as quadras populares. Chamei-lhe nesta revisão o Fado do Bart 2857, com uma 1ª parte, Obras em Piche... (Com a devida vénia, ao autor da letra e ao Manuel Mata, que a recolheu) (*) (LG)


2. Fado do BART 2857: Parte I: Obras em Piche (***)

Aqui em Piche é mato,
Mas manga de animação,
Tem cá uma [bela] piscina,
Foi hoje a inuguração.

F'zeram várias brincadeiras
Que meteram muita graça,
Jogaram também f'tebol
E, ao fim, entrega da taça.

Foi um jogo de grande interesse,
Como já é natural,
Mas ao fim, em vez da taça,
Deram uma cerveja Cristal.

Vou dizer-lhes o resultado.
Só para nós em comum,
Que perderam os furriéis
Por nove golos a um.

Foi um jogo bem disputado,
Ouvi eu, numa entrevista,
Que mais par'cia uma final
Com Sporting e Boavista.

Passou-se isto a vinte e oito,
Mais nada, vou terminar,
E quanto à arbitragem
Acho que foi regular.

José Luis Tavares - Radiotelegrafista
28 de Junho de 1970


[Recolha: Manuel Mata] (**)

[Revisão /fixação de texto: L.G.]

__________

Notas do editor:

(*) Último poste da série > 9 de Dezembro de 2011 Guiné 63/74 - P9165: O nosso fad...ário (6): Fado Canção da Fome: Livrou o autor de levar uma porrada do célebre Pimbas (Manuel Moreira, CART 1746, Bissorã, Xime e Ponta do Inglês, 1967/69)


(**) Vd. I Série >
 Poste de 31 de Março de 2006 > Guiné 63/74 - DCLXV: Cancioneiro da Cavalaria de Bafatá (Radiotelegrafista Tavares) (1): Obras em Piche

(***) Ao tempo do BART 2857 (Piche, 1968/70), que tem um blogue próprio, aqui. Pelo "slideshow" com fotos do João Maria Pereira da Costa, vê-se que era malta danada para jogar á bola...

segunda-feira, 28 de novembro de 2011

Guiné 63/74 - P9109: O nosso fad...ário (1): O Fado da Emboscada (CCAÇ 5, Gatos Pretos, Canjadude, 1969) (João Carvalho / José Martins)





Guiné > Região do Gabu > Canjadude > CCAÇ 5 (Gatos Pretos, 1973/74) - Fado da Emboscada (*). Adaptado de O Embuçado (Música do Fado Tradição, da cantadeira Alcídia Rodrigues; letra de Gabriel de Oliveira; criação de João Ferreira Rosa) [Vd. aqui vídeo, da RTP Memória, inserido no YouTube por MikeFadoEtc em 7/8/2011]





Infogravura: © João Carvalho (2006) / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Todos os direitos reservados

Fado da Emboscada


A história que eu vou contar,
Já há muito aconteceu,
Gatos Pretos em acção,
Na grande operação
Lacoste, em Burmeleu.


A malt' ia pela mata,
Ainda não vira nada,
Mas por mal dos meus tormentos,
Com fortes rebentamentos,
Começou a emboscada.


Logo a malta reagiu,
No meio da confusão,
Atrás deles e a correr,
A gritar e a dizer
Gato Preto, agarra à mão!.


Perante a admiração geral,
No meio da algazarra,
Enquanto os turras fugiam,
Os nossos os perseguiam,
A gritar Agarra, agarra!.


E então já à noitinha,
Quando a tropa instalou,
P'ra nosso contentamento,
Munições e armamento,
Foi o ronco que ficou.


 
 
 
  1. O João Carvalho, que foi furriel miliciano enfermeiro dos Gatos Pretos, CCaç 5  (Canjadude, 1973/74) e - e hoje farmacêutico - quando apareceu na nossa tertúlia, no princípio de 2006, começou a rebuscar o seu "baú de recordações". E nessas voltas ao passado, disse-nos que encontrara "uma pequena bandeira [, guião,] dos Gatos Pretos", tendo digitalizado e enviado uma das faces que se volta a reproduzir aqui...
 
A par dessa preciosidade, também foi desencantar letras de canções com que os Gatos Pretos (se não todos, pelo menos os metropolitanos) exorcizavam os seus fantasmas, os seus medos, as suas angústias nas noites quentes e longas de Canjadude, na região do Gabu... Entre elas, esta letra de fado - o Fado da Emboscada - com que vamos inaugurar esta nova série - O Nosso Fad...ário - destinada a recolher, de maneira mais sistemática, letras  e, se possíveis, músicas de fados... 


2. Não sabemos quem é o autor da letra. Quem quer que tenha sido, não me parece que, a avaliar pela época, tivesse conhecimento do Cancioneiro do Niassa, onde há também diversas letras com adaptações de fados conhecidos (O Turra das Minas, o Fado do Turra, o Fado do Estado Maior, etc.)...  Devia estar familiarizado, em todo o caso, com o Fado "Embuçado", tema que é uma criação de João Ferreira Rosa, que o começou a cantar por volta de 1962, e que foi no seu disco Taverna do Embuçado, 1965).

Mas a  génese deste Fado da Emboscada já aqui nos foi explicada por um outro Gato Preto, mais antigo, o ex-Fur Mil Trms José Martins (1968/70)... Tomamos a liberdade de reproduzir aqui um excerto do seu poste de 1 de Março de 2006, ainda na I Série:

(...) "FADO DA EMBOSCADA



"Este fado, com música do Embuçado, faz referência à Operação Lacoste, que foi uma patrulha [ofensiva] ocorrida em 27 e 28 de Junho de 1969, e que,  tendo partido de Canjadude, passou por Sare Andebe, Ponto Cota 70, Burmeleu, Samba Gano,  e regresso a Canjadude.

"Houve contacto com o IN no final do dia 27. Quando a patrulha se preparava para montar a emboscada, foi detectado, na zona de Burmeleu, um grupo [IN] que nos atacou e ao qual foi iniciada a perseguição. No terreno ficaram armas e munições. Após o recontro retirámos para o Ponto Cota 70, que nos garantia protecção nocturna.

"Durante a noite assistimos à passagem de guerrilheiros que,  no dia seguinte, ao voltar a passar pela zona de Burmeleu, tínhamos 'festa rija' á nossa espera". (...)


Outros dois ilustres Gatos Pretos que pertencem à nossa Tabanca Grande são o ex-Cap Cav Pacífico dos Reis e o José Corceiro a quem perguntamos se não têm conmhecimento de mais letras de fado ou outras canções do Cancioneiro de Canjadude... Sabemos, através do José Martins, que a CCAÇ 5 teve um jornal de caserna, O Gato Preto, pelo menos em 1971, ou desde 1971... e de que terão saído uns 16 números...

3. Tocava-se e cantava-se o fado na Guiné, nas noites quentes e longas da Guiné... Violas, havia sempre, pelo menos uma, ao lado da G3... Violistas, dois ou três... Guitarras eram mais raras... Não tenho ideia de visto ou ouvido alguma, ao vivo, em Bambadinca ou noutros aquartelamentos por onde passei...(Talvez houvesse em Bissau). Vozes para cantar o fado, mesmo desafinadas, havia muitas...Numa companhia como a minha (CCAÇ 2590/CCAÇ 12) que tinha apenas 50 militares metropolitanos (os restantes eram do recrutamento local), lembro-me bem de malta que tocava e/ou cantava à viola ou acompanhado à viola...

Dos violistas, lembro-me logo do GG (Gabriel Gonçalves, 1º Cabo Cripto, lisboeta); do Zé da Ila (Fur Mil At Inf José Luís Vieira de Sousa, madeirense do Funchal); do Joaquim João dos Santos Pina (também Fur Mil At Infr, algarvio de Silves)... Todos eles tinham viola... O 1º Cabo Escriturário Eduardo Veríssimo de Sousa Tavares tocava acordeão (e acho que também arranhava a viola). Mas o que tinha mais cultura fadista era o nosso GG, companheiro inseparável de muitas noitadas e tainadas... Depois havia mais malta de outras subunidades: estou-me a lembrar do J. L. Vacas de Carvalho (hoje, também fadista amador), do Abílio Machado (, fundador do grupo Toque de Caixa), do David Guimarães (, agora ligado ao fado de Coimbra), etc. O Álvaro Basto e o Jorge Félix, que também tocam viola,  só os conheci através do blogue.

O Joaquim Mexia Alves  já não é do meu tempo de Bambadinca (Sector L1) mas sei que este era fadista apreciado e requisitado no TO da Guiné... Aliás, é autor de mais fados, para além do Fado da Guiné, que ele escreveu em 2007 para todos nós, seus camaradas e amigo...  É autor nomeadamente da letra do fado Montemor é praça cheia,  com música do Manuel Maria, e que foi gravado pelo Nuno Câmara Pereira, num disco de 1992, editado pela EMI- Valentim de Carvalho. (Vou ver se recupero um vídeo que fiz em Pombal, em 28 de Abril de 2007, por ocasião do nosso II Encontro Nacional, com a dupla J.L. Vacas de Carvalho / J. Mexia Alves).

Vem tudo isto a propósito de quê ? Do Fado, agora Património da Humanidade... O nosso modesto, discreto mas nem por isso menos valoroso contributo para a celebração deste evento (a inscrição do fado na lista do Património Cultural Imaterial da Humanidade, pela UNESCO) poderia bem ser, daqui a uns tempos, a oferta,  ao Museu do Fado,  de letras de fados cantados e tocados no nosso tempo, na Guiné n(com a identificação das respetivas músicas, em geral fados tradicionais ou então em voga na época)...  Julgo que faz falta, no Museu do Fado, um secção sobre a fado e a guerra do ultramar (ou colonial, como queiram)...

Fica então aqui o meu/nosso apelo para raparmos o fundo ao baú das nossas memórias, e desencantarmos mais letras (e eventualmente músicas) do nosso fad...ário! (LG)

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Nota do editor:

 
(*) Vd. I Série, poste de 28 de Fevereiro de 2006 >  Guiné 63/74 - DXCIII: Cancioneiro de Canjadude (CCAÇ 5, Gatos Pretos)